Propaganda de Hitler



Texto: "O triunfo do Reich de mil anos: cinema e propaganda política na Alemanha nazista (1933-1945)". Wagner Pinheiro Pereira. Pág. 255-269.

"Durante a ditadura de caráter totalitário de Adolf Hitler, o cinema tornou-se um dos mais convincentes meios de comunicação de massas para a psique do povo alemão". Pág. 255

Por muitas vezes ouvimos pessoas afirmarem que a capacidade de Hitler em instigar o povo alemão a se unirem para a guerra, no sentido de defender a prole ariana, era impressionante. De acordo com Wagner Pinheiro podemos observar que o ditador não dispunha apenas de um potencial oratório, mas de uma máquina de propaganda usada para enraizar na mentalidade alemã a supremacia da raça ariana sobre os demais povos "inferiores" e estes deveriam ser exterminados para o bem da evolução humana que seria conduzida pelos germânicos.

Muito antes dos EUA e outros povos do mundo, os alemães já tinham consciência da capacidade que o cinema tinha em influenciar as pessoas, logo, ainda na Primeira Guerra Mundial eles criam a UFA, órgão do governo responsável pela produção de filmes cuja temática consistia na valorização da cultura alemão e patriotismo nacional. Por volta de 1927 Alfred Hugenberg assume a UFA e passa a financiar grupos nacionalistas dos quais, Hitler fazia parte de um deles. Na época este homem que se tornaria o ditador da Alemanha ganha notoriedade com o cine jornal.

"O essencial da propaganda era atingir o coração das massas, compreender seu mundo maniqueísta e representar seus sentimentos". Pág. 257

De acordo com o livro "Minha Luta" de Adolf Hitler, a propaganda deveria ser "simples, emotiva e popular", visto que o povo não era dotado de grande capacidade de assimilação. Por tanto não era preciso grandes enfeites lingüísticos, a arte deveria ser voltada para a lógica da fácil absorção de mensagens que o governo emitia através de sua máquina propagandista, tendo o cinema como principal arma. De acordo com Goebbels, ministro de propaganda do III Reich, "cada filme,..., deveria ser agradável, nunca enfadonho", neste sentido a atenção das pessoas estaria mais presa ao enredo do filme, logo, ao invés de dormirem estariam mais entusiasmadas com a estória num momento de descontração e entretenimento. O ministro acreditava no poder do cinema "graças ao seu 'efeito penetrante e durável'", com isso o partido nazista ganhou força eleitoral até sua ascensão ao poder em 1933.

"... buscou-se associar indiretamente determinado povo ou raça com as noções de perversidade, destruição e exploração". Pág. 261

Com Adolf Hitler no poder o cinema teve uma preocupação maior no sentido de apresentar a visão do bem contra o mal, onde outros povos e etnias como judeus, ingleses, eslavos, etc. eram mostrados de forma caricaturada e aos poucos apareciam como criaturas maléficas, dessa forma o povo não teria dúvida de quem representava o mal. Esta visão maniqueísta era voltada principalmente aos jovens, um exemplo é o filme "O Jovem Hitlerista Quex" de Hans Steinhoff. Fala sobre o jovem Heini Volker que é forçado pelo pai a entrar para a juventude comunista (linha de pensamento abominada por Hitler), mas ao se deparar com os jovens hitleristas acaba se convertendo para o lado destes, que é mostrado como um grupo de jovens puros e disciplinados. Durante uma panfletagem Heini é espancado por comunistas. Ainda em agonia o jovem tem a "visão mística em que a vitória dos nazistas simboliza a construção da 'Nova Alemanha'". Segundo Wagner Pinheiro muito destes filmes retratavam a luta dos jovens nazistas de forma épica, apresentado o herói que sofre e suporta os martírios em defesa de sua causa acima de qualquer circunstância. O personagem de corpo atlético, violento e fiel a seus ideais tinha a intenção de transferir o desejo erótico para o patriotismo nazista.

Um filme de grande relevância foi "O Triunfo da Vontade" de Leni Reifenstahl. A diretora foi escolhida pelo próprio ditador, cujo filme mostrava-o como um Deus que veio ao mundo trazer a "verdade". Aqui foi utilizada a técnica de filmagem em primeiro plano onde até os pequenos detalhes dos objetos ganhavam proporções maiores dando a perspectiva de superioridade. O homem-deus surgia das nuvens em um avião enquanto o povo e os soldados eram filmados em close mostrando a expressão deles como pessoas prontas para o sacrifício. Segundo Erwin Leiser o filme tinha uma aparência tão real que não dava para distinguir a realidade da encenação.

Outras produções cinematográficas foram elaboradas para se criar um senso comum negativo acerca dos deficientes físicos, homossexuais e outras etnias como os judeus. Estes eram enfatizados como verdadeiros inimigos da moralidade alemã, sanguessugas banqueiros que pretendiam acabar com a organização e "pureza" da raça ariana, logo, somado a um darwinismo social já difundido na comunidade científica da época, o povo teria plena consciência que estes vilões deveriam ser exterminados para a glória do pan-germanismo.

"No tratamento da guerra, o cinema nazista exercitou duplamente seu esforço de propaganda, tanto no sentido positivo (exaltação do heroísmo nazista) quanto no negativo (a brutalidade do inimigo)."Pág. 268

Podemos considerar que o governo alemão se preocupou não apenas em organizar sua estrutura político-econômica, mas formar antecipadamente a mentalidade das massas para a guerra. A mídia nazista foi usada com intuito de manipular a opinião pública enfatizando o heroísmo de seu povo e a inferioridade de seus inimigos, sugerindo uma purificação da humanidade. Vimos que os filmes mostravam seus heróis martirizados, mas sempre aptos a superarem as dificuldades, era o estereótipo de um super-homem idealizado por Hitler que representava a pureza da raça. O poder do cinema como formador de opinião publica foi usado primeiramente pelos alemães, suas técnicas eram de fácil assimilação pelas massas onde elas facilmente se identificavam e logo queriam seguir o exemplo dos heróis. Trazendo para a atualidade podemos considerar que estas técnicas ainda são usadas para formular conceitos do que é bem e mal, o sentido de felicidade, de superação, o que devemos ou não fazer, porém não mais voltado para a guerra, mas para alimentar um mercado sem limites.

Segundo Eric Hobsbawn em "A Era dos Extremos", depois da Segunda Guerra a humanidade se tornou mais fria, é importante observar que não apenas a guerra mas o próprio sistema em que vivemos onde a felicidade está naquilo que compramos e possuímos, tornou a humanidade tanto fria quanto cega, tendo em vista que nos deparamos com a fome no mundo, a violência urbana e o aquecimento global, mas não conseguimos evitar o consumo desenfreado ou desligar a televisão para realizar algo produtivo para o mundo.


Autor: Walter Lira Soares


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