A Desjudicialização da Execução Fiscal



Valdoloir Santander

(Oficial de Justiça do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, lotado no Anexo Fiscal da Comarca de Ourinhos)

BACHARELANDO NA FEMM-FUNDAÇÃO EDUCACIONAL MIGUEL MOFARREJ

FIO-FACULDADES INTEGRADAS DE OURINHOS

CURSO DE DIREITO

Resumo

O presente trabalho pretende abordar a questão que envolve a execução fiscal judicial e administrativa. Trata-se de um estudo acerca do anteprojeto de lei de execução fiscal, seu impacto e possíveis implicações que trarão à sociedade brasileira caso seja transformado em lei. Apresenta-se uma análise geral sobre a lei 6.830/80 – lei de execução fiscal, as principais críticas tecidas com referência a referida lei e o por que estudiosos da área alertam para uma mudança profunda neste instituto.A questão que preocupa é a extrema delonga do Poder Judiciário em ultimar o processo de execução fiscal que reclama um funcionamento mais rápido, orgânico, articulado e eficaz.Acredita-se que a questão poderia ser resolvida com a desjudicialização da execução fiscal e a implementação de um processo-administrativo–tributário. Logo, a própria fazenda pública se encarregaria de cobrar a dívida ativa e ter-se-ia a penhora administrativa como procedimento obrigatório para ajuizamento da execução fiscal judicial. Desta feita, culminaria com maior agilidade na cobrança fiscal e, por conseguinte, desafogaria o Poder Judiciário. Faz-se ainda comentários sobre a constitucionalidade da constrição administrativa proposta no anteprojeto acima citado.

Unitermos: anteprojeto de lei de execução fiscal; constitucionalidade; constrição administrativa;desjudicialização da execução fiscal.

1.INTRODUÇÃO

De começo pode parecer imprópriaa colocação de temáticatão vasta que abrange várias questões para serem analisadas em trabalho dessa natureza. Todavia, a falta de metodologia que se nos apresentam as formas de cobrar e de executar o contribuinte devedor aparenta uma falsa impressão de ineficiência do Poder Judiciário que bem justifica uma reflexão sobre a natureza, característica, institutos,constitucionalidade e princípios deste tema, por intermédio de uma visão relativa ao estudo ou à compreensão de um fato ou de um conjunto de fatos em sua evolução no tempo. O fato que se nos apresenta é que o processo-administrativo–tributário, no que tange a execução fiscal , reclama um funcionamento mais orgânico e articulado.

O sistema de justiça não se pode confundir ao sistema dos Tribunais. Nessa esteira tem-se que o Poder Judiciário não é o único órgão incumbido para resolver litígios, pois não se pode entender o direito como uso exclusivo do Poder Judiciário.

É salutar que se compreenda que os três Poderes participam na realização da idéia de direito e na concretização do estado democrático de direito. Devemos lutar para ter uma Justiça rápida, sem, contudo, esquecermos das garantias fundamentais do cidadão.

O volume de processos tramitando no Poder Judiciário é muito grande, porém não corresponde com o valor efetivamente arrecadado que se mostra ínfimo se comparados com o número das ações ajuizadas. Ocorre que as Fazendas Públicas são legalmente obrigadasa ajuizarem ações para evitar os efeitos da prescrição, não se importando se é viável ou não a sua propositura. Logo, a localização do devedor, bem como de seus bens, fica, na prática,a cargo do Oficial de Justiça que se vê com milhares de mandados nas mãos onde a maioria dos endereços ali indicados não pertence mais ao executado, ou porque este se mudou para endereço ignorado ou porque já é falecido e não há inventariante.

A demora na entrega da prestação jurisdicional se dá devido ao grande volume de processos ajuizados sem critérios, diga-se, uma vez que os endereços ali indicados não correspondem ao do devedor, ou se corresponde somente é encontrado um terreno,sem construção alguma no local.E ainda, se é informado o endereço correto do suplicado, este, na maioria das vezes,não possui bens penhoráveis de interesse comercial.

A lei número 6.830/80- Lei de Execução Fiscal -atualmente em vigor no Brasil demonstra ineficácia em tempos de globalização.Parece-nos ser preciso ousar para mudar.

O Senado Federal apresentou um projeto de Lei que institui a penhora administrativa. Tal projeto propõe a cobrança administrativa dos créditos da Fazenda Pública, ou seja a procuradoria fazendária teria o mister de notificar o devedor para que pague o débito no prazo de cinco dias, amigavelmente, sob pena de ver seus bens penhorados, tantos quantos bastempara a garantia da execução.

Para o efetivo e verdadeiro cumprimento do que asseveram os artigos 50 e 37previstos na Constituição Federal Brasileira dependem da eficiência na arrecadação dos impostos, tributos e taxas pela União , Estados, Distrito Federal e Municípios.

