O AMBIENTE URBANO EM PEQUENAS CIDADES NA ERA DA GLOBALIZAÇÃO: UM ESTUDO DE CASO DA CIDADE DE RIACHO DE SANTANA-BA



OLIVEIRA, G. G.
O Ambiente Urbano em Pequenas Cidades na Era da Globalização: um estudo de caso da cidade de Riacho de Santana-Bahia.
Itapetinga - BA: UESB, 2007 (Monografia – Especialização em Meio Ambiente e Desenvolvimento).

O presente trabalho apresenta como objetivo geral, analisar o ambiente urbano das pequenas cidades, tomando como objeto de estudo a cidade de Riacho de Santana – Bahia. Nesse sentido, foi possível relacionar os problemas ambientais com a problemática socioeconômica através de estudos sobre o processo histórico/geográfico de ocupação da cidade. O cenário onde se desenvolveu a pesquisa de campo, revelou-se palco de informações sobre desigualdades sociais e econômicas e, com isso, da concentração de problemas ambientais por elas provocados. Na era da globalização, o ambiente urbano dos pequenos centros também sente as conseqüências da exclusão e da falta de oportunidades que os menos favorecidos sofrem. A ausência de políticas públicas nas cidades pequenas é ainda uma característica marcante. Se por um lado, são nos grandes centros que mais se concentram os problemas relacionados à infra-estrutura, serviços públicos e baixa de qualidade de vida, em geral, por outro, são nesses centros que se concentram a maioria dos investimentos na direção de equacionar tais problemas, tanto no que se refere á iniciativa pública como privada. Entretanto, como revelam os dados obtidos na pesquisa, nas cidades em que o desenvolvimento é estagnado, esses investimentos praticamente inexistem, e a omissão do poder público diante dos problemas sócio-ambientais, especialmente no que se refere aos espaços onde habitam as classes menos privilegiadas, acaba por se materializar como um traço marcante na paisagem urbana.

Palavras-chave: Ambiente urbano, problemas ambientais, globalização.

INTRODUÇÃO

Entende-se por ambiente o resultado de influências políticas, sociais, econômicas, naturais e culturais que interagem num determinado território para produzir e organizar o espaço geográfico. Nesse sentido, o modo de produção constitui um fator importante para a organização do espaço e, consequentemente, para o ambiente.

Em virtude da grande vulnerabilidade que a sociedade mais carente vivencia com a ausência de um ambiente saudável, observa-se que é justamente esta classe social a que mais sofre com os problemas relacionados à saúde, educação, habitação, lazer, saneamento dentre outros fatores fundamentais para o desenvolvimento humano.

A estreita relação que as desigualdades sociais e econômicas apresentam com os problemas ambientais é reconhecida mundialmente a muito tempo e tem sido evidenciada em estudos e debates internacionais. No presente trabalho esta interação é considerada como verdadeira conseqüência da globalização do capitalismo mundial.

Sem dúvidas, o processo de globalização tem contribuído para que a concentração da renda nas mãos dos mais favorecidos venha acentuar-se. Este fato tem contribuído para a ocorrência da segregação espacial e, consequentemente, para o agravamento da crise ambiental em todo planeta.

No âmbito mundial, é sabido que a maior parte dos lucros da produção do capital é enviada para os países desenvolvidos, detentores dos meios de produção, enquanto que para as nações da periferia do capitalismo, submissas e detentora da maior parte dos recursos naturais, resta simplesmente, o convívio com o drama do aumento populacional e com a problemática sócio-ambiental aí estabelecida.

Numa escala menor, este fato pode ser evidenciado com a proliferação de problemas relacionados à fome, epidemias, analfabetismo e violência, dentre outros aspectos inter-relacionados. A problemática que envolve estas questões é uma só: a concentração da renda que por sua vez gera as desigualdades entre as sociedades.

O mundo se defronta ainda com o problema do meio ambiente que vem sendo degradado de forma exponencial, em função da própria filosofia do capitalismo, estimulando a maximização da reprodução do capital sobre qualquer outro objetivo, por isto, o capitalismo é, por natureza, oposto a qualquer controle ambiental, de vez que a industrialização, com a defesa da natureza, aumentaria os custos de produção e diminuiria o lucro. (ANDRADE, 2002, p. 13).

