Igreja Católica e religiões afro-brasileiras



Na Bahia, em mais de 250 anos e pela primeira vez "um padre abençoou o cortejo formado em sua maioria por adeptos do candomblé". Essa benção se deu na tradicional lavagem do Bonfim, em Salvador, no dia 15/01/2009.

Algumas pessoas podem pensar: "Um sacerdote do Deus Altíssimo abençoando macumbeiros! Se isto não for um típico caso de sincretismo que ameaça a verdade da Fé Cristã, não sei mais o que é". Entretanto, três erros procedem desse pensamento:

1.A idéia de que as religiões afro-brasileiras não se pautam por uma moralidade ou ética humanista e justa;

2.A falta de conhecimento de que estas religiões são estruturadas por princípios de respeito aos seres humanos, a ancestralidade afro-brasileira e a natureza;

3.A falta de conhecimento de que seus praticantes preservam e recriam a medicina popular baseada na fitoterapia ("tratamento de prevenção de doenças através do uso de plantas").

O desconhecimento leva a chamar qualquer culto afro-brasileiro de macumba.

Para esclarecer essa questão, vejamos o que se entende por macumba: "Nome que os leigos usam para os cultos que empregam a magia negra e que os adeptos de Umbanda de Linha branca chamam de Quimbanda. Nome genérico que os leigos usam para designar cultos afro-brasileiros. Sinônimo, para os leigos, de feitiçaria e de "despacho" de rua" (CACCIATORE, 1988, 166).

Nesse texto, deve ser entendido por leigo aquele que não tem conhecimento do assunto.

Agora, vejamos o sentido original da palavra: "Antigo instrumento musical de origem africana, usado outrora nos terreiros afro-brasileiros. Era um tubo de taquara, com cortes transversais, onde eram raspadas duas varetas. O instrumento era seguro entre a parede e a barriga do tocador. Semelhante ao canzá. Termo genérico para os cultos afro-brasileiros derivados do nagô, mas modificados por influências angola-congo e ameríndias, católicas, espíritas e ocultistas que se desenvolveram, a princípio, no Rio de Janeiro e talvez em Minas Gerais" (CACCIATORE, 1988, 166).

De fato, é importante que haja uma relação dialógica entre os católicos e os praticantes das religiões afro-brasileiras, que gostam de ser chamados de "Povo de Santo". Para tanto, as religiões afro-brasileiras precisam ser respeitadas em sua essência e identidade através de um ato contínuo de desmistificação e valorização das diferenças culturais que lhes são específicas.

Esse diálogo, num país tão multicultural como é o Brasil, é algo necessário e inadiável para a superação de preconceitos e de falta de conhecimento sobre a ancestralidade afro-brasileira.

É louvável que, mesmo com a demora de dois séculos, a Igreja Católica esteja acenando decisivamente para uma tolerância ao ritual da lavagem da escadaria da Igreja do Senhor do Bonfim.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

CACCIATORE, Olga Gudolle. Dicionário de cultos afro-brasileiros. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1977


Autor: Felipe Figueira


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