LETRAMENTO PARA SURDOS – UM NOVO OLHAR SOBRE AS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS



ALEXANDRA MARIA DOS SANTOS ALBANO[1]

RESUMO

O objeto deste artigo é analisar as práticas pedagógicas aplicadas aos alunos surdos e avaliar os benefícios do letramento bilingüe para os mesmos, assim como a adoção de métodos visuais de ensino. A hipótese se baseia nos métodos orais – auditivos que não têm contribuído para o desenvolvimento cognitivo da pessoa surda, em contrapartida, a LIBRAS está abrindo caminhos para que as escolas mudem suas metodologias baseadas no oralismo e que passem a aderir o bilinguismo, ouseja, utilizar a língua de sinais como linguagem materna para o aprendizado do português escrito, configurando-se como segunda língua. As informações para análise foram obtidas junto a fontes fidedignas como obras de autores especialistas no tema. No aspecto espacial, abrangeu a história antiga e atual dos surdos, tendo como "pano de fundo" cenários do ensino pedagógico parasurdos no Brasil.

Palavras-chaves: LIBRAS, Português, Letramento.

Introdução

O histórico das pessoas surdas, no Brasil, é algo que vem merecendo destaque no meio educacional e gerando polêmicas bastante plausíveis. O que antes era visto como "deficiência" e ausência de capacidade, hoje é considerado como sendo "diferente", ou seja, os surdos têm outros métodos de aprendizado, por meio da Língua Brasileira de Sinais, tornando-os aptos a exercer seus direitos de cidadãos.

A luta para que a LIBRAS seja implementada nas escolas é uma realidade inquestionável, pois o que se observa é que o uso do oralismo ainda é muito difundido, mesmo após desastrosos resultados. A imposição aos surdos para que estes desenvolvam a fala é algo corriqueiro e este "falar" que se impõe é apenas artificial, pois o surdo não conhece esta particularidade que pertence aos ouvintes. O surdo pode até mencionar algumas palavras, todavia, isso dificilmente significa que ele aprendeu e que sabe realmente o que está falando.

Quando o surdo não tem acesso à sua língua materna, geralmente se mostra melindroso, desconfiado, julgando-se fraco por não saber falar, por não ouvir. Percebe-se que eles (surdos) se escondem em seus mundos silenciosos e temem a rejeição, levando-os a fazer de conta que aprenderam porque sentem-se envergonhados por não saberem, lançando fora os questionamentos aos professores, porque acham que, se perguntarem ou responderem errado, serão considerados incapazes, inferiores.

O Letramento surgiu para tornar eficaz o aprendizado dos surdos, pois prioriza a LIBRAS em todas as situações, sendo o português escrito, ensinado como segunda língua.No letramento, o uso de ilustrações nos textos faz com que a leitura torne-se agradável, pois dessa forma, o aluno surdo pode visualizar não só o texto, mas as figuras que representarão o que todas aquelas palavras querem dizer, daí surgirão as interpretações.

Para que o letramento seja plenamente eficaz, é de imprescindível importância que as salas de aula sejam compostas somente por alunos surdos, compartilhando uma mesma linguagem, um mesmo mundo. A educação bilíngüe para surdos (LIBRAS / português) tem sido exemplo de sucesso, todavia, ainda precisa ser adotada em várias instituições de ensino. O letramento tem suas particularidades, o ensino é diferenciado daquele em que costumamos observar nas escolas regulares, pois a língua em questão é a de sinais. O surdo letrado passa a compreender a língua portuguesa escrita, todavia, ele escreve textos e afins de forma diferenciada da dos ouvintes, pois na LIBRAS não existem algumas regras comuns como no português.

O que se propõe é que as escolas valorizem a língua de sinais em seus currículos, oferecendo aos surdos novos métodos de ensino para que possam assumir suas identidades. Propõe-se que o oralismo seja substituído pelo letramento, dessa forma, os alunos poderão aprender melhor, por meio da sua natureza visual – espacial, não lhes sendo imposto algo por convencionalismo, conforme algumas pesquisas indicaram, referindo-se a linguagem oral – auditiva.

A partir dessa problemática, pode-se indagar:

-Qual a magnitude do oralismo sobre a educação dos surdos?

-Até que ponto os métodos orais – auditivos afetam os surdos e quais os benefícios do letramento bilíngüe?

Breve Histórico

A história dos surdos denota preconceito, indiferença e negligência por parte de alguns educadores, do governo e da sociedade. Antigamente, as pessoas que nasciam surdas eram consideradas incapazes de se desenvolver, de aprender, de ser como "os outros", por isso, eram excluídas da sociedade, privadas de se casar, de adquirir ou herdar bens. Injustamente, eram esquecidas, abandonadas em seus mundos silenciosos que, por dentro, ansiavam em poder gritar, mas em vão.

Embora haja poucos documentos sobre a surdez, foi constatado que, antigamente, as crianças surdas que nasciam em lares com condições financeiras mais favoráveis, tinham a oportunidade de tentar desenvolver a fala, a leitura e a escrita. Mas o mais importante não era ensinado: a língua de sinais. Como a repressão era muito grande, os surdos ficavam solitários com suas lutas interiores, sendo que só mais tarde puderam se unir e solicitar seus direitos.

A sociedade francesa, por volta do século XVIII, era totalmente voltada aos costumes e não pretendia modificar o status quo[2] que a envolvia. A fala era imposta aos surdos, ou seja, eles tinham que desenvolver a oralidade[3] a todo custo, nem que para isso ficassem frustrados, desamparados e se sentindo ineficientes.

