A PERCEPÇÃO NO CONTEXTO ESCOLAR



Palavras-chave: Percepção; Escola; Características culturais.

1 INTRODUÇÃO

A percepção assunto deste trabalho é vista de duas formas, a percepção através do sistema sensorial sendo esta considerada biológica intrínseca de cada um e também a percepção através da vivência da criança em casa com a família e nos primeiros anos na escola, isto devido à vida social, os costumes e as crenças.

Este trabalho refere-se à percepção no contexto escolar, sendo inicialmente discutido o processo de percepção (buscando o significado da percepção e seu processo) e a percepção dentro do contexto escolar, sendo referenciado os assuntos de indisciplina e de criatividade.

Esta pesquisa visa mostrar como a percepção é um assunto complexo e por ela não ser trabalhada nas escolas como algo individual, pode trazer conflitos entre alunos e professores, gerando entre outras coisas a indisciplina e falta de motivação.

2 O PROCESSO DE PERCEPÇÃO

Inicialmente se faz necessário investigar o significado da palavra percepção. No Aurélio encontram-se as seguintes definições: perceber. [Do lat. percipere, 'apoderar-se de', 'apreender pelos sentidos'.] V. t. d. 1. Adquirir conhecimento de, por meio dos sentidos. 2. Formar idéia de; abranger com a inteligência; entender, compreender. 3. Conhecer, distinguir; notar. 4. Ouvir: Não conseguia perceber os sons. 5. Ver bem. 6. Ver ao longe; divisar, enxergar:

Aqui encontra-se o significado mais usual de percepção, como forma de aprender através dos sentidos (1, 4, 5 e 6).Nos itens 2 e 3, perceber está relacionado a compreender, a conhecer, portanto ligado aos processos de cognição (GRANJA, 2003).

Segundo Silva (2007, p. 59) "o ser humano, ao nascer, possui possibilidades de percepção definidas pelas características do sistema sensorial humano. Ou seja, são características biológicas". No entanto esta percepção puramente biológica, não agrega significado às coisas do mundo, é por isso que ao longo do seu desenvolvimento o ser humano, através da apropriação da linguagem, do pensamento, dos conceitos históricos e dos significados atribuídos aos objetos, modifica o processo de percepção.

Ainda segundo Silva (2007, p.60) "a nossa relação perceptual com o mundo não acontece através de elementos físicos isolados, mas através de eventos, objetos e situações trazidos pela linguagem e pela cultura". Desta forma, o processo de percepção envolve outras funções além das sensoriais. Para se perceber faz-se necessária a articulação com outros conhecimentos que já tenhamos adquiridos. Pode-se afirmar que a percepção é um agente promotor de aprendizagem.

Bailey (2000), afirma que o, tempo todo, fortes emoções interferem no processo do pensamento racional e, em se referindo aos processos organizacionais, Lundberg e Young (2001) enfatizam que as emoções influenciam os processos cognitivos e comportamentais, evidenciados na inter-relação entre emoções e processos de mudanças, uma vez que as reações são as mais diversas; as atitudes são carregadas de elementos afetivo-emocionais e, em situações em que se avalia uma percepção tida, conscientemente ou não, o comportamento tende a expressar os sentimentos dos indivíduos num dado contexto. Esta visão fica mais evidente ao se considerar os tipos de personalidade e estudos que revelam as respectivas mentalidades (citados por PACHECO JÚNIOR, PEREIRA, PEREIRA FILHO, 2004).

A percepção implica no envolvimento da pessoa completa porque não é o cérebro somente que percebe os objetos e a realidade. A percepção se realiza com o que o homem tem de bom e de ruim, de nobre e de vulgar. Com paixão e culpa, com medo e com desejo. Isto a torna complexa, sobretudo, porque mobiliza a razão e a emoção. A respeito da complexidade da percepção Scott e Powers (1985:116) recordam que a imagem mental que se produz como resultado de um estímulo externo está vinculada a fatores, a exemplo da experiência passada, do contexto, da identidade, das condutas que interferem na comunicação da percepção e do estado de necessidade do indivíduo. Não é por acaso que estudiosos, a exemplo de Zanden (1986) consideram que é mais acertado falar acerca do campo perceptivo em lugar de percepção para indicar sua extensão e complexidade. Lembrança que informa que este conhecimento social é realizado com o indivíduo em sua totalidade. Afinal, a percepção é uma forma de comunicação que estabelecemos com outros homens através da interação social (CITADOS POR ROCHA, 2002).

