ESCOLA E A CONQUISTA DA CIDADANIA



"Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantido-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e a propriedade".

Constituição Brasileira, Artº5º, 1988.

A motivação para investigar a formação da cidadania no espaço escolar esta relacionada a alguns fatores que fazem parte de nossa vida. A maioria da população brasileira não tem os direitos básicos assegurados, ou simplesmente desconhecem tais direitos, direitos que possam garantir uma vida digna, entre estes se encontram educação, saúde, moradia, trabalho e lazer.

Porém com um modelo de gestão governamental fundamentado no neoliberalismo, se dificulta o fortalecimento da democracia e da cidadania, sendo esta entendida enquanto garantia dos direitos civis, políticos e sociais. É nesse quadro de fragilidade do regime democrático e da cidadania, e por acreditarmos na educação enquanto instrumento de formação da cidadania e na escola como instituição social que trabalha com a socialização do conhecimento, formação de hábitos, valores e atitudes, procuramos verificar qual a contribuição da escola para a formação da cidadania democrática.

Na história do povo brasileiro nunca se falou tanto em cidadania e em direitos humanos como nas últimas décadas, fato que se desenvolve após o termino dos governos militares, período de mutilação da cidadania.

É com a Constituição de 1988, a mais liberal e democrática da história do país, os direitos foram ampliados em todas as dimensões: civil, política, social e cultural. Ficou conhecida como "Constituição Cidadã".

Mas ao pensar nas experiências das pessoas que viveram o processo educacional durante a ditadura, é necessário entender suas práticas cotidianas, ações, atuações, que por muito tempo foram silenciadas. Práticas estas que estão inseridas no campo da cultura e não podem ser negadas, pois foram experimentadas de maneiras diversas por homens e mulheres. Algumas destas pessoas ainda encontram-se entre nós para compartilhar as lembranças de uma época difícil, propõe-se problematizar a Educação e quebrar com essa herança da falta de conhecimento sobre os direitos civis.

A realidade brasileira mostra que apenas a formulação das leis não garante os direitos aos cidadãos, havendo, portanto, uma diferenciação entre a proclamação do direito e a forma de desfrutá-lo (Norberto Bobbio, 1986).

Entendemos que para poder desfrutar desse direito é necessário que o individuo tenha condições de exercer sua cidadania, que tem inicio no plano individual, mas não se realiza se não passar pelo coletivo. A questão não é mais fundamentar direitos e sim conhecê-los e garanti-los.

Nessa direção acreditamos que a escola como partidos políticos, sindicatos, movimentos sociais, têm um papel fundamental nesse processo. O grande desafio é de romper com a estrutura escravocrata, que embasa a formação do povo brasileiro, isso criou uma cultura de submissão, onde o indivíduo era desrespeitado tratado como objeto.

Em 1964 o Brasil entrava em uma nova era histórica. Com o Golpe Militar ocorrido em 31 de março de 1964 e os atos institucionais dele decorrentes, as liberdades e garantias individuais são suprimidas. O país ingressou numa fase de arbítrio e de ausência do estado de direito. Esta fase é comumente conhecida nos meios acadêmicos como os "anos de chumbo" da vida política brasileira. Os reflexos logo se fizeram sentir em todos os setores da vida nacional. Na educação, a repercussão imediata deu-se na repressão ao movimento estudantil, no controle das instituições de ensino e na imposição de disciplinas e práticas pedagógicas.

Durante vinte e um anos a Educação Brasileira esteve sob o controle de um Estado opressor. As marcas desta opressão no sistema educacional ainda se fazem sentir. A Ditadura Militar conseguiu fazer com que seus tentáculos atingissem os mais variados lugares do território Nacional.

Nessa direção, educar para a cidadania democrática é essencialmente romper com a cultura autoritária, de submissão, de mando, impregnada nas diferentes relações sociais; é criar uma nova cultura a partir do entendimento de todo e qualquer indivíduo é portador de deveres; é garantir o acesso ao conhecimento que permita-lhe apreender a complexidade das relações e determinações do conjunto da sociedade; é prepará-lo para a sua inserção e participação ativa na organização da sociedade.

Para que a escola possa desenvolver um trabalho nessa perspectiva se faz necessária a construção de um projeto pedagógico, democrático e participativo, em que a formação do sujeito possa ser assumida coletivamente.

Tratar da temática da cidadania, no espaço escolar requer um entendimento da evolução histórica dos conceitos políticos e dos direitos humanos, cidadania e democracia e das suas relações com o contexto político e social, tendo em vista que esses conceitos se entrelaçam e são produzidos nessas relações.