Grande parte das discussões acerca deste tema tem concluído que o modelo de desenvolvimento que tem como prioridade o crescimento econômico e que alimenta os padrões de consumo de uma minoria da sociedade é, sem dúvidas, um modelo concentrador e excludente.

Nas cidades, o reflexo desse modelo é ainda mais visível. Com a intensificação do processo de urbanização, sofrido por várias cidades brasileiras a partir da segunda metade do século XX, tem-se notado um agravamento dos problemas sócio-ambientais urbanos e um rompimento da qualidade ambiental nessas áreas, principalmente no que diz respeito aos bairros mais afastados das partes centrais onde está localizada uma população desassistida do atendimento a certas necessidades consideradas básicas como saúde, educação, saneamento e habitação.

Para entender os processos urbanos na sociedade contemporânea torna-se necessário aprofundar um estudo sobre determinados conceitos inerentes a esta temática, como por exemplo, as categorias de análise do espaço – paisagem, lugar e território – bem como uma discussão sobre as relações da sociedade estudada com um mundo cada vez mais globalizado e os reflexos dessa relação sobre o meio ambiente. Nesta perspectiva, acredita-se que estas questões estejam inter-relacionadas, ou seja, ocorrem de forma simultânea, todos os segmentos de uma sociedade adicionados aos aspectos políticos estão envolvidos no processo de construção do espaço.

Apesar de ser mais visível nas áreas metropolitanas, o aumento da pobreza e sua materialização no espaço não acontecem apenas nas cidades de grande porte. Centros pequenos como Riacho de Santana na Bahia, também sentem as conseqüências destas mazelas. Conforme Santos:

Com diferença de grau e de intensidade, todas as cidades brasileiras exibem problemáticas parecidas. Seu tamanho, tipo de atividade, região em que se inserem etc. são elementos de diferenciação, mas, em todas elas, problemas com os do emprego, da habitação, dos transportes, do lazer, da água, dos esgotos, da educação e saúde são genéricos e revelam enormes carências. (SANTOS, 2005, p.105).

Este trabalho propõe uma análise sobre os problemas sociais existentes em cidades de pequeno porte, e sua relação com a temática ambiental, numa sociedade cada vez mais globalizada e apresenta o objetivo geral de analisar o espaço geográfico urbano das pequenas cidades, tendo em vista os problemas ambientais, tomando como estudo de caso o bairro Mato Verde na cidade de Riacho de Santana, localizada na sub-região do Médio São Francisco na Bahia. Para tanto, buscou-se compreender os problemas ambientais como reflexo da problemática socioeconômica; identificar, através do processo histórico de ocupação da cidade e do bairro, como se desenvolveram as desigualdades sociais; entender, a partir do processo histórico econômico do município, como se deu a expansão urbana dessa cidade e compreender as conseqüências das formas de uso e ocupação do solo, aí adotadas sobre o meio ambiente urbano, sem perder de vista os processos sócio-econômicos em curso no Brasil e no mundo. Acredita-se que as desigualdades sociais mantêm relações estreitamente ligadas com os problemas ambientais.

O trabalho justifica-se, sobretudo, por tratar de conceitos amplamente discutidos na atualidade pela ciência geográfica, a saber: organização do espaço, construção da paisagem, identificação do lugar e temas abordados nas principais conferências nacionais e internacionais sobre a qualidade ambiental, como o próprio conceito de meio ambiente. Evidentemente que a singela compreensão dos componentes estudados pela Geografia ao longo do curso de graduação contribuiu, decididamente, para a escolha desta temática.

Não diferente dos aglomerados urbanos em geral, na cidade de Riacho de Santana os problemas sócio-ambientais são visíveis. Ainda que não tenha um elevado nível de industrialização e urbanização, as desigualdades sociais têm proporcionado gravíssimos problemas envolvendo analfabetismo, enfermidades, fome e violência. Alguns bairros são mais afetados, isso acontece, principalmente, por abrigar uma população mais carente em sua maioria composta de refugiados da falta de emprego no campo.

