O Conceito de ''Abstração Reflexionante'' e o Desenvolvimento da Lógica de Pensar e os Conteúdos de Física



O conceito de "abstração reflexionante" e o desenvolvimento da lógica de pensar e os conteúdos de Física.

Por: Maria José Lacerda Vasconcelos[1]

As preocupações dos teóricos que nortearam seus estudos para o desenvolvimento da pessoa, fizeram a mesma pergunta: Como se constrói o conhecimento?

E hoje, acredito que esta pergunta esteja presente na cabeça dos profissionais
de educação que trabalhar em sala de aula, em particular os professores da área de ciências que leciona física e convivem diariamente com os conflitos dos seus alunos.

Se a escola é o local onde acontece a socialização do conhecimento historicamente acumulado pela humanidade e a finalidade da ação docente se concretiza na tarefa de mediar e mediar com sucesso e sabedoria seus alunos, é preciso que tenhamos sensibilidade para poder selecionar no universo de tantos elementos culturais, aqueles que são fundamentais para a formação dos nossos alunos do ensino médio.

Conforme aponta Saviani (1992) [2] os educadores devem buscar nortear sua ação a partir de três objetivos fundamentais: a identificação das formas mais desenvolvidas em que se exprime o saber objetivo socialmente produzido, a transformação deste saber objetivo em saber escolar que possa ser assimilado pelo conjunto dos alunos e a garantia das condições necessárias para que estes não apenas se apropriem do conhecimento, mas ainda possa elevar seu nível de compreensão da realidade.

No entanto, o nosso trabalho em sala de aula vai muito mais além do que definir os conteúdos e a metodologia a ser utilizada, tem de dar conta a meu ver, a um dos maiores desafios da educação: enfrentar salas de aula com 40 alunos em média, que apresentam momentos e ritmos diferenciados para aprender.

Piaget, em suas pesquisas científicas procurou demonstrar a construção dos processos mentais. Considerou que se estudasse a maneira de como as crianças constroem as noções fundamentais do conhecimento poderia compreender a gênese e a evolução do conhecimento humano, por isso, partiu de uma concepção de desenvolvimento envolvendo um processo contínuo de trocas entre os organismos vivos e o meio ambiente.

Pode-se dizer que o "sujeito epistêmico" protagoniza o papel central do modelo piagetiano, pois a grande preocupação da teoria é desvendar os mecanismos processuais do pensamento do homem, desde o início da sua vida até a idade adulta. Nesse sentido,  a compreensão dos mecanismos de constituição do conhecimento, na concepção de Piaget, equivale à compreensão dos mecanismos envolvidos na formação do pensamento lógico, matemático.

No processo de abstração reflexionante proposto por Piaget e discutido por Becker (1993) [3], o conhecimento é concebido como uma construção. Esta construção acontece através de um processo de abstração reflexionante.

O processo de abstração reflexionante é a projeção num patamar superior daquilo que foi tirado de um patamar inferior. Neste processo a reflexão é o ato mental de construção e reorganização sobre o patamar superior daquilo que foi transferido pelo inferior.

Para o autor, abstração significa retirar, extrair ou arrancar algo de algo. As abstrações sempre incidem sobre um material reflexionante. No estudo da Física, os modelos
formam este material, pois a Física é a ciência dos modelos.O material gera abstração empírica quando for observável, isto é, originários de objetos ou ações. Se o material estiver na classe dos não-observáveis gera abstração reflexionante que é o resultado de coordenações endógenas.

A dificuldade de compreender o conceito físico pela grande maioria dos estudantes do ensino médio e em graduações superiores, advém muitas vezes da falta de correspondência das representações reflexionante com as formas de abstração empírica derivadas da percepção direta da realidade. Como exemplo a idéia carga elétrica, campo elétrico e potencial elétrico no ensino do eletromagnetismo.

A abstração reflexionante é simbólica. Os conteúdos estudados no ensino médio e a maneira como esses conteúdos são ministrados com aulas experimentais ou demonstrativas (quando estas existem nas escolas), não são capazes de promoverem a passagem da abstração empírica para a abstração reflexionante. Estamos apenas considerando os conteúdos relacionados à física clássica

A mudança cognitiva que vai do empírico ao abstrato não ocorre de forma direta e imediata e muitas vezes não ocorrem, por outras implicações decorrentes das interpretações epistemológicas, como acontece com a física quântica. Este é um tema que até o momento não existe um consenso entre os educadores, da melhor maneira de se introduzir no ensino básico os conteúdos desta ciência que criou um novo paradigma no século XX e tem contribuído grandemente com os avanços tecnológicos no muno atual.

Vale lembrar que a abstração será maior ou menor dependendo do contexto onde o indivíduo esteja inserido. O contexto serve para alimentar as experiências anteriores ou os esquemas. Portanto, a preocupação em apresentar os conteúdos de Física de tal forma que sejam associados ao cotidiano do aluno deve ser constante, o que certamente ajuda na mudança cognitiva do sujeito com a mediação do professor. Não é uma tarefa fácil! mas é possível.

A importância da pesquisa no ensino da física é fundamental na prática de um ensino construtivista. Através dela é possível manejar e produzir conhecimento, possibilitando abstração reflexionante, isto pode produzir independência em pensamentos e ações. Em decorrência disso, a educação escolar pode contribuir grandemente na formação de pessoas com senso crítico da realidade. Este pode ser um caminho para o ensino da Ciência da Natureza no ensino médio.

Salvador, Maio de 2009

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AGUIAR, Orlando. As três formas de eqüilibração: análise do material didático de um curso de eletricidade básica. Caderno Catarinense de Ensino de Física. Volume 16 nº. 1 de Abril de 1999. p. 72-82

BECKER, Fernando. Epistemologia do Professor: O cotidiano da escola. Petrópolis Editora Vozes, 9º Edição, 2001.

FERRACIOLI, Laércio. Aspectos da construção do conhecimento e da aprendizagem na obra de Piaget - Caderno Catarinense de Ensino de Física. Volume 16 – Nº. 2 de Agosto 1999. p. 180-194.

PIAGET, J. & GARCIA, R. Psicogênese e História da Ciência. Lisboa: D. Quixote, 1987.

PIAGET, J. Eqüilibração das Estruturas Cognitivas. Rio de Janeiro: Zahar, 1976.




Autor: Maria Vasconcelos


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