ELEMENTOS PARA UM QUADRO DE ANÁLISE do Trabalho Docente



FICHA TÉCNICA

Título: O TRABALHO DOCENTE

Autor: TARDIF,Maurice

Editora: EDITORAVOZES

Cidade: Petrópolis-RJ

Ano: 2005

Número de páginas: 317

ISBN: 85 326 3165-7

Resenha das Páginas: BCAPÍTULO 1 (p.15- 25)

 


O TRABALHO DOCENTE HOJE: ELEMENTOS PARA UM QUADRO DE ANÁLISE

1.1Por que estudar a docência como um trabalho?

O autor inicialmente afirma que cinco espécies de motivos situados em diferentes níveis de análise fundamentam a abordagem da docência como um trabalho interativo. Tardif pretende num primeiro momento deixar claro o status crescente que o ofício e a profissão humana interativa vêm adquirindo na organização socioeconômica do trabalho, num segundo momento situará a docência nessa organização e após discutirá os modelos de trabalho docente impostos pela organização industrial; num quarto momento dirá sobre a necessidade de vincular a questão da profissionalização do ensino com a da análise do trabalho docente; e enfim, num quinto momento, serão destacados os postulados que justificam as abordagens realizadas, e a importância dada a interação humana na análise da docência.

1.1.1Panorama do trabalho interativo e reflexivo

A importância do trabalho sobre a matéria inerte e a matéria viva é considerável, já que está na base das sociedades industriais modernas. Nessas sociedades, até um passado recente o trabalho material foi considerado o arquétipo do trabalho humano e, mis amplamente, da atividade humana. Tanto os marxistas como os funcionalistas e os liberais, passando pelos psicólogos e os engenheiros e os ergônomos tiraram os modelos teóricos do trabalhão das esferas da atividade humana sobre a matéria. Era, portanto, o

fato de estar envolvido por relações sociais de produção que definia o trabalhador e, mais que isso, o cidadão.

Esses modelos clássicos de trabalho procedem de cinco postulados (de Coster & Pichault, 1998 ; Touraine, 1998):

·O trabalho industrial produtor de bens naturais é o paradigma do trabalho;

·Esse paradigma estende sua hegemonia teórica e prática as demais atividades humanas;

·Os agentes sociais se definem por suas posições no sistema produtivo;

·As posições centrais são ocupadas pelos detentores (capitalistas) e os produtores (operários) de riquezas materiais;

·Enfim, o sistema produtivo é o coração da sociedade e das relações sociais;

Explica o autor que estes postulados não refletem apenas as idéias dos teóricos, de sociólogos ou de economistas, mas estão de acordo coma ideologia dominante na sociedade industrial e com seu ethos , como o analisou, por exemplo, Weber em A ética protestante e oespírito do capitalismo(1967). Esse ethos remete a uma moral do trabalho, que Lalive-d'É pinay(1998,p.58) assim resume:

O ser humano é definido ontologicamente como um ser do dever; o trabalho - subentendido o trabalho produtor de bens materiais - é o primeiro dos deveres, o meio por excelência de cumprimento dos outros deveres; noção de dever está restritamente associada ao princípio de responsabilidade (ou liberdade) individual, responsabilidade para consigo e para com os seus, no presente e no futuro; a responsabilidade individual leva a dotar um acompanhamento racional, quer dizer, assim a realização do indivíduo consiste em encontrar seu justo lugar na sociedade, passa pela assunção de uma função em papéis precisos ligados ao trabalho.

Assim, o autor situa que o ensino é visto como uma preocupação secundária ou periférica em relação ao trabalho material e produtivo. A docência e seus agentes ficam nisso subordinados à esfera da produção, porque sua missão primeira é preparar os filhos dos trabalhadores para o mercado de trabalho. O tempo de aprender não tem valor por sim mesmo; é simplesmente uma preparação para a "verdadeira vida", ou seja, o trabalho produtivo, ao passo que, comparativamente, a escolarização é dispendiosa, improdutiva ou, quando muito, reprodutiva. E baseando-se nisto a sociologia da educação interiorizou essas representações e trouxe essas categorias para dentro do campo da análise do ensino. Desse modo, os agentes escolares têm sido vistos como trabalhadores improdutivos (Braverman, 1976; Harris, 1982).

Coloca o autor que esta visão do trabalho não corresponde bem à realidade socioeconômica das sociedades modernas avançadas1. A primeira tese que o autor pretende defenderé: ...longe de ser uma ocupação secundária ou periferiaem relação a hegemonia do trabalho material, o trabalho docente constitui uma das chaves para a compreensão das transformações atuais das sociedades do trabalho.esta tese se apóia em quatro constatações:

Primeira constatação: há cinqüenta anos, a categoria dos trabalhadoresprodutores de bens materiaisestá em queda livre em todas as sociedades modernas avançadas enquanto que os trabalhadores da área de serviços crescem sem parar, o autor usa como exemplo dados daeconomia americana ;

 


1.A expressão "Sociedades modernasavançadas", emprestada do sociólogo britânico Anthony Giddens(1987;1996), indica que nós ainda estamos na fase da modernidade e não numa pós-modernidade(Lyotard,1976) válida somente para alguns fenômenos culturais limitados a uns poucos setores das sociedades modernas avançadas.

