Problemas da educação superior e os multifatores associados



A UNIVERSIDADE BRASILEIRA


A Universidade brasileira é muito heterogênea. Das três funções básicas atribuídas classicamente a ela (ensino, pesquisa e extensão), poucas em nosso país conseguem realmente exerce-las em sua plenitude.Além da diversidade de funções, outros fatores influenciam de maneira objetiva e clara a atenção de nossas instituições de ensino superior, principalmente os associados à possibilidade de acesso.Em certos casos, esse acesso (vestibular) é muito difícil e aberto apenas a um grupo de estudantes privilegiados, quase sempre provenientes de classe média e que tiveram um curso secundário de boa qualidade, em geral oferecido pelo ensino privado (cerca de 33% do total de estudantes universitário estudam em Universidades Públicas, de acesso mais restrito) (MARTINS FILHO, 1999).


O ALUNADO

Além do fator vestibular, agregam-se outros, cujas origens estão no mesmo setor – o econômico. Os vestibulares menos seletivos tendem a trazer para outro grande segmento, o Privado, uma massa de estudantes nem sempre bem preparados e, na maioria das vezes, provenientes das classes menos abastadas da população (SARDENBERG ,1999).


A EXPECTATIVA

MARTINS FILHO (1999), tratando das percepções sociais da América Latina e, pensando na Educação como tarefa permanente, preocupou-se com o enfoque que deve ser dado à Universidade e ao Ensino Superior no Brasil e na América Latina. Parece que a sociedade latino-americana, e a brasileira em particular, espera de suas universidades um papel diverso do desempenhado por aquelas dos países industrializados.

Ocorre que a expectativa da sociedade terceiro mundista, por não ter a universidade dentro do seu campo de disponibilidade, é muito baixa. A sociedade, o povo, por assim dizer, renuncia a pensar sobre suas instituições de ensino superior, abolindo, ou não se permitindo, qualquer pensamento crítico (MARTINS FILHO, 2000).

No passado, com o costume de nossas elites sociais e intelectuais de olharem o mundo com uma visão européia (eurocentrismo), acabava-se sempre analisando os problemas brasileiros e latino-americanos com uma visão quase colonialista. E isso era estendido, também, às reflexões sobre a Universidade, partindo, sempre, qualquer crítica, pensamento ou reflexão, da massa crítica acadêmica (KROTSCH, 1997).


A GLOBALIZAÇÃO


Agora, neste novo milênio, o quadro se modifica. Fala-se muito da globalização, desse processo de internacionalização, principalmente de fundo econômico, mas que traz consigo a cultura, o saber, o conhecimento e impõe uma reavaliação de novos papéis e de novas funções. Portanto, as políticas, ditadas pela globalização, têm levado os fóruns de decisão internacionais a refletir, a produzir teses, documentos que têm tido forte impacto nas esferas de decisão e financiamento do ensino superior (SADER, 2001).

Ultimamente, na maioria dos países latino-americanos, onde ainda a Universidade Pública assume papel importante, principalmente, no Brasil – no setor de produção do conhecimento (pesquisa), formação e titulação de professores (mestrado e doutorado)-,as reformas aparecem e se instalam baseadas num documento intitulado Higher Education(BANCO MUNDIAL,1999).

Esse documento sugere e sinaliza para uma redução progressiva dos gastos estatais com a educação superior em paralelo com uma participação crescente do setor privado na Educação Superior.


A ANÁLISE

É preciso ser realista ao analisar a América Latina e suas universidades. No Brasil, as universidades públicas atraíram para si a função de pesquisa e de formação e titulação de professores e em várias oportunidades substitui o Estado em suas funções essenciais para a população carente, como, por exemplo, no setor da saúde (AROCENA & SUTZ, 1997).

Até a década de 50, praticamente só a elite econômica, com raras exceções, chegava à Universidade. Em 1950, havia somente 266 mil alunos matriculados nas 75 instituições de ensino superior existentes no continente. Já em 1992, o mesmo autor indica 690 universidades com 10,3 milhões estudantes, o que demonstra uma sextuplicação do número de alunos na universidade latino-americana, fato que determinou a abertura de oportunidades de aprendizado superior, semelhante a de muitos países industrializados. Parece, por mais contraditório e surpreendente que isso possa ser, que houve uma relativa massificação nos últimos 40 anos e, ao que tudo indica, descentralizou-se em direção às regiões não-metropolitanas (PAIVA & WARDE, 1994).





