O Amor Não Tira Férias



Quando Tito foi até seu pai, o patriarca estava no computador passeando pelo orkut enquanto conversava com alguns amigos pelo MSN. Disse que eram negócios, mas estes não se assemelhavam às distrações. Na sala a mãe assistia telenovela e não admitia interrupções, apenas as causadas pela rede de TV e os fenômenos da natureza. Com quem conversar? Irmãos, não tinha. Pagava pela solidão.

Durante o dia os pais trabalhavam. A mãe era uma nutricionista. Sabia balancear cardápios, preparar dietas. E lá estava sua vida: com excesso de problemas, calorias em demasia. Sua dieta deveria ser uma, apenas: amor ao filho. O pai, um administrador de empresas, homem que controlava apenas os seus negócios profissionais. A família não era administrada.

Certa vez o filho Tito resolveu abandonar os estudos. Deixou de ir à escola. Tudo normal para os pais, que cansaram de serem chamados ao colégio, pois os problemas eram muitos. Tito passou a sair com freqüência durante ss noites com os amigos. Chegava ao amanhecer. Era cobrado, mas não adiantava. Os pais não exigiam. Passou a beber e através desta conheceu outras drogas, ilícitas. Da maconha para a cocaína e depois o crack. O garoto faleceu aos dezenove anos, vítima da ineficácia familiar. Faltou preocupação; faltou amor; faltou compromisso. Renegaram a vida. Ausentaram-se de suas responsabilidades.

Em 2006 quando cheguei em Porto Alegre (RS) para coordenar pedagogicamente a Fundação Fé e Alegria do Brasil e dar aulas de Língua Materna no município de Novo Hamburgo, região metropolitana da capital gaúcha, convivi muito com o pai de Tito e depois de alguns meses tive o prazer de conhecê-lo. O garoto já estava sugado pelo vício e os pais não lhe davam importância. A tristeza cobria o céu no dia do velório do Tito. Que decepção! O pai aplicou tanto dinheiro na Bolsa de Valores, mas esqueceu de investir amor no coração de seu filho.

Hoje ao olhar para o horizonte, da janela do quarto, sem o barulho e as imagens da TV, com a calmaria que a madrugada me proporciona, escrevo este texto. Não tecido com a pureza dos escritores de outrora, mas com a experiência mantida nesse coração que não se esquece: se a juventude perdeu-se ou está perdida, precisamos ajudá-los. Mas os grandes culpados desse caos são os pais, que em nome do estresse, do trabalho, da boemia, do compromisso, da terceirização da educação acabaram tirando férias. É nesse momento que os crocodilos atacam. O amor não tira férias.


Autor: Sergio Sant'Anna


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