MARIDO PERFEITO??



  Marcio era o marido que toda mulher pediu a Deus.?Além de ter uma excelente situação financeira, era um perfeito cavalheiro, daqueles que ainda se preocupam em agradar a mulher. Ele é daqueles homens que sempre...
  Sempre se lembra de todas as datas importantes do relacionamento, e envia flores, sempre acompanhadas de uma jóia. Está sempre disponível para conversar, a acompanha nas compras pelo shopping, sem reclamar, e sem demonstrar nem um pingo de impaciência. Muito pelo contrário. A espera pacientemente enquanto ela experimenta as inúmeras peças de roupas que separa, e ainda dá opinião a respeito. Opiniões sempre elegantes, pois não é do feitio dele ser grosseiro com ela. Nunca! E muito menos contrariá-la. Inclusive, ele muitas vezes (a maioria delas) escolhe várias peças para dar de presente à esposa!
  Ela é a Janete, uma excelente fisioterapeuta. Tem esta profissão, graças ao marido, pois só estudou depois que se casou com ele. Exerce a profissão apenas como voluntária( e quando tem tempo, ou seja, quando o Marcio permite). Ele considera desnecessário que ela trabalhe fora, que tenha algum ganho financeiro com sua profissão. Diz que ela não precisa ter salário, pois tem tudo. Ele sempre dá tudo o que ela quer!
  Janete veio de uma família muito pobre, e não teve a oportunidade de terminar os estudos quando era solteira, pois começou a trabalhar cedo, para ajudar a mãe, que era costureira, e teve que criar os filhos sozinha, já que o marido se separou dela quando nasceu a Tatiana, irmã mais nova da Janete. São oito irmãos. Janete é a mais velha. Trabalhava de vendedora em uma loja que vendia roupas finas (emprego arrumado pela dona Kênia, uma amiga da mãe da Janete, que trabalhava como doméstica há vários anos na casa da proprietária da loja) quando conheceu o Marcio, um empresário bem sucedido, vinte e nove anos mais velho que ela. Ele tinha ido à loja, comprar um presente para a irmã, que tinha a mesma idade da Janete. Se encantou com a moça naquela tarde mesmo, logo que a viu.
  Depois desta tarde, a vida do Marcio nunca mais foi a mesma. Voltou várias tardes naquela loja. E todas as vezes que ia, sempre procurava pela Janete para comprar algo. Pedia a opinião dela para escolher as peças, e para dizer quais peças deveria comprar. Muitas vezes, até pediu que ela experimentasse, já que, de acordo com ele, a sua namorada tinha o corpo parecido com o dela.
  Janete nunca vendeu tanto, o que a deixava muito feliz, pois recebia comissão pelas vendas. E ela ficava imaginando como ficaria feliz a mulher que iria ganhar todos aqueles presentes lindos. Chegava até mesmo a sentir um pouco de inveja daquela sortuda. Mas, rapidamente se consolava, pensando no dinheirinho extra que ganharia com as comissões. Talvez até sobraria algum, para comprar uma blusa linda que tinha visto numa liquidação em outra loja daquele shopping.
  Ela tinha pouquíssimas roupas. As que usava para trabalhar, eram da loja mesmo, uma espécie de uniforme.
  Se passaram mais ou menos uns dois meses, depois daquela primeira tarde na loja. Naquela manhã, Janete ligou dizendo que não poderia trabalhar naquele dia. O irmão, que trabalhava em uma fábrica no período noturno, havia sido atropelado quando voltava para casa de madrugada. O motorista fugiu, não prestando socorro. Janete estava com ele no pronto socorro público, esperando algum médico para atendê-lo. Apesar de estar bastante ferido, aguardava numa maca no corredor. Não havia vaga para deixá-lo num quarto, e os médicos do SUS estavam em greve. Pagamentos atrasados, falta de materiais básicos para prestarem socorro, etc. Rotina da saúde pública de um país, que apesar de sempre anunciar, através dos seus notórios homens públicos que, ¨nunca na história deste país¨, sempre apresentou problemas. Janete já estava lá, há mais de cinco horas, e apesar do irmão estar sentindo muitas dores, não conseguia atendimento.
  Marcio apareceu na loja naquela tarde, e ficou sabendo, através de uma colega da Janete o motivo dela não ter ido trabalhar. Rapidamente ele foi até o pronto socorro, providenciou uma ambulância de um hospital particular, e foi feita a transferência do Tadeu (este é o nome do irmão da Janete) para que ele fosse atendido por médicos particulares, em uma clínica especializada em atender acidentados. Um luxo de clínica!
