Usucapião



1.Conceito e Previsão Legal

A usucapião é também conhecida por prescrição aquisitiva, regulada no direito das coisas, trata-se de modo originário de aquisição da propriedade e de outros direitos reais suscetíveis de exercício continuado através da posse prolongada no tempo atendidos os requisitos da lei, a saber: a posse e o tempo. Em outras palavras, dispõe-nos a lei, pelos arts. 1.238 a 1.244 do Código Civil, que aquele que detiver a coisa como sua, por determinado lapso temporal em lei fixado, adquirir – lhe – a propriedade.

Exigir – se – a, além da posse e do tempo elementos tais como o animus domini (ânimo de dono) e objeto hábil. Nas demais espécies de usucapião, extraordinário, ordinário e especial, se farão presentes elementos tais como justo título e boa – fé.

2.Generalidades

Para que a posse seja hábil à gerar a usucapião é mister que revista – se das características de ininterrupta, incontestada e com ânimo de dono.
Vale dizer que para efeitos de cálculo de tempo necessário a usucapião, pode o possuidor, somar à sua a posse dos antecessores, segundo disposto no art. 1.243 do C.C.. Em que pese o fato de o possuidor poder somar o tempo de posse dos antecessores à sua, tal posse deverá revestir – se de caráter ininterrupto, "ou seja, na transposição de período para o outro, é mister que as posses se tenham transferido pacificamente, sem ter ocorrido a perda em momento algum."[1]

A posse também deverá ser incontestada, ou seja, mansa e pacífica. Se no período exigido pela lei o dono da coisa venha a manifestar – se de algum modo reclamando a coisa possuída, perderá então a posse a característica de incontestada.

O ânimo de dono, ou animus domini, significa que o possuidor deverá ter como sua a coisa, exteriorizando atos que demonstrem julgar – se proprietário, afastando dessa forma a possibilidade de usucapião nos casos em que na verdade há a mera detenção, como no caso do caseiro ou do zelador, onde há o vínculo de subordinação, ou ainda nas hipóteses em que haja posse indireta, quando não haverá contato físico com a coisa.

Conforme se verá adiante, o tempo para usucapir irá variar conforme a modalidade de usucapião, como por exemplo, usucapião extraoridnário (art. 1.238 do C.C.) que ocorrerá em quinze anos; usucapião ordinário (art. 1.242 do C.C.) que dar- se – a em dez anos; usucapião especial que se dará em cinco anos.

3.Fundamento da Usucapião

É sabido, segundo a Constituição Federal, que toda propriedade, todo bem, móvel ou imóvel deve ter uma função social, ou seja, deve ser usada pelo seu dono, seja de que forma for, direta ou indiretamente, devendo gerar utilidade. Se o proprietário deste bem porta – se de maneira desinteressada em relação a sua propriedade, não utilizando – a de modo a gerar – lhe utilidade, dela se descuidando como se não fosse seu proprietário, estará proporcionando a outro a oportunidade para que dessa propriedade venha se apossar e te – la como sua, exteriorizando atos inerentes à de um proprietário. Apossando – se, outrem, desta propriedade de forma mansa e pacífica e prolongando – se esta posse por determinado tempo previsto em lei, estarão preenchidos os requisitos para que se torne hábil a aquisição desta propriedade por quem de fato a exerça, pois que atende ao interesse da coletividade que se proceda a transformação de uma situação fática em uma situação juridicamente legal, vale dizer, uma situação de direito.

"Interessa à paz social a consolidação daquela situação de fato na pessoa do possuidor, convertendo – se em situação de direito, evitando – se, assim, que a instabilidade do possuidor possa eternizar – se, gerando discórdias e conflitos que afetem perigosamente a harmonia da coletividade.
Assim, o proprietário desidioso, que não cuida do que é seu, que deixa seu bem em estado de abandono, ainda que não tenha a intenção de abandoná – lo, perde sua propriedade em favor daquele que, havendo se apossado da coisa, mansa e pacificamente, durante o tempo previsto em lei, da mesma cuidou e lhe deu destinação, utilizando – a como se fosse sua."[2]

4.Espécies

Como já fora mencionado, a usucapião pode ter como objeto bens móveis e imóveis, sendo a sobre bens imóveis a que ocorre com maior freqüência e o sobre o qual discorreremosno curso do presente trabalho.

