A Melhoria de Gestão como Forma de Atender as Demandas da População



A melhoria de gestão como forma de atender as demandas da população

Fausto Bernardes Morey Filho

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Ao longo da história, as formas de organização social, do viver e trabalhar foram afetadas e modificadas por constantes transformações tecnológicas. Então, qual seria a diferença existente no atual processo de mudança? A diferença está no fato delas serem agora mais freqüentes, profundas, abrangentes e caracterizadas pela sua generalização em dimensões globais. Outra característica própria do que ocorre hoje é o incrível aumento da velocidade destas transformações que desafiam as formas tradicionais de organização social e do trabalho, levando-as a crise.

Em estudos sobre crises potenciais, foram analisadas as conseqüências da aceleração destas mudanças sobre os indivíduos e foi identificado um aumento do desemprego, do mal-estar e do stress no ambiente social, da instabilidade psicológica e de comportamentos irracionais, da violência social, da criminalidade e marginalidade e do uso excessivo de drogas lícitas e ilícitas[1].

Essas transformações, entre outras, resultaram em ampliação das demandas da sociedade sobre os governos que, de início, se mostraram cada vez menos capazes em responder aos novos e enormes desafios.

Dificuldade de resposta dos governos às crises e às demandas

A vida das populações é cada vez mais complexa em um contexto de mudanças aceleradas e os governos necessitam se aparelhar para enfrentar fatos como, por exemplo:

-O número de cidadãos a ser atendido pelo governo tem crescido e continuará a crescer;

-Os cidadãos estão cada vez mais exigentes e conscientes de seus direitos;

-Os cidadãos manifestam um sentimento crítico com relação ao desempenho do governo e da justiça.

Nas últimas décadas, o atendimento às demandas da sociedade brasileira parece estar aquém das expectativas, apesar da existência de inúmeras ilhas de excelência no setor público, entre as quais se pode citar alguns entes representativos onde os avanços conquistados são notórios:

-Receita Federal e os mecanismos para declaração de renda;

-Justiça Eleitoral e o sistema de votação e apuração de eleições;

-Prestação de serviços integrados ao cidadão do tipo Poupatempo;

-Petrobrás e o exemplar desenvolvimento técnico;

-Tribunal de Contas da União, organização reconhecida e premiada pelo Prêmio Nacional de Gestão Pública no ciclo de 2004;

-Centro de Análises de Sistemas Navais da Marinha do Brasil, organização reconhecida e premiada pelo Prêmio Nacional de Gestão Pública no ciclo 2005.

Porém os governos e as organizações estatais parecem responder de forma lenta e ineficiente e, principalmente, consumindo volumes crescentes de recursos para realizar suas missões. O volume das receitas públicas apresenta significativo e constante crescimento nos últimos 15 anos, passando de aproximadamente 25% no início da década de 1990, para 34 do PIB em 2005 e no ritmo atual, a receita pública ultrapassará 40% do PIB brasileiro até a metade da década de 2010

O nível de recursos públicos destinados aos investimentos é reconhecido como insuficiente pelos economistas. A questão do financiamento público tornou-se crítica, pois de um lado não parece haver mais espaço de crescimento continuado das receitas e do outro, muitas das despesas são de natureza irredutível e apresentam crescimento constante, como por exemplo, as aposentadorias do setor público e privado.

Em função da escassa disponibilidade de novos recursos, o atual modelo tornou-se insustentável, sendo clara a necessidade de racionalização no uso dos recursos já disponíveis.

Uma das prováveis razões para que os governos não estejam conseguindo atender às demandas dos cidadãos de maneira adequada pode estar ligada à maneira como os órgãos estão organizados e são administrados, isto é, suas estruturas organizacionais e os modelos de gestão que eles têm adotado para realizar suas funções.

Vale ressaltar que a insatisfação dos clientes/cidadãos com o desempenho e ineficiência no uso dos recursos públicos e na oferta de bens e serviços não é um fenômeno apenas brasileiro.

Breve histórico sobre a administração pública

De maneira geral, os Estados passaram, ao longo dos últimos 150 anos, por três formas [2] de organização.

