A Inconstitucionalidade do Regime Especial de Direito Administrativo



Fernanda Castro

O regime especial de direito administrativo, mais popularmente conhecido como REDA, é um regime de contratação temporária de pessoas para prestarem serviço ao poder público, tendo, via de regra, durabilidade de dois anos, podendo ser prorrogado por mais dois anos.

O referido regime avalia os candidatos por meio de um processo de avaliação simplificado, podendo ser realizado por entrevistas, avaliações curriculares ou até mesmo de prova escrita.

Cada Estado determinará através de decreto a aplicação do Regime Especial de Direito Administrativo. Na Bahia o decreto n. 1.401 de 31 de julho de 1992, dispõe acerca procedimento para contratação temporária sob regime especial de direito administrativo, in literis:

Art. 1º - A contratação de pessoal em regime especial por tempo determinado, prevista no Capítulo IV da Lei nº 6.403, de 20 de maio de 1992, obedecerá às determinações constantes deste Decreto.

Art. 2º - Só serão permitidas contratações de pessoal em regime especial por tempo determinado para atender necessidade temporária de excepcional interesse público.

Ocorre que a Constituição Federal prevê, em seu art. 37, inciso II, a obrigatoriedade da realização de concurso público para a contratação com o serviço público, conforme dispõe, in verbis:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

I - ...

II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;

Isso demonstra que uma lei infraconstitucional que venha a determinar outra modalidade de avaliação para o ingresso na carreira pública não deverá ser considerada constitucional, tendo em vista seu confronto com os ditames da Carta Magna, pois viola um claramente um preceito constitucional.

Assim, a lei que instituiu o Reda demonstra-se flagrantemente inconstitucional, além de privilegiar uns poucos. Sabe-se que a única forma de se modificar os ditames da Constituição Federal, só pode ocorrer através de medida provisória ou por meio de emenda constitucional, portanto, partindo do ponto de vista técnico, a inconstitucionalidade existe.

A única hipótese em que a Constituição libera a contratação para o serviço público sem a realização de concurso público é no caso de cargo de confiança em que o critério de seleção é a "confiança", entretanto outros critérios deverão ser levados em conta.

Permite-se que a escolha dos cargos em comissão seja livre, podendo-se nomear pessoas da própria Administração Pública, ou até mesmo fora dela, o que não é o caso do regime especial de direito administrativo.

No caso do Reda, este não se caracteriza uma contratação para cargo de confiança, já que este último é demissível ad nuntum e nada tem haver com um processo de avaliação simplificado de tempo determinado.

O regime especial de direito administrativo configura-se, na verdade, como uma tentativa de balizar os trâmites legais para a entrada na carreira pública.

Insta salientar que o referido regime estimula a corrupção e desonestidade que tanto ocorre no Brasil. Aqueles que possuem algum conhecido no serviço público, já saem em vantagem, uma fez que quem realiza o procedimento de avaliação do reda é o próprio órgão interessado, não havendo nenhum tipo de controle, ou mesmo critério que deverá influir no resultado.

Existem ainda muitas outras tentativas de alguns para que se tente burlar a forma de ingresso no serviço público, entretanto algumas leis vêm surgindo com o objetivo de combater essas irregularidades. A exemplo se tem a lei que proíbe o nepotismo, que configura-se como sendo o ato de servidores fazerem ingressar parentes seus no serviço público, por meio de influências próprias, sem a utilização de nenhuma avaliação justa e criteriosa para tanto.

Há ainda comentários sobre uma lei proibitiva do Reda, entretanto, há aqueles que defendam, baseando-se na emergência de alguns serviços que exige uma contratação mais rápida, mais imediata, não tendo que passar pela burocracia exigida nos concursos públicos.

Entendo que essa justificativa realmente seja uma realidade, entretanto não considero como sendo suficiente para fundamentar a utilização do Reda.

Somente em situações excepcionais é que deveria haver a utilização da contratação de um regime simplificado, o que na prática, sabe-se que isso não ocorre. Cada vez mais, muitos órgãos adotam o Reda, sem nem mesmo demonstrar a mínima urgência da contratação.

O brasileiro tem uma cultura de "querer se dar bem", mesmo que para isso, tenha que prejudicar outros que lutam, justamente, para conseguir seu lugar ao sol.

É o famoso "jeitinho brasileiro"que nada mais é do que uma violação singela dos ditames legais determinados pela sociedade. Digo singela, porque, na maioria das vezes, não chega a ser um crime tipificado, mas não deixa de ser uma tentativa de desviar das regras estipuladas para todos.

É necessário acabar com esses absurdos que só vem a desestimular a concorrência leal e a estimular a desonestidade e incompetência de alguns servidores. Isso porque, uma das conseqüências da burla à exigência constitucional de concurso público, vem descambar para uma desqualificação dos profissionais do serviço público, uma vez que ao se permitir que muitos entrem sem a avaliação adequada, seria arriscar quanto à sua real capacidade para prestar tal serviço.

Esse é um risco grande que se corre ao se permitir a entrada de pessoas que não são avaliadas da devida forma. O concurso público configura-se como uma forma mais segura de se contratar, posto que é dotado de inúmeros critérios e exigências adequados ao tipo de serviço exigido. Portanto, aquele que for aprovado no concurso, demonstrar-se-á, a princípio, tecnicamente capaz de realizar a atividade exigida, uma vez que passará por toda a avaliação pertinente a cada cargo.

A grande verdade é que a instituição do Reda acaba por permitir a contratação preferencial de pessoas determinadas, desprezando o critério da igualdade e da concorrência que o verdadeiro concurso público requer.

Bibliografia

BASTOS, Celso Ribeiro e MARTINS, Ives Gandra. Comentários à constituição do brasil. São Paulo: Saraiva, 1990. Vol. 3 e 7.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, Direito Administrativo. 14.ª ed., Ed. Atlas S.A., São Paulo 2002.

GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 6.ª ed., Ed. Saraiva, São Paulo 2001.


Autor: fernanda castro


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