Características Geográficas do Município de Riacho de Santana

Riacho de Santana está localizada na mesorregião geográfica do Centro-Sul baiano, incluído na microrregião geográfica de Guanambi-BA, entre a Serra Geral e o Baixo Médio São Francisco (IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Por outro lado, na regionalização geoecônomica, elaborada pela Superintendência de Estudos e Informações (SEI) o município está incluído na região econômica do Médio São Francisco, totalmente no "polígono das secas".

Esta ocupação foi marcada por vários problemas econômicos e sociais, como por exemplo, a crise econômica do algodão no final dos anos 1980 e a concentração de renda acentuada pela atividade carvoeira, que provocaram a formação de desequilíbrios ambientais, acentuados pelo modelo concentrador e excludente da política capitalista.

A elaboração deste trabalho resulta de um Diagnóstico Ambiental Participativo realizado no ano de 2004 como trabalho monográfico de conclusão do curso de graduação em Geografia pela Universidade do Estado da Bahia, em que foi possível identificar vários problemas sócio-ambientais no perímetro urbano de Riacho de Santana - Bahia.

Este diagnóstico constatou que os problemas ambientais ocorrem de forma diferenciada em cada bairro da cidade. Os bairros habitados por uma população maior e mais carente são também aqueles que abrigam a maior parte da problemática sócio-ambiental. Esta, não é apenas uma característica de Riacho de Santana, mas de todas as cidades dentro do sistema de produção capitalista e, mais especificamente, das situadas nos países de periferia. Dessa forma, muitos têm sido os estudos envolvendo esta temática em outras localidades.

Portanto, para iluminar a análise do objeto estudado, buscou-se o embasamento teórico-metodológico através de outros autores que anteriormente abordaram conceitos fundamentais envolvendo a mesma temática. As categorias de análise do espaço como paisagem, lugar e território são conceitos imprescindíveis nesta discussão e, relacioná-los com a crise ambiental, tendo em vista os efeitos da globalização, é ainda um procedimento inevitável.

Conforme Guedes, quando se tem uma premissa do conhecimento geral, consegue-se por dedução ou desdobramento lógico, atribuir ao particular as mesmas propriedades encontradas na premissa, caracterizando o chamado método dedutivo. A partir de uma abordagem geral sobre a temática, o local passa a ser um objeto de análise.

Para o entendimento do objeto empírico, foram coletados dados que possibilitassem o conhecimento, não só do espaço físico estudado, como também da visão dos órgãos públicos e da própria população. Nesse sentido, utilizaram-se fotografias, entrevistas com a população, visitas in loco, levantamento e análises de dados junto à Secretaria Municipal de Obras, Saúde, Assistência Social e Educação. Tendo o Bairro Mato Verde, área da pesquisa, uma população com aproximadamente dois mil habitantes, as entrevistas seguiram por amostragem. Os questionários, permitiam informar a quantidade de pessoas em cada domicílio, o grau de escolaridade dos mesmos, a renda familiar, o acesso aos serviços de saúde, o grau de satisfação com a limpeza pública, o consumo de energia, o abastecimento de água e o acesso aos programas do Governo Federal como Fome Zero, Bolsa Escola, Vale Gás, dentre outros.

Foram 20 questionários aplicados em domicílios visitados. Os domicílios foram escolhidos por quarteirão. Antes das entrevistas realizou-se uma visita geral no bairro, para verificar a quantidade de quarteirões. Estes foram divididos em par e ímpar e os questionários foram aplicados apenas nos quarteirões pares. Um em cada quarteirão. Os dados daí obtidos foram sistematizados em gráficos e tabelas para serem analisados à luz do referencial teórico estudado, o que proporcionou a redação final da pesquisa.

A FORMAÇÃO DO ESPAÇO GEOGRÁFICO DE RIACHO DE SANTANA/BA: AS PARTICULARIDADES DO LUGAR E O MEIO AMBIENTE

Considerando o espaço urbano como resultado de diferentes processos históricos, a pesquisa empírica parte de uma análise da formação histórica e espacial da cidade de Riacho de Santana.

