CONSUELO



Consuelo era mais um baiano trabalhador, honesto, que paga suas contas em dias e se diverte no final de semana. Mas tinha um problema: chamava-se Consuelo. Não que isso fosse um problema como atirar uma pedra no ônibus ou acusar um senador de corrupção, mas se chamar Consuelo era motivo de muita gozação entre os amigos. “Bom dia, dona Consuelo”, sempre que o encontrava da boca de Zé soava esses verbetes desgraçados, assim pensava Consuelo. “Oi Consuelozinha”, dizia-lhe também amiúde um de seus amigos mais íntimos.
E Consuelo acabou sua faculdade de Economia na Universidade Estadual de Santa Cruz debaixo dessa gozação. Os professores tentavam dar aula e logo, na hora da chamada... “CONSUELO”! E dava-se o vexame. Vexado o pobre Consuelo não sabia o que fazer da vida já que não podia passar nos corredores da Uesc que ouvia de um de seus conhecidos ou não: “Oi Consuelo”. Conhecidos ou não já que um nome como o de Consuelo faz uma pessoa ser conhecida tal como Lady Di era em Londres. “Sabe aquele rapaz ali”, diziam fofocando enquanto ele passava desconfiado, “se chama Consuelo!” ;“Consuelo! Não diga!” E Consuelo ia e vinha, como manda a constituição, ouvindo os burburinhos com seu nome.
Foi numa semana de véspera ao seu aniversário que tomou a decisão que julgava mais importante de sua vida: ABRIR UM PROCESSO JUDICIAL PARA MUDAR O NOME. Foi até o fórum no Centro de Itabuna e descobriu que só poderia tentar aquilo em Salvador.
Partiu para Salvador numa segunda-feira de manhã fria para abrir aquele processo acompanhado de advogado e tudo. Ficaram vários meses nessa luta para ver o juiz, já que a justiça no Brasil é tão lerda que cada vez mais parece que ela vai parar. E parou, mas antes atendeu o pobre do Consuelo que não aguentava o fato de seus conterrâneos de Ilhéus e de Itabuna terem tanto preconceito com aquele nome que para ele não significava nada, mas para a galera que “o amava” significava castigo.
O juiz parecia fúnebre em uma toga que mais parecia roupa encomendada para o juízo final. Ao seu lado estava seu advogado que usava um terno negro de um pano bem forte e uma camisa bem rosa, com uma gravata listrada de vermelho e azul marinho. Ele trajava-se com um jeans e uma camisa social vermelha. A Sessão começou atrasada porque o juiz estava lendo uma revista de fofoca que comprara na banca de revistas fora do fórum. E a fofoca devia ser boa, pois ele não tirava os olhos da Brazil’s Magazine. E, ao relatar seu problema ao juiz que pareceu não ter lido o processo pois falava mais das fofocas que lia do que entendia do processo, o juiz olhou-lhe e disse: “Você está fazendo essa confusão porque tem o nome de CONSUELO?”, o velho tirou os óculos, “Meu nome é NOÊMIA, NOÊMIA CARDOSO DE JOSÉ MARIA!”
E assim a nossa amiga, ou melhor, o nosso amigo não conseguiu em mais uma de suas peripécias mudar seu nome.
Triste, abatido, ele caminhava na Rua Marquês de Paranaguá em Ilhéus quando se bateu com a mulher que aguentaria os seus abusos quando velho. Não que tenha sido amor à primeira vista como nos filmes de James Cameron, mas foi afeição, química abstrata inexplicável e, nesse meio o desejo de fazer o irracional que é o sexo. Fizeram e, aliás, a vida deu a eles em tempo de crise econômica 17 filhos que criaram com muito carinho. Ele também se encontrou nela em outro detalhe: o nome dela era GILVAN ROBERTA MARTINS.
E como mudaram de sexo, ou melhor, de nome? No casamento ele passou a ser Gilvan, embora também não gostasse muito do nome e ela passou a ser Consuelo. Algumas vezes são vistos cantando e tocando nos bares em Itabuna e Ilhéus, fazem uma dupla inigualável...



GABRIEL NASCIMENTO
Autor: Gabriel Nascimento


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