Nosso direito pátrio disciplina três diferentes espécies de usucapião de bens imóveis, a saber: a extraordinária, a ordinária e a especial ou constitucional, sendo esta ultima espécie subdividida em rural (pro labore) e urbana (pró-moradia ou pro misero).

E ainda em conformidade com a Lei nº 6.011/73 (Estatuto do Índio), temos a usucapião indígena. Assevera o art. 33 do retro citado dispositivo legal que: "O índio integrado ou não, que ocupa como próprio, por dez anos consecutivos, trecho de terra inferior a cinqüenta hectares, adquirir – lhe – á a propriedade plena."

Passemos então á análise de cada espécie de usucapião em particular.

4.1.Usucapião Extraordinária

A usucapião extraordinária encontra respaldo legal no art. 1.238 do Código Civil que nos traz:

"Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire – lhe a propriedade, independentemente de título e boa – fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.

Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir – se –á a dez anos, se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo."

Em análise ao dispositivo podemos retirar os requisitos para a usucapião extraordinária, quais sejam, posse por quinze anos de forma continua, ou seja, ininterrupta, exercida de forma mansa e pacífica e com animus domini (ânimo de dono). Os quinze anos de posse a que se refere o art. 1.238 do CC devem ser exercidos continuamente, sem interrupções, podendo o possuidor atual juntar á sua posse o tempo de posse de seus antecessores. Durante todo o decurso do tempo estipulado pela lei a posse deve ser tida sem contestação. Esta aquiescência de todos faz presumir não haver direito contrário ao que se manifesta pela posse. O animus domini significa que o possuidor manifesta um comportamento no sentido de ser ele o real dono da coisa exteriorizando atos que demonstrem julgar – se proprietário.

Ficam dispensados os requisitos do justo título e da boa – fé.
De acordo ainda como parágrafo único do citado artigo, a posse de quinze anos pode ser reduzida á dez anos caso o possuidor tenha estabelecido no imóvel sua moradia habitual ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.

Esta espécie de usucapião é a mais comum, bastando para tanto o ânimo de dono e a continuidade tranqüila da posse por quinze anos, estando dispensado o usucapiente do justo título e da boa – fé, que sequer são presumidos, não são requisitos exigidos, servindo o título, caso houver, apenas como um reforço de prova.

4.2.Usucapião Ordinária

A usucapião ordinária, como se verá, distingue – se da extraordinária pela presença de certas características notadamente marcantes.

Esta modalidade de usucapião encontra – se prevista no art. 1.242 do Código Civil, que assim dita:

"Art. 1.242. Adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e incontestadamente, com justo título e boa – fé, o possuir por 10 (dez) anos.

Parágrafo único. Será de 5 (cinco) anos o prazo previsto neste artigo se o imóvel houver sido adquirido, onerosamente, com base no registro constante do respectivo cartório, cancelado posteriormente, desde que os possuidores nele tiverem estabelecidos a sua moradia, ou realizado investimento de interesse social e econômico.

Com uma atenta leitura do dispositivo supra transcrito é possívelestabelecer suas características bem como vislumbrar as diferenças desta espécie de usucapião para a usucapião extraordinária. Já tratamos de esclarecer acima o que seria a posse contínua e incontestada (aquela que se prolonga por certo lapso temporal sem interrupções e sem ser contestada), sendo esta característica comum a modalidade extraordinária e a ordinária.

Tratemos agora das características específicas da usucapião ordinária.

A usucapião ordinária apresenta como características, além da posse mansa e pacífica por dez anos ou cinco, conforme o caso seja o do caput ou do parágrafo único, exercida com animus domini, de forma contínua e incontestada, também faz – se necessário o justo título e a boa-fé, ao contrário da usucapião extraordinária, na qual estes dois últimos requisitos eram dispensados, não sendo sequer presumidos.

