A Viagem



Uma mente fluídica como as águas de um lago divagava despretensiosamente, porém repleta de esperança de enxergar além de onde seus horizontes atuais eram capazes de ver.

Apaziguado com a harmonia e silêncio do local, com seu manto e capuz, o velho jovem estava com seu cetro a fazer desenhos na areia quando um lampejo de consciência lhe ocorreu. Sua aparência profundamente serena e forte, agora era de mais força e serenidade... Tudo ao seu redor era o mesmo, mas sua percepção era outra... Um sentimento puro e elevado de amor pulsava em seu peito, enquanto que um elevado nível de consciência lhe tomava o espírito e mente.

O entendimento de que tudo o que ele próprio representava e de tudo aquilo que podia compreender era ínfimo em relação ao todo que existe e pode ser conhecido; uma humildade real e sincera lhe abria portais para um entendimento superior. Uma libertação das amarras que nos mantém presos onde quer que estejamos tornou seu espírito mais leve e, por isso, capaz de galgar passos além, rumo a um nível mais elevado e sublime de consciência.

O vislumbre de mundos tão belos quanto diversos daquele tão harmônico em que vivia se fez; a visão de seres e cidadelas cintilantes, de feições e formatos o mais próximo da perfeição que era capaz de conceber aconteceu.

A noção de tempo e de limites por um instante se desfez. Uma vasta liberdade invadiu seu ser, e a paz mais profunda que já conhecera refrescou-lhe o âmago.

Mas algo o puxara para a praia à beira do lago em que seu corpo de matéria estava. Toda a paz e consciência que experimentara eram agora reduzidas, traduzidas e interpretadas de acordo com os padrões de compreensão de seu corpo atual; ainda assim, uma vaga – e mesmo assim gigante - lembrança de tudo o que experimentara se fazia presente; com um olhar compenetrado e profundo e um sorriso dos que conhecem a paz, olhava o lago reluzente à sua frente.

O sol já não era mais o mesmo, nem mesmo a relva ou o horizonte; tudo passara a ser visto com outro olhar. Seu pequenino amigo do lago, um peixinho azul e sorridente, veio aos saltos do lago para brincar com ele. O amor e carinho que sentia pelo animalzinho era agora mais profundo e intenso, mais puro e verdadeiro. O pequeno bichinho parecia sentir a mudança, visto que seu sorriso e alegria eram ainda mais vistosos do que o eram antes.

 O pôr-do-sol estava chegando ao seu auge, deixando a todos numa aconchegante e agradável penumbra – ainda com vestígios permanentes de uma viva luz. Chegava ao fim mais um dia, o término de mais uma viagem e que daria início a muitas outras.


Autor: Carlos Cordeiro


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