Segunda constatação: Na sociedade dos serviços, grupos de profissionais, cientistas e técnicos ocupam progressivamente posições importantes e até dominantes em relação aos produtores de bens materiais. Essa importância dada ao conhecimento leva autores (Naisbitt, 1982; Stehr, 1994) a afirmar que agora nós estamos numa sociedade da informação ou do conhecimento, mais do que numa sociedadedos sérvios orientados para produtos materiais.Assim coloca o autor que adaptadaa emergência de uma nova economia, estaria surgindo progressivamente a "sociedade cognitiva".

Terceira constatação: essas novas atividades trabalhistas estão relacionadas historicamente às profissões e aos profissionais que são representantes típicos dos novos grupos de especialistas na gestão dos problemas econômicos.

Enfim, a quarta constatação: entre as transformações em curso, parece observar o crescente status de que gozam, na organização socioeconômica, nas sociedades modernas avançadas, os ofícios e profissões que têm seres humanos como "objeto de trabalho".

Assim, coloca o autor mais a diante sem eu texto que o trabalho interativo parece um dos principais vetores de transformação atuais da organização socioeconômica das sociedades modernas avançadas.

1.1.2CENTRALIDADE DA DOCÊNCIA NA ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO

Qual o lugar da docência entre essas transformações? Lembra o autor que a docência é uma das mais antigas ocupações modernas, tão antigas quanto a medicina e o direito.

Em 1998, a Unesco apontou que existiam cerca de 60 milhões de professores no mundo trabalhando em condições muito diferentes segundo os países e as culturas. No decorrer do texto o autor fala dos valores financeiros destinados a educação, por exemplo, no Canadá as despesas destinadas ao ensino primário e secundário correspondem a 8,3% das despesas públicas.

No Brasil, segundo dados do Ministério da Educação e Cultura (MEC,2003)e do instituto Nacional de estudos pedagógicos( Inep, 2003), existem perto de 2,5 milhões de professores atuando nas escolasprimáriase secundárias da rede pública e privada. Cerca de 250.000 atuam no nível pré-escolar; 41.000 trabalham nas classes de alfabetização (1ª série) 1.600.000 nas escolas primárias (5ª a 8ª séries) e 450.000 no ensino médio, por fim, 43.000 atuam no setor da educação especial. Ao mesmo tempo, é preciso considerar que uma grande parte dos professores tem mais de um emprego e precisam cumprir dois ou três contratos semanalmente para receber um salário decente. Há aproximadamente 53 milhões de alunos na escola primária e secundária e os investimentos em educação representam 5,2% do PIB brasileiro (MEC/Inep ,1997-1998). Em média, as despesas anuais com educação ficam entre 225 dólares americanos por aluno.

Ora, a escolarização repousa basicamente sobre interações cotidianas entre os professores e os alunos. Sem essas interações a escola não é nada mais que uma imensa concha vazia. Mas essas interações não acontecem de qualquer forma: ao contrário, elas formam raízes e se estruturam no âmbito do processo de trabalho escolar e, principalmente, do trabalho dos professores sobre e com os alunos.

1.1.3APROFISSIONALIZAÇÃO DO ENSINO E O TRABALHO DOCENTE

Nesta parte do texto o autor coloca que a questãodos modelos de gestão e de realização do trabalho docente nos leva diretamente ao tema da profissionalização do ensino. Junto com este temacentral vem se enxertando toda uma série de proposições visando transformar e melhorar tanto a formação dos mestres quanto o exercício da docência.Tanto na Europa, quanto na América do Norteobserva-se a existência de alguns consensos a respeito disso: dar novamente poder, sobretudo aos estabelecimentos locais a aos atores da base;promover uma ética profissional fundamentada no respeito aos alunos e no cuidado constante de favorecer seu aprendizado; construir coma s pesquisas uma base de conhecimentos ao mesmo tempo rigorosa e eficiente que possa ser realmente útil na prática; derrubar as divisões que separam os pesquisadores e os professores experientes e desenvolver colaborações frutuosas;valorizar a competência profissional e as práticas inovadoras mais que as ações realizadas segundo receitas ou decretos;introduzir nos estabelecimentos escolares uma avaliação do ensino que permita uma melhora das práticas e dos atores; fortalecer a responsabilidade coletiva dos professores e favorecer sua participação na gestão da educação; integrar os pais na vida da escola e nos processos de decisão a respeito dos alunos; reduzir a burocracia que desvia, muitas vezes, as reformas a seu favor; introduzir no ensino novos modelos de carreira favorecendo uma diversificação de tarefas; valorizar o ensino na opinião pública.

Coloca o autor ainda, que, todavia, com o tempo se constata que todas essas proposições generosas nunca chegam a ser incorporadas realmente no funcionamento dos estabelecimentos escolares e nas práticas dos profissionais do ensino.Tanto na Europa como na América do Norte o diagnóstico é severo; os professores se sentem pouco valorizados e sua profissão sofreu uma perda de prestígio; a avaliação agravou-se, provocando uma diminuição de sua autonomia, a formação profissional é deficiente, dispersiva, pouco relacionada ao exercício concreto do serviço; a participação à vida dos estabelecimentos fica reduzida. Ainda acresce o autor que os estabelecimentos são muitas vezes refratários a reformas, seja por inércia e costume, seja simplesmente porque não recebem recursos financeiros e materiais e temporais necessários para leva-los adiante .Enfim, diz Tardifa própria estruturação das organizações escolares e do trabalho dos professores se presta pouco a uma profissionalização séria desse ofício : fechados em suas classes os professores não têm nenhum controle sobre o que acontece fora delas; eles privilegiam ,consequentemente, práticas marcadas pelo individualismo, ausência de colegialidade, o recurso à experiência pessoal como Critério de competência, etc.


Autor: Marlúbia de Paula


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