Stf Proíbe Fisco De Coagir Contribuintes: Veto Judicial Em Prol Da Livre Iniciativa



Com base nas garantias do livre exercício de trabalho, ofício ou profissão e de qualquer atividade econômica lícita, asseguradas no inciso III, do artigo 5º e no artigo 170, parágrafo único, da CF, respectivamente, o Supremo Tribunal Federal, em recente julgado, proibiu o poder público de coagir contribuintes.

São exemplos comuns de coação a apreensão de mercadorias sem que a presença física destas seja necessária para a comprovação do que o Fisco aponta como ilícito; o denominado regime especial de fiscalização; a recusa de autorização para imprimir notas fiscais; a inscrição em cadastro de inadimplentes com as restrições daí decorrentes; a recusa de certidão negativa de débito quando não existe lançamento consumado contra o contribuinte; a suspensão e até o cancelamento da inscrição do contribuinte no respectivo cadastro, entre outros.

Segundo o entendimento da Corte Suprema, o direito de tributar do Estado não pode exceder direitos de caráter fundamental do devedor, como a prática da livre atividade empresarial, econômica ou profissional.

Nas palavras do Ministro Celso de Mello, o “Estado não pode valer-se de meios indiretos de coerção, convertendo-os em instrumentos de acertamento da relação tributária, para, em função deles – e mediante interdição ou grave restrição ao exercício da atividade empresarial, econômica ou profissional – constranger o contribuinte a adimplir obrigações fiscais eventualmente em atraso”.

Com efeito, a Magna Carta, em seu artigo 170, prescreve que o exercício de atividade econômica só pode ser limitado por lei. Por outro lado, a administração tributária não tem o poder de obstaculizar a atividade da empresa somente por ser credora da mesma.

A sanção que por meio indireto vise ao pagamento de um tributo, provocando a restrição ao direito de livre iniciativa, é objeto de Súmulas dos Tribunais Superiores, que condenam quaisquer práticas do poder público nesse sentido, se não vejamos: a) “é inadmissível a interdição do estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de tributo” (Súmula nº 70/STF); b) “é inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para cobrança de tributo” (Súmula nº 323/ STF); c) “não é lícito a autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias nas alfândegas e exerça suas atividades profissionais (Súmula nº 547/STF); e d)  “é ilegal condicionar a renovação de licença de veículo ao pagamento de multa, da qual o infrator não foi notificado” (Súmula 127/STJ).

Note-se que a razão de ser de tais verbetes é no sentido de que a Fazenda Pública deve cobrar os seus créditos através de execução fiscal, sem impedir ou restringir a atividade profissional do contribuinte.

Nessa esteira de raciocínio, fica coibida a administração de cercear a atividade empresarial, com o fito de compelir o devedor a pagar o débito tributário, uma vez que este procedimento fatalmente conduziria ao confrontamento das liberdades constitucionalmente asseguradas.

Embora contumaz devedor tributário, um sujeito passivo jamais pode ter aniquilado por inteiro o seu direito ao livre exercício da empresa, em razão da inobservância do dever de recolher os tributos por ele devidos aos cofres públicos. O Estado deve responder à inadimplência do contribuinte com o lançamento e a execução pontual dos valores que entender devidos, em hipótese alguma com o encerramento da unidade econômica.

Ainda, deve-se ter em vista a inconstitucionalidade de tais medidas adotadas pela Fazenda Pública, sob a ótica do princípio da proporcionalidade, porquanto, se com a imposição de sanções menos gravosas e até mais eficientes (como a propositura de medida cautelar e ação de execução fiscal), pode o Estado realizar o seu direito à percepção da receita pública tributária, nada justifica a aplicação de sanções indiretas como a recusa de certidões negativas de débito, ou inscrição em cadastro de devedores, que resultam em sérias e graves restrições ao exercício da livre iniciativa econômica, as quais vão da impossibilidade de registrar atos societários nos órgãos do Registro Nacional do Comércio até a proibição de participar de concorrências públicas.

Desse modo, sempre que houver a possibilidade de se impor medida menos gravosa à esfera jurídica do indivíduo devedor do fisco, cujo efeito seja equivalente ao decorrente da aplicação de medida mais restritiva, deve o poder público optar pela primeira, em obediência ao princípio da proporcionalidade em seu aspecto necessidade.

Além disso, a restrição ou cessação da atividade empresarial tornaria mais remota a possibilidade de satisfação do crédito da Fazenda, vez que o devedor provavelmente perderia a própria possibilidade de arcar com seus débitos, acarretando ainda consideráveis danos sociais.

Por conseguinte, a decisão do Supremo Tribunal Federal traduz-se em acertado, e mesmo, louvável veto judicial às arbitrárias práticas perpetradas contra devedores da administração tributária, medidas estas despóticas e próprias de ditadores, porquanto subvertem o sistema legal vigente em detrimento de liberdades fundamentais.


Autor: Thais Gutparakis de Miranda


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