Ainda no mesmo século, surgiram estudiosos que passaram a entender que os surdos tinham a sua própria linguagem, tratava-se dos gestos que traduziam a sua natureza visual. De acordo com Cristina B.F. de Lacerda (1998),o "método francês" de educação de surdos é o mais notável no que se refere a abordagem gestual. O pioneiro a estudar a língua de sinais foi o abade Charles M. De L'Epée que, procurando se ater às características dessa nova linguagem pôde observar nos grupos de surdos que os mesmos desenvolviam a comunicação visual - gestual, obtendo êxito com esse método natural, espontâneo. De L'Epée, baseando-se na linguagem gestual, teve a excelente idéia de criar um método educacional visando a linguagem de sinais da comunidade surda, fazendo alguns adendos de sinais, que tornavam sua estrutura mais próxima à do francês e denominou esse sistema de "sinais metódicos". Juntamente com essa nova proposta educacional, priorizou-se também que os professores deveriam aprender tais sinais para se comunicar com os surdos. Era uma relação de ganha – ganha, podendo professores e alunos aprender simultaneamente, sendo a língua falada e escrita pertencente ao grupo majoritário - o dos surdos.

É interessante ressaltar, em conformidade com a citação de Lacerda que, diferentemente de seus contemporâneos,

De L'Epée não teve problemas para romper com a tradição das práticas secretas e não se limitou a trabalhar individualmente com poucos surdos. Em 1775, fundou uma escola, a primeira em seu gênero, com aulas coletivas, onde professores e alunos usavam os chamados sinais metódicos. Divulgava seus trabalhos em reuniões periódicas e propunha-se a discutir seus resultados. Em 1776, publicou um livro no qual divulgava suas técnicas. Seus alunos manejavam bem a escrita, e muitos deles ocuparam mais tarde o lugar de professores de outros surdos. Nesse período, alguns surdos puderam destacar-se e ocupar posições importantes na sociedade de seu tempo. O abade mostrava-se orgulhoso de que seus discípulos não só liam e escreviam em francês, mas que podiam refletir e discutir sobre os conceitos que expressavam, embora houvesse avaliações contrárias que indicavam haver profundas restrições nesse suposto êxito (...) (Cristina B.F. de Lacerda, 1998)

Ainda sob a análise de Cristina B.F. de Lacerda (1998), em decorrência das práticas pedagógicas aplicadas aos surdos, concretizou-se, em 1878, em Paris, oI Congresso Internacional sobre a Instrução de Surdos, onde se tornou possível realizar debates mais profundos sobre as metodologias de ensino aplicadas naquela época à comunidade surda. Nesse Congresso, os surdos puderam se manifestar, assinando documentos que lhes eram favoráveis, mas ainda não era o suficiente para livrar-lhes do preconceito vigente.

Não demorou muito para que o II Congresso Internacional fosse realizado, pois o mesmo ocorreu no ano de 1880, em Milão, trazendo novidades significativas e tornando-se um marco histórico na educação de surdos. O método oralista passava a adquirir mais adeptos, utilizando inclusive, exemplos de alguns surdos que conseguiam se comunicar bem fazendo uso da linguagem oral. Neste Congresso, a maioria participante dos debates defendia com veemência o método oralista, defendendo que a língua de sinais não era relevante, fato que levou o Congresso a optar pelo método oral, banindo a língua de sinais por considerá-la prejudicial ao desenvolvimento da fala, fator essencial para que uma pessoa possa tornar-se parte de uma sociedade (segundo a maioria das pessoas). Ainda na concepção de Cristina B. F. de Lacerda, o único opositor ao oralismo foi Gallaudet, dos Estados Unidos, que desenvolvia um trabalho baseado nos sinais metódicos do abade De L'Epée e que obteve resultados satisfatórios por parte de seus alunos.

O método oralista, oriundo da Alemanha, estava ganhando força a partir do Congresso de Milão e sendo adotado em vários países da Europa e, mais tarde, sendo utilizado no mundo todo.

Sabe-se que a LIBRAS[4] passou a ser utilizada no Brasil a partir dos anos 90, então, a comunidade surda pôde respirar mais aliviada, podendo se comunicar por meio da linguagem que lhe pertencia, uma linguagem latente. Antes desse período, a preocupação dos estudiosos era descobrir um modo para que os surdos desenvolvessem a linguagem, utilizando, para tal, métodos orais - auditivos que não contribuíram para o sucesso da pessoa surda, principalmente, aquela que se encaixa no contexto da surdez profunda.

A linguagem é, sem dúvida nenhuma, algo essencial, todavia o que não se notava ou o que se negligenciava, era a veracidade dos fatos: o surdo profundo não pode aprender o português nem quaisquer outras matérias, sendo instruído como se fosse ouvinte, pelo método usual em escolas regulares que lhe priva de utilizar a língua de sinais para a obtenção de melhores resultados. Para um aluno que tem certo grau de audição, não haverá problemas tão graves (e ainda assim, é aconselhado ensinar-lhe a LIBRAS) se for instruído com o intuito de oralizá-lo, porém, a grande maioria dos surdos (e não menos capazes que um ouvinte), precisa estar em constante contato com a LIBRAS, com o seu mundo, para que então, alcancem a tão desejada subjetividade.

Como uma forma de expressar seus sentimentos, as comunidades surdas foram surgindo, com o intuito de mostrar que a identidade surda é de suma relevância e o contato com pessoas surdas é absolutamente necessário. O surdo passa a sentir parte do grupo, podendo compartilhar pontos de vista, contrariedades, afinidades, enfim, passa a vislumbrar capacidades que lhe eram ocultas, mas que, por meio do contato com o seu mundo peculiar (que é muito semelhante a de outros surdos), encontra-se a si mesma para então, ir de encontro ao outro.

