Possibilidade de progressão de regime e concessão de livramento condicional ao sentenciado estrangeiro



Constitui objetivo fundamental da República Federativa do Brasil: “promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”, proclamado no inciso IV do artigo 3º de nossa Carta Magna. Corolário disso é a garantia a um tratamento isonômico perante a lei, ademais, o caput do artigo 5º de nossa Constituição brasileira disciplina que “Todos são iguais perante a lei, sem preconceito de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade [...]”. Destarte, tratando-se da possibilidade da progressão de regime ou concessão de livramento condicional ao sentenciado estrangeiro, não pode haver dúvidas da aplicabilidade desses benefícios também aos estrangeiros sentenciados na égide de nosso ordenamento jurídico brasileiro. Aproximo-me então da linha de pensamento do doutor Leopoldo Stefanno Leone Louveira, que pautado no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, defende a possibilidade de aplicação dos institutos penais supracitados também aos estrangeiros sentenciados sob nossa jurisdição. Ainda no campo normativo e indo além dos dispositivos constitucionais, é elementar ponderar que a nossa Nação é signatária do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de Nova Iorque, que na primeira parte de seu artigo 2º dispõe que “Cada Estado Parte no presente Pacto compromete-se a respeitar e a garantir a todos os indivíduos que se encontrem nos seus territórios e estejam sujeitos à sua jurisdição os direitos reconhecidos no presente Pacto, sem qualquer distinção, derivada, nomeadamente, de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política, ou de qualquer outra opinião, de origem nacional ou social, de propriedade ou de nascimento, ou de outra situação.” Em seu artigo 14 fica convencionado que "todas as pessoas são iguais perante os Tribunais e as Cortes de Justiça". O artigo 26 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de Nova Iorque ainda dispõe que: "Todas as pessoas são iguais perante a lei e têm direito, sem discriminação, a igual proteção da lei. A este respeito, a lei deverá proibir qualquer forma de discriminação e garantir a todas as pessoas proteção igual e eficaz contra qualquer discriminação por motivo de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião, política ou de outra natureza, origem nacional ou social, situação econômica, nascimento ou qualquer outra situação". A meu ver, ainda que todos esses dispositivos coloquem a igualdade e o repúdio à discriminação em posição de destaque, o maior motivo e mais forte princípio que deve ser levado em conta é o da dignidade da pessoa humana. O princípio da dignidade humana, que a meu ver é o de maior relevância em nosso ordenamento jurídico, conforme ensina Alexandre de Moraes: “ concede unidade aos direitos fundamentais e garantias fundamentais, sendo inerente às personalidades. Esse fundamento afasta a idéia de predomínio das concepções transpessoalistas de Estado e Nação, em detrimento da liberdade individual. A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa”. Como salienta Leopoldo Louveira “o julgador não pode dar as costas à evolução do pensamento jurídico e da própria sociedade sob pena de perpetuar, no mais das vezes, posições equivocadas ou incondizentes com a melhor aplicação do Direito”. O pensamento jurídico evoluiu no sentido de dar uma maior proteção aos direitos individuais que ganharam unidade com o fortalecimento do princípio da dignidade humana, destarte, a aplicação do Direito Penal e do Processual Penal deve ocorrer inspirada pelo princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Não obstante, o princípio da dignidade da pessoa humana não é apenas um princípio jurídico-constitucional, trata-se de um princípio de forte caráter moral, que representa uma direção axiológica para as condutas individuais. Kant em seu brilhantismo e sapiência já afirmava que para que seja atingida a dignidade da pessoa humana deve-se agir “de tal maneira que trates a humanidade, em tua própria pessoa e na pessoa de outro ser humano, jamais meramente como um meio, porém sempre ao mesmo tempo como um fim”. O estrangeiro não pode ser tratado de forma diversa nessa questão unicamente por ser condicionado ao fato de ser nascido em outro território. É estrangeiro, mas tal fato não lhe retira a característica fundamental de ser pessoa humana, e assim sendo, tem pleno direito ao respeito e defesa de sua dignidade. Negar-lhe, quando mereça (leia-se, quando atenda aos requisitos objetivos e subjetivos e às condições impostas pela legislação Penal e processual penal brasileira), a progressão de regime ou a concessão de livramento condicional é uma forma repudiável de discriminação em função da origem e uma afronta à dignidade da pessoa humana. Bibliografia LOUVEIRA, LEOPOLDO S. L. Possibilidade de progressão de regime e concessão de livramento condicional ao sentenciado estrangeiro. Boletim IBCCRIM. Ano 16, nº 196. São Paulo: Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, 2009.
Autor: Caio Cézar Will Dias


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