Mas para tratarmos de tais assuntos temos que entender o que significa a palavra direito, entre os diferentes significados, optamos pelo que esta mais ligado a teoria do Estado ou da política nesse sentido de direito:

"É um conjunto de normas de conduta e de organização, constituindo uma unanimidade e tendo por conteúdo a regulamentação das relações fundamentais para a convivência e sobrevivência do grupo social, tais como as relações familiares, as relações econômicas, as relações superiores de poder, também chamada de relações políticas, e ainda regulamentação dos modos e das formas através das quais o grupo social reage a violação das normas de primeiro grau ou a institucionalização da sanção" (Norberto Bobbio, 1999,p.349).

 

Esse conceito de direito tem uma relação com o surgimento dos direitos humanos. Esses foram estabelecidos evoluíram diante da necessidade da sociedade em ter o que se chama equilíbrio social, ou seja, o direito e os deveres para todos os homens igualmente.

Para Dalmo Dallari, a idéia de cidadania esta intimamente relacionada às condições básicas para participar da vida pública, o que exige assegurar os direitos fundamentais aos indivíduos, ou seja, a cidadania expressa um conjunto de direitos que dá a pessoa a possibilidade de participar ativamente da vida e do governo de seu povo (1998, p.14).

Para Alain Touraine (1996) destaca a responsabilidade dos cidadãos de um país como um dos alicerces da democracia:

"Não há cidadania sem a consciência de filiação a uma coletividade política, na maior parte dos casos, a uma nação, assim como a um Município, a uma região, ou ainda a um conjunto federal. (...) Assim o termo cidadania refere-se diretamente ao Estado-Nacional"(p.93).

Tanto falamos em democracia e cidadania, mas por fim o que representa essa cidadania democrática, como se constrói a cidadania democrática? Essa construção exige um controle dos cidadãos sobre os governantes, como forma de proteção contra o governo.

A ausência de cidadania democrática ocorre quando os governados não tem controle sobre os governantes, pela alienação dos governados em relação à produção de leis e pela transgressão dos diretos sociais e econômicos. Essas características parecem deixar bastante claro que vivemos, no Brasil, exatamente essa ausência da cidadania democrática.

Para Milton Santos cidadão é o individuo que tem a capacidade de entender o mundo, a sua situação no mundo e de compreender os seus direitos para poder reivindicá-los.(1997, p.133).

Ao tomarmos como referência essa definição de cidadão e diante do quadro da marginalidade de direitos em que vive grande parte da população brasileira, são poucos os que podem ser considerados, realmente, cidadãos no sentido da cidadania democrática. É muito comum o poder político usufruir benefícios públicos em favor do atendimento privado, isso se tona cada vez mais evidente devido à falta de participação do povo brasileiro.

Precisamos tornar o cidadão mais participativo e ativo, pressuposto esse que orientou o estudo de Maria Victória Benevides sendo considerada:

"como principio democrático (...) "Não é um favor" e, muito menos uma linguagem retórica. É a realização concreta da soberania popular, e supõe a participação do povo como possibilidade de criação, transformação e controle sobre o poder ou poderes. Essa forma de participação é que possibilitará uma educação política, entediada como cidadania ativa".(p.19-20).

Na concepção de Norberto Bobbio (1986), confirma que a educação para a cidadania esta longe da ideal, apesar de terem discursos sobre a democracia, nos últimos séculos, incorporado a idéia de que a única forma do súdito transformar-se em cidadão égarantir-lhe o direito à cidadania ativa e a educação.

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. História da Educação. São Paulo: Moderna, 1996.

BENEVIDES, Maria Victória. A consciência da cidadania no Brasil, 1994.

BOBBIO, Norberto. O Futuro da Democracia: uma defesa das regras do jogo, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1986.

_______________ Dicionário de Política, Brasília: Ed. Universidade de Brasília, 12º Ed. 1999.

DALLARI, Delmo. Direitos Humanos e Cidadania. São Paulo: Moderna, 1998;

GHIRALDELLI JR, Paulo. História da Educação. São Paulo: Cortez, 1990;

MARROU, Henri-Irénée. História da Educação na Antiguidade. São Paulo: EPU, 1990

MARTINS FILHO, João Roberto. Movimento Estudantil e Ditadura Militar:1964-1968. Campinas: Papirus, 1987.

RIBEIRO, Maria Luiza Santos. História da Educação Brasileira:a Organização Escolar. 16ª ed. Campinas: Autores Associados, 2000;

ROMANELLI, Otaíza de Oliveira. História da Educação no Brasil (1930/1973). 7ª ed. Petrópolis: Vozes, 1985;

SILVA, Luis Heron (Org). Escola Cidadã – Teoria e Prática. Petrópolis, RJ: Ed. Vozes. 1999.

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TOURAINE, Alain. O que é democracia? Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 1996

_______________ Podemos viver juntos?: Iguais e diferentes. Petrópolis, RS: Vozes, 1998.


Autor: Lucas Antônio Morates


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