Seguindo a orientação de Harvey (1993), de que a compreensão dos processos históricos se constitui em fonte primordial para a consciência e a prática política e social. Buscou-se relacionar os fatos históricos nessa cidade analisando suas características ambientais e relacionando-as com o contexto mundial, que nas últimas décadas tem assumido um caráter cada vez mais globalizado. Dessa forma, buscou-se verificar os efeitos do global para o local e do local para o global.

O processo de formação histórico/espacial de Riacho de Santana revela-se, como o resultado de um passado economicamente rico, porém, com uma marcante desigualdade social, típica do período colonial em que a agricultura latifundiária predominava na maior parte da região Nordeste do país. Com a economia estruturada num modelo de desenvolvimento predominantemente agrário, o município de Riacho de Santana conseguiu sua emancipação em 1878, mas o seu processo de formação territorial se dá desde o século XVIII.

Seguindo a mesma trajetória do processo de colonização do Brasil, o espaço territorial de Riacho de Santana foi, inicialmente, ocupado por índios em franco processo de dizimação e por negros escravizados para os trabalhos das primeiras atividades agropecuárias da região. Estas duas etnias – as quais foram fundamentais para o desenvolvimento das principais atividades econômicas exploradas no município, como o árduo trabalho nas minas de salitre – juntamente com os brancos de origem européia, contribuíram para a formação da população atual.

O atual processo de construção e organização do município de Riacho de Santana está inserido dentro da dinâmica territorial ocorrida no Brasil nas últimas décadas do século XX. No âmbito nacional, observa-se uma significativa mudança no modo de vida da sociedade, marcada pelo intenso nível de industrialização e urbanização. Este processo de urbanização já vinha se acelerando desde os anos 1950 e, já na década de 60 daquele século, ultrapassava os 50%, quando o país passou a ser predominantemente urbano, com grande concentração de população nas grandes metrópoles, para onde convergem a maioria dos fluxos migratórios.Grande parte da população de menor renda do país, principalmente a nordestina, passa a se refugiar nos grandes centros urbanos em busca de melhores oportunidades.

Esse quadro se reverte um pouco no final da década de 1980, acentuando-se na década seguinte, quando as metrópoles brasileiras encontram-se saturadas em virtude do aumento do desemprego, instabilidade econômica e até mesmo da crise política que o Brasil enfrentou na década de 1980, considerada por muitos analistas econômicos como a década perdida. Dessa forma, o êxodo rural ocorrido em pequenos municípios nordestinos passa a se direcionar, também, para as cidades de menor porte, aumentando, significativamente, o grau de urbanização.

Os núcleos com mais de 20 mil habitantes vêem crescer sua participação no conjunto da população brasileira, passando de pouco menos de 15% do total em 1940 para quase o dobro (27,2%) em 1960, para 50% em 1980 e 61,42% em 1996. (SANTOS, 2002).

Mesmo seguindo um ritmo menor, esse fenômeno tem ocorrido também na Mesorregião do Médio São Francisco, onde está inserido o município de Riacho de Santana que atingiu um grau de urbanização de 39,98% (SEI, 1996), mas ainda encontrando-se abaixo da média baiana de 62,4% (SEI, 1996).

Em Riacho de Santana, que sempre se caracterizou por ter uma economia primária, o processo de urbanização também pode ser observado. Entretanto, apesar de apresentar um significativo crescimento do seu grau de urbanização no período compreendido entre 1980 e 2000, esse município ainda se mantém como marcadamente rural. Conforme dados da SEI (1996), em 1980 a taxa de urbanização era de 25,68 %, uma década após atinge 30,72% indo para 33,48% em 1996. No senso do IBGE de 2000 a taxa atinge 38,44 %.

