A Ocupação Territorial de Vitória



O período que precedeu a configuração atual

A dinâmica ocupacional de Vitória deve ser analisada desde sua fundação (1551 – Século XVI). Os fatores religiosos, primeiro, e, posteriormente, os econômicos foram os mais importantes na construção daquilo que conhecemos hoje enquanto espaço urbano. A Igreja, por intermédio dos Jesuítas, consolidou a permanência na vila e edificou as primeiras construções importantes. A força dessa instituição cravou raízes e ampliou sua participação, ao colocar como prioridade a catequização dos índios que viviam nesta área. Com a proibição de se construírem estradas e se aprofundar a colonização no sentido do interior, graças à proteção natural que o Estado fornecia aos interesses da Coroa, a cidade acabou ficando de lado nos processos de crescimento que ocorriam nas outras capitanias próximas.

Somente no Século XIX, após vários acontecimentos como, por exemplo, a abolição da escravatura e a chegada de imigrantes ao Estado, tiveram início alguns projetos de maior monta, graças aos interesses políticos que, por vezes, destinavam recursos à estruturação da Capital.

Os aspectos econômicos

A partir dessa época, a ocupação dos espaços em Vitória passou a demonstrar sua característica mais marcante, qual seja a alternância de investimentos determinada pelos rumos que os governantes seguiam para atender aos interesses de suas políticas econômicas e dos grupos por eles representados. Os governadores apoiados pelos produtores rurais investiam pouco na Capital, cuidando apenas da infra-estrutura, mesmo que precariamente, ao passo que aqueles ligados ao comércio que começava a se estruturar, investiam nas regiões do Porto e do Centro, com aterros, alargamento de avenidas e construção de novas edificações, sem o interesse de preservar as de governos anteriores. As avenidas eram abertas, aterros eram realizados, demolições aconteciam, novas edificações surgiam e a cidade assumia novas formas e contornos.

Avenida Jerônimo Monteiro: prédios eram demolidos para a ampliação da passagem dos novos tempos. (Autor desconhecido – 19??)[1]

Deve-se destacar o Projeto do Novo Arrabalde, do Presidente de Estado, José de Mello Carvalho Muniz Freire (1892 – 1896), que visava a expansão urbana da Capital rumo à região norte da ilha e um incremento nas atividades econômicas, transformando Vitória em um grande centro de comércio, canalizando a produção do norte e do sul do Espírito Santo e ainda, mantendo comércio com outros Estados. Àquela época, não houve uma aceitação por parte da população, que via muitos impedimentos na nova área, como a falta de infra-estrutura e de transportes adequados. A área só voltaria a merecer atenção, no fim da Década de 60, no Século XX, como será explicado posteriormente.

Governo Muniz Freire (1892 – 1896) – O Novo Arrabalde: Primeiro momento voltado à ocupação da zona norte da ilha.[2]

Os governos que se seguiram não foram ousados como o de Muniz Freire, visto que aquela intenção megalômana colocara o Estado numa situação crítica do ponto de vista econômico. Após um período de reestruturação e moderação nos investimentos, com governantes mais acautelados, a assunção ao cargo maior do Estado, do Presidente Jerônimo de Souza Monteiro trouxe uma dinâmica voltada a privilegiar os interesses de seus apoiadores, ou seja, os produtores da região sul, especialmente de Cachoeiro do Itapemirim, seu reduto de forças. Vitória, entretanto, resistia e crescia graças ao desenvolvimento de suas atividades comerciais relacionadas ao porto. O comércio se ampliava devido à exportação do café, o que justificava os investimentos que deveriam ser feitos para uma melhor estruturação da cidade.

Porto de Vitória – Década de 40: o sustentáculo da estrutura comercial e social de Vitória e das relações comerciais com o resto do mundo.[3]

Até a década de sessenta a economia capixaba estava focalizada no sistema agro-exportador centralizado pela monocultura do café. A erradicação dos cafezais causou transtornos de grande repercussão em todo o estado, o que gerou reflexos gigantescos na ocupação territorial da capital e dos municípios adjacentes. A idéia de que a implantação da Companhia Vale do Rio Doce e do porto de Tubarão, juntamente com a Companhia Siderúrgica de Tubarão absorveriam toda a mão-de-obra deslocada das áreas rurais acabou se revelando errônea.

Praia de Camburi: Antes do Porto de Tubarão, de Jardim da Penha e do Aeroporto.[4]

A ocupação desordenada somada à falta de estrutura urbana para absorver a crescente demanda de moradias e carência de áreas propícias para a habitação, acabou criando bolsões de pobreza em várias partes da cidade, principalmente em uma das primeiras a serem ocupadas à época de sua fundação: a região de Santo Antônio. Próximo dali, o lixão a céu aberto atraiu pessoas que não tinham meios de subsistência e que, vivendo do que tiravam do lixo, passaram a construir suas casas.