Com a percepção dos estudiosos acerca do ensino para surdos, foram surgindo, paulatinamente, pontos de vista mais coerentes com a realidade dos alunos surdos. Passou-se a reconhecer que o mais correto é que o ensino seja oferecido por meio de uma linguagem visual – espacial (língua de sinais). É sabido que as escolas devem desenvolver esta metodologia de ensino em turmas homogêneas, para que os alunos possam estar no mesmo grau de aprendizado, enfrentando as mesmas situações e aprendendo a vencê-las. Mas em contrapartida, a heterogeneidade (surdos e ouvintes) nas turmas, faz com que o surdo não acompanhe a maioria ouvinte, ficando sempre para trás e se auto – julgando impotente diante das adversidades encontradas em seu caminho. Para que essa realidade seja mudada é importante que os professores que atenderão à esses alunos tenham domínio da Libras, pois assim poderão ter um trabalho e contato efetivos com tais alunos.

A LIBRAS no Brasil, passou a ser reconhecida oficialmente no ano de 2002, então, temos 5 anos em que a mesma passou do status "estranho" para "conhecido". Apesar dos anos que se passaram, ainda é comum ver pessoas que nem ao menos sabem o que quer dizer LIBRAS, sendo corriqueira a resposta de que LIBRAS refere-se a moeda de ouro inglesa ou ainda, a antiga moeda portuguesa. Será que não deveríamos ter enraizada em nossa cultura o respeito pelo diferente e como lidar com isso?

A partir do momento em que o meio televisivo passar a mostrar seus programas não somente na linguagem oral – auditiva, mas também mostrando a LIBRAS num canto / espaço da televisão, as pessoas irão se familiarizando com a linguagem de sinais e os surdos poderão assistir os programas televisivos e compreendê-los. Em algumas igrejas e programas de televisão, já podemos notar a presença de um intérprete para os surdos, e isso é relevante. Recursos como legendas também auxiliam bastante, mas para que haja uma efetiva recepção das informações recebidas é importante que o surdo tenha passadopor um processo de letramento, pois devido às falhas vocabulares há uma perda significativa de informações e ligação dos significados aos contextos.Essas mudanças facilitam muito a vida daqueles que não ouvem, fazendo com que se sintam parte de um todo onde a maioria ouve, todavia, respeita as diferenças.

A surdez, o preconceito e o medo de fracassar

Em tese, os surdos brasileiros passaram, e ainda passam, por períodos muito difíceis, tanto nas escolas (especiais ou não), tanto na sociedade. Os estabelecimentos de ensino regulares não oferecem o que o surdo precisa para se desenvolver, ou seja: uma língua compartilhada em sala de aula, onde todos possam se comunicar livremente, sem precisar fingir que entendeu e que sabe o que é desconhecido. A língua de sinais é a ferramenta essencial para que o surdo obtenha êxito em suas atividades, sejam elas familiares, sociais, culturais ou profissionais. As escolas especiais para surdos necessitam de professores que dominem inteiramente a LIBRAS, utilizando o currículo mais conveniente, estando a língua de sinais como "mãe" de todas as outras procedentes desta. O português deve ganhar nova roupagem, sendo para o surdo, uma segunda língua, tal qual funciona com os ouvintes quando aprendem um idioma estrangeiro.

Muitos surdos "tentam" aprender em escolas regulares, o que os ouvintes aprendem, ou melhor: apreendem. A oralidade os confunde e a escrita é quase que um sacrifício, pois raramente conseguem expor suas idéias e tampouco explicá-las. O fato é que o aluno surdo sente vergonha em não saber o que a maioria ouvinte sabe, ele se julga incapaz, deficiente em suas habilidades cognitivas. Mesmo sentindo estar fazendo parte de um mundo estranho, eles fingem aprender, pois temem a rejeição e o abandono. Os professores, com o intento de amenizar a situação acabam agravando-a, gerando conflitos internos para o aluno surdo, que passa de uma fase escolar para outra sem ter adquirido preparo para tal. Nesse caso, o "empurrãozinho" dos professores para que o discente passe de um ano para o outro, sem estar preparado, tem conseqüências bastante desagradáveis no futuro. Conforme destaca Goffman, In BOTELHO,

O estigma cria tensões e embaraços porque está fundado na crença de que o sujeito estigmatizado não é completamente humano, e a pessoa não pode romper com a crença porque aprendeu a se ver com os mesmos olhos. (GOFFMAN, 1982, p. 15, In Paula Botelho, 2002. p. 26).

As pessoas surdas são visuais: elas aprendem com as imagens e a leitura se torna menos difícil ou, pelo menos, há tentativas de ligar uma coisa a outra, através de ilustrações e do próprio entendimento do texto. É uma outra estratégia e nada tem a ver com as instruções que os alunos ouvintes obtêm em seus estudos. O surdo aprende seguindo a língua de sinais, imprescindível para a constituição de suas convicções e da própria identidade.

O não – saber disfarçado em entendimento

Conforme analisa Botelho, a sociedade, sempre pré - disposta a aceitar o que é padrão e a rejeitar o diferente, acaba gerando no indivíduo considerado fora das normas tradicionais, o medo de aprender, de perguntar, de se descobrir e até de viver com mais plenitude. O medo da rejeição e até da humilhação, faz com que o dessemelhante (aos olhos da maioria), se recolha em seu mundo por temer as diferenças que, de modo algum, são anomalias, no caso dos surdos.

