Direito Fiscal Ambiental no Brasil



Direito fiscal ambiental no Brasil

1.Brasil

No Brasil não há um dispositivo inserido no CTN voltado à preservação ambiental, esta é uma das propostas que a doutrina e os pesquisadores judiciários brasileiros já fizeram ao Congresso Nacional, a fim de proporcionar uma maior inserção das questões fiscais ambientais nas construções legislativas.

A política nacional ambiental é orientada pela Lei n.º6.938, de 31/08/1981, e em seu artigo nº 4, inciso VII, determina as ações e objetivos necessários à preservação do meio ambiente. Entre eles é importante citar os incisos I e VII, respectivamente: "compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico" e "imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos".

Conjuntamente com os objetivos constitucionais explanados anteriormente, e, sendo a defesa do ambiente um dos princípios da atividade econômica brasileira, a tributação ambiental é possível e encontra guarida legal.

Algumas legislações já podem ser citadas como parte de uma vontade do legislador para a ajuda ao meio ambiente, assim, para melhor esclarecer, abaixo seguem alguns exemplos classificados por setores econômicos de atuação:

1.1Florestas

Em 1966, conforme pode ser verificado na Lei nº 5106/1966 e em seus decretos regulamentadores, a legislação previu a dedutibilidade dos valores gastos com os investimentos realizados em reflorestamentos. Tal incentivo terminou em 1986,[1]e com ele observou-se uma diminuição dos investimentos em reflorestamentos. A taxa de plantio na década de 1970 e 1980 foi verificada como sendo de 400 mil hectares por ano, e ao final de 1987 já se verificava um declínio considerável no plantio. Este dado pode ser utilizado para comprovar a eficiência do incentivo.[2]

1.2Combustíveis

1.2.1Diferenciação de alíquotas para o IPI

Em 1993, o Decreto Federal nº 755 estabeleceu diferentes alíquotas para o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para veículos movidos a álcool e veículos movidos a gasolina. Inicialmente, a diferença de alíquota se deu por motivos econômicos, pois a intenção era incentivar o consumo de veículos movidos a um combustível alternativo, ou seja, a álcool. A mudança de comportamento pelo consumidor foi verificada, visto que tanto o preço do combustível alternativo, quando o dos carros deste segmento eram mais baratos, e o resultado foi a diminuição do nível de poluição atmosférica nas grandes cidades.[3]

Como pode ser verificado na tabela abaixo, de 1980 até 2006, apesar do aumento da frota de veículos brasileiros, a emissão média, por exemplo, de monóxido de carbono de um veículo era de 54g/km, hoje essa emissão é 0,4 g/km.[4] Note-se que isso decorre por diversos fatores, mas o principal índice é a utilização de um percentual de álcool no combustível utilizado pelos veículos brasileiros.

Cabe salientar que as emissões no Brasil ainda são de grande volume, colocando o país no 16º. lugar na lista dos 30 principais países com mais emissões no mundo. De acordo com o relatório das Nações Unidas, este fator ocorre pel desmatamento das florestas Brasilieras. Este documento informa que o país possui grande destaque na produção de biocombustíveis, e que cerca de um terço dos transportes brasileiros utilizam este tipo de combustível. Tal medida tomada pelo país colabora com a não emissão de poluentes[5].

1.2.2Contribuição sobre a importação e comercialização de petróleo e seus derivados

A CIDE, Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, criada pela Lei 10336/2001, em decorrência da Emenda Constitucional nº 33/2001, foi criada para incidir sobre a importação e a comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados, e álcool etílico combustível. O montante recolhido é destinado, conforme o orçamento do Estado, conforme parágrafo 1º, para as seguintes realizações:

"I - pagamento de subsídios a preços ou transporte de álcool combustível, de gás natural e seus derivados e de derivados de petróleo;

II - financiamento de projetos ambientais relacionados com a indústria do petróleo e do gás; e

III - financiamento de programas de infra-estrutura de transportes."

