DANO MORAL E ASSÉDIO MORAL



1.1 DANO MORAL

Além do direito a dignidade da pessoa humana estar protegido na Carta Magna como um dos princípios fundamentais, o legislador pátrio teve a preocupação de punir aquele que viesse a transgredir esse princípio e a indenizar aquele que teve sua dignidade transgredida.

No título II, que se refere aos direitos e garantias fundamentais, o legislador traz a possibilidade de ressarcimento por dano moral estabelecido no art. 5º, incisos V e X, que dizem o seguinte:

V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem.

X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

Observa-se, nesse sentido, que o dano elucidado na Constituição Federal e seguido pela doutrina tem como fundamento básico o prejuízo decorrente da violação do direito a dignidade. Ou seja, para que possa vim a ocorrer uma indenização faz-se necessário que a vítima tenha sofrido um detrimento em seu bem jurídico.

Dessa forma, encontram-se inúmeras definições para o dano moral, sendo uma delas: "O dano moral vem a ser a lesão de interesses não patrimoniais de pessoa física ou jurídica, provocada pelo fato lesivo" (DINIZ, 2005, p. 52).

Pamplona Filho (1999, p. 34) também traz a sua definição, como sendo "a lesão ou prejuízo que sofre uma pessoa, em seus bens vitais naturais – não patrimoniais – ou em seu patrimônio valorado economicamente".

Sergio Cavalieri Filho faz, em sua definição, uma ligação mais direta com o princípio da dignidade humana, sendo o "dano moral, à luz da Constituição Federal vigente, nada mais é do que a violação do direito à dignidade" (MELO 2007, p. 16).

O melhor conceito que traduz fielmente o que seria o dano moral em qualquer esfera jurídica, entretanto, é trazido por Wilson Melo da Silva, que diz o seguinte:

lesões sofridas pelo sujeito físico ou pessoa natural de direito em seu patrimônio ideal, entendendo-se por patrimônio ideal, em contraposição ao patrimônio material, o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor econômico. (...) seriam exemplificadamente, os decorrentes das ofensas à honra, ao decoro, à paz interior de cada qual, às crenças intimas, à liberdade, à vida, à integridade corporal (MELO 2007, p.15).

Todavia, numa visão do dano moral relacionado diretamente ao ambiente de trabalho, trazida por Melo (2007, p. 21), escudando-se em Santiago Rubistein, diz o seguinte: "o agravo ou o constrangimento moral a infligido quer ao empregado, quer ao empregador, mediante violação a direitos ínsitos à personalidade, como conseqüência da relação de emprego." Para respaldar o que foi dito, importante visualizarmos o que traz a Consolidação das Leis do Trabalho, em seu art. 482, incisos "j" e "k" e no art. 483, inciso "e", repudiando veementemente qualquer ato lesivo a honra e a boa fama dentro do ambiente laboral.

Sendo assim, entendemos que o dano moral é caracterizado como uma lesão que venha a trazer um prejuízo ao ser humano em sua personalidade, tendo o sofrimento psicológico um dos seus exemplos e sendo exatamente o que acontece no assédio moral, onde os atos contra a moral são sistematicamente repetitivos, podendo ser praticado tanto pelo empregado quanto pelo empregador.

Este fenômeno, sem dúvida, enseja uma futura reparação por danos morais, haja vista que reúne os elementos necessários para a indenização, tais como: humilhação, coação, constrangimento, xingamentos, entre outros. Mas com um detalhe lhe é peculiar: a repetição e o prolongamento da situação humilhante, contribuindo também para a indenização.

Vale salientar, contudo, que não é qualquer frustração na vida que deve ser vislumbrada como dano moral, mas aquilo que atinja a honra e a dignidade do ser humano, trazendo-lhe um prejuízo.

Como explica Melo (2007), cabe ao juiz verificar a culpabilidade do agressor, além das condições sociais e econômica das partes e a proporção social que tal fato levou. Sendo assim, o juiz deve ter em seu fundamento que não se deve indenizar a pessoa lesionada de maneira que venha a arruinar o agressor, mas também não deve desmerecer o sofrimento da vítima do assédio moral.