A Administração Patrimonialista que corresponde ao modelo das antigas monarquias, no qual imperava a falta de diferenciação entre o público e o privado, a Administração Burocrática e a Administração Gerencial.

A Administração Pública Burocrática surgiu no final do século XIX, a partir da necessidade de eliminar o nepotismo e a corrupção reinantes na Administração Patrimonialista da época. A base da Administração Pública Burocrática é a existência de uma grande hierarquia funcional profissionalizada e de caráter impessoal. Os processos de trabalho são rígidos, com foco nas normas, nas regras e nos procedimentos burocráticos. As organizações hierárquico-burocrática-funcionais foram decisivas para a construção dos Estados Nacionais e para o desenvolvimento industrial, pois incorporaram a racionalização e adoção de regras e práticas compatíveis com a eficiência técnica e a impessoalidade. Porém, frente à crescente necessidade do Estado em se responsabilizar por novas atividades, tem aumentado a complexidade das estruturas administrativas, que são cada vez mais difíceis de serem gerenciadas.

A Administração Gerencial. A reforma da Gestão Pública de 1995/98 preconiza um novo modelo de funcionamento do Estado baseado na adoção da responsabilização gerencial baseado na administração por resultados, pela busca da excelência na gestão e pelo controle social. Contempla, entre outras, as seguintes premissas:

-Foco no cidadão como alvo da ação do Governo;

-Busca do desenvolvimento de uma cultura gerencial nas organizações públicas;

-Busca de melhoria contínua nos serviços públicos prestados;

-Reorientação dos mecanismos de controle do Estado para os resultados;

-Busca de maior flexibilidade administrativa;

-Exaltação da transparência por meio da prestação de contas à população;

-Avaliação de desempenho dos agentes públicos.

A administração gerencial - conceitos da gestão pública contemporânea

Quando a descrição da administração pública é realizada ressaltando seus aspectos negativos, normalmente são citados: o excesso de pessoal, o desperdício, a negligência no atendimento ao público, a falta de foco nas necessidades dos cidadãos e a baixa capacidade gerencial dos órgãos.

Normalmente a atuação dos órgãos públicos tem estado orientada apenas para o cumprimento de formalidades contidas nos sistemas legal e normativo, ou seja, se no atendimento dos requisitos burocráticos formais. O novo princípio de gestão [3] corresponde à substituição parcial dos controles burocráticos clássicos pelo controle dos resultados, a busca intencional pela excelência e o controle social realizado por organizações da sociedade civil.

Modernizar o governo implica, portanto, alterar aspectos ligados a mentalidade da burocracia pública, sua organização e práticas, capacitando-a para responder adequadamente às demandas e necessidades da população. Os textos teóricos sobre a reforma da Gestão Pública de 1995/98 explicitam as principais diferenças entre a administração pública burocrática e a administração patrimonialista que a antecedeu e a administração pública gerencial que a sucede.

A nova redação do caput do art. 37 [4] da Constituição Federal resume, de certa forma, o espírito da Reforma Administrativa.

"Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados e do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência ..."

O Artigo 37 indica as qualidades necessárias para uma gestão pública de excelência, que são os seguintes:

-Legalidade: Obediência à lei, pois nenhuma gestão poderá ser considerada como de excelência à revelia da lei;

-Impessoalidade: Não fazer acepção de pessoas. A consistência, a rapidez no atendimento, a confiabilidade, a cortesia, e o conforto e a segurança são requisitos básicos de um serviço público de qualidade e devem ser acessíveis para todos os usuários indistintamente;

-Moralidade: A gestão pública deve ser pautada por um código e princípios morais de aceitação pública;

-Publicidade: A gestão pública deve dar publicidade aos fatos e dados e ser transparente, procurando ser eficaz na indução do controle social;

-Eficiência: Fazer o que é necessário ser feito com qualidade e ao menor custo possível, buscando a melhor relação entre qualidade do serviço e qualidade do gasto.

O princípio da eficiência claramente expresso na Constituição Federal é uma regra plenamente exigível e expressa a necessidade dos Governos e dos legisladores de garantir a melhoria da qualidade dos serviços públicos, o atendimento dos anseios da população e o respeito no trato da coisa pública. A Administração Pública Gerencial declara a importância da adoção de um Novo Modelo de Gestão para a ação administrativa.