A COMPARAÇÃO


O crescimento, porém, ocorreu diferentemente de país para país. No Uruguai, México e Argentina, se deu mais no setor público, com financiamento do Estado, enquanto no Chile e no Brasil tal desenvolvimento se deu às custos do setor privado. Estima-se que no Brasil cerca de 67% dos estudantes estejam no estejam no setor privado (BANCO MUNDIAL, 1999).

A forte demanda reprimida na base do ensino de segundo grau, que pressiona continuamente por aumento de vagas no ensino superior, é um dos fatores determinantes dessa expansão. Na maior parte da América Latina e também no Brasil, é baixa a quantidade de jovens da faixa etária entre 18 e 25 anos com acesso ao terceiro grau, segundo dados da UNESCO (MARTINS FILHO, 2000).

Enquanto o Suriname tem apenas 9% dos jovens dessa faixa etária na Universidade, o Brasil tem 11,6%, a Colômbia 13,7% e o Chile 30%.Calcula-se não mais de 2 milhões de estudantes universitários no Brasil.

Dados oficiais de 1998 mostram que o Brasil dispunha de 99 universidades (37 federais, 19 estaduais, 03 municipais e 40 particulares) e 1.565.056 estudantes, dos quais 959.320 em universidades particulares (MARTINS FILHO, 1999).


A QUALIDADE

Quanto à qualidade da Universidade brasileira observamos que algumas têm respeitabilidade internacional e produção científica de ponta. Quanto ao ensino de graduação e pós-graduação existem aspectos positivos e negativos que demandam tempo e investimentos (MARTINS FILHO,1998b).

É muito raro no Brasil, com honrosas exceções, que universidades não financiadas pelo setor público produzam pesquisas. É claro que a questão econômica está na base do problema – e com a globalização, a situação tem piorado muito.


A PROBLEMÁTICA

Em conseqüência disso, a problemática para o futuro está colocada dentro de um “quebra-cabeças” muito difícil de resolver e seguramente terá que ser solucionada com urgência, principalmente devido à crescente necessidade de formação de estudantes que aí vem chegando.

Estima-se que, com a ampliação do ensino secundário, a atual necessidade de 2 milhões de vagas terá de ser aumentada, pois, no mínimo, 3 milhões de estudantes deverão ter espaço garantido nos próximos 5 anos em nossas universidades (CATANI,1997).

Porém, como não há investimento no setor público e essas universidades relutam em ampliar suas vagas, alegando, mesmo às vezes sem razão, que a pós-graduação tão necessária para o desenvolvimento da qualidade suga todos os recursos, o aumento terá de ser feito, salvo melhor juízo, no setor privado que, por sua vez, está lutando para titular seus professores e tentando implantar pós-graduação e pesquisa (MARTINS FILHO, 2000).


OS RESULTADOS

A pós-graduação latino-americana, particularmente no México, Argentina e Brasil, logrou desenvolver programas de pós que inter-relacionados com a pesquisa alcançaram padrão quantitativo bastante apreciativo em termos internacionais. Nas três últimas décadas – desde o início dos anos 70-, o Brasil saltou de 180 para 2 mil cursos de pós-graduação, o que contribuiu fortemente para o desenvolvimento científico e tecnológico brasileiro (MARTINS FILHO, 2000).

Ainda refletindo sobre a bandeira da globalização, é claro que o sistema universitário latino-americano está sendo modificado, adaptado, moldado em uma proposta única, que percorre todos os cantos do mundo (globalizado) (CATANI,1997).


A SOLUÇÃO POSSÍVEL

É a proposta da Universidade Privada, atenta ao mercado, formando profissionais adaptados ao mundo moderno, exigente, competitivo e especializado.

Segundo KROTSCH (1997), “... esta proposta é o produto de uma política que, fundamentalmente, coloca a necessidade de orientar a educação superior em direção ao mercado e às suas exigências”.

Mas com as verbas minguando; a sociedade exigindo, cada vez com maior velocidade e rapidez, profissionais aptos para preencher a demanda do mercado e os estudantes sem recursos e inadimplência, a adaptação é complexa (SARDENBERG, 1999).

