CASSANDRA



CASSANDRA

De Romano Dazzi

 

Não sei por que lhe haviam dado o nome de Cassandra.

Era uma moça bonita, assim como a sua homônima grega.

Como aquela, tinha ficado solteira; mas as semelhanças acabavam aqui.

Esta não possuía nenhum dom, muito menos da profecia. 

Vivia de um modesto negócio de floricultura, digna, mas pobremente, como toda a classe média sempre viveu – e continua vivendo.

Tratava as flores como gente – e gente como flores: sempre com gentileza, com carinho, sem pressa.

Lembro-me de suas coroas, delicadamente montadas com flores de estação; em poucas horas, quando morria alguém importante, as coroas surgiam do nada, arrumadas tão bem, que somavam uma harmoniosa tristeza  à dor dos familiares.

Ou talvez fosse apenas uma impressão minha.

Lembro-me de buquês de rosas, elegantemente ajeitados pela Cassandra de forma inconfundível,  que apareciam em casa, quando minha irmã estava em sua exuberante primavera; ou dos gladíolos, que meu pai mandava à minha mãe, quando ela ainda estava em seu opulento outono.

As rosas ficavam dias enfeitando a sala; mas os gladíolos eram longos, incômodos, desequilibrados, não cabiam em vaso algum, e acabavam  num balde de cozinha.

Nos dias de finados, devido à ligação com a minha família, me deixavam com ela, Cassandra,  e eu a ajudava a levar ao cemitério  crisântemos e dálias, as “flores dos mortos” .   Eu a achava parecida com aquelas flores de saudade.

Bem,  Cassandra era acima de tudo uma moça triste, solitária, pouco comunicativa.

Devia haver, naquela figurinha minguada, muito carinho para dar; muita sede de amor, mas percebia-se que estava secando, como uma flor do campo, ano após ano.

Em breve – imaginava eu - ela estaria entre as páginas de um livro, apenas uma lembrança triste.  Hoje, com certeza,  deve estar lá, mas nem sei o nome do livro...

Esta minha Cassandra nunca fez uma profecia, nunca se arriscou a olhar o futuro; só uma vez me disse: - você vai longe, menino!- Tinha razão; vim parar no Brasil.

 

Cassandra, a da Mitologia, por sua vez, ouvia a voz os Deuses e podia prever o futuro; contudo, devido a uma terrível maldição, ninguém acreditava nela.

Cansou de dar avisos sinistros, mas Tróia foi destruída, justamente porque ninguém a escutou.

A única coisa que deixou, foi...... uma próspera escola de Cassandras. Deve dar dinheiro, trabalhar nesta linha.

Hoje, com microfones, alto-falantes, radio, televisão e internet, há centenas de  Cassandras em miniatura, que de uma forma ou de outra, infelizmente todos acabamos escutando.

Elas nos ameaçam com os mais violentos castigos, nos alertam para desastres próximos, nos mostram um futuro de terremotos, erupções, inundações e invasões de extraterrestres belicosos, mal encarados e mal intencionados.

A CHH (Cassandra’s Hollywood Highschool)  é uma das mais ativas - cria catástrofes imensas; a CGC (Cassandra’s Greenpeace Catastrophy) comunica-nos o próximo fim do mundo – daqui a uns dois mil anos no máximo, provavelmente.

As ameaças me preocupam – e muito; tanto que estou me preparando para quando este tempo chegar; comprando umas comidinhas, estocando vinho e cerveja, preparando um abrigo subterrâneo a prova de quase tudo.

– Como disse?  Só daqui a  vinte mil anos?

- Oh, que alivio! Ainda bem!  Pensei ter ouvido que o cataclismo  aconteceria daqui a dois mil   anos! Com vinte mil, tenho muito mais tempo para me organizar.

Mas sejam dois mil, vinte mil ou duzentos mil, preciso pensar seriamente nisso..... 


Autor: Romano Dazzi


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