Modelo de gestão – Conceito e definições

"Todos os processos de gestão baseiam-se em dois pilares fundamentais: as políticas, que são os princípios e as diretrizes básicas que balizam decisões e comportamentos; e as práticas, que são os diversos tipos de procedimentos, métodos e técnicas utilizados para a implementação de decisões e para nortear as ações no âmbito da organização e em sua relação com o ambiente externo" [5]

O termo Gestão [6] é utilizado para designar a administração que é realizada pela organização de forma ativa e orientada pela busca intencional por um desempenho e resultado superiores. Gestão é o conjunto de atividades de acompanhamento e análise do funcionamento das unidades / áreas da organização. Esse acompanhamento tem o objetivo de subsidiar tecnicamente os gestores da organização na adoção de medidas de ajuste para garantir a obtenção dos resultados esperados.

A gestão ocorre em todos os níveis organizacionais e pode ser analisada a partir de algumas das dimensões da organização, tais como o país ou a região em que atua, suas unidades organizacionais ou os serviços prestados.

Definição do Modelo de Gestão

Há uma significativa gama de aspectos que podem descrever o modelo de gestão adotado por uma organização. Eles podem fazer referência sobre a forma como a estrutura organizacional está estabelecida, quais as políticas que orientam as ações e a tomada de decisão dos gestores, quais as práticas gerenciais comumente adotadas em relação aos fornecedores, funcionários, governo e clientes, entre outros.

Modelo de Gestão pode ser entendido como o conjunto de práticas colocadas em execução pela própria direção de uma empresa para atingir os objetivos que tenha fixado. Dessa forma, o "método de gestão compreende o estabelecimento de condições de trabalho, a organização do trabalho, a natureza das relações hierárquicas, o tipo de estruturas organizacionais, os sistemas de avaliação e controle dos resultados, as políticas em matéria de gestão de pessoas e os objetivos, valores e a filosofia de gestão que o inspiram". [7]

O modelo de gestão adotado por uma organização envolve os diversos aspectos organizacionais relacionados à sua estrutura e também ao seu funcionamento, conforme exemplificado a seguir:

-Atribuições organizacionais: nível de formalidade da distribuição das responsabilidades e atribuições dentro da organização; se a organização pratica planejamento ou não; se o planejamento é centralizado ou descentralizado e se é participativo ou não;

-Estrutura organizacional: nível de hierarquização da estrutura; nível de concentração de suas atividades; quadro enxuto ou inchado de pessoal, etc.

-Burocracia: nível de rigidez das normas e procedimentos; nível de flexibilidade administrativa; formalidade na definição dos procedimentos;

-Modelo de decisão: grau de centralização da decisão, de participação dos funcionários, de delegação de autoridade, de capacitação para a tomada de decisão; como é exercida a liderança, etc.

-Mecanismos de controle e acompanhamento: grau de utilização de procedimentos burocráticos para controle; intensidade do uso da tecnologia da informação no apoio ao desempenho dos seus processos de trabalho; mecanismos de controle das pessoas e dos resultados e como são avaliados os processos de trabalho, entre outros.

-Transparência: grau de transparência da organização; de facilidade de acesso a informações (interna e externamente à organização); prestação de contas internas ou ao cidadão; avaliação de desempenho; controles externos, etc.

Além disso, o modelo de gestão pode ser fortemente influenciado pela cultura e clima organizacionais. Os valores e as crenças da organização podem ser arraigados ou difusos e o clima organizacional pode ser saudável ou turbulento, o moral do pessoal pode estar alto ou baixo e, ainda, pode existir ou não um clima de resistência a mudanças e também de insegurança.

O estilo de gerenciamento do gestor, que envolve, entre outros, a centralização do poder, o grau de ousadia, de conservadorismo, de participação ou de paternalismo em suas ações, também influenciará na escolha do modelo de gestão a ser adotado por uma organização. Outros fatores importantes são a idade e a origem da organização, já que ela pode ser nova, madura ou antiga, fruto de uma fusão ou aquisição, pode ser pública, administração direta ou indireta, entre outros tipos. As experiências e o nível de profissionalização dos gestores certamente influenciarão também no modelo de gestão mais adequado para a organização em que atuam.

