Velhos



VELHOS

De Romano Dazzi

 

A vida não é longa; todos sabem e repetem que é curta, um efêmero instante.

Mas dá tempo de fazer um monte de coisas boas, importantes para si mesmo e para os outros.

Tudo o que  a natureza nos deu, todas as magníficas peças de que é feito o nosso organismo. podem ser bem usadas, de mil maneiras, em beneficio dos que estão próximos de nós; pense na boca, nos braços, nas pernas; nos milagres que as mãos podem fazer.

Porém, chega um momento em que, qualquer coisa que tenhamos feito ou deixado de fazer, alcançamos o fim.

Nada mais é heróico ou bonito, neste último ato; transformamo-nos, quase sem perceber., em uma mera máscara, uma caricatura, um arremedo do que éramos.    

Agora, podemos reagir a isso, ou deixar-nos andar.

Podemos levantar a cabeça e orgulhosamente olhar a vida e a morte de frente e dizer: aqui estou, eu fui bom, fiz uma longa caminhada, carreguei o meu fardo, cumpri meu dever, amei e sofri,  não temo a falta de futuro, porque vivi.

Ou então, desistir, baixar a cabeça, sofrer, com resignação e paciência, o lento escoar dos últimos dias, apavorado pela soma de sintomas, de pequenos sinais, que indicam o fim do asfalto.... 

 

As pessoas velhas, aquelas que perderam a energia necessária para  continuar a respirar e viver;  aquelas que não têm mais a mínima  vontade de lutar  para se manter a tona;  aquelas que não tem mais forças para se arrastar para cá e para lá,  na tentativa de continuar fazendo alguma coisa boa;  aquelas que estão jogadas no fundo de uma poltrona ou de uma cama, no menor quartinho da casa, doentes, tristes, solitárias;  sendo ou sentindo-se inúteis e indesejadas; bem, todas elas deveriam poder exercer o sagrado direito de sumir do mapa, de sair pelos fundos, de simplesmente desaparecer.

De repente, sem preparo ou aviso prévio, sem pompa ou circunstância, sem choro nem vela: assim, de uma hora para a outra, o velhinho – ou a velhinha -  sumiria.

Não ficaria jogado na cama, precisando de coisas que hoje são  caríssimas (como um remédio, uma roupa, um equipamento), ou raríssimas  (como um carinho, um sorriso, um minuto de atenção).

Estaria rolando por aí, e de repente:

- Uai,  cadê o Vovô ?  Zezinho, vai ver se ele está no quarto!  

- Não Pai, fui olhar, ele não está lá! 

- Estava aqui agora mesmo... Puxa!...Sumiu.  

Sabe quantas coisas melhorariam? Pode imaginar quantas crianças ganhariam um quartinho só para elas, quantas cadeiras de balanço poderiam ser jogadas fora? Quantos pinicos, quantas comadres, quantos cobertores embolorados e quantas fotos amareladas iriam para o lixão? 

Pessoas não se conformam com a fragilidade da vida e com a velocidade com que ela escorre e se acaba ; não aceitam que são feitas de material descartável e que só por mera sorte duraram tanto.

E no entanto, é assim mesmo. Somos bolhas de sabão. E é bom que não sejamos mais que isso. Falta-nos só a consciência disso.

Temos pouco tempo, não deveríamos desperdiçá-lo, pois é precioso; usá-lo bem, saboreando sabiamente, com calma, gulodice e até luxuria,  todos os inexoráveis minutos que nos puxam para o fim.

A bolha de sabão, de qualquer forma, o que quer que tenhamos feito ou deixado de fazer, de repente, puf! 

Puxa ! sumiu.


Autor: Romano Dazzi


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