Um Olhar Sobre a Informação Que Desinforma



UM OLHAR SOBRE A INFORMAÇÃO QUE DESINFORMA

POR

DAVID CAMILO[1]

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Após a entrada em cena da indústria midiática, torna-se uma tarefa difícil escolher ou tomar uma postura racional sobre os conteúdos apresentados nos diversos meios, tudo parece causar alarde, até mesmo assuntos tão antigos e muito discutidos, não há mais crivo, critério nem ao menos uma pré-condição de possibilidade de verdade, fator esse que chega a ser encarado, sem outra possibilidade, como motivo de risos prolongados pelos intelectuais e estudiosos das áreas afins de determinados assuntos dentro das ciências do conhecimento. Faço aqui esse adentro para relatar quão arcaicas, tardias e sem critério são algumas publicações em catálogos e revistas populares que tem uma finalidade anterior a de informar e trazer conhecimento, ou seja, o sensacionalismo, em termos capitalistas, a inserção no mercado, ou no caso de programas de televisão, o IBOPE através do sensacionalismo barato, da apelação, enfim de todos os subterfúgios para explorar a mente e o senso-comum.

Dentre os vários assuntos polêmicos, optei pela matéria que foi capa da última edição da revista Superinteressante que teve como título "Quem escreveu a Bíblia?", temáticas como essas tentam trazer inquietações na mente das pessoas como se fossem uma surpreendente e inovadora descoberta, o que não é verdade, pois tais assuntos são aludidos na sociedade a tempos. Sabemos também que o fato da Bíblia ser apontada como alvo de críticas por vários setores da mídia "massificada", utilizando termos Adornianos, não é nada contemporâneo, sobretudo, em uma sociedade na qual as pesquisas e os questionamentos da comunidade intelectual eclodem com tamanho atraso, fator esse que torna claro tais notícias críticas parecerem tão desatualizadas.

Todos os embates e discussões religiosas sobre as questões de interpretação bíblica iniciadas e polemizadas em fins do século passado, só agora emergem sobre nosso país. O que pesa nisso tudo, não obstante o visível atraso, é o euforismo da descoberta do que novo que não é novo, querem realmente deixar a impressão de que tudo é revolucionário, colocando em questão a leitura atenta e prudente do livro que traz a mensagem e os preceitos cristãos personificados na palavra de Deus.

Destarte, a reportagem da revista Superinteressante, "Quem escreveu a Bíblia?", vem exatamente no sentido do que ora abordamos, ou seja, para os que têm conhecimentos primários dos princípios da exegese literária, tal relato não causa a menor preocupação, a não ser a de cunho crítico pela pobreza de conteúdo por parte de quem assina um texto de tão baixa conceituação, restando talvez bons risos. Contudo, não pretendendo nos demorar, veremos algumas informações errôneas a nível conceitual da matéria já citada.

Iniciemos então com um fator preocupante relatado pelo articulista José Francisco Botelho, qual seja, o de que o povo Judeu foi altamente influenciado pelos povos cananeus. Como já é postuladamente conhecido, um pressuposto básico e basilar suste que a teoria liberal imprime uma semi-incapacidade de Judeus produzirem algo original, o que faria persuadirmos-nos de que qualquer produção literária e cultural dos descendentes de Abraão de elevada qualidade somente fosse possível uma vez que realizadas e dependentes dos vizinhos mais evoluídos. Percebemos que em nenhuma vez durante o texto o articulista recorre às fontes clássicas de documentos ocidentais e menos ainda orientais, o berço das origens dos referidos escritos bíblicos, é totalmente ausente o seu ponto de vista da teologia, da Ciência progressiva, da filosofia, acarretando em um abismo de "achismo", o que não classifica-se nem como história (porque carece de fatos contundentes) nem Filosofia (porque não possui rigorosidade, radicalidade e visão de conjunto) tão pouco Teologia (visto que se quer apóia-se em menor grau nesta).

Desde a origem da hipótese documental de estudiosos como Graf, Kuenen e Welhause, todos no século XIX, exegetas liberais consideram o Pentateuco (cinco primeiros livros da Bíblia) como proveniente de múltipla autoria, isto é, cabe a seguinte interrogação, "Quer-se informar ou massificar informação?" desinformação? Talvez, sensacionalismo? Quem sabe.

O assinante da matéria, ainda deixa uma interrogação, diria, "arcaica" como esta que aviso, irei parafrasear: Se o próprio Moisés, profeta que escreve o Pentateuco, em determinada parte narra a própria morte, como pode ter sido ele o autor? Visto isso, quem seria então o autor dos cinco primeiros livros da Bíblia?

A resposta para tal pergunta é una, segundo a postulação da hipótese documental, haviam alguns documentos editados e após foram traduzidos por minimamente quatro correntes distintas, a saber, a tradição Javista, a Eloísta, a Deuteronômica e a Sacerdotal. Cada uma delas tinha sua formação destacada pelas iniciais de cada documento, em alemão e inglês: JEDP, de acordo com a ordem de seu respectivo desenvolvimento.

Além disso, apontar a arbitrariedade da autoria do Pentateuco pela hipotética desarmonia dos livros que o compõem, implica em um pressuposto reducionista de que a mudança de estilo da obra requer necessariamente uma mudança de autor. Permito-me aqui a uma analogia, mesmo consciente de estas devem ser com cuidado empregadas (uma vez que mal utilizada torna-se a mãe das falácias). Tal hipótese é dizer que a Obra Parerga und Paralipomena (1851) da autoria do filósofo alemão Arthur Schopenhauer não é de sua autoria visto que a escrita é outra que a de O Mundo como Vontade e como Representação (1818), devido a maturidade do autor na primeira aqui citada, ou ainda, seria como alegar que Machado de Assis não poderia ser autor de "Panóplias" do romance "Memórias Póstumas de Brás Cubas" e dos contos "Papéis Avulsos", além de suas peças de teatro e crônicas por apresentar em cada um destes gêneros, e dentro dos próprios gêneros, diversidade de estilo.

O que se quis com esse breve texto, foi relatar e evidenciar estes pequenos inconvenientes provocados pela indústria cultural, que por um lado apresenta seus benefícios, na podemos deixar de citar as diversas informações úteis à sociedade como pesquisas científicas, artigos e teses publicadas nos diversos meios, mas, por outro lado o sensacionalismo, a desinformação ou preconceito omitido, a falta de rigorosidade e aprofundamento nas notícias e publicações que visam vender, isto é, a preocupação a muito deixou de ser a de cunho informativo passando a números de vendas e edições de revistas e periódicos, deixo ao fim, uma última interrogação que serve como suplemento e ao mesmo tempo complemento das que já mencionei durante o texto, uma pergunta para qual a resposta não é o fim último, mas sim, um eterno questionar-se para avaliar e medir: "Para onde foi o crivo ético nas informações? Quer-se noticiar ou usurpar e deturpar o conhecimento? Levemos a frente estas interrogações, não só para este mas para os diversos assuntos que a informação midiática norteia e polemiza.




Autor: David Camilo


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