Com relação a comprovação probatória do sofrimento, existe um entendimento jurisprudencial do STJ e de uma grande parte da doutrina de que, como o dano moral atinge no íntimo do indivíduo e não se tem como mensurar o estrago causado, essa é dispensável (MELO, 2007).

Nesse sentido, faz-se necessário apenas a demonstração do fato que deu origem a lesão, trabalhando-se em cima da presunção, tendo em vista que qualquer pessoa de mediana sensibilidade se ofenderia com o assédio moral no ambiente de trabalho, carecendo apenas a demonstração do fato jurídico ilícito onde se configuraria um dano à honra e à moral.

Para melhor elucidar essa questão com relação à jurisprudência, indispensável trazer a baila o voto do Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, senão vejamos:

Já assentou a Corte que não há falar em prova do dano moral, mas, sim, na prova do fato que gerou a dor, o sofrimento, sentimentos íntimos que o ensejam. Provado assim o fato, impõe-se a condenação, sob pena de violação ao art. 334 do Código de Processo Civil. (STJ, REsp 318099 / SP - Terceira Turma - Rel. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito - DJ 08.04.2002).

Outro voto que contribui para embasar esse pensamento é do Ministro Salvio de Figueiredo Teixeira, que diz o seguinte: "A prova do dano moral se satisfaz, na espécie, com a demonstração do fato que o ensejou e pela experiência comum." (STJ, REsp 304738 / SP - Quarta Turma - Rel. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira - DJ 13.08.2001).

Tendo em vista que o trabalhador, por estar subordinado a um superior hierárquico, é freqüentemente mais prejudicado moralmente, afinal essa subordinação é intrínseca à relação de trabalho, sendo um terreno fértil para o abuso de poder. Esse abuso é mais ocorrente quando o empregador tem a intenção de se livrar daquele trabalhador inconveniente, que não interessa mais a empresa, seja porque estar adoecido ou porque sua capacidade intelectual ameaça o cargo do superior.

No que tange ao acidente de trabalho, contudo, a comprovação probatória deve ter uma ligação direta com o dano causado e à atividade desenvolvida pelo empregado. Ou seja, para o empregado solicitar uma ação indenizatória por acidente de trabalho contra o empregador, faz-se necessário a comprovação de que a lesão foi originado da atividade exercida, além da culpa do empregador que, por ação ou omissão, contribuiu para o fato (MELO, 2007).

Diferentemente do dano moral por violação à honra do trabalhador, em que basta demonstrar a existência do fato ilícito, o dano moral oriundo do acidente de trabalho deve, além de ter a comprovação do ocorrido, fazer ligação direta com o nexo de causalidade entre o dano sofrido e a atividade exercida, e a culpabilidade do empregador, como expressa o art. 7º, inciso XXVIII, da Constituição Federal.

Portanto, havendo uma responsabilidade do empregador em relação ao fato que ensejou a molesta, por dolo ou culpa através de uma determinação judicial, este deverá indenizar o trabalhador lesionado.

Esta questão é de fácil visualização quando se relaciona às doenças ocupacionais, hoje tão freqüentes no ambiente trabalhista, denominadas de LER/DORT, que estudaremos mais adiante.

No próximo tópico analisaremos mais precisamente o dano moral no ambiente de trabalho e suas especificações.

1.1.2 Dano Moral Trabalhista

O dano moral trabalhista, como já foi mencionado anteriormente, pode ocorrer tanto por parte do empregado contra o empregador, quanto por parte do empregador contra seu subordinado, sendo essa a forma mais freqüente.

Ademais, o dano pode ser observado em qualquer das fases empregatícias, melhor dizendo, tanto na fase pré-contratual, quanto na fase contratual e até na fase pós-contratual (MELO, 2007).

No que tange à prática do assédio moral (ensejador de indenização por dano moral), é de conhecimento que os trabalhadores mais visados são aqueles que conseguiram uma estabilidade na empresa, seja por decisão judicial, por estarem voltando de auxílio-doença ou após licença maternidade, sendo levados pela empresa a pedirem demissão através desse ato reprovável.