Diz – se justo título aquele permeado de idoneidade capaz de transferir a propriedade. Decidiu a 5ª Câmara Civil do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo que " justo título é qualquer fato jurídico que tenha o poder, em tese, de efetuar a transmissão, embora na hipótese lhe faltem requisitos para realizá-la" (RT 526/55)

Boa – fé provem do latim, bonafides, e pode ser tida como a crença em que se acha o possuidor, de que a coisa possuída lhe pertence. Preceitua o Código Civil, em seu art. 1.201 que "é de boa – fé a posse, se o possuidor ignora o vício, ou o obstáculo que impede a aquisição da coisa." Pelo parágrafo único do citado artigo 1.201 pode – se notar que o justo título e a boa fé estão intimamente ligados, quando assim nos traz o dispositivo legal: "Parágrafo único. O possuidor com justo título tem por si a presunção de boa-fé, salvo prova em contrário, ou quando a lei expressamente não admite a presunção."
Como se viu o justo título e a bonafides estão atrelados um ao outro, sendo justo o título tem-se presumida a boa-fé, sendo injusto o título desaparece por seu turno a boa fé, já tenso assim decidido nossos tribunais, a exemplo a decisão do extinto Tribunal de Alçada de Minas Gerais: "Em conseqüência de título não justo, não se pode alegar a existência de boa-fé, pois o imóvel adquirido em escritura pública, não assinada pelo vendedor, não pode dar ao possuidor a firme e segura certeza de que realmente lhe pertença, ou que o possua com animus domini." (RT 495/209)

Ainda neste entendimento de que não havendo justo título não há que se falar em boa-fé, decidiu assim o Tribunal de Justiça do Paraná: "Improcedente ação de usucapião fundada no art. 511[3] do Código Civil, quando o autor não tem justo título e nem prova de boa-fé." (RT 420/294).

Importante fazer constar, ainda em relação à boa-fé, que esta deve existir desde o momento da sua aquisição durante todo o decurso do tempo necessário a ele.

4.3.Usucapião Especial

A usucapião especial é também chamada de Constitucional por ter sido introduzida no ordenamento jurídico pela Constituição Federal. A usucapião especial se da sob duas formas: Usucapião especial rural, também chamada de pro labore, e Usucapião especial urbana, também conhecida por pró- moradia. Esta ultima é uma inovação trazida pela Constituição Federal de 1988, regulamentada no seu art. 183 e também nos arts. 9º (usucapião urbana individual) e 10 (usucapião urbana coletiva) do Estatuto da Cidade, instituído pela Lei nº 10.257 de 10/07/2001.

Assim como na usucapião extraordinária, a especial dispensa a existência de justo título e da boa-fé, entretanto exige – se a posse atual da gleba.

4.3.1.Usucapião Especial Rural

Os requisitos exigidos pela usucapião especial rural, além da posse mansa e pacífica, com ânimo de dono, que é por prazo menor que a usucapião ordinária e extraordinária conforme se verá adiante, são necessários os seguintes requisitos específicos: não ser o usucapiente proprietário nem de imóvel urbano, nem rural uma vez queo beneficio só se dirige ao não-proprietário; a área é exclusivamente rural, cujo critério usado é o da localização, isto é, somente o imóvel constante na zona rural; não ultrapassar a área usucapienda a 50 (cinqüenta) hectares contínuos, afastando – se a soma de áreas; ter a área usucapienda se tornado produtiva pelo trabalho do prescribente ou de sua família,beneficiando o possuidor que conseguiu explorar economicamente o bem; ter o prescribente fixado residência permanente na área.

A usucapião especial rural ou pro labore ou ainda usucapião agrária teve suas origens no direito brasileiro com a Constituição Federal de 1934, sendo mantida na CF de 1937 e de 1946. Durante algum tempo aplicou-se o chamado Estatuto da Terra, instituído pela Lei nº 4.504/64 até que viesse a ser editada a Lei nº 6.969/81 especialmente feita para regulamentar a aquisição, por usucapião especial, de imóveis rurais. O art. 1º da citada lei dispõe o seguinte: "Todo aquele que, não sendo proprietário rural nem urbano, possuir como sua, por 5 (cinco) anos ininterruptos, sem oposição, área rural contínua, não excedente de 25 (vinte e cinco) hectares, e a houver tornado produtiva com seu trabalho e nela tiver sua morada, adquirir-lhe-á o domínio, independentemente de justo título e boa-fé, podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para transcrição no Registro de Imóveis."
A Constituição Federal de 1988 vem em seu artigo 191 aumentar a dimensão da área rural suscetível dessa espécie de usucapião para cinqüenta hectares, posteriormente o atual Código Civil de 2002, vem em seu art. 1.239 e reproduz literalmente o que dispõe o art. 191 da Carta Magna:

"Art. 1.239. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra em zona rural não superior a cinqüenta hectares, tornando – a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade."