Dessa forma, ainda que o município tenha vivido momentos alternados de crescimento e retração do contingente populacional, a partir dos anos 1980, conforme será demonstrado a seguir, o que se observa em relação à população urbana é o crescimento constante. A população da cidade que era de apenas 6.056, em 1980, salta para 8.373 em 1991 e em 1996 para 9.614 habitantes (SEI, 1996). Nos dados divulgados pelo IBGE referente ao censo de 2000, o número de habitantes na cidade chega a um total de 11.011 habitantes.

Esse fenômeno pode ser atribuído à crise da atividade algodoeira na década de 1980 (ver item 2.2), que proporcionou certa migração, tanto para a sede do município quanto para outras cidades. O êxodo rural ocorrido na década de 1980 resultou, dentro do espaço urbano de Riacho de Santana, no surgimento de novos bairros, como é o caso do bairro Mato Verde que corresponde à área de estudo.

Ainda que o nível de urbanização não seja muito elevado, a velocidade com que se deu o seu crescimento, atrelada à falta de planejamento urbano para abrigar esta nova população, proporcionou à cidade uma série problemas, uma vez que sua rede de infra-estrutura não se encontrava adequada às novas demandas, principalmente no que diz respeito à pavimentação de ruas, iluminação pública, coleta e disposição final dos resíduos, saúde e educação. Esses aspectos serão discutidos no terceiro capítulo deste trabalho.

Atualmente, com uma população estimada em 29.069 habitantes, Riacho de Santana ocupa a quarta posição entre os municípios mais populosos da mesorregião do Médio São Francisco, perdendo em população absoluta apenas para os municípios de Bom Jesus da Lapa, Barra e Ibotirama, Dessa população total, que se distribui em 6. 339 famílias, 11. 011 pessoas encontram-se na cidade e 17.630 no meio rural.

Conforme já mencionado, a dinâmica populacional do município sofreu alternância entre momentos de crescimento e estagnação ou mesmo retração, nas últimas décadas do século XX, conforme ocorreram mudanças significativas nos processos sócio-econômicos do país e da região.

Segundo dados do IBGE (ESTADOS & MUNICÍPIOS, 1978), a população do município de Riacho de Santana entre as décadas de 1950 e 1970, passou por um processo de crescimento de 38,47%, visto que na década de 1950, a população deste município estava em torno de 21.301 e chega a 29.496 habitantes em 1970 distribuídos em uma extensão territorial de 3.873 Km2.

Esses dados possibilitaram estimativas do Centro de Pesquisas e Estudos (CPE), em 1978 por ocasião do centenário da emancipação política da cidade, de que a população teria alcançado de 32.639. Entretanto, o que se observa, conforme dados do Centro de Estatísticas e Informações (CEI), é que houve uma estagnação durante a década de 1970, quando a população apenas chega a 29.719 habitantes em 1980, apresentando um crescimento de pouco mais de 200 habitantes em relação ao número alcançado dez anos atrás.

Como toda a região Nordeste do país, o município sofreu um longo período de emigração para os estados do Sul e Sudeste do país, para onde as pessoas se deslocavam à procura de emprego e melhores condições de vida. Esse processo de êxodo rural se revela mais fortemente na dinâmica populacional do município a partir da década de 1970, quando se inicia a já mencionada crise da cultura do algodão. Nesse período o crescimento vegetativo, mal consegue superar as perdas de população por conta da emigração.

Durante a década de 1980 a população total do município chega a sofrer uma considerável redução em números absolutos, caindo dos 29.719 habitantes em 1980 para 23.578 habitantes em 1990. Pode ter interferido nesse processo, a redução territorial que Riacho de Santana sofreu em 1989 com o desmembramento do "distrito" de Matina. Entretanto, a CEI considera o intenso processo migratório como o fator principal que contribuiu para esse decréscimo.

A partir da década de 1990, em virtude das altas taxas de desemprego geradas por sucessivas crises político-econômicas, que se verificam até hoje, grande parte dos emigrantes, passou a fixar-se na sede do município, porque, sendo a problemática do desemprego nacional e de característica estrutural, marcada pelo efeito da globalização, ela atinge também as grandes metrópoles.

