Presente de Natal



Como é de costume, todos os anos os correios recebem uma quantidade enorme de missivas destinadas ao Velho Nicolau, popularmente conhecido como Papai Noel. É muito mais trabalho para a centena de milhares de empregados do governo federal. Além da separação de cartas, alguns funcionários são designados à leitura das narrações e depois se incumbem de transmitir o pedido ao chefe Noel. De gorros vermelhos nas cabeças exercem a função dantes trabalhada pelos, hoje, cansados duendes. Ah, querem saber quem é Nicolau? Já devem imaginar. Hoje esse serviço tornou-se burocrático demais, há várias seções até se chegar ao "Bom Velhinho", mas ele é real, ou seja, continuou com o Real, apesar de a política econômica ser mais audaciosa, menos medrosa. Luiz Inácio, hoje, exerce esse papel – de "Velho do Natal" – que antes já fora de Fernando Henrique, Itamar Franco, José Sarney, sem falar em Fernando Collor e os nossos generais ditadores.

Há quem diga que Lula é o que mais se assemelha ao "Senhor Nicolau", pelas feições – talvez a barba. Mas não podemos esconder a semelhança de Dom Pedro II com sua barba branca, apesar do serviço dos correios ainda não existir.

Nessas cartas, diversos pedidos: desde o mais simples brinquedo ao grito e seu quilométrico eco. Das letras impróprias, ainda mal escritas ao amassado e sujo papel e suas frases compostas de argumentos invejáveis. Dorme naquelas letras a emoção, passa a saudade, aguça a indignação. E lá nas letras misturadas, uma confusão de consoantes e vogais, nasce o pedido de socorro de Isabel, carinhosamente tratada como Isbel. Com treze anos, cursando o sétimo ano do Ensino Fundamental em um Colégio Público, a garota, da periferia de uma cidade do interior brasileiro, clama por uma solução. Não quer continuar sendo violentada pelo pai, que desde os quatro anos a estuprava. Chantagens, presentes, ameaças eram itens mantenedores da menina refém.

No rosto de cada duende (carteiros) a lágrima estampada, a indignação escancarada e a esperança por uma solução. O presente da menina seria livrar-se do pai que durante anos a violentou.


Autor: Sergio Sant'Anna


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