O objetivo da usucapião pro labore é a fixação do homem no campo, não se contentando assim com a simples posse, exigindo – se uma ocupação produtiva do imóvel.

Cabe aqui anotar que não é possível a usucapião pro labore de imóveis públicos, qualquer que sejam eles, inclusive as terras devolutas.

4.3.2.Usucapião Especial Urbana

Essa espécie de usucapião é uma inovação que a Constituição Federal de 1988 trouxe regulamentada em seu artigo 183, que diz:

"Art.183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando – a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural."

Esta espécie de usucapião não será aplicada à posse de terreno urbano sem construção, uma vez que constitui-se de requisito essencial a utilização do imóvel para moradia do possuidor ou de sua família. Nesta espécie bem como na usucapião rural não se reclama o justo título nem a boa-fé.

O art. 1.240 do novo Código Civil reproduz integralmente o art. 183, §§ 2º e 3º da Constituição Federal.

Somente terá legitimidade para usucapir o possuidor como pessoa física uma vez ser exigência da lei que o prescribente utilize – se do imóvel para sua moradia ou de sua família, ficando impossibilitado de usucapir a pessoa jurídica visto que esta tem sede, não residência, tampouco tem família, não estando portanto legitimada à argüir a prescrição aquisitiva.

O imóvel, quanto a sua extensão não poderá ultrapassar duzentos e cinqüenta metros quadrados (CC, art. 1.240) que representa um tamanho máximo fixado pelo legislador constituinte sendo entendido como suficiente à moradia do possuidor ou de sua família.

4.3.2.1.Usucapião urbana individual do Estatuto da Cidade

A Lei nº 10.257/01, que instituiu o Estatuto da Cidade, prevê e disciplina a usucapião urbana individual e coletiva.

Dispõe o art. 9º da citada lei: "Aquele que possuir como sua área ou edificação urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural." O Estatuto da Cidade entrou em vigor poucos meses antes do novo Código Civil de 2002 que em seu art. 1.240 traz preceito quase idêntico ao do referido estatuto. Diferem – se uma vez que o Código Civil fala em "área urbana" e o Estatuto da Cidade fala em "área ou edificação urbana". Sendo o objetivo visado pela lei é a moradia, não seria possível a aquisição por usucapião urbana apensa da área.
"Tal fato induz construção, restando concluir que tanto a área (com a construção) como a edificação (só o direito de superfície) poderão ser objeto de usucapião urbana do Estatuto da Cidade. O limite de duzentos e cinqüenta metros quadrados não pode assim ser ultrapassado, seja a área do terreno, seja para a edificação."[4]

Por se tratar de lei especial que veio com escopo de regular dispositivo constitucional, o Estatuto da Cidade não sofreu alteração com a superveniência do Código Civil de 2002 uma vez que a lei geral (CC de 2002) não derroga a especial (Estatuto da Cidade).
O § 1º do art. 9º do Estatuto da Cidade deixa bastante evidente à proteção da entidade familiar dispensada pela lei.

4.3.2.2.Usucapião urbana coletiva do Estatuto da Cidade

Tem sua previsão legal no art. 10 do Estatuto da Cidade, que institui a usucapião coletiva de áreas urbanas com mais de duzentos e cinqüenta metros quadrados que seja ocupada por população de baixa renda, onde não for possível identificar os terrenos ocupados individualmente.

Reza o art. 10 da Lei nº 10.257/01:

"Art. 10. As áreas urbanas com mais de 250 m² (duzentos e cinqüenta metros quadrados), ocupadas por população de baixa renda para sua moradia, por 5 (cinco) anos, ininterruptamente e sem oposição, onde não for possível identificar os terrenos ocupados por cada possuidor, são suscetíveis de serem usucapidas coletivamente, desde que os possuidores não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural".
Esta possibilidade de usucapião coletiva trazida pelo art. 10 do Estatuto da Cidade trouxe em seu bojo a possibilidade de regularizar áreas de favelas ou de aglomerados residenciais sem condições de legalização dominial.

