O dano moral decorrente do acidente de trabalho e a (in)transmissibilidade da ação indenizatória aos sucessores



Karolyne Mascarenhas Araújo

Graduanda do curso do Direito na Universidade Estadual de Feira de Santana - Bahia

Resumo

O presente artigo tem como objeto de estudo o dano moral decorrente do acidente de trabalho e a possibilidade de transmissão da ação indenizatória aos sucessores, vez que quando a vítima da lesão moral falece em razão do infortúnio trabalhista, há dificuldade em se definir os legitimados para a propositura da ação indenizatória. O estudo da matéria é relevante social, acadêmica e juridicamente, tendo em vista que, atualmente, existem muitas divergências doutrinárias e jurisprudenciais em relação ao tema.

Palavras-chave: Dano moral. Acidente de trabalho. Legitimados. Ação indenizatória. Sucessão. 

1. INTRODUÇÃO

Este estudo tem como fim examinar a possibilidade de transmissão da ação reparatória de danos morais aos sucessores nos casos em que a vítima falece como consequencia do infortúnio trabalhista, tendo em vista que o problema da ocorrência do dano moral decorrente do acidente de trabalho e a (in)transmissibilidade da ação indenizatória aos sucessores, atualmente vem suscitando diversas controvérsias doutrinárias e jurisprudenciais.

Quando se trata da vítima direta do dano, a legitimidade ativa não é  objeto de divergências. O problema se configura quando a vítima da lesão moral vem a falecer em razão do infortúnio trabalhista, uma vez que nesses casos há dificuldade em se definir os legitimados para a propositura da ação reparatória. Nessas situações, cabe ação de reparação por dano moral suportado pela vítima que já  faleceu? Os sucessores tem legitimidade ativa ad causam? Esse é o problema central do presente trabalho, justificado pela divergência doutrinária e jurisprudencial sobre o tema, o que se comprova através dos julgados e doutrina contraditórios sobre a matéria.

As correntes doutrinárias que se propuseram a explicar a questão da transmissão do direito à reparação do dano moral têm se pautado, principalmente, na natureza jurídica do direito violado e na consequência dessa violação, o direito ao crédito indenizatório.

2. O DANO MORAL

Desde as épocas mais remotas, o homem busca a reparabilidade do dano moral. Nas codificações mais antigas de que se tem registros há previsões, ainda que primitivas,  acerca da reparação ao dano extrapatrimonial. No Brasil, foi a Constituição Federal de 1988 a primeira lei a prever expressamente o direito à indenização por danos imateriais, embora já houvesse uma corrente doutrinária majoritária nesse sentido.

É preciso ressaltar, no entanto, que apesar da previsão constitucional e do apoio de grande parte dos juristas, num primeiro momento, alguns doutrinadores e tribunais, se mostraram resistentes à ação indenizatória por danos morais, sob os argumentos de que esta demanda ocasionaria o enriquecimento sem causa àqueles que a pleiteassem, além de considerarem imoral a compensação em dinheiro da dor sofrida pela vítima da ofensa. A dificuldade de provar a ocorrência do dano moral e de aferir monetariamente um valor justo para ressarcir o ofendido também eram argumentos bastante utilizados contra a indenização por dano extrapatrimonial.

O dano moral é a lesão que ofende o patrimônio imaterial da pessoa, em contraposição ao dano material. É o prejuízo que atinge a esfera íntima, os bens considerados morais, como a sua honra e liberdade. Silva preleciona que: 

Danos morais são lesões sofridas pelo sujeito físico ou pessoa natural de direito em seu patrimônio ideal, entendendo-se por patrimônio ideal, em contraposição ao patrimônio material, o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor econômico. [...] Danos morais, pois, seriam exemplificativamente, os decorrentes das ofensas à honra, ao decoro, à paz interior de cada qual, às crenças intimas, à liberdade, à vida, à integridade corporal. (1999, p. 1- 2) 

   A proteção aos bens considerados imateriais está garantida constitucionalmente, no art. 5º, V e X, CF, a seguir transcritos: 

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

V –  é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além de indenização por dano material, moral ou à imagem;

X –  são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; (BRASIL, 1988) 

   Mas é de ressaltar que não há critérios objetivos definidos em lei para determinar a ocorrência do dano moral, ensejando, portanto, daquele que vai julgar um cuidado especial, a fim de que a indenização não se transforme em um instrumento de enriquecimento indevido.  

2.1. Prova do dano moral 

Muitos doutrinadores defendem que não é necessário provar o dano moral, por tratar-se de uma lesão ao patrimônio imaterial, que repercute na esfera íntima da pessoa. De fato, esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: 

Já  assentou a Corte que não há que falar em prova do dano moral, mas, sim, na prova do fato que gerou a dor, o sofrimento, sentimentos íntimos que o ensejam. Provado assim o fato, impõe-se a condenação, sob pena de violação do art. 334 do Código de Processo Civil.  (BRASIL, 2002) 

O que deve ser levado em conta é o sentimento médio do cidadão comum, e presumir-se quais atos ilícitos causariam ofensas à  esfera íntima da pessoa. Para Melo (2007), o ordenamento jurídico deve prever que diante de certos procedimentos ilícitos o indivíduo de mediana sensibilidade se sentiria ofendido e agredido em seus valores pessoais. Portanto, qualquer agressão aos bens ditos personalíssimos acarreta a possibilidade de reparação.  
 

