O mito 'eu sou melhor que você'



Um dos mitos de casal mais rígidos é aquele que considera que na relação alguém é sempre superior e, por isso, responsável pela felicidade do outro. O julgamento daquele que ocupa o papel complementar de inferior é que cabe apenas ao superior cuidar, resolver os problemas e zelar pela harmonia no relacionamento – pois ele é mais inteligente, capaz ou tem mais sorte. Vamos ver um exemplo disso.

Toda vez que Maria precisava ir de carro a qualquer parte João a levava porque ela não dirigia – e não dirigia porque não lidava bem com máquinas. João, no entanto, aprendeu a dirigir muito cedo e era o motorista oficial do casal. Muitas vezes a contragosto, pois quando levava trabalho para terminar em casa essas interrupções o atrasavam e sobrecarregavam duplamente.

Mas ele não era dado a reclamações, assim toda vez que alguém criticava Maria por sua dependência João explicava que já estava acostumado, pois "ela sempre foi assim, tem pouco senso de direção e não consegue nem ler mapas" e sorria compassivo.

Ela detestava quando ele a tratava como criança, mas, como não dirigia e precisava do favor dele, se calava e não se atrevia a reclamar do modo como ele se referia a ela.

O mito era: Maria édependente, João não! Mas eles não se renderam à rigidez mítica. Discutiram esse ponto da relação – que embora fosse uma situação simples poderia crescer e se tornar um grande conflito se a ela se juntassem outros pequenos atritos, não conversados e negociados.

Nessa conversa eles não se prenderam a superficialidade dos fatos discutindo as dificuldades mecânicas de Maria nem a concordância, seguida de mau humor de João. Mas questionaram o acordo, não-verbal e feito no início do casamento, sobre quem se ocuparia da tarefa guiar o carro. Conjeturam, também, se após todo esse tempo as dificuldades dela com máquinas ainda existiam.

Concluíram que o comportamento dos dois era baseado no mito "mulher não foi feita para guiar-se na vida e precisa de um homem". E perceberam que, inadvertidamente, Maria desempenhara o papel de dependente porque era confortável não ter de enfrentar o trânsito estressante, deixando a tarefa para ele.

João, por sua vez, percebeu que embora fosse cansativo, transporta-la lhe fazia sentir-se importante por ter alguém que dependia dele. No fundo ele se julgava superior e mais bem preparado que ela para essa e outras tarefas. Esse pensamento era um segredo seu, jamais comentado com ninguém, entretanto algumas atitudes o denunciavam.

Quem aqui manda sou eu

João e Maria tinham um grande amigo que, após se casar, mudou para outro estado. Um dia ele telefonou a João comunicando que viria a cidade para um compromisso de trabalho e permaneceria por dois dias.

Feliz com a notícia ele o convidou a se hospedar em sua casa durante a curta estada. Por conhecer o carinho que Maria tinha pelo amigo ele supôs que, em seu lugar, ela faria o mesmo e ficaria feliz por tê-lo em casa alguns dias. Entretanto, ao ser comunicada a reação dela foi de raiva e eles discutiram. João não conseguia compreender porque ela se zangara tanto. E nem ela se entendeu, pois gostava muito do amigo e ficava feliz quando ele os visitava.

Maria ficou ainda mais confusa quando percebeu que concordava com a decisão do marido e, ainda assim, estava com raiva da situação que ele criara. Sentia-se frustrada e com a estranha sensação de ter sido roubada em algo. Mas ao mesmo tempo se sentia inadequada como se não tivesse direito de se irritar, que aquilo tudo fora desnecessário e uma grande bobagem.

Algumas crises são desencadeadas quando o casal, inconscientemente, disputa quem tem mais poder na relação e não se negocia sobre quem terá liberdade para alterar, ainda que provisoriamente, a rotina dos dois.

Você já deve ter vivido contradições como essa em seu relacionamento. A confusão de pensamentos e sentimentos não se dá porque a rotina foi quebrada, mas pelo fato do outro fazer algo sem antes perguntar se você concordava ou aceitaria.

Isso é mais comum quando um dos dois se julga superior. E, embora, seja um sentimento que fica profundamente escondido, sem que você se dê conta ele emerge em seu modo de tratar e falar com o outro.

Lustrando o relacionamento

A cortesia é muito importante e não pode perder espaço só porque o casal tem intimidade e vive junto há muito tempo. Jamais se deve usar a poupança conjunta para trocar o carro ou os móveis da sala sem antes consultar o outro. A opinião do outro tem peso quando se toma decisões, sobretudo quando elas significam mudanças importantes.

Para avaliar o nível de sua cortesia, preste atenção: se para se sentir valorizado você precisa tutelar alguém. Se você só se apaixona por pessoas, charmosamente, dependentes e depois se irrita com a incapacidade dela para tomar decisões. Se não suporta a idéia de ceder numa negociação.

Se a última palavra na discussão tem, sempre, de ser a sua ou se continuamente parte de você a decisão de quebrar a rotina, cuidado você precisa reciclar suas maneiras, pois com seus comportamentos está contribuindo para criar um relacionamento do tipo gangorra – eu por cima você por baixo e isso não vai acabar bem, pois quando o poder é desigualmente dividido, de modo que um possua mais que o outro ambos contribuem para intoxicar e encurtar a vida do relacionamento.


Autor: Sueli Nascimento


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