Tal contribuição incide sobre o setor da economia que causa poluição em alta escala, os combustíveis fósseis, e tem a finalidade de desestimular a importação e consumo destes bens e realizar a proteção do meio ambiente. Tal contribuição somente poderá ser analisada e tida como eficaz após uma análise neutra da reação do mercado à sua instituição.

A majoração do preço do combustível visa incentivar a alteração do comportamento do consumidor para o consumo de alternativas, como os biocombustíveis, mais precisamente o álcool proveniente da cana de açúcar. Como conseqüência proporciona a melhoria da infra-estrutura de transporte rodoviário brasileiro e das condições de transporte público.

1.3Agricultura

Com relação ao Imposto Territorial Rural – ITR, a Lei nº 9393/96 e a Lei de Política Agrícola, Lei nº 8171/91 prevêem que a isenção deste tributo incidirá sobre as áreas de reserva legal, áreas de preservação permanente, áreas de interesse ecológico para a proteção de ecossistemas, sempre de acordo com as legislações aplicáveis.[6]

1.4 Serviços públicos

A Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental, chamada de TCFA, foi criada pela Lei n.º 10165, de 27/12/2000. Tal legislação alterou as disposições da Lei que trata das Políticas Nacionais do Meio Ambiente, a Lei nº 6939/81.

A taxa ambiental cobrada pela administração pública pelo exercício de fiscalização e controle cabe ao IBAMA, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, órgão do governo brasileiro responsável pela atividade de fiscalizar e controlar as atividades poluentes, bem como os utilizadores de recursos naturais.

Assim, a taxa é baseada em um serviço prestado pelo IBAMA (serviço de fiscalização ambiental, por forma de poder de polícia[7] [8]) e são contribuintes desta todos aqueles indicados na legislação e seus anexos. Também estão incluídos nos anexos da Lei os valores e as proporções a serem pagas pelo contribuinte, conforme sua atividade.

Para a elaboração da legislação e definição de valores a serem pagos foram determinados índices para cada atividade como "potencial de poluição", ou PP, e o "grau de utilização dos recursos naturais", GU.

A legislação estabelece a identificação dos contribuintes, e em um anexo delimita todas as atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais, e ainda seu grau de potencial de poluição e utilização, definindo, assim, os sujeitos passivos do tributo.[9]

Uma das determinações desta legislação é a obrigatoriedade de elaboração, por parte do contribuinte, de uma declaração das atividades exercidas no ano calendário anterior. Tal declaração tem como objetivo a reunião de dados e índices a serem utilizados pelo IBAMA para controle e melhoria da proteção ambiental.

Infelizmente esta taxa tem sido objeto de inúmeras interpelações judiciais por parte das empresas, indústrias e prestadores de serviços brasileiros, que alegam inconstitucionalidades na cobrança. De qualquer forma, esta é por excelência uma taxa ambiental inteiramente criada para a defesa do meio ambiente e cobrada por um órgão que funciona para a preservação do meio ambiente.

1.5Urbanização

A tributação sobre a função social da propriedade encontra guarida no ITR, imposto já mencionado acima. A CRFB, em seu artigo nº 186, estabelece a necessidade da função social da propriedade rural, e para isso a utilização adequada dos recursos naturais e a preservação do meio ambiente são critérios a serem observados e cumpridos pelos proprietários rurais, sob pena de terem seus bens desapropriados.

Assim, a questão fiscal é importante, o ITR tem sua alíquota majorada em relação à verificação de mau aproveitamento da propriedade rural. Serve de incentivo à boa utilização da terra e dos recursos naturais.

O mesmo ocorre com o imposto municipal sobre a propriedade territorial urbana, o IPTU.[10] Este imposto pode ter sua alíquota diminuída para os casos em que seja comprovada preservação de áreas verdes[11].