2.2. Fundamentos da reparação 

A reparação, em casos de dano moral, consiste no pagamento de um valor em dinheiro, definido judicialmente, com uma função satisfatória compensatória pela lesão sofrida. 

O fundamento da reparabilidade pelo dano moral está em que, a par do patrimônio em sentido técnico, o indivíduo é titular de direitos integrantes de sua personalidade, não podendo conformar-se a ordem jurídica em que sejam impunemente atingidos. (PEREIRA  apud MELO, 2007, p. 19) 

    A indenização por danos morais objetiva compensar o sofrimento a que foi submetido o ofendido. Nas ações que buscam a reparação por danos materiais, a reparação tem o escopo de ressarcir o prejuízo material ou transportar a vítima à situação material semelhante àquela anterior à lesão, desempenhado, assim, uma função de equivalência. Entretanto, o mesmo raciocínio não se aplica à reparação de danos morais:

A reparação dos danos morais não busca reconduzir as partes à situação anterior ao dano. Meta impossível. A sentença visa a deixar claro que a honra, o bom nome e a reputação da vítima restaram lesionadas pela atitude consequente do causador do dano. Busca resgatar o bom conceito de que se valia o ofendido no seio da sociedade. O que interessa, de fato é que a sentença venha a declarar a idoneidade do lesado; proporcionar um reconforto à vítima, e ainda, punir aquele que reagiu, negligentemente, expondo o lesado a toda sorte de dissabores. (ALMEIDA apud MELO, 2007, p. 19) 

    Assim sendo, a reparação por danos extrapatrimoniais, simplesmente tem a função de amenizar o sofrimento do ofendido, pois ao violar sua honra, intimidade, dignidade não há possibilidade de restabelecer a conjuntura em que se encontrava anteriormente. A indenização, nesses casos, não é o preço da ofensa sofrida, mas uma forma de minimizar as consequências dessa ofensa.

2.3. Dano moral decorrente das relações de trabalho 

Uma das particularidades do Direito do Trabalho é seu caráter protetivo em relação aos empregados. E, em que pese esse ramo do direito ter como objetivo garantir o respeito aos direitos dos trabalhadores, até  a promulgação da Carta Constitucional de 1988, a reparação do dano moral no campo do Direito Laboral não era admitida, vez que não havia preceito legislativo específico sobre a matéria. A justificativa para a ausência da mencionada regulamentação era o fato de que o dano moral não se incluía no rol das matérias trabalhistas. Hoje, porém, não há mais dúvidas quanto ao cabimento da indenização por danos extrapatrimoniais decorrentes das relações de trabalho. Nessa perspectiva: 

A reparação dos danos morais trabalhistas compatibiliza-se com a finalidade maior do Direito do Trabalho, na medida em que promove o respeito à  dignidade do trabalhador, mediante fixação de um remedium iuris capaz de garantir à sociedade a certeza na efetivação de um mínimo de proteção aos direitos humanos mais elementares do trabalhador. (BASTOS apud PAIVA, 2008, p. 86) 

    Importa ressaltar que é no campo das relações entre empregado e empregador que há maior probabilidade de acontecer uma ofensa à honra, liberdade ou imagem devido à subordinação daqueles em relação a esses. Nesse sentido, se conclui que: 

Se em algum âmbito de Direito o conceito de dano moral pode ter alguma aplicação, é precisamente no Direito do Trabalho. O Direito do Trabalho aparece como o ramo jurídico em cujo seio o estudo do Dano Moral deveria alcançar o máximo desenvolvimento, já que, nesse direito a proteção da personalidade adquire especial dimensão, tanto por sua primordial importância – dado o caráter pessoal e duradouro da relação, como por ter sido objeto de uma garantia jurídica especial. (VILLARD apud MELO, 2007, p. 22)  

    O dano moral decorrente das relações de trabalho é "o agravo ou o constrangimento moral infligido quer ao empregado, quer ao empregador, mediante violação a direitos ínsitos à personalidade, como conseqüência da relação de emprego." (MELO, 2007, p. 21).

    A partir da análise do conceito supra se conclui que podem ser vítimas de dano moral na relação empregatícia tanto o trabalhador quanto o empregador. Nesse sentido tem destaque a Consolidação das Leis do Trabalho que dispõe sobre a possibilidade de ocorrência de dano moral e sua reparação, pelo empregado ou pelo empregador, em decorrência da ruptura do contrato de trabalho pela prática de ato lesivo da honra ou da boa fama (MELO, 2007).

3.  TITULARES DA AÇÃO INDENIZATÓRIA 

3.1. Partes 

De modo geral, se conceitua parte como aquele que pleiteia e contra quem se pleiteia uma demanda jurisdicional. Pinto (2001, p. 171), citando Chiovenda estabelece um conceito estrito de parte: "Parte é aquele que demanda em seu nome próprio (ou em cujo nome é demandada) a atuação de uma vontade da lei, e aquele em face de quem esta atuação é demandada". Segundo o conceito de Areosa: 

Partes são os sujeitos do contraditório instituído diante do juiz, sendo os interessados da relação processual, haja vista a imparcialidade do juiz, pessoa totalmente desinteressada no resultado da demanda. As partes são os destinatários dos atos jurisdicionais, verdadeiros sujeitos passivos da atividade diretiva do juiz, mas também são sujeitos de cooperação deste mesmo juiz, na medida em que ambos possuem o mesmo objetivo, qual seja, induzir o juiz a lhe dar uma solução favorável. (1999, p. 184) 

A doutrina tradicional admite quatro formas para se adquirir qualidade de parte: pela demanda, pela citação, pela sucessão e pela intervenção voluntária. No presente estudo nos interessa, com relevância, a sucessão como forma de aquisição da condição de parte, além, evidentemente, a aquisição da condição de parte através da propositura da demanda.