Surge a extensão universitária, como tentativa de captar recursos, produzindo bens e recursos para usuários ou consumidores finais. Utilizada em muitos países com relativo sucesso e permitindo que um país mais pobre enfrente desafios no mundo globalizado.


O DESAFIO

É preciso ampliar vagas de graduação em Universidade Públicas para formar profissionais capacitados ao mercado. As Universidades Particulares fazem as suas partes comportando cerca de 70% do alunado que necessita se graduar e se capacitar ao mercado (MARTINS FILHO, 2000).

As Universidades Públicas necessitam fortalecer o ensino de pós-graduação ampliando-o em número de vagas e procurar parcerias privadas (PAIVA & WARDE, 1994).

Os reflexos da globalização estão aí e a reflexão cuidadosa só permite um caminho: o da perda de preconceitos e a busca da competência. “É um hábito enraizado da Universidade Brasileira, Pública ou Privado, reagir com expressões de ressentimento às críticas que lhe são feitas” (MARTINS FILHO, 1998a).

É uma queixa freqüente dos críticos da Universidade, principalmente de fontes governamentais, que as instituições de ensino superior, em vez de refutar com argumentos ou apresentar algumas alternativas de ação, quando atacadas, tratam apenas de firmar sua própria relevância (KROTSCH, 1997).


O DEBATE

Em vários trabalhos, MARTINS FILHO (1998b) procurou demonstrar que é hora da Universidade dar um passo à frente e enriquecer o debate com idéias não apenas defensivas, mas de sentido altamente construtivo.

Nos tempos de globalização é preciso medir os reflexos sobre a sociedade e refletir sobre o que a sociedade espera da Universidade brasileira e seus pesquisadores e educadores (NOGUEIRA, 1999).

Os mercados globais são estimulados ou inibidos pela ação direta do Estado através de suas políticas de flexibilização e privatização dos diversos setores, como por exemplo, a prestação de serviços públicos (Educação) o que poderá gerar crescimento ou retração (SCHIRM, 1999).







CONCLUSÃO

Os dilemas do ensino superior no Brasil e outros países da América Latina se traduzem em motivo de estudos por vários educadores que entendem que a transformação da sociedade passa fundamentalmente pelo preparo das novas gerações através do ensino de qualidade cuja ponta do iceberg encontra-se nas Universidades sendo que os cursos de pós-graduação merecem destaque pois permitirão o aprimoramento e o desenvolvimento de novas tecnologias.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AROCENA, R. e SUTZ, J. A Universidade do Uruguai: quando todos os desafios chegam juntos.São Paulo: MNZ Editores, 1997.
BANCO MUNDIAL.Higher Education.Geneve: BM, 1994.
CATANI, A.M. Universidade na America Latina.São Paulo: CORTEZ, 1997.
KROTSCH,C.P. La Universidad entre el Estado y El mercado.São Paulo:CORTEZ,1997.
MARTINS FILHO, J. Em defesa das Universidades.Brasília: Editora do Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras, 1997.
MARTINS FILHO, J. A experiência vivida – a Universidade e outros cenários. Campinas: Editora da UNICAMP, 1998a.
MARTINS FILHO, J. O ensino superior no Brasil: situação atual e perspectivas.São Paulo: CIEE, 1998b.
MARTINS FILHO, J. Que Universidade? São Paulo: Editora da UNESP, 2000.
NOGUEIRA, J.C. Ser médico. São Paulo: CREMESP, 1999.
PAIVA, V. e WARDE, M.J. Dilemas do ensino superior na América latina.Campinas: Papirus,1994.
SARDENBERG, R.M. Os rumos do Brasil até o ano 2000.São Paulo: CIEE, 1999.
SCHIRM, S.A Mercados globais e margem de ação do Estado.São Paulo: Papers,1999.






Autor: EDSON COSTA


Artigos Relacionados


Resenha Sobre Reflexões Sobre A Educação Universitária

A Universidade No Brasil

Graduação Em Serviço Social Por Métodos De Ensino à Distância: Corresponderá As Necessidades Humanas?

Resumo Histórico Sobre Os Médicos Sem Fronteiras

O Ensino Superior No Brasil

Educação Física E Qualidade De Vida

A Inadimplência E A Suspensão Do Fornecimento De Energia Elétrica