Assim, o crescimento vegetativo da população contribuiu para um aumento do índice populacional, durante essa década, chegando a população total ao contingente de 29.069 habitantes, como já mencionado. Porém, ressalta-se, esse crescimento tem se concentrado na área urbana, pois o êxodo rural tem contribuído, cada vez mais, para o esvaziamento do campo e a emigração de jovens e adultos para a cidade em busca de melhores condições de vida; processo, esse, ainda mais intensificado pela ausência de Ensino Médio ou profissionalizante no meio rural.

Como resultado dessa dinâmica populacional do município, observa-se uma série de modificações no espaço geográfico da cidade. A expansão territorial do Bairro Mato Verde nos últimos anos do século XX destaca-se dentre esses processos.

O que se observa, entretanto, é que essas modificações, resultantes do crescimento da população urbana, não podem ser consideradas como efeito de desenvolvimento do município, mas sim, do forte êxodo devido às precárias condições de trabalho no meio rural onde as práticas arcaicas e predatórias nos processos de produção da agricultura e da criação de gado são ainda constantes, deixando o município sem condições de concorrência num mercado cada vez mais globalizado, onde a competitividade é um fator que se torna fundamental para a sobrevivência.

2.2 Riacho de Santana: no auge do processo de Globalização, a economia primária sobrevive lado a lado com as desigualdades sócio-espaciais.

Inicialmente, a economia do município estruturava-se na predominância do cultivo do algodão e da agricultura de subsistência, tendo como principais culturas o milho, o feijão de corda, o feijão branco, arroz e a mandioca. Com o aumento populacional, a atividade agrícola ganha impulso e dinamismo, surgindo a necessidade de programar a produção para atender as necessidades de consumo da população urbana. Outro fator que contribuiu para o dinamismo econômico foi o crescimento das relações comerciais com outros municípios, que provocou intensificação da necessidade não só de aumento da produção, mas também de sua diversificação. Com isso, o município vai buscar, através de implementos diversos na economia, uma posição no espaço regional e estadual, tendo como produto base a cultura do algodão "rim-de-boi", que durante seu auge (1695-1970), mais de dois séculos, propiciou a este município muita riqueza e destaque na produção estadual.

A economia girava em torno da produção do algodão, que tanto oferecia trabalho no cultivo, como nas usinas algodoeiras que haviam se instalado na cidade. Estas usinas empregavam inúmeros funcionários, e dinamizavam o comércio e a vida da população, até a década de 1980.

A produção agrícola não se restringia apenas à cultura do algodão, sendo também produzido como culturas permanentes a banana, o coco da baía, a laranja e a manga. E, como culturas temporárias o arroz, a batata doce, a cana-de-açúcar, feijão, fumo em folha, melancia, mandioca e milho. Na pecuária, destacava-se o rebanho bovino que em 1974 ultrapassava cinqüenta mil cabeças, trinta e três mil suínos, quinze mil ovinos e mais de cinco mil caprinos. Todavia, historicamente, sempre foi a cultura do algodão que se constituiu no principal pilar da economia local.

Entretanto, ao final da década de 1970, o auge do dinamismo econômico baseado no algodão foi interrompido com o aparecimento do "bicudo". A baixa na produção resultou num declínio econômico rápido e abrangente que abalou economicamente, não somente o município, como também toda a região e perdurou durante toda a década de 80.

Neste período, a economia estagnou e os produtores rurais que desenvolviam a monocultura do algodão, passaram a buscar a ampliação da atividade pecuária que já era praticada. Com a ajuda do governo estadual essa atividade ganhou destaque no município.

Entretanto, a pecuária não conseguiu se constituir no grande pilar da geração de riqueza para Riacho de Santana, os agricultores descobriram uma forma mais rápida e lucrativa de obter renda, baseada na extração da lenha para geração de carvão vegetal. A atividade, hoje, é praticada em todas as áreas onde ainda há matas, e a velocidade em que se processa é assustadora. Atualmente, qualquer tipo de madeira é utilizada, na maioria das vezes de forma ilegal e clandestina, sem que seja feito manejo florestal ou mesmo reflorestamento. O solo desprotegido provoca o desencadeamento acelerado do processo erosivo, além de compactação proporcionando o impedimento da prática agrícola. Dessa forma, reduzem-se as possibilidades de um melhor aproveitamento da terra e, conseqüentemente, intensifica-se o processo de êxodo rural.