    Importa ressaltar que no processo do trabalho, as partes recebem nomes diferentes daqueles utilizados no processo civil. Nos dissídios individuais, o autor é reclamante e o réu é reclamado. Nos inquéritos para apuração de faltas graves, o impetrante é requerente e o impetrado é requerido. Nos dissídios coletivos, o autor é  suscitante e o réu é suscitado.

A partir do momento em que a pessoa adquire a personalidade jurídica passa a ser titular de direitos e deveres. Isso, contudo, não significa que está habilitada para exercê-los indiscriminadamente. Para que o sujeito possa efetivamente gozar dessa situação deve ter capacidade. "A capacidade em direito é a aptidão pela ordem jurídica para o gozo e exercício de um direito por seu titular" (MARTINS, 2008, p. 178).

Com uma acepção mais completa, Nascimento (2002, p. 318), em alusão a Monteiro, define a capacidade como sendo "a aptidão para ser sujeito de direitos e obrigações e exercer por si ou por outrem os atos da vida civil. É um elemento da personalidade. Exprime poderes ou faculdades; personalidade é a resultante desses poderes.". 

Assim é que os relativamente e absolutamente incapazes podem ser partes, pois tem capacidade para tal. O que não lhes é permitido é  o ingresso em juízo, por carecerem de capacidade processual. Nesse sentido, importa distinguir a capacidade civil da capacidade no processo do trabalho.

    No direito civil são relativamente incapazes os menores de dezesseis anos; os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos; e os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade. Os relativamente incapazes são os maiores de dezesseis e os menores de dezoito anos; os ébrios habituais; os viciados em tóxicos; e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido; os excepcionais sem o desenvolvimento mental completo; e os pródigos.

   No processo do trabalho, o menor de dezesseis anos é absolutamente incapaz, pois é proibido de trabalhar, salvo a partir dos quatorze anos, na condição de menor aprendiz. Dos dezesseis aos dezoito é  considerado relativamente incapaz, pois apesar de poder assinar recibos de pagamento, não tem autonomia para firmar o termo de rescisão do contrato de trabalho, o que exige a assistência de representante legal. Somente a partir da maioridade civil17, dezoito anos, é que o trabalhador adquire a capacidade plena, inclusive para a prática de atos processuais, tais como ingressar em juízo e assinar o termo de rescisão contratual.

É necessário lembrar que não somente a pessoa natural ou pessoa jurídica são titulares de direitos e deveres. Nossa lei processual conferiu a alguns entes despersonalizados a capacidade de figurarem em um processo como partes. É o caso da massa falida, da herança jacente, da herança vacante, do espólio, das sociedades irregulares e do condomínio imobiliário, conforme art. 12, incs. III, IV, V, VII e IX, do Código de Processo Civil.Portanto, tanto as pessoas naturais e jurídicas, quanto os entes despersonalizados são capazes de figurarem em um processo como parte.   
 

3.2. Espécies de representação 

Como há casos em que a pessoa, embora tenha a capacidade de direito, não tem a capacidade processual, surgiu o instituto da representação, em que uma pessoa age em nome de outrem, substituindo-a e manifestando a vontade do representado. 

Representar significa tornar presente, estar no lugar de alguém, desempenhar um papel que se lhe é confiado. Representante é exatamente aquele que surge no lugar de quem não pode desempenhar. Representação é o ato ou a ação, mas também a qualidade atribuída para o fim de agir no lugar de outrem. (NASCIMENTO, 2002, p. 320). 

    Portanto, o representante é um terceiro, distinto do titular do direito, que deve preencher todos os requisitos determinados legalmente para que possa exercer a representação.

3.3.  Legitimidade ordinária e legitimidade extraordinária

A doutrina entende que a legitimação ordinária se configura quando há coincidência entre os sujeitos da relação processual e os sujeitos da relação material, pois o natural é que as partes no processo venham a ser aquelas que desempenham esse papel na demanda. Todavia, conforme menção anterior, há situações em que a capacidade de direito sofre restrições no campo processual, como no caso em que o sujeito é capaz de estar em juízo, mas faltam a ele alguns requisitos para exercer pessoalmente os atos processuais. 

    A legitimidade extraordinária configura uma capacidade excepcional atribuída legalmente a uma pessoa para que esta ajuíze ação, em nome próprio, na defesa de direito alheio.  O Código de Processo Civil, art. 6º (BRASIL, 1973) preceitua que "ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei". Assim, é que os sindicatos são legitimados extraordinariamente para defender interesses de seus associados, tal qual o Ministério Público goza da mesma faculdade nas ações civis públicas. "A legitimidade seria, então, uma limitação à capacidade de estar em juízo." (AREOSA, 1999, p. 189). 