3. A PERCEPÇÃO NO CONTEXTO ESCOLAR

A percepção é uma experiência que o indivíduo tem para conferir significado ao mundo social e neste sentido, ela tem um papel importante no trabalho educativo, especialmente, na tarefa de construir e de reconstruir o conhecimento. Tarefas nas qual o aluno deve aprender a conferir novos sentidos e novos significados ao mundo e a sua própria experiência nele. Uma educação interessada no crescimento do indivíduo deve privilegiar a percepção como um conhecimento da realidade, um conhecimento situado porque a percepção também está vinculada aos valores desenvolvidos e estimulados pelas diferentes classes sociais de uma sociedade determinada (ROCHA, 2002).

A percepção também tem a sua contribuição no processo avaliativo, no que se refere à avaliação feita pelo professor, de modo geral, não se coloca em dúvida a capacidade técnica e moral do professor e da escola para julgar o aluno. Por esta razão a formação de juízo tem um papel interessante no debate educativo, pois, em última instância, o juízo é uma modalidade específica de conhecimento. Recorda-nos Bárcena (1994:13) que embora a capacidade de julgar seja uma habilidade fundamental do indivíduo, ela é tão difícil quanto a capacidade para discriminar entre alternativas. Este autor tem razão porque julgar implica em escolher entre o justo, o correto, o bem e o mal. Dito de outra forma, julgar é uma atividade dirigida pela ética. Com isto fica mais evidente que se deveria prestar mais atenção ao julgamento dos professores porque eles não realizam uma atividade técnica. Ao contrário, estes profissionais ponderam ou deveriam ponderar sobre os objetos educativos e, naturalmente, a respeito do seu relacionamento com o aluno através outros elementos, a exemplo de sua personalidade como adverte Tajfel (1989). Partindo destas questões, deveríamos perguntar se o professor está preparado ou se ele é consciente das exigências do julgamento (CITADOS POR ROCHA, 2002).

O debate a respeito da sensibilidade no julgamento é o segundo aspecto resgatável no relacionamento possível entre percepção, juízo e procedimento avaliativo. Recupera-se este aspecto porque o ensino é uma atividade que deveria ser de acolhida ao aluno. Uma acolhida relativa às suas necessidades, as suas dúvidas e as suas certezas. Uma atividade com espaço para ouvir e considerar o outro como um sujeito que tem algo a dizer a respeito de si mesmo e do mundo. Estamos nos referindo à dimensão formativa do ensino que transcende a transmissão do conhecimento. Em síntese, nossa crença se fundamenta no trabalho educativo que comporta a avaliação além das atividades pontuais que pretendem medir a capacidade do aluno para armazenar e relacionar idéias e informações (ROCHA, 2002).

Não se pode negar que um dos grandes problemas da escola é a sua configuração em termos de espaço e tempo, que não favorece a aprendizagem dos alunos. Aulas expositivas em seqüência acabam por tornar o aluno passivo na construção do conhecimento, favorecendo a dispersão e obstruindo a autonomia. Salas de aula com carteiras rígidas e enfileiradas cansam o corpo e não favorecem uma postura saudável.Será que preparamos nosso aluno para a difícil tarefa de aprender e perceber o mundo? Qual é o papel do corpo neste processo? Há uma inter-relação entre percepção, corpo e conhecimento? (GRANJA, 2003).