Existem alunos surdos que acreditam que suas conclusões são corretas, ignorando a verdadeira resposta, pois crêem que suas convicções refletem o acerto, não o erro. Mas diferente daquele que pensa que sabe, enquanto desconhece, encontramos aquele que sabe que não sabe, mas que quer passar a impressão de que entende, se encaixando na análise de Paula Botelho (2002, p. 32), mostrando que, dessa forma, o aluno passa a negar, copiosamente, as dificuldades que lhe são apresentadas, acometido pela alienação que refletirá o seu estado de negação da realidade.

A necessidade de "ser como os outros" (ouvintes), faz com que o aprendiz surdo se camufle ao querer dar a impressão de que sabe tudo, mas que, na verdade, pouco aprendeu por causa das diferenças acentuadas em sala de aula. Ele quer saber como os outros, mas enquanto sua educação na escola for dada junto aos ouvintes, privando-lhe da sua língua materna, apenas agravará sua situação e o colocará, freqüentemente, em posição inferior.No aprendizado, a língua de sinais é essencial, devendo esta ser compartilhada por todos, num ambiente homogêneo e sem preconceitos. O surdo torna-se "atrasado", segundo Paula Botelho,

Não porque não ouve ou porque usa língua de sinais e, sim, porque a escola e as políticas educacionais não levam em conta a necessidade de um ensino baseado na percepção visual. Houvesse escolas de fato bilíngües, com professores preocupados com a aquisição da língua materna e da língua escrita pelo surdo, como língua estrangeira, investimento na produção de recursos didático visuais, oferta plena de programas televisivos legendados, entre outras condições, e nenhuma informação seria perdida.(2002. p. 94).

Oralismo – experiência frustrada

O oralismo é ainda muito praticado no Brasil, intentando desenvolver na pessoa surda, a audição, de forma terapêutica, assim como a fala. Após algumas experiências com o método oral – auditivo, percebeu-se que os surdos não conseguem desenvolver a fala de modo satisfatório, nem tampouco a escrita. Quando se pratica o oralismo, a língua de sinais não é utilizada, denotando uma espécie de imposição de uma linguagem estranha para o surdo, trazendo-lhe mais dificuldades de comunicação e crise de identidade. Sacks, In QUADROS, expressa perfeitamente a questão do oralismo, destacando que:

O oralismo e a supressão do Sinal resultaram numa deterioração dramática das conquistas educacionais das crianças surdas e no grau de instrução do surdo em geral. Muitos dos surdos hoje em dia são iletrados funcionais. Um estudo realizado pelo Colégio Gallaudet em 1972 revelou que o nível médio de leitura dos graduados surdos de dezoito anos em escolas secundárias nos Estados Unidos era equivalente apenas à quarta – série; outro estudo, efetuado pelo psicólogo britânico R. Conrad, indica uma situação similar na Inglaterra, com os estudantes surdos, por ocasião da graduação, lendo no nível de crianças de nove anos (...). (Sacks, 1990, p.45, citado por QUADROS, 1997, p. 22).

O que se percebe é que o oralismo pretende ensinar os surdos a falar, ou seja, a desenvolver uma aptidão que não lhes pertence. O que acontece, em tese, é que o aluno aprende a pronunciar as palavras e acaba nem ao menos sabendo o que está falando. A pessoa surda adulta, após anos de investimento em sua fala, vai percebendo gradualmente que não é entendida pelos ouvintes e que também, não compreende totalmente o que os últimos querem lhe transmitir. É algo, no mínimo, desanimador. É algo parecido com "nadar, nadar e morrer na praia", pois cada vez que tiram da pessoa surda o direito de serem instruídas em sua língua materna (LIBRAS), elas acabam desistindo do processo por não serem compreendidas, por se sentirem rejeitadas, não – respeitadas.

A não observância das necessidades dos surdos é um fator preocupante, pois só quem está envolvido com esta causa sabe o quanto é triste a realidade que envolve o ensino voltado para a surdez: um ensino atrasado, com métodos inadequados, uma redução significativa nos conteúdos infelizmente por idéias deturpadas com relação às metodologias de ensino para surdos e estrutura deficiente para proporcionar uma melhoria significativa. Faltam professores habilitados em LIBRAS; carecemos de materiais didáticos pedagógicos para suprir as necessidades dos surdos e ensiná-los de acordo com o que necessitam; falta estrutura governamental para investir na educação surda. Faltam muitas coisas que torna-se difícil enumerar, todavia, sobra preconceito e negligência face às necessidades prementes do surdo.

O Letramento e as ascensões do aluno surdo

O Letramento[5] é a prática mais acertada para o ensino do aluno não – ouvinte. A língua de sinais é preponderante em todas as situações, para o aprendizado do português, em sua modalidade escrita. Com a adesão de figuras ilustrativas em cada texto, o aluno poderá fazer conexões entre o que vê, de forma ilustrada, e o que lê. A leitura irá se tornar mais prazerosa por dois motivos: em sala de aula, haverá uma só língua compartilhada (a de sinais), deixando o aluno mais seguro e menos melindroso face à mínima percepção de erro. Outra razão é que o aprendiz poderá consultar a sua memória fotográfica, onde estão armazenadas as formas ortográficas de algumas palavras e seus respectivos significados, conforme as instruções e correlações aprendidas em sala de aula e no próprio meio social.