Em regra, a legitimação extraordinária é dada a quem pode deduzir em juízo posições substanciais de outros e provocar efeitos jurisdicionais sobre elas, não excluindo do processo o sujeito titular daquela posição e destinatário daqueles efeitos, que o envolve como "litisconsorte necessário". (FAZZALARI, 2006. p. 402) 

    A legitimação extraordinária é exercida através da substituição processual, estando configurada quando um sujeito participa de um processo na qualidade de parte, mas não é o titular do direito pretendido. Acrescenta ainda Fazzalari (2006, p. 402), que "somente em sentido impróprio se pode falar de 'substituição processual' como sinônimo de legitimação extraordinária: no sentido de que seu titular pode realizar atividades processuais no lugar do destinatário dos efeitos", pois, o titular in casu é parte.

Nessa perspectiva, a verdadeira substituição processual ocorre quando a "legitimação extraordinária pode ser exercida em lugar da ordinária (do destinatário dos efeitos do provimento), sem a participação do destinatário no processo" (FAZZALARI, 2006, p. 403).  É  pertinente, para uma melhor compreensão do estudo, uma breve análise sobre os institutos da substituição processual e da sucessão processual. 
Consiste a substituição processual numa legitimação extraordinária, autorizada pela lei, para que alguém pleiteie, em nome próprio, direito alheio em processo judicial". (MARTINS, 2008, p. 199).

   O Código de Processo Civil dispõe em seu art. 6º, já transcrito em passagem precedente, que ninguém pode pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei. Portanto, as situações de substituição processual caracterizam uma legitimação anômala ad causam, uma vez que o direito de agir não é exercido pelo titular do direito material, e sim pelo substituto processual, que detem o direito de ação ou de defesa.  

[...] o substituto processual encontra sua legitimação para defender, em nome próprio, direito de outrem, em juízo, porque entre ele e o substituído existe uma relação ou uma situação jurídica de caráter substancial, pela qual, através do direito do substituído, vem o substituto a satisfazer interesse que lhe é próprio. (PINTO, 2001, p. 181-182). 

    Portanto, mesmo pleiteando direito alheio, o substituto age em nome próprio. Logo, atua defendendo seus próprios interesses. Assim, o substituto é parte do processo, integrante da relação processual. A partir dessa conclusão é plausível enfatizar que a substituição não se confunde com a representação, principalmente porque o representante não adquire a condição de parte do processo e atua em nome alheio representando direito alheio. Também não se confundem substituição e sucessão processual, tendo em vista que o sucessor pleiteia direito próprio e não de outrem.

3.3.1. Sucessão processual 

A sucessão processual é também uma forma de substituição de partes no processo. Porém, o sucessor, como consequência da sucessão, ingressa em juízo para defender interesse próprio, pois é o titular do direito objeto da demanda. Ocorre, portanto, uma alteração na titularidade do direito em litígio.  

Quando uma das partes desaparece (morte da pessoa física; ou fusão ou incorporação da sociedade, que seja "parte" com outra) enquanto está  em curso o processo, ele sofre interrupção, mas pode prosseguir com os sujeitos que tomam o lugar, no plano substancial, do sujeito desaparecido (na sucessão mortis causa se trata do herdeiro; na fusão da sociedade, da sociedade que dela resulta). Nesse caso à sucessão nas posições substanciais corresponde a "sucessão no processo", e a legitimação do sucessor no processo se funda também nos efeitos substanciais que a pronúncia a ser emanada é destinada a desenvolver no patrimônio dos sucessores. (FAZZALARI, 2006, p. 404)

    Pode ocorrer nos dois pólos processuais, tanto em relação ao empregado quanto ao empregador. A sucessão pode ocorrer inter vivos ou causa mortis. Nos casos de sucessão decorrente da morte de um dos litigantes, o processo é suspenso e a sucessão, necessariamente, deve ocorrer, pois não há aí necessidade de manifestação de vontade da parte contrária, visto que a sucessão processual independe desse consentimento. Dispõe o Código de Processo Civel que: 

Art. 43 - Ocorrendo a morte de qualquer das partes, dar-se-á a substituição pelo seu espólio ou pelos seus sucessores, observado o disposto no Art. 265 Suspende-se o processo:

I - pela morte ou perda da capacidade processual de qualquer das partes, de seu representante legal ou de seu procurador; (BRASIL, 1943)

Art. 1.055 - A habilitação tem lugar quando, por falecimento de qualquer das partes, os interessados houverem de suceder-lhe no processo. (BRASIL, 1943)

Art. 1.056 - A habilitação pode ser requerida:

I - pela parte, em relação aos sucessores do falecido;

II - pelos sucessores do falecido, em relação à parte. (BRASIL, 1943) 

  Em matéria processual trabalhista, a sucessão inter vivos22 , geralmente, é observada na "sucessão de empresas" em que vigora o princípio da continuidade da empresa. Reza o art. 448 da CLT (BRASIL, 1943) que "a mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalhos dos respectivos empregados".

    Em relação aos empregados, é mais comum que a sucessão seja é causa mortis. Assim dispõe o art. 43 do Código de Processo Civil, cuja redação afirma que em caso de falecimento do reclamante, os herdeiros, geralmente representados pelo espólio, assumirão o pólo ativo da ação.

    Quando o empregado não deixa bens, não havendo, por conseguinte, processo de inventário, se admite que a viúva e os filhos ingressem como sucessores, bastando para tanto, a apresentação da certidão de casamento, certidão de nascimento, ou certidão de dependentes emitida pelo INSS. 