A usucapião coletiva foge a "normalidade" da idéia de usucapião que sempre foi voltada à uma área certa, delimitada ao tornar possível que se adquira a propriedade pela usucapião de áreas com mais de duzentos e cinqüenta metros quadrados onde não é possível a identificação dos terrenos ocupados por cada possuidor.

A usucapião coletiva apresenta alguns requisitos comuns a todas as outras espécies de usucapião, quais sejam, a posse mansa e pacífica por um dado lapso de tempo ininterrupto (no caso cinco anos), com ânimo de dono. Não obstante, apresenta alguns requisitos próprios desta espécie de usucapião, a saber: Área maior que duzentos e cinqüenta metros quadrados. Não há um limite do tamanho da área, devendo apensa superar os duzentos e cinqüenta metros quadrados. Vale lembrar que é vedado usucapir terras públicas, portanto a área deve ser de propriedade particular.
A população deve ser de baixa renda. Muito embora não seja explicitado o conteúdo da expressão "população de baixa renda" pelo legislador, entende – se abrangida àquela camada da população que não possui condições de adquirir, por negócio oneroso, simples imóvel de moradia.
Trata o art. 10 do Estatuto da Cidade de áreas urbanas onde não se é possível identificar os terrenos ocupados por cada possuidor, sendo esta expressão utilizada em referencia À núcleos habitacionais desorganizados como uma unidade, sendo impossível de se destacar parcelas individuais.

5.Procedimento

O procedimento da ação de usucapião é regulado pelos arts. 941 a 945 do CPC e limita-se aos casos de bens imóveis urbanos ou rurais. Aplica-se tanto a usucapião ordinária quanto a extraordinária.

Anteriormente à Lei nº 8.951/94, integrante da reforma do CPC, o procedimento da ação de usucapião era especial, isso devido a uma fase procedimental diferenciada, a audiência de justificação de posse. Com o advento da reforma do CPC esta fase foi suprimida, sendo agora o procedimento, praticamente o ordinário. Sua manutenção no Livro IV do CPC (Dos Procedimentos Especiais) é justificável devido sua característica de "procedimento edital", no qual diversos são os citados. O edital é requisito indispensável, não se admitindo sua ausência.

Tratando – se de usucapião coletivo, previsto na Lei 10.257/2001, o rito será o sumário (art. 14 da Lei Especial).

O procedimento ordinário é aplicado subsidiariamente às ações de usucapião.

6.Propositura

Além dos requisitos do art. 282 do CPC, a petição inicial da ação de usucapião exigirá que o autor identifique claramente o imóvel, procedendo à sua descrição minuciosa com perfeita individuação, quanto à sua confrontação, área, divisas e demais características e fazendo juntada de planta e memorial descritivo, pois uma vez procedente a cão, a sentença será registrada no ofício competente. Por isso é necessário que a petição inicial traga os elementos necessários para o registro imobiliário.
Em se tratando de usucapião coletivo (Estatuto da Cidade) autoriza – se o ingresso da ação sem a identificação de cada terreno, mas a área total deve ser objeto de descrição minuciosa, planta e memorial descritivo, pois, também, nesse caso, a sentença será levada a registro, regra do art. 10, § 2º, da Lei 10.257/2001.
Quando se trata de imóveis rurais, há a exigência da planta e demais requisitos do art. 225, § 3° da Lei 6.015/73.

O art. 942 menciona que é expressamente indispensável á petição inicial, o fundamento do pedido. Deve o autor explicitar os elementos hábeis a gerar o usucapião, demonstrando ter justo título, quando e como adquiriu a posse, dentre as modalidades legais, se trata – se de posse única ou somada à dos antecessores (mencionando quais foram e quais os períodos de posse), e que se cuida de posse ininterrupta, incontestada e com ânimo de dono.

7.Legitimidade ativa

Trata – se de legitimado ativo aquele que se encontre na condição de possuidor, que haja completado o tempo necessário a usucapião, sendo indiferente o fato de ter ele possuído a coisa durante todo o lapso temporal ou tenha somado à sua a posse dos antecessores, ou, mesmo, que já não tenha posse, no momento da propositura.

