A profícua missão de ensinar fundamentada em uma concepção Neurodidática



Educar é um exercício milenar. Em tempos priscos, a atividade educacional já era exercida como mola impulsionadora do processo evolutivo. Desde os diálogos socráticos à realidade educacional atual, o ser humano sempre esteve envolto a ambientes que motivaram a aprendizagem e instigaram a descoberta de mecanismos e recriação de meios que ocasionassem uma melhoria de vida da espécie humana na terra. O desejo de aprender está arraigado à essência humana.

Devido à importância da educação para a sociedade, vários modelos educacionais foram criados, muitos teóricos apresentaram "fórmulas para o sucesso da aprendizagem" e uma miscelânea de paradigmas educacionais se instaurou no Sistema de Ensino Brasileiro. Algumas instituições seguem os moldes do tecnicismodifundido nos anos 70, inspiradas nas teorias behavioristas da aprendizagem e da abordagem sistêmica do ensino, apresentam como prática pedagógica ideal o desenvolvimento de atividades mecânicas, inseridas numa proposta educacional rígida e passível de ser totalmente programada em detalhes pelo professor. Outras instituições negam a prática tecnicista e acreditam que o saber deve ser instigado, construído, esta teoria foi denominada construtivismo, e a partir da definição do próprio vocábulo, nota-se que ela dissemina a idéia de que o saber deve ser construído, por não estar acabado e cristalizado no pensamento do professor. Para os teóricos deste modelo educacional a aprendizagem acontece por meio da interação do indivíduo com o meio físico e social, com o simbolismo humano, com o mundo das relações sociais; e se constitui por força de sua ação e não por qualquer dotação prévia. Todavia, nas instituições que seguem o modelo tecnicista, ou o modelo construtivista, ou naquelas que se dizem adeptas dos dois, acontece o insucesso educacional para alguns alunos e novas ideias surgem como possíveis soluções para este impasse.

A Neuropedagogia se apresenta como uma nova teoria, que diferente das outras, não se prende às discussões filosóficas, mas à praticidade do funcionamento cerebral e suas relações com o processo de aprendizagem, constitui-se comoelemento somatizador às teorias anteriores.

Para o educador preocupado em resolver as peculiaridades do processo de aprendizagem, faz-se necessário além do conhecimento acerca das práticas educacionais instituídas pelos modelos educacionais, a concepção sobre o funcionamento cerebral dos educandos e suas implicações no processo de aprendizagem. Como poetiza Rubem Alves, educar requer conhecimento e significação.

"Se fosse ensinar a uma criança a beleza da música
não começaria com partituras, notas e pautas.
Ouviríamos juntos as melodias mais gostosas e lhe contaria
sobre os instrumentos que fazem a música. Aí, encantada com a beleza da música, ela mesma me pediria que lhe ensinasse o mistério daquelas bolinhas pretas escritas sobre cinco linhas.Porque as bolinhas pretas e as cinco linhas são apenas ferramentas para a produção da beleza musical. A experiência da beleza tem de vir antes."

O educador contemporâneo deve buscar subsídios para o processo de significação da aprendizagem. Como fazer com que o indivíduo se interesse pela "beleza da música"? Quais arranjos neurais estabelecem o aprender significativo? Como instigar a assimilação, acomodação, equilíbrio e adaptação das informações adquiridas durante o processo ensino-aprendizagem? Uma possível resposta para os questionamentos supracitados seria o educador trabalhar com a plasticidade cerebral visando propiciarsinapses na estrutura neural de seus alunos.

Pode-se ilustrar o supracitado por meio de uma reportagem publicada naRevista Superinteressante que descreveu comprovações acerca da revolução do cérebro. Segundo a reportagem o sistema nervoso é capaz de fazer novas conexões e esta capacidade regenerativa da estrutura cerebral pode ser a saída para inúmeros problemas de aprendizagem. Além disso, a ciência provou que a pessoa utiliza todo o cérebro e não 10% dele como se acreditou durante muito tempo, o que ocorre é que algumas partes do cérebro se desenvolvem mais, porque são mais ativadas que outras. Os indivíduos pensam de maneira diferente e aprendem por meio de estímulos diferentes, eles utilizam as áreas mais desenvolvidas do seu cérebro para compreender problemáticas que lhe são propostas. Um aluno que tem habilidade lingüística, pode desenvolver seu raciocínio lógicomatemático, por exemplo, por meio de estruturas lingüísticas. Parafraseando a obra O Alienista de Machado de Assis, a estrutura neural deixa de ser uma ilha e passa a ser um arquipélago. Inúmeras são as possibilidades de se estabelecer sinapses que geram a aprendizagem e cabe ao educador contemporâneo fazer uso deste conhecimento para desenvolver o cognitivo de seus alunos.