De acordo com a prefeitura da cidade de Curitiba, em 2006 foram 8.650 imóveis a receberem descontos de 5% a 100% no IPTU por manter áreas verdes. Estes imóveis foram identificados por técnicos da prefeitura como preservadores de "bosques de mata nativa, pinheiros isolados e árvores de grande porte". A redução do tributo é uma forma de preservar a natureza ainda existente nos centros urbanos. O benefício fiscal está previsto no Código Florestal[12] do município e permite uma compensação do proprietário destes terrenos pela manutenção da área, evitando o abandono e degradação.

1.6Outros instrumentos econômicos relativos aos tributos fiscais ambientais

1.6.1ICMS Eclológico

O ICMS Ecológico é um dos principais exemplos brasileiros de utilização da tributação na defesa ambiental. Não se trata de um tributo, mas sim da utilização da arrecadação financeira e da distribuição das receitas fiscais para fazer com que as administrações públicas contribuam para a preservação ambiental.

Os valores arrecadados pelos Estados com o ICMS são necessariamente repassados aos Municípios de acordo com a regra Constitucional disposta no artigo nº 158, da CRFB.[13] Contudo, é no parágrafo único, inciso VI, do artigo mencionado, que está a base deste instrumento:

"Artigo nº 158, inciso IV, Parágrafo único. As parcelas de receita pertencentes aos Municípios, mencionadas no inciso IV, serão creditadas conforme os seguintes critérios: I - três quartos, no mínimo, na proporção do valor adicionado nas operações relativas à circulação de mercadorias e nas prestações de serviços, realizadas em seus territórios; II - até um quarto, de acordo com o que dispuser lei estadual ou, no caso dos Territórios, lei federal."

Assim, as receitas geradas pelo imposto são objeto de disputa pelos Municípios. A repartição do ICMS pode ser verificada de duas maneiras:

- os municípios atraem quanto mais investimentos industriais e comerciais possíveis, para participarem em maior parte na porção dos 3/4 do montante (conforme inciso I), pois somente quem gera um valor agregado à receita do tributo tem direito a participar de um valor maior proporcional a este valor agregado, e ainda

- poderão participar na parcela restante, conforme as determinações Estaduais[14] (conforme inciso II).

É nesta segunda parte que o ICMS Ecológico encontra guarida, pois cada Estado poderá criar suas próprias normas e regras para a distribuição desta parcela de 1/4 sobre o montante a ser distribuído da receita gerada com o ICMS.

Este instrumento baseia-se na necessidade de fazer com que as administrações municipais se preocupem mais com o meio ambiente. Assim, aqueles Municípios que apresentam índices verdes[15] são contemplados com uma parte maior do montante destinado à totalidade dos Municípios.

Assim, ao invés de servir como fator de alteração da sociedade através da majoração da carga tributária ou o uso de instrumentos de subsídio fiscal, o ICMS Ecológico não altera em nada a tributação, não tem o condão de fazer nenhuma mudança no comportamento do consumidor ou do comerciante e prestador de serviço. O sujeito objeto deste instrumento é a própria administração pública.

O Estado que primeiro idealizou e aplicou uma legislação com critérios ambientais para a distribuição das receitas com o ICMS foi o Paraná, tendo em vista a necessidade de ajudar os municípios que possuíam parte da sua extensão com algum tipo de preservação ambiental obrigatória e não podiam gerar um valor agregado suficiente para a manutenção das necessidades básicas.[16] O resultado foi muito melhor do que o esperado. Além da maior preservação gerada nestes municípios, o que se verificou foi o aumento dos índices de áreas preservadas e maior atenção ao meio ambiente por parte do restante dos municípios.