Modelo de Excelência em Gestão Pública

"O Modelo de Excelência em Gestão Pública é a representação de um sistema gerencial constituído de sete partes integradas, que orientam a adoção de práticas de excelência em gestão com a finalidade de levar as organizações públicas brasileiras a padrões elevados de desempenho e de excelência em gestão." [8]

A organização pública pode buscar modelos de referência que a apóiem e facilitem no entendimento e na estruturação de seu modelo de gestão próprio. Mesmo que um modelo de referência seja utilizado, cada organização é única e seu modelo de gestão também. Podem ser utilizados como referência os seguintes modelos:

-Modelo de Avaliação em Gestão Pública para aplicação em órgãos públicos do Programa Nacional de Gestão Pública e Desburocratização da Secretaria de Gestão do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG) do Governo Federal;

-Modelo Geral de Avaliação de Desempenho e utilização de Indicadores de Desempenho, ambos desenvolvidos pela FGV sob encomenda do MPOG.

Um dos maiores desafios do setor público brasileiro na década de 1990 era e ainda é de natureza gerencial. A responsabilização gerencial baseada na busca pela excelência da gestão foi um dos pilares da reforma da Gestão Pública de 1995/98. O novo modelo de gestão pública deveria orientar as organizações em sua transformação gerencial e permitir, ainda, avaliações de desempenho. Em 1997, o Programa Nacional de Gestão Pública e Desburocratização optou pelos Critérios de Excelência cujos fundamentos representam o "estado da arte" em gestão.

A busca por um Modelo de Gestão com características contemporâneas não significa abandonar as práticas da gestão tradicionais, principalmente no que se refere ao uso da intuição e da experiência do gestor na tomada de decisão. Porém se a organização adotar mecanismos de gestão por processo de trabalho orientado pelo atendimento dos requisitos dos clientes internos e externos, a organização poderá incorporar neste modelo a tomada de decisão baseada em indicadores de desempenho.

Os resultados obtidos por uma organização serão conseqüência da gestão de cada um destes fatores. Para a busca intencional de resultados é necessário planejar as ações, colocá-las em funcionamento, verificar se os resultados planejados estão sendo atingidos, permitir a adoção de correções de rumo ao longo do tempo e apoiar a tomada de decisão, mas é comum encontrar organizações que não possuem um ferramental adequado de avaliação do desempenho das suas áreas e de seus processos de trabalho e nem dados ou informações de referência. Além disso, é fundamental estabelecer correlações entre as iniciativas estratégicas adotadas e os resultados obtidos. A organização deve estar pronta para, efetuadas as medições e avaliações, adotar a tempo as correções necessárias para não comprometer os objetivos institucionais ou operacionais.

A tomada de decisão baseada em indicadores de desempenho deve ser caracterizada pela busca de resultados de forma equilibrada, considerando, além de aspectos financeiros, aqueles relacionados aos clientes, aos seus processos internos, à medição da capacidade de inovação, de aprendizado e de crescimento da equipe e da organização, entre outros.

Uma instituição ou órgão público deve levar em consideração não apenas os aspectos finalísticos, mas também os aspectos administrativos.


[1] Stanford Research Institute

[2]Bresser Pereira (2001)

[3]Luiz Carlos Bresser Pereira, Gestão Pública no Brasil Contemporâneo, edições Fundap.

[4]Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Senado Federal, Centro Gráfico, 1988.

[5]Dutra, J.S. Administração de Carreiras: uma proposta para repensar a Gestão de Pessoas. São Paulo: Atlas, 1996, p. 109.

[6] O termo Gestão utilizado neste artigo trata de práticas gerenciais e não se refere à prática de órgãos públicos de "fazer gestão junto a alguém" nem ao período de mandato do dirigente de um órgão.

[7] Jean François Chanlat (1996)

[8]Documento 1 – Instrumento para avaliação da Gestão Pública – ciclo 2006 – Secretaria de Gestão do Ministério do Planejamento.


Autor: Fausto Morey


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