Não se pode negar que a atividade carvoeira tem gerado renda para o município. Entretanto, esta renda tem sido concentrada nas mãos de uma minoria. Os atravessadores e os proprietários de caminhões e carretas são os mais beneficiados. Os carvoeiros são na maioria, analfabetos ou vítimas da falta de informação. Observa-se, portanto, que a atividade supracitada, apesar de proporcionar uma breve dinamização da economia local, não foi capaz de proporcionar crescimento econômico sustentável para o município.

Crescimento econômico não significa desenvolvimento social. A atividade foi caracterizada pela alta concentração da renda, além dos danos causados aos ecossistemas naturais, e com isso a situação econômica, ambiental e social, nesse município, torna-se ainda mais preocupante.

Atualmente, a produção de carvão tem passado por uma crise. Apesar disso, continua sendo a principal atividade econômica do município, uma vez que a pecuária continua estagnada e não se verifica nenhum surgimento de uma outra atividade para ocupar a mão-de-obra carvoeira.

A pecuária, que sempre se caracterizou como atividade prioritária não garante mais a estabilidade econômica. Para se ter uma idéia, o número de cabeças de gado bovino se manteve estagnado nos últimos trinta anos, não ultrapassando as mesmas cinqüenta mil cabeças de outrora, (IBGE de 2002). Ainda com base nos números fornecidos pelo IBGE, houve um drástico declínio no rebanho de suínos, chegando a um total de apenas 12.119 cabeças com uma queda de quase onze mil cabeças entre 1974 e 2002. Além disso, existem os rebanhos de caprinos e eqüinos que não evoluíram, apresentando, praticamente, os mesmos números.

A produção agrícola, também não mostra uma satisfatória evolução, o município produz praticamente as mesmas culturas de trinta anos atrás e ainda de forma tradicional e arcaica, o que implica na baixa produtividade e no reduzido rendimento da lavoura. Dados colhidos junto ao IBGE de 2002 nos revelam uma produção anual de banana que atinge os duzentos mil cachos, vinte mil frutos de laranja e vinte e um mil frutos de coco da baía. Das culturas temporárias, merecem destaque a mandioca com uma produção de mais de quarenta e cinco mil toneladas, o algodão com vinte mil toneladas e o feijão com mil e oitenta toneladas.

Riacho de Santana ainda dispõe de duas cerâmicas de porte intermediário que absorve uma razoável mão-de-obra e sua produção é suficiente para atender ao mercado interno. Esta atividade, no entanto, tem provocado sérios impactos ambientais, já que implica na retirada da madeira e sua queima e na emissão de gases poluentes na atmosfera, além da retirada da argila nas margens dos rios para a produção de blocos, alvenarias e telhas para construções, alterando o formato de seu leito e provocando mais erosão.

Diante do cenário acima exposto e da existência de uma economia cada vez mais globalizada que oferece mercadorias produzidas em condições bem mais competitivas, independentes dos locais onde são produzidas, chegando ao mercado a preços bem inferiores aos produzidos na região, não é difícil de imaginar que a crise progressiva em curso no município só tende a se agravar.

Justifica-se, então, uma breve análise do processo de organização do setor terciário em Riacho de Santana, sempre apresentou uma atividade comercial pouco desenvolvida, em função do baixo poder aquisitivo da população decorrente do alto índice de desemprego. Um breve histórico sobre o comércio riachense revela que esta atividade concentrava-se no início do século XX em torno da Praça Monsenhor Tobias, uma vez que ali estava o centro econômico e político-administrativo do município. É neste espaço onde se localizava o primeiro mercado municipal que hoje constitui o atual Salão Paroquial.