3.1 A INDISCIPLINA E A PERCEPÇÃO SOCIAL DOS PROFESSORES

A percepção social dos professores sobre a indisciplina nas escolas é um território ainda mais pressuposto que mapeado na literatura educacional. De acordo com Garcia (2005, p. 91) a concepção de indisciplina que predomina no discurso educacional expressa como são pensados os processos sociais que estariam na base da indisciplina. O processo de elaboração da construção social da indisciplina é complexo e depende do contexto onde está inserido. Assim, as crenças dos professores acerca das expressões de indisciplina colaboram naquela construção, mas são instáveis, nem sempre enxergando como indisciplina os mesmos eventos em contextos diferentes (CITADO POR DAMKE, 2008).

Uma outra perspectiva, fornecida por Rocha (2002, p. 103), sugere que a percepção social é uma forma pela quais as pessoas mantêm contato com o mundo em que vivem. A percepção necessita de diferentes ocasiões para se transformar em conhecimento, e enquanto um processo ativo origina-se da relação entre sujeito e objeto. Assim, o que vai ser denominado indisciplina, nas escolas, precisa ser pensado como uma construção social que ocorre através das interações entre professores e alunos, entre outros atores, em um ambiente cultural de interação, a escola, que significa um mundo que é significado também pela existência de indisciplina (CITADO POR DAMKE, 2008).

No ambiente escolar o entendimento dos professores sobre as expressões de indisciplina acabam adquirindo várias conotações. Em uma pesquisa realizada por Oliveira (2002, p. 90), a percepção de indisciplina entre professores, engloba: não respeitar professores e colegas, não cumprir regras pré-estabelecidas, ser mal comportado, malcriado, perturbar o trabalho dos colegas e professores, fazer barulho, não permitir o bom funcionamento da aula, falar o tempo todo, provocar desordens, boicotar as aulas, faltar com pontualidade, rebeldia à autoridade e ofender os colegas e professores. O trabalho de Oliveira (2002, p. 93) apresenta a indisciplina interpretada pelos professores segundo uma sinuosa leitura comportamental. Assim, por exemplo, algumas expressões de barulho ou conversa, é indisciplina, mas o silêncio não tende a ser pensado como tal? (CITADO POR DAMKE, 2008).

Finalmente destaca-se a contribuição de Capalbo (1979). Essa autora afirma que grande parte dos nossos conhecimentos são recebidos dos pais, professores e das pessoas mais velhas, e que adquirimos certa visão de mundo e uma série de tipificações e modos de tipificar admitidos pelo grupo social onde nascemos e crescemos, que são os costumes, os hábitos e modos típicos de se comportar, com objetivo de alcançar certos fins típicos (p. 39). O fato de recebermos este conhecimento implicará nas percepções, ou seja, na maneira de percebermos os objetos e o ambiente social que nos rodeia. A percepção dos professores acerca da indisciplina escolar, poderia resultar desse conhecimento que faz parte de suas crenças, experiências culturais e de seus valores. O conhecimento recebido ao longo dos anos orienta a interpretação de mundo e todas as possibilidades de ações e projetos futuros, tanto teóricos quanto prático. A percepção sobre indisciplina poderia, assim, nos dizer sobre valores, crenças e referências culturais afinal anacrônicas. Estaríamos pensando a indisciplina segundo modos de percepção que apesar de operantes teriam seu prazo de validade expirado? (CITADO POR DAMKE, 2008).

Finalmente, a percepção sobre indisciplina pode estar a refletir crenças, valores e referências culturais que persistem talvez porque persistam determinadas noções de escola. A indisciplina na escola, assim, enquanto persiste, pode estar indicando que persistimos em algumas noções de escola, já deslocadas do seu tempo de validade (DANKE, 2008).

3.2 A CRIATIVIDADE E A PERCEPÇÃO POR PARTE DOS ALUNOS

Csikszentmihalyi (1996) destaca a influência do contexto social, em interação com as características do indivíduo, no desenvolvimento e expressão da criatividade. Esse autor afirma que

"criatividade não ocorre dentro dos indivíduos, mas é resultado da interação entre os pensamentos do indivíduo com o contexto sócio-cultural. Criatividade deve ser compreendida não como um fenômeno individual, mas como um processo sistêmico" (p. 23). Neste sentido, o mais importante é investigar "onde está a criatividade" e não "o que é a criatividade" (CITADO PORFLEITH E ALENCAR, 2006).

