Um navio no planalto
Um navio no planalto
(Primeira edição em 13.11.2005)
Nutro o maior respeito pelo Senado. Sofro com os Senadores, com aqueles que lutam para revelar a verdade no curso das CPIs.
A luta é desgastante e cruel, na medida em que a mentira se aproveita das brechas legais e faculta aos depoentes mal intencionados o amplo controle das situações controversas, as quais constituem a matéria-prima das investigações.
Por isso, entendo que Suas Excelências estejam cansadas, desgastadas, ansiosas e, por isso, não percebam a infiltração insidiosa das imagens caricatas que à sua volta vão se desenhando, no cenário geral da crise.
E nem percebam ademais Suas Excelências quando, desrespeitados em sua própria Casa, transpõem os limites do real e adentram os territórios da fantasia, atropelando a lição clássica ─ aliás, frequentemente mal interpretada ─ de que a arte imita a vida.
Quem testemunhou a sessão da CPI adiante reconstituída, cujo teor facilmente a identificará, poderá aferir que o desenrolar das investigações parlamentares emula a trama de “O Navio Negreiro”, de Castro Alves, e terá ainda a chance de acompanhar, a baixo custo de imaginação, as intervenções do Poeta, a seguir recuperadas.
Cena Um
Depõe um cidadão – ex-assessor do então ministro da fazenda – suspeito de haver transportado material “alquímico” de Brasília a Campinas. “Alquímico” porque, conforme assegurou e logo desmentiu o ex-assessor, o material embarcou em Brasília sob a fórmula de uísque e chegou a Campinas transubstanciado em um milhão e quatrocentos mil dólares americanos.
Castro Alves
Autor: Osorio de Vasconcellos
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