É através da escolha de critérios específicos que definem se o Município está ou não preocupado com o meio ambiente que se conseguiu alcançar a mudança de comportamento das autoridades municipais gerando uma mais-valia do meio ambiente.[17]

Este instrumento é idealizado para proporcionar um benefício para a manutenção e preservação dos recursos naturais, e representa, nas palavras de Márcia Vidonho, "a aplicação do princípio do protetor recebedor, segundo o qual aquele agente público ou privado que protege um bem natural em benefício da comunidade deve receber uma compensação financeira como incentivo pelo serviço de proteção prestado".[18] Talvez este instrumento seja hoje a forma mais visível de aplicação deste princípio, que é novo mas real, entretanto, provavelmente, servirá de apoio e idéia aos novos instrumentos que poderão surgir.

Atualmente, diversos Estados Brasileiros[19] possuem uma legislação específica referente ao repasse do ICMS incluindo uma condicionante ambiental; além disso, a grande maioria dos Estados está analisando e propondo aos seus legisladores a inclusão da perspectiva ambiental na repartição das receitas do imposto.

Este instrumento é comprovadamente uma forte medida de alteração de comportamento filo-ambiental com fortes indícios de que será, a longo prazo, uma das principais medidas fiscais e financeiras com características ambientais adotadas no Brasil.

1.6.2Água

O consumidor do bem "água" ainda não paga pelo recurso extraído da natureza no Brasil. O valor cobrado pela água, chamado de tarifa de água, refere-se aos valores atribuídos à sua extração e distribuição. Em 1997, o governo brasileiro, através da Política Nacional de Recursos Hídricos[20] determinou um valor econômico à água com a finalidade de internalizar no custo ao consumidor final o valor do bem.

A Lei n.º 9.433/1997[21] dispõe sobre o uso e cobrança dos recursos hídricos, sendo que os mandamentos mais importantes para o presente estudo referem-se aos artigos nº 19 e nº 20, que tratam da determinação da valoração do uso da água; qual seja:

"Artigo nº 19: A cobrança pelo uso de recursos hídricos objetiva: I - reconhecer a água como bem econômico e dar ao usuário uma indicação de seu real valor; II - incentivar a racionalização do uso da água; III - obter recursos financeiros para o financiamento dos programas e intervenções contemplados nos planos de recursos hídricos.

Artigo nº 20. Serão cobrados os usos de recursos hídricos sujeitos a outorga, nos termos do artigo nº 12 desta Lei."

Esta legislação apenas criou a determinação legal para a existência e possibilidade de regulamentação da cobrança efetiva. Também foi estabelecido que o valor arrecadado deverá ser destinado à recuperação das bacias hidrográficas em que foram gerados.[22]

Esta legislação ainda carece de regulamentação em alguns Estados do País e já foi aplicada no Ceará, que iniciou a cobrança em 1988 e na bacia hidrográfica do Rio Paraíba do Sul, compreendendo os Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, que iniciaram a cobrança em 2002[23], e ainda nas bacias hidrográficas dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí, onde o início da cobrança se deu em 2007.[24]

De acordo com o doutrinador e economista Jorge Madeira Nogueira,[25] os valores arrecadados não geram estímulo para que ocorra a mudança de comportamento do consumidor. O que está ocorrendo é apenas a utilização deste recurso econômico para o aumento de riquezas dos cofres públicos.

Vários são os posicionamentos em relação à cobrança do uso da água. Neste caso, estamos diante de um preço público estipulado pelo uso do recurso natural, e não de um tributo especificamente, pois trata-se de uma remuneração pelo uso do patrimônio público em escassez, e não uma prestação de serviço do Estado. Não pode este valor ser um imposto, pois neste caso não poderia ocorrer a utilização específica de um bem, ou mesmo a destinação do montante arrecadado para fins específicos. Também não se trata de uma taxa, pois não é o exercício do poder do Estado que está em questão, nem mesmo um serviço público posto à disposição. É, sim, um bem público posto à disposição e sobre o qual quem o consome deverá arcar com custos. Assim, apesar de tratar de um instrumento econômico ambiental não se pode, neste caso, tratar o valor cobrado por tributo.




Autor: Marcelo Silva


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