Para isso, os entes da federação necessitam de mecanismos eficientes para obter sucesso.Mecanismos estes como legislação específica moderna que acompanhe a atual conjuntura econômica que em tempos de globalização imploram por medidas e soluções céleres. Assim, para que o Estado cumpra com sua obrigação constitucionalé mister o aprimoramento da máquina pública com o objetivo de otimizar a arrecadaçãodos tributos pagos pelos cidadãos brasileiros.

2- APRESENTANDO-SE SOLUÇÕES

Para se tentar evitar a derrocada do Poder Judiciário no que tange à execução fiscal, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional apresentou um anteprojeto de lei que pretende solucionar a crise instalada no âmbito das execuções fiscais. Tal anteprojeto, ao que parece, propõe a execução fiscal administrativa – constrição, avaliação earrematação de bens em leilão extrajudicial.Aponta as falhas do atual sistema e também eventuais soluções.

O anteprojetoinova ao propor um procedimento que permite a integração da fase administrativa de cobrança da dívida ativa com uma ulterior fase judicial, impedindo-se, assim, a duplicidade de atos e destinando ao crivo do Poder Judiciário somente as demandas que não obtiveram êxito na fase extrajudicial e que ainda assim tenha condições patrimoniais de satisfazer o débito.

Ao contrário do que assevera o parágrafo único do artigo número 174 do Código Tributário Nacional, o anteprojeto propõe um novo rito onde prevê a interrupção da prescrição já na fase administrativa, mediante notificação ao devedor de sua inscrição na dívida ativa, objetivando, assim, isentar a Fazenda Pública da obrigatoriedade de promover ação via judicial para evitar a prescrição.

Deste modo as fazendas públicas terão um prazo maior para organizar as dívidas ativas, verificando e revendo endereços e ainda para perscrutar o patrimônio do devedor, agilizando, dessa maneira, a cobrança do débito, culminando maior êxito no recebimento das dívidas ou se revelando necessária intervenção do Poder Judiciário para realização de execução forçada.

3. CONCLUSÕES

Em última análise, acerca dos defensores e detratores deste instituto, pode-se concluir que se em uma face temos o lado positivo de possibilitar uma execução ágil e eficaz em outra teremos, em tese,concentrado nas mãos de um mesmo poder: a autonomia de criar um tributo, cobrá-lo e executá-lo até a penhora e posterior arrematação ou adjudicação em via administrativa.

Outrossim, não se faz necessária que a penhora administrativa seja efetivada sob as vistas do Juiz uma vez que tal instituto não é , necessariamente, jurisdicional.

Não há que se excogitar da constitucionalidade da execução administrativa porque o devido processo legal pode também ocorrer nas esferas do Poder Executivo e Legislativo, e não somente no Judiciário , como querem alguns, os quais confundem o devido processo legal com o devido processo judicial.

Nada obstante, a qualquer momento no curso da execução administrativa , poderá o executado socorrer-se do Poder Judiciário, devendo o Juiz avocar os autos para si - devendo ser atendido num prazo não superior a 24 horas. Ora, se uma minoria dos executados paga os débitos e a grande maioria ou não é localizada nos endereços fornecidos pelas fazendas ou não possui bens penhoráveis ou, se possui, aproveita-se da mora do trâmite processual para assim se safar das dívidas fiscais.

Logo, para se evitar a prescrição iminente,utiliza-se da prática de continuar despejando, sem critérios,milhares e milhares de ações executivas em um Poder que já está quase paralisado. Tal aberração não pode e não deve continuar a ocorrer sob pena de termos um Judiciário cada vez mais lento na entrega da prestação jurisdicional, sacrificando Juízes e servidores que têm que se desdobrar para não perderem prazos.

Ocupa-se desnecessariamente o tempo precioso dos Magistrados e Serventuários da Justiça os quais poderiam estar cumprido outras atividades jurisdicionais que mereceriam maior atenção.Não quero dizer que não seja importante para a sociedade a arrecadação de tributos, mas apenas que seja mudada a atual e errônea cultura de que somente o Poder Judiciário pode exercer o devido processo legal.

Urge, desta forma, o legislador conceder maior autonomia aos Procuradores Fazendários para que estes promovam as cobranças e execuções fiscais sem a intervenção do Judiciário, tendo em vista ainda que somente 1 % das execuções fiscais judiciais volta efetivamente aos cofres públicos, a cada ano[1].

Cabe à sociedade discutir e aprovar qual caminho pretende trilhar, porém uma coisa é certa "nem tudo o que enfrentamos pode ser mudado. Mas nada pode ser mudado enquanto não for enfrentado." (James Baldwin).

4. FONTES

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5. REFERÊNCIASBIBLIOGRÁFICAS

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[1] Segundo estudo desenvolvido pelo Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas Judiciais (CEBEPEJ) e patrocinado pela secretaria de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça.


Autor: VALDOLOIR SANTANDER


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