PENSAMENTOS DA NOVA HERMENÊUTICA



Este artigo apresenta algumas características dos pensamentos da nova hermenêutica constitucional. Estudam-se o método tópico, concretista, científico-espiritual e o normativo estruturante, em razão da descrença proporcionada pelo positivismo racionalista, propiciada pela falibilidade de suas soluções, tais pensamentos ressurgiram como métodos de interpretação.

Proposta inicialmente por Nicolai HARTMANN, o método tópico foi revigorado por Theodor VIEHWEG, em razão da insuficiência do método científico. O pensamento sistêmico seria por excelência um pensamento dedutivo, ao contrário da tópica que trabalha sob a perspectiva do "respectivamente justo". A tópica é uma técnica de pensar por problemas, desenvolvida pela retórica. Ela se desdobra numa contextura cultural, ao contrário dos argumentos dedutivos, por meio da compreensão de toda a complexidade do problema (BONAVIDES, 2006, p. 449).

Refuta-se, portanto, o pensamento sistêmico, para que se pense nas soluções aos problemas. É um trabalho proposto na razão direta da dualidade problema e solução, por meio daquilo que é justo e culturalmente aceito. Se há um problema, que venha a solução por meio daquilo que é justo e aceitável para o caso, se for preciso que se utilizem tentativas (PEIXINHO, 2003, p. 76).

Os métodos, do ponto de vista da tópica, são condicionados a pontos de vista, ou como denomina VIEHWEG, na condição de "topoi". Partindo da premissa de que a Constituição é um sistema aberto, com definições abstratas e indefinidas, a interpretação constitucional também é designada sob a perspectiva de pontos de vista. Há uma eterna vinculação ao problema, mantendo a redução e a dedução em limites modestos (BONAVIDES, 2006, p. 453).

A tópica na interpretação da Constituição tem caráter eminentemente prático, visto que existe para solucionar problemas específicos e concretos (BONAVIDES, 2006, p. 450). Razão de constituir-se num pensamento focalizado no problema a partir do pensamento problemático e não do pensamento sistemático, pensar topicamente é assumir que toda questão implica a existência de mais de uma resposta (PEIXINHO, 2003, p. 74).

O método tópico pressupõe algumas premissas basilares, quais sejam: o caráter prático, aberto e preferência pela discussão. Assim, seu principal objetivo é proporcionar, por um processo de argumentação, uma pluralidade de interpretações que resultam na adequação da norma constitucional ao caso concreto (PEIXINHO, 2003, p. 76).

Os problemas constitucionais são, em sua grande maioria, ligados à violação de direitos fundamentais. Neste caso, a tópica encontra terreno propício para sua aplicação, haja vista a amplitude dos conceitos contidos na norma. Dando uma margem de ação muito extensa ao intérprete (LEITE, 2002, p. 61).

Concluindo, a tópica é, assim, uma técnica de pensar por problemas que possa servir de recurso interpretativo das normas jurídicas, estabelecendo uma forma de raciocínio que procede por questionamentos sucessivos, em torno de uma relação pergunta-resposta (BULOS, 1997, p. 28).

Como pode ser percebido, o pensamento tópico abandona qualquer vinculação a um estatuto normativo. Prevalece a vontade do intérprete, o qual faz a interpretação por meio de pontos de vista (topoi), começando o seu estudo interpretativo pelo caso concreto, com a intenção de moldar a norma que atender a situação fática (PEIXINHO, 2003, p. 99).

Para o método interpretativo concretizador, a interpretação constitucional é considerada uma concretização, ou seja, a aplicação de normas jurídico-constitucionais é a maneira de interpretar.

A amplitude e os preceitos abertos da Constituição colocam o fator interpretação numa importância primordial para o sistema constitucional, ao contrário das demais normas, nas quais problemas de interpretação são menos freqüentes, pois são aplicáveis a cada caso diretamente (HESSE, 1998, p. 54).

O problema que HESSE previu, em relação à Constituição, defende já que se trata de uma norma fundamental, aberta e repleta de princípios muitas vezes abstratos, portanto necessita de concretização. Assim, a tarefa da interpretação passa a ser a de concretização da lei em cada caso.

Para corrigir as falhas relativas aos preceitos abertos, o método concretizador parte da premissa que a norma jurídica não se confunde com o seu texto puro, eis que é um trabalho de construção, ou seja, é concretizado. Portanto, o texto não é o ponto de partida, mas, sim, o seu resultado (PEIXINHO, 2003, p. 81).