3.3.2. Legitimidade ativa para agir no caso de dano moral decorrente do acidente de trabalho

   Paiva (2008, p. 92) ressalta que o procedimento da ação reparatória ao dano extrapatrimonial na seara trabalhista segue os preceitos estabelecidos pelo Código Civil e pelo Código de Processo Civil, aos quais recorre subsidiariamente. Assim, para ingressar em juízo é necessário ser parte legítima para tanto, além, da coexistência de outros dois fatores, a possibilidade jurídica do pedido e o interesse de agir.

    No caso do dano moral especificamente, não há o que se questionar quanto à legitimidade da própria vítima para impetrar a ação indenizatória. Os problemas e entendimentos divergentes, quanto à legitimidade para propositura dessa ação, surgem quando o empregado vem a falecer em decorrência de acidente do trabalho.

    De acordo com o Código de Processo Civil, art. 1056 (BRASIL, 2002), "a habilitação pode ser requerida pela parte, em relação aos sucessores do falecido e pelos sucessores do falecido, em relação à parte". Destarte, são legitimados para requerer a habilitação os sucessores ou dependentes do empregado, e também a parte contrária.

    Nesse contexto, é indispensável a aclaração que se segue sobre os possíveis legitimados no caso de sucessão processual devido à  morte do trabalhador, quais sejam o espólio e seus herdeiros (sucessores), pois dispõe o art. 43 do Código de Processo Civil (BRASIL, 943) que: "ocorrendo a morte de qualquer das partes, dar-se-á a substituição pelo seu espólio ou pelos seus sucessores". 

    A partir da análise dos dispositivos do Código de Processo Civil, é  possível conceituar o espólio como uma entidade sem personalidade jurídica, representada, judicial e extrajudicialmente, pelo inventariante, ou, antes dele, pelo administrador provisório (arts. 12, Ve § 1º, 985 e 986, CPC). É a massa patrimonial, que pertenceu a pessoa falecida, e que será distribuída aos herdeiros ou legatários. É, portanto, o conjunto de bens, direitos e obrigações de uma pessoa após sua morte, e enquanto não distribuídos para os herdeiros. Já os herdeiros são aqueles chamados a suceder o de cujus na totalidade ou fração da herança.

    No presente estudo, é fundamental, também, tecer breves considerações sobre a os lesados diretos e indiretos, e consequentemente sobre o dano reflexo.   

Quando o ofendido comparece, pessoalmente, em juízo para reclamar reparação do dano moral que ele mesmo suportou em sua honra e dignidade, de forma direta e imediata, não há dúvida alguma sobre sua legitimidade ad causam. Quando, todavia, não é o ofendido direto, mas terceiros que se julgam reflexamente ofendidos em sua dignidade, pela lesão imposta a outra pessoa, torna-se imperioso limitar o campo de repercussão da responsabilidade civil, visto que poderia criar uma cadeia infinita ou indeterminada de possíveis pretendentes à reparação do dano moral, o que não corresponde, evidentemente, aos objetivos do remédio jurídico em tela. (FERRARI, 2008, p. 72) 

    Importa salientar que o procedimento da ação indenizatória por danos morais respeita as regras processuais civis, devendo o autor, na petição inicial, "formular pedido certo e determinado relativo aos danos morais, por força do disposto no art. 286 do Código de Processo Civil" (PAIVA, 2008, p. 130). Entretanto, tem-se admitido pedido genérico, sem a indicação do quantum indenizatório pretendido.  Nessa perspectiva, Paiva (2008, p. 130) afirma que "a reparação por dano moral decorrente da relação laboral deve ser postulada por meio de uma ação trabalhista, [...], podendo, inclusive o ofendido formular tal pedido de forma cumulativa".

    Há  ainda outros aspectos objeto de controvérsias, mas nesse momento vamos nos ater à questão dos lesados direta e indiretamente por danos morais e a legitimidade ativa em cada caso. 

3.3.3. Dano reflexo ou dano por ricochete: lesados indiretos 

Tanto nos casos de dano moral quanto material, se admite a possibilidade de existência do dano direto e do dano indireto, também chamado de dano reflexo ou dano por ricochete. De tal modo, "enquanto o dano direto se esgota na ofensa direta à própria vítima, o dano reflexo resulta, no mais das vezes, não diretamente do ilícito perpetrado, mas como decorrência do mesmo". (MELO, 2007, p. 36).

    "O lesado indireto é aquele que, não sendo a vítima direta do fato lesivo, vem a sofrer com esse evento por experimentar um menoscabo ou uma lesão a um bem jurídico patrimonial ou moral em razão de sua relação com o lesado direto". (DINIZ, 2004, p. 86). Portanto, o lesado indireto é aquele a quem os efeitos da lesão ao bem jurídico alheio atingem, enquanto o lesado direto é o titular do bem jurídico imediatamente lesado.

    O dano por ricochete caracteriza-se quando uma pessoa sofre reflexos de uma ofensa causada a outrem, tendo em vista que o dano causado a uma pessoa pode causar reflexos materiais e morais em outras, que não a vítima direta da agressão. "Há situações nas quais é  possível identificar-se o dano reflexo, como fatores supervenientes a agravar o montante do prejuízo resultante do dano direto". (DINIZ apud MELO, 2007, p. 37).

    Nesse sentido, "no tocante à questão dos danos morais, a situação fica mais clara, porquanto é perfeitamente compreensível que a agressão perpetrada contra uma determinada pessoa possa vir a repercutir no íntimo de uma outra ou mesmo de uma coletividade". (MELO, 2007, p. 37).