  Janete não teve como recusar. Diante do sofrimento do irmão, ficou sem ação, quando viu o Marcio chegando ao pronto socorro acompanhado de um enfermeiro e de um médico especializado em atendimentos de urgência. Viu o irmão ser conduzido à ambulância, por um maqueiro, delicadamente. Cena igual, ela só tinha visto em filmes americanos, pois todas as vezes que presenciou alguém ser transportado em maca, foi algum paciente do SUS. Ela ficava espantada de ver a falta de cuidado dos funcionários que empurravam o paciente deitado. Pensava que era por causa da pressa, da urgência.
  Foi levada de carro, pelo Marcio, até a clínica chique onde o irmão estava sendo atendido. De lá, ela ligou para a mãe, dizendo do ocorrido, e comunicando-a que o motorista do Marcio estava a caminho, para levá-la à clinica.
  – Que homem santo, meu Deus! A mãe dela repetia insistentemente esta frase.
  Tadeu foi muito bem atendido, ficou vários dias internado, pois teve que fazer algumas cirurgias. Todos os dias o motorista do Marcio levava a mãe da Janete para visitar o filho. O Marcio ia pessoalmente buscar a Janete na loja. Para levá-la à clínica chique. Imaginem o contentamento dela!
   Neste meio tempo, começaram a namorar. Janete não se sentia apaixonada por ele, mas não teve como recusar o pedido de casamento daquele homem que foi tão bom para ela e sua família. Sentia muita gratidão. Mas amor...
  Durante o tempo de namoro, um dia ela foi surpreendida por um carro de entregas de mercadorias, quando chegava em casa, junto com o Marcio, depois do trabalho. Foram vários embrulhos, da loja em que ela trabalhava. Quase não acreditou: todas as roupas que ele comprou naquelas tardes que ele ia lá, eram para ela!
  Abriu os pacotes, completamente emocionada e não cabendo em si de felicidade. Os irmãos ficaram maravilhados! A mãe agradeceu a Deus aquele homem santo na vida da filha dela. Não podia ser diferente, e ao fim daquela noite, estavam de casamento marcado para dali a dois meses.
  Janete, atendendo a um pedido do Marcio, se demitiu do trabalho, logo no dia seguinte. Precisava de tempo livre, para os preparativos do casamento.
  O casamento foi como um conto de fadas para a mãe da Janete. Dona Arlete estava emocionadissima e não cabia em si de felicidade. Janete estava muito grata. E com medo! Até tentou conversar com dona Arlete, mas foi logo interrompida:
  - Minha filha, amor não existe. Veja só, me casei com seu pai apaixonada, e deu no que deu. Me abandonou com os filhos pequenos, e o que é pior, sem dinheiro, passando necessidades. Com você vai ser diferente. O Marcio é um santo homem, qualquer mulher queria estar no seu lugar. Então, pare de reclamar, e levante as mãos para o céu, todos os dias, agradecendo. Não seja ingrata!
  Janete sentia muita falta de trabalhar, de ter seu próprio dinheiro, de se sentir produtiva. Tentou conversar sobre isso com o Márcio, mas ele não deu atenção. Aliás, na maioria das vezes, quando tentava conversar com ele sobre suas inquietações, sobre idéias que tinha para se sentir mais útil, ele desviava o assunto. Falava sobre alguma roupa ou jóia que viu numa loja e que ia comprar para ela. Márcio também não gostava muito que ela saísse de casa sem ele. Janete ficava meses sem ver a mãe, ou qualquer outra pessoa da sua família. Suas amizades antigas foram abandonadas. Marcio dizia que não ficava bem, na atual posição dela, ter contato com pessoas assalariadas. Aliás, de acordo com ele, não ficava bem ela ter contato com ninguém quando ele não estivesse presente. Como ele trabalhava e viajava muito, a maior parte dos dias, Janete ficava sozinha em casa, isolada do mundo. Ela não gostava de contrariá-lo, afinal ele sempre era tão bom para ela! Um santo homem, e ela não queria ser ingrata! E todas as vezes que Janete sentia aquela sensação de vazio, de falta de algo, ela se lembrava destas palavras da mãe, e se sentia pior ainda, uma ingrata. Pedia desculpas a Deus, e agradecia o marido que tinha...

Autor: Maria Francisquini


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