Da mesma forma, Sternberg e Lubart (1999) ressaltam o valor do ambiente no desenvolvimento da criatividade, ao expressarem que "O indivíduo precisa de um ambiente que encoraje e reconheça suas idéias criativas. O indivíduo pode ter todas as condições internas necessárias ao desenvolvimento do pensamento criativo, mas sem o estímulo do ambiente, sua criatividade nunca se manifestará" (p. 11). Amabile (1996) vai mais além, ao afirmar que "de todos os fatores e ambientes sociais que podem influenciar a criatividade, a maior parte pode ser identificada de alguma forma em sala de aula" (p. 203) (CITADOS POR FLEITH E ALENCAR, 2006).

Em um estudo recente, Matos (2005) examinou a criatividade e percepção do clima de sala de aula de alunos da 4ª série do ensino fundamental de escolas consideradas abertas, intermediárias e tradicionais do Distrito Federal. Os resultados revelaram haver interação significativa entre gênero e tipo de escola quanto à percepção dos alunos em relação ao clima de sala de aula para criatividade. Pesquisas conduzidas por Alencar (1997) e Alencar, Collares, Dias e Julião (1993) indicaram que, tanto no contexto universitário como no ensino médio, de acordo com a percepção dos alunos, a criatividade é pouco incentivada pelos professores (CITADOS POR FLEITH E ALENCAR, 2006).

4 CONCLUSÃO

A percepção é um assunto muito complexo de ser discutido, pois, a percepção vai além do sistema sensorial humano, pois, a percepção também é reflexo da vida cultural do homem (de vivências, de costumes e de crenças). Justamente por ser algo tão heterogêneo, já que cada indivíduo tem a sua própria percepção, isto se torna muitas vezes ignorado nas escolas, onde o aluno não é tratado de forma particular, sendo todos colocados num mesmo nível.

Esta questão de considerar os alunos de maneira homogênea, faz com que a criatividade de muitos não seja estimulada e nem reconhecida, faz com que não exista motivação em aprender e principalmente a indisciplina pode ser mal interpretada. Tudo isso gera conflitos nas escolas e nas salas de aulas, onde muitas vezes o que se vê hoje é uma falta de harmonia entre alunos e professores, gerando em alguns casos até mesmo a violência em sala.

5 REFERÊNCIAS

DAMKE. A. S. Indisciplina Escolar: percepção social dos professores. Disponível em: <http:// www.anped.org.br/reunioes/29ra/trabalhos/posteres/GT13-2124--Int.pdf >. Acesso em: 10 jan. 2009.

FLEITH, D. DE S.; ALENCAR, E. M. L. S. DE. Percepção de alunos do ensino fundamental quanto ao clima de sala de aula para criatividade.In: Psicologia em Estudo, Maringá, v. 11, n. 3, p. 513-521, set./dez. 2006.

GRANJA, C. E. DE S. C. A música na escola e o desenvolvimento da percepção. In: SEMINÁRIOS ABERTOS DE PÓS-GRADUAÇÃO, São Paulo, FEUSP, 2003.

 

PACHECO JÚNIOR, W.; PEREIRA,V. L. D. DO V.; PEREIRA FILHO, H. do V. Interdependência entre a Motivação e o Processo de Percepção. In: XXIV Encontro Nac. de Eng. de Produção - Florianópolis, SC, Brasil, 03 a 05 de nov de 2004.

ROCHA, M. R. M. Crença, mito e verdade. Barcelona, 2002. 103 f. Tese (Doutorado em Educação) - Faculdad de Ciencias de la Educació, Universitat Autónoma de Barcelona, Barcelona, 2002.

SILVA, D. R.DA. Psicologia da Educação e Aprendizagem. Indaial: Ed. ASSELVI, 2007.


Autor: Paulo Frick


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