Um problema bastante perceptível é que as escolas regulares, por serem constituídas, em sua maioria, por alunos ouvintes, fazem uso freqüente de leituras, interpretações textuais, seminários e alguns trabalhos de cunho científico, ou seja, colocam os alunos a pensar, a pesquisar. Por outro lado, as escolas para surdos não oferecem tais atividades de leitura e escrita, não estimulam o aluno a querer saber mais, a ir além daquilo que se julga ser o limite. O modelo que as escolas especiais para surdos precisam aderir, proveniente das escolas regulares, é a prática de se ler e escrever, todavia, utilizando a LIBRAS na sua amplitude.

A princípio, o dicionário do aluno surdo deve ser formado com termos que ele conheça e que possa reconhecer em seus estudos. O professor, imbuído de cuidado, deve ir ajudando o aluno surdo a abrir seu leque lexical. Por ser extremamente visual, o discente surdo é atraído pelo que ele vê, então, quanto mais ilustrativos forem os elementos textuais dados em sala de aula, maiores serão as probabilidades de apreensão do conteúdo.

O letramento bilíngüe (LIBRAS-português), proporcionará ao aluno surdo, com a imprescindível ajuda do professor, a reconhecer as peculiaridades da língua portuguesa, como pontuações, regras gramaticais, etc. Em tese, as dificuldades surgirão, todavia, o ensino continuado e eficaz irá contribuir de forma essencial para o êxito dos surdos.

Os alunos se interessarão muito mais pelas interpretações de textos se o docente tiver fluência em LIBRAS, assim, o grau de dificuldade diminuirá e o professor poderá interagir de forma mais satisfatória com os alunos. Agindo dessa forma, o professor poderá questionar elementos que se encontram no texto, debater e criar hipóteses, até que obtenha a resposta desejada, que significará absorção do conteúdo. Outro ponto significativo é que o texto deve estar intimamente ligado com o cotidiano do aluno, ou seja, que possa lhe ser útil. Como bem exemplifica Sueli F, Fernandes:

(...) Escrever uma lista de compras, ler uma bula de remédio ou uma reportagem no jornal, saber como fazer funcionar um eletrodoméstico seguindo instruções de um manual, entender as regras de um game, preencher uma ficha funcional ou fazer um currículo para emprego são atividades de leitura e escrita significativas para o aluno. Há que se pensar de forma crítica as coisas que pedimos aos nossos alunos para escrever. (2006, p. 2).

Educação bilíngüe para surdos – uma questão de identidade

Todos os seres humanos, desde a mais tenra idade, criam em seu meio (primeiramente, familiar) uma forma de comunicação. Podemos observar que nos primeiros meses de idade, as crianças são regidas por sinais em decorrência da fala ainda não adquirida , então, passam a fazer uso de expressões faciais e até corporais e, quando desejam alguma coisa, mostram para os pais o que desejam e se fazem entender. Gradualmente, a criança ouvinte vai aprendendo as primeiras palavras, conseqüência da sua percepção ao que os outros falam e ela, graças a sua audição, absorve e memoriza as palavras, repetindo-as e ligando o significado ao significante.

A criança surda, filha de pais surdos, possuirá menos dificuldades de comunicação em seu lar, especialmente se os pais souberem a LIBRAS de forma ampla, podendo assim, inserir o novo membro da família no mundo a que lhe pertence. O bebê surdo aprende, nos primeiros meses, coisas similares aos dos ouvintes: faz uso de expressões faciais, corporais, gesticulam. O que os diferencia é que o bebê ouvinte logo começa a falar as primeiras palavras que lhe foram ensinadas, ao passo que o surdo continuará utilizando os gestos e expressões supracitadas, pois é uma forma de substituir a língua oral – auditiva. Se os pais da criança surda forem ouvintes é muito relevante que os mesmos aprendam a LIBRAS e usem-na em casa, com o seu filho, isso oportunizará o desenvolvimento da linguagem de sinais e das propriedades intelectuais do aprendiz. Essa forma de agir irá determinar como a criança enfrentará dois mundos distintos: dos ouvintes e dos surdos. Tendo a LIBRAS como língua primária em casa, os surdos irão se sentir mais à vontade e seguros, desenvolvendo suas aptidões com a certeza de que são parte integrante de uma sociedade que pode entendê-los e até mesmo, ajudá-los.

A educação bilíngüe para surdos é um processo que deve ser ministrado na escola e em casa, assegurando assim, o sucesso da metodologia. Cabe ressaltar que o português (no caso do Brasil), não deve ser ensinado simultaneamente com a língua de sinais, não dá certo e gera confusões para o aluno. Tornar-se letrado, na análise de Paula Botelho,

numa abordagem bilíngüe pressupõe a utilização de língua de sinais para o ensino de todas as disciplinas. Proporcionada como primeira língua (L1), o aprendizado da língua de sinais é oferecido aos surdos em situações significativas, como jogos, brincadeiras e narrativas de estórias, mediante a interação com outros surdos adultos competentes em língua de sinais. Faz também parte do projeto bilíngüe que todo o corpo de funcionários da escola, surdo e ouvintes, e os pais, aprendam e utilizem a língua de sinais (2002, p. 112).

Observa-se que todos devem se empenhar para o sucesso do modelo bilíngüe, praticando a LIBRAS em tempo integral na escola e dando continuidade em casa. É dessa forma que os surdos aprenderão o português escrito, sendo primeiramente, fluentes na LIBRAS em direção a novos horizontes. Faz-se interessante mencionar, conforme destacou Botelho (2002, P. 113), que países como a Dinamarca e a Suécia têm formado pessoas surdas bastante qualificadas em língua de sinais, escrita e leitura. Nota-se que na Suécia, o bilinguismo foi implantado em 1981, ou seja, o país investiu na educação para os surdos e, atualmente, muitos deles trabalham em áreas em que é necessário o ensino superior. Nos países em que a língua de sinais foi devidamente aceita e instaurada, gerou confiança nas pessoas surdas, ou seja, elas acreditam fazer parte de uma cultura que merece reconhecimento e que a sua linguagem tem valor, construindo assim, uma positiva percepção de si mesmo.