    Geralmente, os casos de danos reflexos observados relacionados ao direito do trabalho dizem respeito à morte do trabalhador em decorrência de acidente de trabalho e à incapacidade absoluta ou temporária. Corroborando com esse entendimento, pertinente ao dano reflexo na esfera das relações trabalhistas, é possível concluir que: 

O dano reflexo, na seara trabalhista, não decorre unicamente do evento lesivo morte. Pode também ocorrer em razão de dano estético deformante ou incapacitante. Cabe esclarecer que, embora a legitimidade de propositura da ação de indenização por dano estético seja excluída da vítima, a regra comporta exceção para contemplar a possibilidade de os parentes próximos sofrerem o dano moral dito reflexo ou a ricochete, decorrente de uma lesão estética imposta a um ente querido. Situações haverá em que o dano estético causado a vítima repercutirá no seio familiar. Contudo, o que se estará buscando indenizar não será o dano estético, mas sim o dano moral, que, neste caso, será reflexo ou em ricochete. (MELO, 2007, p. 38) 

    Assim, quando uma ofensa contra uma pessoa tem repercussão na esfera íntima de um terceiro, este último tem legitimidade para propor uma ação reparatória, pois nesses casos, "o terceiro aí legitimado teria sido atingido em sua órbita própria, por fato danoso perpetrado contra outra pessoa, caracterizando-se o dano moral reflexo ou indireto, também chamado de dano por ricochete" (MELO, 2007, p. 38).

O terceiro atingido de forma reflexa pela lesão causada diretamente à  vítima, deve ajuizar ação indenizatória em nome próprio, pois está  buscando a reparação ao dano que sofreu. Não se trata, portanto de substituição processual. 

Registre-se, ainda, que no caso de o acidentado falecer por decorrência de acidente ou doença ocupacional, poderão ingressar com a ação de dano moral todos aqueles que mantinham laço afetivo com o de cujus. Repare que aqui os demandantes agirão em nome próprio e não em substituição à dor e angústia que originaram o dano moral, neste caso, não é pela incapacidade laborativa do acidentado, mas pela perda de um ente querido. São legítimos para pleitearem esta espécie de dano moral não aqueles "a quem o morto devia alimentos" (art. 948, II, CC), mas todos aqueles que conviviam com o falecido e com ele mantinham intensa afeição. (FERRARI, 2008, p. 74) 

      Ainda nessa perspectiva, Ferrari assevera que quando a vítima vem a falecer por conta de acidente de trabalho ou doença ocupacional: 

São legitimados, como autores, para pleitear o pagamento da indenização pelos danos sofridos em razão da morte do ente querido aquelas pessoas que com ela conviviam mediante estreito vínculo de afetividade, amor e grande vínculo de amizade. Podem ser herdeiros ou não. O caso não é  de hereditariedade, pois a indenização buscada em nome próprio, pelo dano indireto causado à pessoa que sofreu o dano moral pela morte da vítima. A indenização, por isso, não integra o espólio da vítima. (2008, p. 74)    

    Destarte, se conclui que todos aqueles que mantinham relações afetivas com o de cujus poderão ajuizar ação de indenização por dano moral. Mas é preciso ressalvar que nesses casos peculiares, de danos que os atingiram indiretamente, os demandantes agirão em nome próprio e não em substituição à vítima direta.  

4.  Transmissibilidade mortis causa do direito à indenização por dano moral

   Há  três correntes doutrinárias sobre a possibilidade ou não de transmissibilidade mortis causa do direito à indenização por dano moral, que podem ser resumidas da seguinte forma: "a) intransmissibilidade, pelo menos para alguns fatos geradores do dever de indenizar; b) transmissibilidade, se por algum meio o titular do direito à indenização manifestou vontade de exercer a pretensão [...]; c) transmissibilidade em princípio, só sendo transmissível a pretensão lex specialis". (MIRANDA apud MARTINS, 2007).

    A primeira, mais restritiva, considera a reparação do dano moral um direito personalíssimo, indisponível, e, portanto, intransmissível, sendo somente possível a propositura, ou prosseguimento, da demanda reparatória pelo próprio ofendido. A segunda corrente doutrinária admite a substituição processual se a vítima direta ajuizou ação indenizatória, ou se, ao menos, manifestou concretamente o desejo de reparação da ofensa moral. E a terceira teoria é totalmente permissiva, admitindo, irrestritamente, a substituição nos casos de morte do ofendido.    
 O dano moral atinge a honra da pessoa, que é um direito da personalidade, e como tal, é intransmissível, irrenunciável, inalienável e imprescritível. São direitos destinados a proteger a dignidade humana. O art. 11 do Código Civil (BRASIL, 2002) dispõe que "com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária".

    A partir da análise do dispositivo supra, se conclui que é a vítima que sofreu o dano moral, quem tem o direito de pleitear ação reparatória. Um dos principais defensores dessa corrente é Wilson Melo da Silva. Para ele o direito à indenização por dano moral não se transmite com a herança, tendo em vista ser um direito personalíssimo, consequentemente intransmissível.  

Os bens morais são inerentes à pessoa, incapazes, por isso de subsistir sozinhos. Desaparecem com o próprio indivíduo. Podem os terceiros compartilhar da minha dor sentindo, eles próprios, por eles mesmos, as mesmas angústias que eu. O que não se concebe, porém, é que as minhas dores, as minhas angústias, possam ser transferidas de mim para o terceiro. Isto seria atentatório da própria natureza das coisas e, materialmente, impossível. Não existe, pois, o jus hereditaris relativamente aos danos morais, tal como acontece com os danos puramente patrimoniais. A personalidade morre com o indivíduo, arrastando atrás de si todo o seu patrimônio. Só os bens materiais sobrevivem ao seu titular. (SILVA, 1999, p. 648-649). 