Maria Aparecida Affonso Moysés e Cecília Azevedo Lima Collares preceituam no artigo "Medicalização: elemento de desconstrução dos direitos humanos" que a sociedade trata seus problemas com naturalismo, transformando-os em algo natural e inevitável, deste modo, contribui para que eles permaneçam. Pode-se fazeruma analogia com o que fora apontado pelas autoras e a problemática da educação atual (repetência, fracasso escolar), pois nota-se que muitos educadores rotulam alunos como hiperativos, DDAs, disléxicos, entre outros arquétipos disseminados no contexto educacional atual e se conformam com o fracasso destes educandos. A falta de preparo dos professores para lidar com estas situações faz com que eles as caracterizem como algo inevitável. É uma nova vertente da "medicalização" diferente daquela aplicada na década de 60 e que visava silenciar o espírito dos jovens revolucionários denominando-os indivíduos cuja agressividade era resultado de uma disfunção cerebral. A suposta medicalização atual exclui crianças e adolescentes que por se comportarem de uma forma "diferente" são hostilizadas e esquecidas nos bancos escolares, muitas vezes oprimidas e rotuladas como limitadas. Os laudos que os professores pedem para entender o comportamento dessas crianças geralmente indicam a necessidade de avaliações diferenciadas que têm como principal objetivo aprovar os alunos com perfil diversificado do restante da turma. Poucos sugerem práticas pedagógicas que visem incentivar a superação das dificuldades destes educandos.

A Neurodidática propõe a superação destas dificuldades por meio do estudo da plasticidade cerebral e da aprendizagem significativa. Uexküll cita "Tudo que um sujeito percebe torna-se seu mundo da percepção, tudo que ele faz, seu mundo de ação. Mundo de ação e percepção formam juntos uma totalidade fechada, o 'millieu', o "mundo vivido".

Deste modo, é preciso que educadores conheçam as teorias relacionadas à Neuropedagogia e aprendam a trabalhar com os sistemas nervoso central e nervoso periférico, responsáveis pela aprendizagem e ordenação dos sentidos, além de conhecer a realidade de seus alunos, para que a partir dela, tracem sua ação pedagógica. A significação dos conceitos trabalhados em sala de aula é fundamental para a aprendizagem, sem ela o sistema nervoso central não encontra estímulo para captar as informações que lhe são apresentadas. A prática pedagógica deve se pautar na afetividade, na introdução de conceitos por meio de estímulosdo sistema nervoso periférico, que está relacionado aos sentidos, para que em seguida, o sistema nervoso central seja instigado a exercer sua função de acomodação, equilíbrio e adaptação dos conceitos propostos pelo educador aos alunos e o fracasso educacional seja superado.

Bibliografia:

SILVA, Ana Beatriz B. Silva. Mentes Inquietas. 42ª Edição. ed. Gente, 2003.

Revista Superinteressante. A revolução do cérebro. edição 229, agosto de 2006

MOYSÉS, Maria Aparecida Affonso e Collares Cecília. Medicalização: elemento de desconstrução. (Artigo científico)

TELLES, Vera Stela Telles. A leitura cognitiva da Psicanálise: problemas e transformações de conceitos. (Artigo científico)

SAVIANI, Dermeval. Escola e democracia. 34ªEdição. ed. Autores Associados

Cunha, Maria Isabel. O bom professor e sua prática. 13ª Edição. ed. Papirus.

Patto, Maria Helena Souza. Para uma crítica da razão psicométrica. (Artigo científico)


Autor: Rosilene Fernandes Diniz


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