O Mundo Inimigo: Literatura E Sociedade



A condição da arte esclarecida por Antonio Cândido entende as manifestações literárias como expressão da sociedade. Dentro desse raciocínio, a narrativa do escritor mineiro Luiz Ruffato, assumindo uma postura interativa e dialógica entre literatura e sociedade, possibilita a expressão e a representação de identidades socialmente anônimas que segundo ele, não costumam ser retratadas no campo literário.

O desejo de Luiz Ruffato em colaborar no processo de representação social, chama para o centro o periférico que passa a ser iluminado e, portanto colocado em foco. Realiza por força de sua vontade, como escritor e agente da linguagem, a oportunidade para um exercício de crítica social, revestido no mais das vezes, por um estilo que enriquece uma narrativa, onde os desvalidos tem vez e voz 1, assim como Adélia Bezerra define a música de Chico Buarque.

O escritor pretende fazer uma leitura de décadas anteriores. Seu projeto chama-se Inferno Provisório e consiste em uma pentalogia composta pelos títulos: Mama Son Tanto Felice, O Mundo Inimigo, Vista Parcial da Noite, lançamento mais atual, O livro das Impossibilidades e São São Paulo, título inspirado numa musica de Tom Zé.

O volume I retrata a pequena cidade mineira de Rodeiro na década de 50, mostrando o forçado processo de migração dos interioranos para zonas mais ricas. O Mundo Inimigo, volume II, objeto do presente estudo, já mostra o filho do migrante se instalando numa cidade maior, a mineira Cataguases. Seus personagens moram num cortiço, o Beco do Zé Pinto e o tempo é a década de 60 e início de 70.  No volume III, as histórias saem desse cortiço indo em direção à periferia de Cataguases. O objetivo do autor é evidenciar a perda do imaginário rural e a infiltração do comportamento urbano que resulta no surgimento de complicadas ralações estabelecidas mediante a dialética do imaginário rural/urbano. No volume IV, São Paulo e Rio de Janeiro da década de 80 e 90 serão palcos e farão surgir o sujeito interiorano submetido à lógica do capital. O volume V retratará a São Paulo do ano 2000.

Importa dizer que a intenção de Luiz Ruffato em Inferno Provisório é escrever sobre o universo operário e sobre a condição do trabalhador urbano brasileiro. Ele retrata a vivência de pessoas que normalmente são deixadas à margem de todos os movimentos, inclusive da literatura. Mostra uma gente simples que ao migrar do interior para a cidade, defronta-se com uma eterna incoerência; perde seu território, sua raiz e ao retornar devido às constantes mudanças, paradoxalmente, já não é mais o mesmo. Desse modo, os desterritorializados tornam-se sujeitos híbridos, perdem alguns hábitos e adquirem outros, ou então acumulam tanto antigos quanto novos, tudo isso em virtude do processo de desterritorialização que os impele em busca de melhores condições de vida.


Autor: Sandra Moreira dos Santos


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