A face do mal



O que é o mal. Qual sua origem? Pode-se afirmar que tem uma face? Trata-se de um ser? Uma idéia? Uma desculpa para nossos atos?  Acredito que dentre as verdades buscadas, o mal tenha sido um assunto que sempre foi estudado pelo homem desde o momento em que tomou consciência de sua própria existência e de sua relação com o mundo, com o Ser e com o próprio homem.

O demônio sempre ocupou o imaginário popular, embora não se possa afirmar com certeza que sua imagem seja tão antiga como o próprio homem. Mesmo na sociedade cristã, da qual fazemos parte, sua imagem remonta a apenas 500 anos A.C quando os judeus foram mantidos como escravos na babilônia e nesta cultura se acredita no paraíso e no inferno, bem como na existência de um Deus do bem e um Deus do Mal. Até este momento, não vemos na história do povo judeu alguma menção ao demônio, diabo ou qualquer outro nome. Tanto que Deus é o que prática o bem como o próprio mal. É o mesmo Deus criador que tem ódio, se arrepende, promete destruir, matar e assim por diante. 

A partir de estão o demônio aparece como uma forma de contrapeso, dentro da idéia dos opostos, se existe o bem e este é um Ser, existe também o mal e este passa a ser visto também como um ser. Mas Deus sendo único e verdadeiro, essência pura, criador de tudo e de todos, poderia criar um ser que viesse a exercer força destruidora sobre o homem, criado a sua imagem a semelhança?

Com isso, e acreditando na existência do Ser Superior, independentemente se for dentro de uma teoria criacionista ou evolucionista, temos a certeza da existência do Livre Arbítrio, ou seja, o homem sendo racional é capaz de separar o bem do mal e escolher entre um e outro. Porém nossa sociedade insiste na afirmação de que existe uma força obscura e que exercer influência direta todos nossos atos. Então, se praticamos o bem estamos com Deus e se praticamos o mal é porque estamos possuídos pelo demônio. Onde fica o livre arbítrio?

Ou Deus criou o homem com o livre arbítrio e com isso a desculpe do demônio é somente uma fuga para enganar a nós mesmos e os outros. Ou Deus é uma história inventada pelo próprio homem como justificativa de sua pequenez. As três coisas juntas são impossíveis, pois uma anula a outra se insistirmos  em mantermos este nível de reflexão.

Dessa forma pode-se dizer que Pitágoras foi um dos primeiros filósofos a explanar sobre a existência do mal. Para ele o mal estava no próprio homem e a única forma de se livrar do mal era reencarnando diversas vezes, até eliminar todo o mal. O homem contém o mal, suas ações são voltadas para o mal para atender seus sonhos, suas iras, seus ódios, suas paixões.

Platão de certa forma segue o mesmo raciocínio de Pitágoras, porém separando o corpo da alma, ou seja, o homem é  uma alma prisioneira em um corpo. Dessa forma  o ser não é puro enquanto ser que existe neste mundo, pois o corpo é que nos enche  de amores, paixões, temores, imaginações, enfim nos leva a praticar o mal.

Até aqui podemos perceber que desde a origem da discussão, o mal não é visto como um ser criado ou preexistente antes do próprio homem, mas faz parte do pensar humano, do querer humano, da opção entre fazer ou não fazer algo. Mesmo sem entrar na questão do livre arbítrio contigo no Livro do Genesis, primeiro livro da Canon bíblico.

Santo Agostinho, Bispo da emergente Igreja Cristã, em seu livro 'O Livre-arbítrio', vem nos mostrar que Deus, o criador de tudo e de todos, não é o criador do mal. Deus, o Ser verdadeiro e único, sendo bom, jamais poderia criar algo contra a sua própria essência. Dessa forma o mal não seria um ser e sim a ausência do ser perfeito que é Deus. Dentro de uma fórmula matemática o mal seria visto com o  resultado da equação do mundo sem a presença do bem.

Levando em consideração a teoria do Livre-Arbítrio concedido por Deus ao homem, ele acredita que o mal é o resultado de nossa liberdade, pois o Ser Supremo, que é perfeito, criou um ser que fosse livre em suas escolhas, ou seja, quis criar um ser que pudesse escolher o bem de forma voluntária, qual seja o próprio homem. Dessa forma o homem dentre todos os seres criados por Ele, é o único ser que possui vontade, liberdade e conhecimento. Assim para Agostinho Deus não é o criador do mal, mas o criador do livre-arbítrio, que concede aos homens a liberdade de exercer o mal, ou melhor, de não praticar o bem.

Descartes, que é considerado o pai do racionalismo moderno nos faz a seguinte pergunta:  por que erramos?  Por que praticamos o mal? Seguindo o mesmo raciocínio de Agostinho, para ele o erro ocorre como resultado de nossa liberdade. Deus ou qualquer outro ser não são os culpados por nossos erros. O homem pela própria liberdade é capaz de escolher, de conhecer, de reconhecer e aceitar como certo ou válido determinado comportamento.  

Assim, conforme Luiz Paulo Horta, a única fonte do Mal é alguém grudar-se a si mesmo, é não entrar no jogo do amor, é não abrir espaço para a imensa ternura de Deus, é ficar do lado de fora da casa onde nós somos sempre esperados e sempre acolhidos.

Encerrando esta pequena reflexão sobre o mal, podemos afirmar que o próprio Jesus Cristo, conforme narrado por Mateus, afirma que o que sai da boca do homem procede do coração, e isso contamina o homem. Porque do coração procedem os maus pensamentos, mortes, adultérios, prostituição, furtos, falsos testemunhos e blasfêmias. São estas coisas que contaminam o homem e não os maus espíritos ou o próprio demônio como muitas vezes justificamos para validar nossos próprios erros.  É muito fácil seguirmos a orientação de nosso próprio coração, de nossos medos, angustias e depois culparmos outro ser e assim sairmos ilesos de nossas escolhas. Essa é a conclusão que chegamos ao analisar a face do mal sob a ótica da filosofia e da própria religião durante milênios de busca e reflexão.


Autor: Luiz Pedro


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