    Tal corrente doutrinária embasa sua tese no já transcrito art. 11 do Código Civil, não admitindo, portanto, que os herdeiros ajuízem ação reparatória por dano moral sofrido pelo de cujus, pois "dado seu caráter eminentemente subjetivo, jamais se transferiria ativamente a terceiros, seja pela sucessão comum, seja pelo jus haereditatis" (MELO apud STOCO, 1997, p. 526). Para os defensores dessa teoria, a pessoa que sofreu danos morais é a única legitimada para pleitear judicialmente o ressarcimento. Assim sendo: 

[...] é  a vítima, aquela que teve seu direito da personalidade violado, quem tem o direito de reclamar em juízo indenização por danos morais. Veja-se que essa foi a intenção do legislador ao determinar que a legitimidade para pleitear indenização por danos causados à  sua personalidade é o próprio ofendido, vítima do evento danoso. (PAIVA, 2008, p. 129) 

    O Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, em julgamento de recurso ordinário, destaca o caráter personalíssimo do dano moral, prelecionando sua extinção com a morte da vítima: 

DANO MORAL. AÇÃO PROPOSTA PELO ESPÓLIO. DIREITO PERSONALÍSSIMO DO DE CUJUS.   O dano moral é direito personalíssimo, indisponível em tese, intrínseco a determinada pessoa, cujo exercício exclusivamente lhe compete, e tem por objeto a própria pessoa ou é concedido em virtude de algumas de suas específicas condições. Em certos casos, pode ser auto-sacrificado, porque sua proteção tem por escopo a dignidade, o respeito e a consideração da pessoa humana. Por isso a doutrina o diz direito absoluto. Direitos personalíssimos se extinguem com a morte da pessoa natural, quando não exercidos pelo seu único titular, não se transmitem, e não atinem com a herança que é resultante da arrecadação de bens corpóreos e de feição economicamente apropriada do de cujus. (BRASIL, TRT 3ª Reg., 2004) 

    Tal qual Wilson Melo da Silva, Rui Stoco defende a impossibilidade de transmissibilidade do direito à reparação por dano moral, acrescentando ainda que mesmo nos casos em que a vítima já havia ingressado em juízo requerendo a reparação, é inadmissível a sucessão processual. É nesse sentido o trecho de sua doutrina em destaque: 

Os danos morais dizem respeito ao foro íntimo do lesado, pois os bens morais são inerentes à pessoa, incapazes, por isso, de subsistir sozinho. Seu patrimônio ideal é marcadamente individual, e seu campo de incidência, o mundo interior de cada um de nós, de modo que desaparece com o próprio indivíduo. (STOCO, 1997, p. 527) 

Depreende-se, destarte e consoante assertivas anteriores, que o direito de pleitear judicialmente indenização por danos morais não se transmite, não sendo permitido nem aos herdeiros diretos do ofendido. Especificamente, o espólio, conjunto de bens que integram o patrimônio do de cujus, não possui legitimidade para representar o pólo ativo das demandas indenizatórias de dano moral.

    O espólio somente teria legitimidade para as causas relacionadas ao patrimônio material do ofendido. Aqueles que se sentem atingidos com o falecimento da vítima podem ajuizar ação indenizatória, mas em nome próprio, buscando a reparação da sua dor, conseqüência indireta do infortúnio trabalhista, configurando-se aí o dano reflexo ou por ricochete.

    Portanto, a corrente doutrinária, em análise, consigna ser a ação de indenização por danos morais personalíssima, não se admitindo que os herdeiros e sucessores, geralmente representados pelo espólio, tenham legitimidade ativa ad causam.   
 A segunda corrente doutrinária entende que a transmissibilidade do direito à indenização por dano moral é condicionada à manifestação do ofendido em exercer a pretensão indenizatória, fato que se caracteriza através da propositura da ação pela própria vítima quando vivo, ou por meio de qualquer ato que demonstre sua pretensão, como a mera constituição de advogado. Assim é que alguns autores aprovam a admissibilidade da sucessão, condicionada à exteriorização da vontade do ofendido em vida em casos de indenização por dano moral.  

A rigor, o dano é intuiti personae, ou seja, é próprio da pessoa da vítima, sendo que tal dor não se transmite aos herdeiros. Contudo, nos termos do art. 943 do Código Civil, "o direito de exigir reparação e a obrigação de prestá-la transmitem-se com a herança". Logo, se o acidentado já havia iniciado o processo judicial e veio a falecer no seu decurso, cabem aos herdeiros prosseguirem no pólo ativo da demanda, nos mesmos moldes que acontece com qualquer outra ação trabalhista. (Dallegrave Neto apud DINIZ, 2008, p. 75) 

    Se a vítima não manifesta a pretensão de reparação por eventuais danos morais sofridos, não há que se falar em transmissão do mencionado direito aos sucessores. De acordo com a corrente da transmissibilidade condicionada, os sucessores do ofendido somente terão legitimidade para propor a ação indenizatória, quando a vítima houver demonstrado ter sentido a ofensa moral. Caso não haja exteriorização da vontade em pleitear a ação indenizatória ou mesmo o ajuizamento pela própria vítima, não há que se falar em transmissão do direito aos herdeiros, porquanto o direito à reparação não chegou a integrar o patrimônio do de cujus. Em julgado recente, o TST reiterou esse entendimento: 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. 1. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. DIREITO PERSONALÍSSIMO. PROCESSO EM CURSO. SUCESSÃO. O falecimento do autor no curso do processo em que busca a reparação por dano moral não impede a continuação da demanda por intermédio de seus sucessores, vez o direito reconhecido já ganhou contornos patrimoniais. (BRASIL, TST, 2007) 

Segundo se depreende da análise dos julgados, nos casos em que a vítima do dano moral falece após a propositura da ação reparatória, não há dúvidas quanto à admissibilidade da transmissão aos herdeiros do direito de exigir a reparação.  