A usucapião coletiva, instituída pelo Estatuto da Cidade, confere legitimação extraordinária ao estabelecer em seu art. 12, inciso III, "como substituto processual, a associação de moradores da comunidade, regularmente constituída, com personalidade jurídica, desde que explicitamente autorizada pelos representados".

8.Legitimidade passiva

A Lei 8.951/94 atribuiu nova redação ao art. 942 afastando as dúvidas que havia no sistema anterior, no qual ordenava a citação de "réus ausentes, incertos e desconhecidos".

Com a reforma do CPC, deve – se requerer, na petição inicial a citação de duas espécies de réus, a saber:

" A) Réus certos. São os confinantes e aquele em cujo nome se encontra registrado o imóvel. Comporta a seguinte subdivisão:

a.1) réus certos em local certo. Quando é conhecido o paradeiro (os confinantes, em regra, nos imóveis contíguos), a citação será pessoal. Por isso, a falta de contestação destes réus não importa necessária nomeação de curador.

a.2) réus certos em local incerto. Pode ocorrer de se saber quem é o principal réu da ação de usucapião, ou seja, aquele em cujo nome se encontra o imóvel registrado, mas ser desconhecido seu paradeiro. Também algum confinante pode não ser encontrado no imóvel vizinho. Nessa hipótese, segue-se a regra geral da citação por edital (art. 231).

Por se tratar de réu citado por edital, tem incidência o disposto no art. 9º, II, ou seja, é obrigatória a nomeação de curador.

B) Réus incertos. Na hipótese de o imóvel não se encontrar registrado, os réus são incertos e, por isso, serão citados por edital. Neste caso, e até porque nem se sabe se tais réus existem ou não, permanece o entendimento jurisprudencial de não ser necessária a nomeação de curador."[5]

O art. 942 determina que também se proceda a citação de eventuais interessados que possam ter pretensões incompatíveis com o pedido de usucapião e que, sendo citados por edital, possam comparecer, e manifestar – se.

Trata – se, portanto de litisconsórcio necessário.

9.Intimação da Fazenda Pública

O art. 943 do CPC, integrante da já citada reforma do CPC, trazida pela Lei 8.951/94, determina que deverão ser intimados, por via postal, os representantes da Fazenda Pública da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, para possam se manifestar caso haja eventual interesse na causa.

Justificável a intimação destes entes vez que dada a impossibilidade de usucapião de terras públicas, caberá a estes entes públicos, em sendo o caso, a alegação e conseqüentemente a prova, de que se trata de bem público, e por isso, inviável o usucapião.

10.Intimação do Ministério Público

O art. 944 CPC manda que o membro do Ministério Público atue como custos legis em todos os atos do processo de usucapião. Há interesse público na causa em razão da citação editalícia obrigatória de terceiros interessados incertos e desconhecidos e pela natureza de direito real da ação que busca declarar um direito erga omnes. O Ministério Público tem amplos poderes, seja para produção de provas e interposição de possíveis recursos. Ocorrerá a nulidade do processo se o membro do Ministério Público não participar dele, devendo ser efetuada a intimação para que atue como custos legis.


11. Sentença e Registro de Imóveis

O possuidor, ao promover ação de usucapião, já terá se tornado proprietário, se presentes os requisitos legais.

Nessa modalidade de procedimento especial, a sentença terá natureza declaratória uma vez que não altera uma relação jurídica, apenas a reconhece como existente, retroagindo ao momento em que a aquisição da propriedade se deu, e não produz efeitos só a partir de quando é prolatada.

Esta sentença se tornará o título com o qual o autor irá obter o registro imobiliário, pois será ela transcrita no ofício correspondente, mediante mandado,satisfeitas as obrigações fiscais, regra do art. 945 do CPC. O registro tem por objetivo dar publicidade ao título dominial do autor e facilitar-lhe a disponibilidade do direito respectivo

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume V. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008

SALLES, José Carlos de Moraes. Usucapião de bens imóveis e móveis. 6. ed. rev. ampl. e atual. de acordo com o código civil de 2002.São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.

VENOSA, Silvio de Salvo.Direito civil: direitos reais. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2006.

WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil, volume 3: processo cautelar e procedimentos especiais. 8. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.




Autor: Carlos Roberto Carvalho Junior


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