Com o aumento da população, aquele espaço não mais atendia às necessidades do comércio riachense, o que determinou a mudança na centralidade a partir da construção de um novo mercado municipal na década de 1950 contribuindo para a formação da atual Praça Lauro de Freitas. Neste contexto, ocorreu uma lenta transferência dos estabelecimentos comerciais da Praça Monsenhor Tobias para a Lauro de Freitas e, com isso, houve a formação da Rua Gercino Coelho ligando as duas praças.

Na década de 1990, o comércio de Riacho de Santana experimenta um ligeiro aumento no dinamismo em função de vários aspectos, dentre os quais se destaca o aumento populacional, as políticas assistencialista do Governo Federal, expansão do sistema previdenciário e do crescimento da oferta de emprego no setor de serviços, que contribuíram para um pequeno aumento no poder de compra dos riachenses, refletindo na atividade comercial.

No ano de 2001, houve uma nova transferência do mercado municipal, uma vez que o antigo não mais atendia as necessidades do comércio do município em virtude do pequeno espaço que o mesmo dispunha.O novo mercado, localizado às margens da rodovia que atravessa a cidade, é dotado de um amplo espaço que, paulatinamente, vem atraindo os estabelecimentos comerciais, bem como o centro financeiro do município. As feiras livres acontecem durante o decorrer da semana, tendo o sábado, como o dia de maior movimento, é nesse dia em que as pessoas do interior do município se deslocam para cidade a fim de realizarem suas compras e comercializarem seus produtos oriundos da agricultura de subsistência.

No que diz respeito à composição do comércio, constata-se uma grande desigualdade tanto no número de estabelecimentos quanto na diversidade destes. Nesta perspectiva, uma pesquisa por amostragem, realizada durante o trabalho de campo, revelou que 25,39% dos estabelecimentos comerciais do centro da cidade são de artigos e confecções. Um outro setor que se destaca é o farmacêutico com um percentual de 8,73%, pontuando apenas nesta parte da cidade. Porém os bares e lanchonetes constituem o setor que apresenta um maior percentual somando 34,12% do total, enquanto que os estabelecimentos de gêneros alimentícios somam apenas 11,9%.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Deve-se destacar que o conceito de meio ambiente adotado neste trabalho, o define como o resultado de ações conjuntas de elementos naturais e antrópicos. Quando estes são envolvidos, necessariamente, todos os valores subjacentes a eles, tais como: os aspectos sociais, culturais, econômicos e políticos, também são envolvidos. Dessa forma, desconsiderou-se o ambiente em que apenas os conjuntos de ações naturais são contemplados, estabelecendo um enfoque majoritário aos elementos humanos.

Considerou-se que as pequenas cidades não dispõem de um crescimento a ponto de acompanhar a evolução do capitalismo na era da globalização, e desse modo, apresentam graves problemas sócio-ambientais em detrimento da fraca economia. Assim, o estudo sobre a formação do espaço geográfico em Riacho de Santana mostrou que esta cidade não é contemplada pelos avanços tecnológicos e as modificações sofridas no modo de produção capitalista, nesta sua terceira fase, como tem acontecido com outras localidades brasileiras Na periferia do capitalismo existem outras periferias, onde os problemas sociais variam de pontos a pontos, ou seja, dentro do bairro as diferenças socioeconômicas são vigentes. As áreas foram ocupadas sem que houvesse uma preocupação, por parte do poder público, em atender a população no que se refere à infra-estrutura. Sem haver planejamento de políticas para o crescimento do bairro, torna-se difícil um crescimento urbano sustentável. Ausência de pavimentação da maioria das ruas, a falta de iluminação pública e o destino inadequado dos resíduos nas áreas menos privilegiadas são alguns aspectos relacionados a esta falta de planejamento.

Dessa forma, a ausência de políticas pública que possam equacionar os problemas sócio-ambientais existentes na cidade, torna-se um traço marcante em sua paisagem, como na de muitas outras do universo das cidades nordestinas, que inserem-se na periferia da periferia do sistema capitalista. Só o exaustivo estudo de realidades como esta poderá apontar possíveis caminhos no sentido de vislumbrar um futuro mais includente para esta localidade.

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Autor: Glhebia Gonçalves


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