Reclamação de Mulher



Em quase todas as repartições em que trabalho, um bando de mulheres me escolhem para fazer suas lamentações. Devem me achar com cara de tonto, de padre ou de palhaço.

A maioria reclama que o que a gente ganha não dá nem para sustentar a família. Azar delas, não queriam ser iguais aos homens? Agora que se danem.

Perto de onde moro, moram também três mulheres, duas casadas. Os dois marmanjões passam o dia bebendo e à noite tocando violão e jogando baralho. As madames passam o dia se matando para tratar os vagabundos.

Recentemente fui à repartição e chegando lá encontrei três madames reclamando do governador. Desceram a lenha no homem. Quando me viram, aumentaram ainda mais o volume e perguntaram a minha opinião.

- Não sei, madame, e não adianta a senhora vir se queixar a mim, eu não sou nenhuma autoridade, o governador não é meu parente, nem conhecidos somos, por que a madame não vai falar diretamente a ele?

- Tá louco? Do jeito que aquele bicho é? É capaz de ele me comer vivinha.

- Isto eu não duvido não, madame.

Como ela viu que não conseguia mesmo meu apoio, começou a descer a lenha nos homens, começando pelos membros da família dela.

- Eu tenho 25 anos de trabalho, sempre sustentei o meu marido e ele nunca fez nada para mim. Trabalho que só louca. Agora ele está querendo ainda mais. Como ele não trabalha, eu é que dou dinheiro para os fins de semana dele. Como o governo não está pagando, eu também estou dura. Quando chega em casa a sexta-feira, meu marido já chega reclamando:

- É...amanhã é sábado, estou sem um tostão, preciso arrumar outra mulher.

- Já viu que petulância mais sem vergonha?

- Mande ele pastar, madame.

- O quê? Tá ficando doido mesmo? Se eu mandar ele pastar, vou ficar vendo navios com a idade que tenho.

- Não sei o que dizer, madame. Quem sabe a senhora dando umas bofetadas nele as coisas melhoram...

- Ficou lelé de uma vez. Se eu der umas bolachadas nele, é capaz de ele me mandar pro inferno.

- Não deve ser pior que aqui, senhora. Pelo menos os que partiram daqui para lá, nunca voltaram para nos aconselhar, a não serir lá, portanto não se preocupe. Um foguinho a mais outro a menos não vai alterar muito.

Pensei que a dona me deixaria de lado. Pura ilusão a minha. Ela passou a descer a lenha no filho.

- O meu filho tem 18 anos de idade. Paguei todo o estudo dele. Arrumou um empreguinho, mas ele gasta todo o dinheiro dele não sei onde.

- Deve ser na zona, madame.

- Sei lá, mas o fato é que as roupas, o calçado e a comida, sou eu quem dou tudo. Pois ele não teve a petulância de falar hoje de manhãqueacomida ládecasaerauma

verdadeira goroba?

- Provavelmente era mesmo, madame.

- É nada, estes homens de hoje em dia são todos preguiçosos. Só querem saber deles mesmo. Onde se viu falar que as mulheres têm que trabalhar para sustentar os marmanjos?

- Foram as mulheres que escolheram, minha senhora. Eu, por enquanto, ainda sou daqueles que trabalham para sustentar a família. Mas estou a procura de uma mulher deste novo tipo. Se a senhora encontrar uma que tenha este gabarito, tenha caridade, me avise com antecedência. A senhora já pensou ter uma mulher que cozinha, lava a roupa, cuida da casa e dos filhos, vai pro serviço enquanto eu ficaria em casa dormindo até às 10 horas assistindo televisão, jogando um baralhinho com os amigos? A senhora pensa que eu gostaria de ir para o céu depois de uma vida destas? De jeito nenhum.

- Por isso é que era bom o tempo antigo. O homem trabalhava para sustentar a família. A mulher só tomava conta da casa. Também não sei por que os homens andam doidos por causa das mulheres, que andam atrás dos homens. Tem mulher que só falta engolir os homens. Isto é muito antigo. Desde os tempos da Bíblia. Lá no livro Gênesis, diz que Adão estava bem quieto no seu canto. Estava trabalhando no pesado para sustentar a Eva. Não é que a Eva apareceu, de repente, e ofereceu uma maçã a Adão? Ele disse não, que era proibido, mas ela insistiu. Disse que foi uma cobra que disse a ela que aquilo era delicioso. Parece que nunca tinha visto cobra. Como a Eva lutava muito, Adão, coitadinho, comeu um pedacinho da maçã! Pronto! Endoideceu o homem. Ficou louquinho da vida. Toda vez que Adão via uma maçã, pulava em cima. Esse mal foi tão grande que pegou em todos os homens. É uma doença hereditária. E a Eva querer culpar o pobre do Adão, que não teve culpa em nada?

- Olha aqui, seu puxa-saco, é melhor a gente ir trabalhar. O tempo está passando e daqui a pouco o chefe chega.

- É mesmo, depois a gente conversa.

- Muito obrigado, não é preciso. Já sei de que lado você está.

E a vida continuou.


Autor: Henrique Araújo


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