A terceira corrente da transmissibilidade, que afirma ser possível a transmissão da pretensão à reparação por danos morais, consigna que o que está se transmitindo, na verdade, é o direito à indenização, configurando-se nesses casos uma transmissibilidade incondicionada. Segundo os precursores dessa corrente doutrinária "embora haja divergência na doutrina, [...] o direito à reparação por danos morais é transmissível causa mortis, já que a reparação é uma obrigação pecuniária ou in natura." (SCHIAVI apud FERRARI, 2008, p. 74).

    Cavalieri Filho, defensor dessa tese, acredita que a corrente que sustenta a intransmissibilidade do dano moral é equivocada, uma vez que, para ele: 

O que se transmite aos sucessores da vítima não é o dano material ou moral por ela sofrido, mas sim o direito à indenização correspondente. O dano moral, que decorre de uma agressão a bens integrantes da personalidade, só a vítima pode sofrer, enquanto viva, porquanto a personalidade se extingue com a morte. O direito à indenização correspondente, porém, não se extingue com a morte. Uma vez perpetrado o dano, nasce a obrigação de indenizar para o causador do dano e o direito à reparação para o ofendido. Este último, que tem natureza patrimonial, se transmite aos herdeiros da vítima. (CAVALIERI apud MARTINS, 2007) 

    A corrente da transmissibilidade se fundamenta no art. 943 do Código Civil (BRASIL, 2002) in verbis: "o direito de exigir reparação e a obrigação de prestá-la transmitem-se com a herança". Desse modo, "o direito à indenização constitui um crédito que integra o patrimônio do ofendido e, no caso de óbito, passa a fazer parte da universalidade de bens que compõe a herança" (MARTINS, 2008).  

    Essa corrente também utiliza como base legislativa o art. 12 do Código Civil(BRASIL, 2002) que preceitua: 

Art. 12. Pode-se exigir que cesse ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.

Parágrafo único. Em se tratando de morto, terá legitimação para requerer a medida prevista neste artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral ata o quarto grau. 

Ainda, defendendo a teoria da transmissibilidade, Dias (1997, p. 802), é enfático ao assegurar que "a ação de indenização se transmite como qualquer outra ação ou direito aos sucessores da vítima. Não se distingue, tampouco se a ação se funda e dano moral ou patrimonial". Não há deste modo, em sua opinião, qualquer obstáculo à transmissibilidade da ação de reparação.

    O Tribunal Superior do Trabalho tem se mostrado nos últimos anos partidário dessa corrente, de forma a consagrar o entendimento particular dessa doutrina em vários julgados, conforme podemos comprovar abaixo: 

RECURSO DE REVISTA. ILEGITIMIDADE DA RECLAMANTE E COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. AÇÃO AJUIZADA PELA VIÚVA NA CONDIÇÃO DE HERDEIRA.  Na teoria da transmissibilidade, os dependentes da vítima podem propor ação de reparação, por não se tratar de direito personalíssimo do de cujus,  visto que a ação de indenização é de natureza patrimonial. (BRASIL, TST, 2008) 

Deste modo, para os defensores desta última corrente teórica, é incontroversa a transmissão aos sucessores da pretensão à indenização por danos morais, visto que a indenização constituirá um credito em dinheiro, que fazia parte do seu patrimônio. O que se transmite, hereditariamente, é o direito de acionar o responsável pela lesão extrapatrimonial.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da exposição dos dados coletados durante a pesquisa, doutrina e jurisprudência de diversos tribunais brasileiros, bem como as respectivas análises, foi possível perceber que as três hipóteses sobre a matéria estão bem difundidas. Embora não ainda haja um consenso sobre o assunto.

Nos últimos tem se observado uma tendência dos tribunais, em especial o Tribunal Superior do Trabalho, em se admitir a transmissibilidade do direito à indenização por danos morais incondicionalmente aos sucessores. Nos parece ser essa a orientação mais compatível com a legislação vigente, ressaltando-se o fato de que tal estudo comporta reflexões mais aprofundadas.

Por hora, é preciso lembrar que todos aqueles que tenham sua honra atingida, indiretamente pelo infortúnio trabalhista, poderão ajuizar ação indenização, alegando para tanto o dano reflexo ou dano em ricochete.  Nesse último caso, os lesados reflexamente demandam direitos próprios, não restando configurada a sucessão.

   Isso se deve ao fato de que os herdeiros e aquelas pessoas que mantinham laços afetivos com a vítima podem pleitear indenização sob a alegação de dano moral reflexo.  A pretensão é nomine proprio, e não proveniente de herança.

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Autor: Karolyne Mascarenhas Araujo


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