O modelo sueco para a formação de surdos é muito interessante, abrindo os olhos dos governantes de outros países para o seu acertado modelo educacional, fazendo com que passem a ver o quanto as pessoas surdas são capazes de aprender e progredir mas, que para tal, precisam da imprescindível ajuda governamental para que a utopia passe a ser realidade.

O investimento em profissionais intérpretes na LIBRAS também é um aspecto importante, dessa forma, ouvintes e surdos poderão compartilhar seus pontos de vista, suas curiosidades e compreender mundos diferentes (entende-se: pessoas diferentes). A contratação de professores surdos também é um aspecto de relevância, levando-se em consideração que os mesmos têm fluência na LIBRAS e certamente passaram por situações similares aos alunos surdos, o que os levará a se identificar com o professor e a criar, automaticamente, uma auto – imagem positiva. No caso do Brasil, ainda incipiente na LIBRAS, demorará um tempo significativo para que a Comunidade Surda obtenha o sucesso e o respeito almejados.

Conforme analisa Botelho (2002, p. 116), a Suécia adotou, para o modelo bilíngüe, a cooperação das organizações de pais surdos, ou seja, os pais refletiram sobre o ensino das escolas regulares e concluíram que não era um local apropriado para as crianças surdas. Como toda transição oferece alguma resistência, não foi diferente com a instauração da língua de sinais sueca. O bimodalismo era aplicado com frequência e foi sendo abolido paulatinamente, já que era um método que não dava resultados positivos, mas superficiais.

O que se pretende é valorizar a leitura como foco principal para o aprendizado da escrita, em contato com a língua de sinais, utilizando a tradução. O texto é aplicado em sala de aula, traduzido para a língua de sinais e daí advêm as interpretações textuais.

O que se intenciona destacar é que o surdo precisa estar em constante contato com a língua de sinais para que não perca a sua identidade, mas solidifique-a. A esse respeito, Paula Botelho analisa que, com relação à língua de sinais,

aprende-se por intermédio dela e sobre ela. Há, ainda, valorização intensa da atividade de narrar: os surdos contam e vêem outros contarem estórias, reais e imaginárias, em línguas de sinais, a partir ou não de textos escritos. E aprendem a não conceber o aprendizado da língua escrita como uma ameaça à supressão da língua de sinais e, por conseguinte, à sua identidade. Aprendem a dar valor equivalente à língua escrita, à língua oral e à língua de sinais (2002. p. 94).

No Brasil, ainda existe o preconceito descabido com relação a LIBRAS, na aceitação desta ser uma língua verdadeira, embora diferenciada. A resistência ainda é grande e não pode ser negligenciada, pois muitas escolas para surdos utilizam o oralismo como método de ensino, outras, aderiram a comunicação total, isto é, todas as formas utilizadas para se comunicar são válidas. O que acontece é que o método da comunicação total é tudo e nada, ao mesmo tempo. Mistura-se português sinalizado, leitura labial, gestos para a compreensão das mais diversas situações, etc. Enquanto o foco está em tudo, fica difícil desenvolver um aprendizado mais consistente, mais reativo e menos passivo.

Tornando a prática pedagógica para surdos mais eficaz

Após comprovada a ineficiência dos métodos orais – auditivos para a educação dos surdos, torna-se imprescindível algumas sugestões para a melhoria da metodologia de ensino envolvendo a comunidade surda, intentando sedimentar a LIBRAS nas escolas especiais para proporcionar a esta comunidade o direito de se desenvolver, de aprender por intermédio da sua própria linguagem e, a partir desse pressuposto, obter sucesso.

O Brasil, mesmo que incipiente na educação para surdos, está dando os primeiros passos em busca de uma melhor formação para crianças, adolescentes e adultos surdos, todavia ainda resta o preconceito que insiste em não enxergar a necessidade das pessoas surdas de utilizarem sua língua materna. A imposição do português, utilizando-se o método oral – auditivo, ainda acontece muito e impede que o letramento bilíngüe e as práticas pedagógicas visuais sejam plenamente aplicadas aos surdos, atrasando significativamente o êxito do projeto. O surdo não quer usar aparelhos auditivos e tornar-se semelhante ao ouvinte; ele quer a sua identidade, sua língua, seus direitos reconhecidos.

Faz-se importante citar algumas metodologias educacionais relevantes para os surdos, envolvendo a sua inquestionável natureza visual, sejam elas:

Produções textuais dos surdos

As produções textuais dos surdos são diferenciadas e merecem destaque, além de um entendimento mais profundo dos professores, não só daqueles que ministram aulas para surdos, mas os que corrigem provas de surdos em concursos e afins, para que estejam atentos aos textos e as suas peculiaridades.

Na maioria das vezes, a pessoa surda tem uma ótima memória visual das palavras e as decoram globalmente, porém, ocorre de inverter a posição das letras, como por exemplo: froi (frio).

A ortografia errada não quer dizer que o aluno surdo não saiba o seu significado, o que acontece é que ele pode confundir algumas letras, trocando-as (s, z, ç / ã, na), isso se deve ao fato dele não poder ouvir os sons e onde se encontram as sílabas tônicas. Por exemplo: exército. Como ele não ouve o som, o "e" continua inalterado, portanto, pode acontecer de não inserir o acento.

