Violências e Morte



VIOLÊNCIAS E MORTE

Nas sociedades atuais, a perplexidade diante das formas de manifestação das violências tem suscitado diversas discussões e proposições, muitas vezes, impulsionadas pela comoção pública que a espetacularização midiática e o discurso policial imprimem no imaginário social.
Quando tais manifestações resultam em mortes, a sensação latente de insegurança entre os urbanautas tende a se materializar e, de certa forma, a intermediar as relações sociais cotidianas. Ou seja, temos a sensação de que as violências estão disseminadas em tudo e todos. Nesse sentido, penso ser oportuno discutirmos a questão de como é vista e sentida a banalização do fenômeno das violências, através das mudanças sociais ocorridas em relação à experiência da morte (Koury, 2003).
Empiricamente, tem-se observado que o grau de visibilidade midiática afeta de modo significativo o fato de se ter ou não uma maior sensibilidade às manifestações de violências. Com isso, a banalização evidenciada pela morte faz com que sejamos tentados a exigir cada vez mais rigor punitivo – mito da pena de morte - e menor intolerância com as práticas de violências que resultem em morte.
Historicamente, o mais importante e significante tipo de morte para os seres humanos é a morte de um dos seus. Todavia, o comportamento urbano brasileiro atual diante das violências, parece, está sendo moldado sob novos códigos nas práticas de sociabilidade. Em casa ou na rua, temos a sensação de que as violências estão sempre a nos rodear prontas para o bote.
Nesse sentido, o medo da morte estabelece uma tensão entre os espaços públicos e privados. A falta de expressões sociais de solidariedade tende a dar lugar a uma fragmentação acelerada das esferas de vida social. O isolamento em pequenos feudos restringem os contatos sociais e limitam as interações individuais e coletivas.
O medo da morte, a indiferença e o fingimento com a dor do outro vitimizado, como elementos de um economia moral do sofrimento, tende a fomentar a individualização. Nesse sentido, “as regras sociais parecem passar a vigorar apenas no sentido mercantil, através do individualismo que nega a individuação como processo interativo da pessoa na sociedade” (Koury, 2003).
Segundo Norbert Elias (1990 e 1993), a repressão à emoção foi o elemento-chave na constituição da civilização moderna, pois as bases da sua sociabilidade avançou através de “uma conspiração do silêncio”. Isto significa que, de certa maneira, a modernidade confina na pessoa suas emoções, banindo-as do social “para o reino do segredo”.
Para Koury (2003), socialmente, parece, a tendência da nova sensibilidade emergente no Brasil de negar a morte e o sofrimento pela morte na esfera social vem sendo feita através de uma ênfase na morte como código norteador e ameaçador atrás das regras sociais, que as violências, por sua vez, dinamizam no cotidiano.
Nesse sentido, quanto mais afastada e constrangida se encontra a pessoa das discussões sobre a morte e as violências no cotidiano, quanto mais a subjetividade diante do matar e do morrer for tratada como problema pessoal, íntimo e não social, como indizível, mais o individualismo parece comandar os destinos individuais. O que tende a enfatizar a naturalização e o anonimato da morte, como desilusão e como código básico de conduta social, além de acelerar uma fragmentação de sentimentos coletivos a favor da contenção das violências criminosas.

Autor: Arnaldo Eugênio


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