Bairro São Pedro, dias atuais: local já foi conhecido como "Lugar de toda a pobreza". Após aterros, melhorias em saneamento básico e investimentos sociais, hoje é um grande bairro de Vitória.[5]

O crescimento da população, devido à migração interna de pessoas provenientes de Estados da região Nordeste do Brasil (Bahia, Alagoas e Sergipe) em busca de empregos, ou da região Sudeste (Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais) por possuírem maior qualificação para a empregabilidade, causou um deslocamento para as áreas periféricas de outros municípios, criando impactos relevantes também na organização social destes.

A região do Novo Arrabalde, planejada à época de Muniz Freire, finalmente teve sua ocupação efetivada, inclusive estendendo-se para além dos limites da ilha.

A Região do Novo Arrabalde, nos dias atuais: novo centro dos interesses econômicos, políticos e do judiciário Capixaba.[6]

A área compreendida pela Enseada do Suá, Praia de Santa Helena, Praia do Canto Jardim da Penha e Jardim Camburi passou a concentrar a população de classe média, que estava empregada em setores produtivos e de serviços que exigiam uma melhor carga de conhecimentos e, conseqüentemente, pagava melhores salários. A elevação do nível de vida, como sempre, causa elevação nos valores de imóveis e, como efeito disso, um deslocamento de pessoas com menor poder aquisitivo para áreas periféricas da cidade. O ingresso de capital estrangeiro e a chegada de diretores de empresas e de funcionários de padrão salarial maior, só fazem acentuar este deslocamento.

Jardim da Penha, Século XX: a expansão rumo ao norte ultrapassa os limites da ilha.[7]

A preservação do patrimônio histórico

A consciência de preservação do patrimônio público é bem recente, se levarmos em conta toda a história de criação de determinados espaços. Do casario antigo de Vitória, ainda restam poucas casas. Já as edificações ligadas aos Poderes Executivo e Legislativo, mesmo tendo suas sedes transferidas para a região de Bento Ferreira (uma área que surgiu nas décadas de 60/70), ainda permanecem erigidas no centro da capital, por conta de seu poder institucional. Mas as edificações ligadas à Igreja Católica são as mais preservadas, devido a seus valores gravados na formação cristã do capixaba. O conjunto arquitetônico do centro tem como destaques, a respeito da preservação:

- Teatro Carlos Gomes

- Palácio Domingos Martins;

- Arquivo Público Municipal;

- Palácio Anchieta;

- Escola Maria Ortiz;

- Várias igrejas, destacando-se a Catedral Metropolitana de Vitória, a Igreja de São Gonçalo, Capela Santa Luzia, Igreja e Convento do Carmo, Igreja e Convento São Francisco e Igreja do Rosário.

Antiga Igreja de São Tiago (1552), hoje Palácio Anchieta, sede do Governo Estadual: a preservação das instituições religiosas e administrativas é marcante no Centro da cidade.[8]

Considerações finais

O histórico da ocupação urbana de Vitória segue a análise de Harvey (1993)[9], no que tange ao crescimento desordenado e sazonal, marcado pelos investimentos de capital maiores ou menores, nesta ou naquela área, dando uma característica de colcha de retalhos, que pode ser facilmente observada, por exemplo, na Praça Costa Pereira, onde edificações do fim do Século XIX convivem com espigões das décadas de 1970 e 1980, entrelaçados por imóveis das décadas de 1920 e 1930. A lógica capitalista moldou a cidade de acordo com os interesses econômicos vigentes a cada época, daí então, quando a cafeicultura dominava, os investimentos focavam a área do Porto de Vitória. Mais tarde, com a entrada em cena de grandes empresas como CVRD e CST, houve um deslocamento para a região norte da cidade, ou seja, a região planejada para o Novo Arrabalde, porém décadas depois, e também para outros municípios graças à criação dos portos da Aracruz Celulose (Portocel), no município de Aracruz e da Samarco Mineração (Porto de Ubu), no município de Anchieta. Complementando o quadro de avanço na logística portuária, temos a ampliação e modernização dos portos de Vitória e de Capuaba (Vila Velha), propiciando uma diversificação dos produtos exportados e importados.

Mesmo com projetos de revitalização do centro de Vitória como o "Morar no Centro" por exemplo, desenvolvidos pela Prefeitura Municipal, atualmente o pólo de concentração de investimentos inscreve-se na Enseada do Suá, onde companhias estrangeiras cravam suas sedes regionais em escritórios modernos, instalados em edifícios idem, traços marcantes do Século XXI, e que começam a receber como vizinhos condomínios residenciais de luxo, dando início então, a uma nova fase de localizações e recolocações graças ao poder econômico.




Autor: Eduardo César Miotto


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