Na hora da correção de textos dos alunos surdos, os professores devem ter conhecimento da pontuação utilizada. Por não possuir a capacidade de ouvir, o aluno não acentua corretamente as frases, pois pontuá-las de forma acertada, fazendo uso de entonação, ritmos e afins, está intimamente ligada a natureza do ouvinte, que ao falar, percebe onde deve inserir ponto final, vírgula, aspas, etc.

As pessoas surdas não identificam os artigos feminino e masculino, por isso em suas produções textuais estes gêneros podem estar trocados. Exemplo: "O menina ganhou presente pai". Nessa frase, além do artigo "o" estar inapropriado, faltou o elemento de ligação (do), pois na LIBRAS não há conectivos. Na LIBRAS, não há o uso dos verbos ser, estar e ficar, então, os textos dos alunos surdos não mostrarão tais verbos e aparentarão estar errados mas, é apenas mais uma característica diferenciada da língua de sinais.

Ao analisar dados, percebeu-se que os alunos, surdos ou ouvintes, tem tido poucas oportunidades de uso da língua portuguesa em situações realmente significativas, os textos sugeridos em sala de aula denotam pouco seu dia a dia, são descontextualizados e repetitivos. Para os alunos surdos o simples processo de reescrita destes textos tem surtido poucos resultados no aprimoramento do português escrito, além do descontentamento em reescrever algo que, de início, decorrente da descontextualização, ele pouco compreendeu, simplesmente preencheu as linhas solicitadas pelo professor.

Umas das formas de tornar os textos dos surdos mais eficientes é a utilização de um "diário" em sala de aula, ou seja, os alunos escrevem todos os dias, o que faz com que seu contato com a linguagem escrita seja constante. Partindo desse pressuposto, notou-se que quando o aluno detalha suas experiências e acontecimentos do dia a dia a linguagem flui com maior facilidade, e principalmente, há uma notável mudança de postura diante da linguagem escrita, possibilitando-lhes que passem a dominar alguns aspectos formais das convenções que regulamentamo uso social da língua.

Para desenvolvimento de tal atividade, é importante que o professor esteja em constante contato com o que for produzido por seus alunos, faça as adequações dos elementos coesivos e auxilie no enriquecimento lexical. É de suma importância também que essas correções sejam sempre relidas por eles e justificadas pelo professor já no processo de adequação, que é interessante que seja feito com o acompanhamento do aluno e que sejam feitas no próprio texto, pois a partir da natureza visual do surdo ele perceberá nas próximas descrições os elementos que lhe faltam. Se nas primeiras vezes ele utiliza aspectos da Libras, o que é comum, nas próximas vezes em que escrever, procurará adequar a linguagem escrita às formalidades da língua portuguesa.

Para resultados efetivos é imprescindível que haja um real comprometimento tanto do professor, que deverá corrigir semanalmente tais diários, como dos alunos que deverão escrever diariamente e comprometer-se a ler as correções. É importante também que seja aberto um espaço das aulas para que o professor possa sentar-se com cada aluno e juntos, no diário possam perceber as progressões e as falhas que ainda devem ser supridas.

Através dessa prática, notou-se um real progresso nas composições dos alunos de uma forma geral, a perda do temor de escrever sempre temendo não se adequar ao proposto pelo professor e uma relativa confiança e valorização de suas idéias, pois estes constantemente trocam os "diários" com os colegas, mostram para outros professores, o que antes não ocorria com outros tipos de produções, pois a escrita era lhes como um tabu, habituados a crer que o que escreviam era visto como sem valor por crerem estar sempre "errado".

Passos para tornar o aprendizado mais atraente para os surdos

Como já foi constatado, o surdo é visual, isto é, para que ele possa entender as mais diversas situações cotidianas, faz uso de sua aguçada capacidade de interpretação visual, seja por meio de figuras, expressões corporais e faciais e afins. É interessante que as ofereçam atividades que possam auxiliar no aprendizado dos mesmos, fazendo uso constante da LIBRAS em suas atividades cotidianas. Abaixo, algumas atividades que podem ajudar no ensino de surdos:

-Teatro: por ser uma arte totalmente voltada à expressão facial e corporal, é algo que agrada o surdo e pode lhe dar prazer em executar, pois estará utilizando os seus dons naturais e por meio deles, poderá aprender com mais facilidade em virtude da satisfação de estar fazendo algo que vai de encontro ao seu "eu". É interessante que os professores provoquem no aluno o desejo de querer aprender mais, de abrir seus horizontes. O teatro ajudará a pessoa surda e pensar, a conhecer-se melhor e a utilizar os seus dons intrínsecos.

-Palestras ministradas por surdos: A escola precisa palestras que sejam ministradas por outros surdos, isso vai ajuda-los a acreditar em suas potencialidades ao se deparar com um exemplo de sucesso de alguém parecido com eles, em se tratando da audição. Investir em palestras e seminários contando com a presença de pessoas surdas, será de grande valia para o aluno surdo. É interessante, de igual forma, a presença de intérpretes (LIBRAS / Língua Portuguesa) para que o sentimento de valorização da LIBRAS seja cada vez mais forte, dentro e fora da comunidade surda.

-Momento "descontração": O momento descontração é para que os surdos possam se sentir mais à vontade, podendo contar experiências de vida uns para os outros, criando assim um ambiente de amizade e afinidades.

-Encontros de surdos: Partindo-se do pressuposto de que as escolas irão adotar os métodos de ensino específicos para os surdos, é muito relevante que as mesmas possam manter contato com outras escolas que tenham surdos e, eventualmente, promover passeios unindo as escolas a fim de tornar a troca de experiências entre eles, algo mais natural, mais corriqueiro. Essa prática fará com que se sintam mais felizes em poder conhecer pessoas novas, aprender mais e trocar informações.