O método concretizador, nesse contexto, recupera a superioridade categórica da norma, tendo em vista que o procedimento de interpretação parte da superioridade da norma para o caso concreto, ou seja, a compreensão do sentido do texto normativo, nesse ponto de vista da concretude, leva o intérprete a conectar o preceito constitucional escrito à atividade prático-normativa, para elaborar a real interpretação.

O método concretista de Konrad HESSE busca encontrar o resultado constitucionalmente apurado em um procedimento ao mesmo tempo racional e controlável, fundamentando esse resultado racional e controlavelmente e, ainda, criando a certeza jurídica e previsibilidade (HESSE, 1998, p. 55).

Paulo BONAVIDES afirma que o método concretista gravita ao redor de três elementos básicos: a norma que se vai concretizar, a compreensão prévia do intérprete e o problema concreto a resolver (BONAVIDES, 2001, p. 440).

Ao contrário do pensamento tópico, o método hermenêutico-concretizador parte da norma constitucional para o caso concreto, levando em conta o próprio resultado da concretização da norma[1].

Método integrativo ou científico-espiritual afirma que a tarefa interpretativa deve ser realizada de modo a conciliar o texto aos valores e à realidade da comunidade e não apenas apreender o sentido dos conceitos da norma analisada (CANOTILHO, 1999, p. 1139).

Esse método defende que a Constituição há de ser interpretada sempre como um todo, com percepção global ou captação de sentido. Defende que o intérprete deva sempre se prender à realidade da vida, à "concretude" da existência, compreendida, sobretudo pelo que tem de espiritual, enquanto processo unitário e renovador da própria realidade, submetida à lei de sua integração (SMEND, p.239 APUD BONAVIDES, 2006, p. 437).

O método Científico-espiritual de Rudolf SMEND assim é definido, de forma resumida, como sendo interpretado levando-se em conta dois requisitos básicos: um sistema de valores subjacentes ao texto constitucional e o sentido e a realidade da Constituição como elementos do processo de integração da norma (CANOTILHO, 1999, p. 1176-1177).

A norma constitucional se interpretada a partir desse método será integrada, quando houver obscuridão, por meio da correlação existente da época e das circunstâncias que a circundam.

Interpretando dessa maneira, a interpretação do desiderato constitucional adquire feições primordialmente política, afastando-se de suas finalidades jurídicas.

O grande problema do método científico-espiritual de SMEND refere-se à quantidade de mutação dos possíveis resultados da interpretação.

O método normativo-estruturante de Friedrich MULLER inspira-se na tópica, à qual faz algumas modificações a fim de adequá-la ao processo de concretização da norma, eis que o exercício da interpretação não se dissocia da normatividade do mandamento constitucional, entendido como algo a mais do que o conteúdo expresso do texto constitucional.

Compreende-se a norma constitucional como algo além do que a literalidade do texto; aceita-se que sua estruturação e sua racionalização ultrapassam a interpretação do texto literal, o que contraria os métodos tradicionais de hermenêutica jurídica (BONAVIDES, 2006, p. 457). O método normativo-estruturante de MULLER "busca evitar a separação das duas Constituições – a formal e a material – bem como aquele conhecido confronto da realidade com a norma jurídica" (BONAVIDES, 2006, p. 457-458).

Enfim, o método normativo-estruturante de MULLER reúne os postulados metodológicos tradicionais, incrementado com elementos axiológicos de ordem político-constitucional.

Portanto, estes são os modelos relativos à nova hermenêutica constitucional.

REFERÊNCIAS

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 11ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2001, p. 437-458.

BULOS, Uadi Lammêgo. Manual de interpretação constitucional. São Paulo: Saraiva, 1997, P. 28-35.

CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 3ª ed. Coimbra: Almedina, 1999, P. 1139-1177.

HESSE, Konrad. Elementos de direito constitucional da república federal da Alemanha. 20. ed. Tradução de: Luis Afonso Heck. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998, p. 54.

LEITE, George Salomão. Interpretação constitucional e tópica jurídica. São Paulo. Editora Juarez de Oliveira, 2002, p. 61.

PEIXINHO, Manoel Messias. A interpretação da Constituição e os princípios fundamentais: elementos para uma hermenêutica constitucional renovada, 2ª ed., Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003, p. 74-99.




Autor: Kleber Vinicius Bezerra Camelo de Melo


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