-Uma vez na semana, hora do conto e da piada: A hora do conto ou da piada, o que faz parte da Cultura Surda e são muito apreciadas por eles, são contadas em LIBRAS, pode ser algo muito proveitoso para os surdos, é o momento em que poderão contar estórias utilizando todas as possibilidades que a língua de sinais oferece (alfabeto manual, números, expressões facial e corporal). Isso os ajudará a desenvolver ainda mais suas percepções com relação à língua falada e escrita.

-Professores Bilíngües: Contratação de professores fluentes na LIBRAS e em Português, dessa maneira, haverá maior número de alunos surdos inclusos no projeto bilíngüe. A contratação de docentes surdos deve ser priorizada pelas escolas.

-Bibliotecas visuais: investir em livros, revistas e materiais didáticos que sejam ilustrativos e de fácil acesso à comunidade surda.

Estes são apenas alguns métodos que o professor e a escola podem utilizar para tornar a prática do ensino para surdos mais prazerosa e eficaz. O direito dos surdos aprenderem em sua língua materna não pode ser retirado, a maioria ouvinte precisa proporcionar à comunidade surda a chance de conquistar seus objetivos, demonstrar suas capacidades. Nesse sentido, vale citar o sábio texto de Couto – Lenzi, citado por BOTELHO:

Será que alguém pode, licitamente, negar aos surdos seu legítimo direito de utilizar sua audição, de aprender a língua falada em seu país, de integrar-se à sociedade? [...]. Que as pessoas que [...] de algum modo interferem na vida de um surdo, pensem na enorme responsabilidade que têm em relação a eles. Que pensem que uma oportunidade tirada ou não oferecida poderá implicar em um prejuízo irreparável em sua vida e em sua integração (Couto – Lenzi, 1997, In BOTELHO, 2002, p. 20).

Conclusão

Durante a revisão teórica, conforme a maioria dos autores expostos no presente artigo, reportam-se aos métodos orais - auditivos como elemento negativo na educação do surdo, prejudicando o seu desenvolvimento cognitivo e a construção de sua identidade.

A história dos surdos demonstra um grande preconceito proveniente da sociedade em que, a todo custo, rejeitou (e muitos ainda rejeitam) a surdez, obrigando a pessoa surda a ser instruída pelo método oral – auditivo, intentando desenvolver-lhe a fala, mesmo que artificial. O que se provou ao longo dos anos é que pouco ou nada se aproveitou com este método pedagógico, pois os alunos não absorveram os conteúdos, ficaram atrasados em sua escolaridade e prostrados em suas reais habilidades.

Somente no ano de 2002 a LIBRAS passou a ser reconhecida no Brasil, todavia, ainda existem escassas escolas que se dedicam ao ensino da mesma, assim como também há escassez de cursos que possam habilitar professores a dar aulas utilizando a língua de sinais. O primeiro passo já foi dado: a LIBRAS não é somente uma junção de sinais, mas sim, uma língua própria da comunidade surda, assim como o português caracteriza o meio de comunicação entre brasileiros ouvintes.

Para que o letramento bilingüe possa ter o devido resultado, são necessárias algumas mudanças no cenário educacional para surdos, como por exemplo: Os professores (fluentes em LIBRAS), devem tornar o ensino mais agradável aos alunos, fazendo uso de métodos visuais, de textos que ofereçam gravuras, de filmes legendados, de dramatizações em língua de sinais e até de debates em sala de aula (sobre um texto, sobre uma encenação, etc), onde os alunos poderão descobrir coisas novas e tirar suas dúvidas.

O que se pretende demonstrar é o quanto a pessoa surda pode se desenvolver quando faz uso contínuo da LIBRAS, o que lhe possibilitará o aprendizado de outras línguas (não somente o português), o ingresso em universidades e, principalmente, a conquista de sua tão sonhada subjetividade.

REFERÊNCIAS

BOTELHO, Paula. Linguagem e Letramento na educação dos surdos – ideologias e práticas pedagógicas. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2002.

FERNANDES, Sueli F. Práticas de letramento na educação bilingüe para surdos. Curitiba: SEED, 2006.

GOTTI, Marlene de Oliveira. Português para deficiente auditivo. Brasília: Edunb, 1991.

LACERDA, Cristina B. F. de. Um pouco da história das diferentes abordagens na educação dos surdos. Cad. CEDES vol.19 n.46 Campinas, Set. 1998.

QUADROS.Ronice Müller de. Educação de surdos: A aquisição da linguagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.


[1] Formação em Letras,Especialista em Educação Especial – IBPEX, Professora da Rede Pública de Ensino do Estado do Paraná de Língua Portuguesa para alunos surdos. E-mail: [email protected]

[2] Empregado aqui no sentido de não querer mudar as coisas mas, conservá-las, deixá-las como são.

[3] Oralizados refere-se aos que têm razoáveis ou boas habilidades de fala e de leitura labial, enquanto os "não oralizados apresentam precárias habilidades. (PAULA BOTELHO, 2002, p. 30)

[4] Língua Brasileira de Sinais.

[5] Letramento é o estado daquele que não só sabe ler e escrever, mas que também faz uso competente e freqüente da leitura e da escrita, e que, ao tornar-se letrado, muda seu lugar social, seu modo de viver na sociedade, sua inserção na cultura. (Soares, 1998, citado por BOTELHO, 2002, p. 63).


Autor: Alexandra Albano


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