Dessa forma, observa-se a necessidade de uma punição aos empregadores que se utilizam dessa prática e, em contrapartida, de uma compensação indenizatória aos empregados que sofreram com esse assédio, surgindo a partir daí o fundamento da indenização por dano moral oriundo do assedio moral.

Trata-se de uma punição do empregador que utiliza seu poder para intimidar e discriminar empregados, quando deveriam utilizar esse poder para motivar e incentivar a equipe para um aumento da produtividade laboral.

Nesse sentido, trazemos à tona a questão da competência para julgar e processar essas ações de dano moral trabalhista de caráter indenizatório, tendo ocorrido uma reestruturação judiciária após a Emenda Constitucional n.º 45, de 08.12.2004.

Antes da sanção da emenda, havia certa obscuridade quanto a competência para processar e julgar danos morais oriundos de relação trabalhista, haja vista que se tratava de um ilícito de caráter cível e muitos juristas defendiam que fosse o assunto de competência da justiça comum estadual (MELO, 2007).

Com a promulgação da EC/45, a competência da justiça do trabalho foi significativamente alargada, competindo à mesma processar e julgar as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho, como relata o art. 114, inciso VI, da Constituição Federal.

Apesar dessa prática já ser corriqueira nos Tribunais brasileiros anteriormente, a emenda veio para ratificar e consolidar tal prática, não deixando nenhuma dúvida sobre essa competência (MELO, 2007).

Como ensina Bezerra Leite:

Importante assinalar que antes da EC n.º 45/2004 já havia entendimento doutrinário e jurisprudencial no sentido de que as ações que tivessem por objeto a indenização por danos morais propostas pelo empregado em face do empregador, ou seja, decorrentes de uma relação de emprego, estariam sob a competência da Justiça do Trabalho, ainda que o juiz tivesse de aplicar normas de direito civil. O critério era muito simples: havendo lide entre empregado e empregador, mesmo em se tratando de ação de indenizatória por dano moral, a competência seria da Justiça do Trabalho, por força do critério ratione personae adotado pela primeir parte do art. 114 da CF, em sua redação original (2009, p. 218).

No mesmo sentido, o TST editou a Súmula n.º 392 afastando qualquer discussão sobre o assunto, que diz o seguinte:

DANO MORAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. Nos termos do art. 114 da CF/1988, a Justiça do Trabalho é competente para dirimir controvérsias referentes à indenização por dano moral, quando decorrente da relação de trabalho.

Com relação à prescrição, esta é um tema é bastante polêmico, haja vista que existem três correntes diferentes: uma corrente que reflete o CC/02, baseando-se nos três anos para reparação civil, como reza o art. 206, §3º, V; outra numa prescrição com lapso temporal de dez anos, de acordo com o art. 205 do CC/02, pois para essa corrente não há uma determinação expressa no que tange ao dano moral. E, por fim, uma visão de cunho trabalhista trazida pela CF/88 em seu art. 7º, XXIX e pela CLT em seu art. 11, que exprime uma prescrição de cinco anos, e de até dois anos após a extinção do contrato de trabalho (MELO, 2007).

A corrente que adota o CC/02, baseado no art. 206, §3º, V, fundamenta seu posicionamento no fato de que a Legislação Trabalhista não coloca nenhum empecilho que viesse a obstacularizar a prescrição civil, sendo de notório conhecimento dos juristas que aquilo que não é regulado pelas leis trabalhistas pode, perfeitamente, ser buscado nas normas cíveis de maneira complementar.

Ademais, acrescenta-se outro argumento: os danos morais não são vislumbrados como crédito trabalhista, pois não passariam de uma pretensão indenizatória com a possibilidade de se realizar num crédito. Este argumento descaracterizaria sua tutela através da visão trabalhista, afinal esta determina a proteção de "créditos resultantes da relação de trabalho".

Diante desses argumentos é que se escuda essa corrente civil, observando que a indenização propriamente dita, mesmo oriunda da relação trabalhista, tem natureza civil, uma vez que resulta do ordenamento cível e deve, por isso, ser tutelada por este (MELO, 2007).

Após a EC/45, entretanto, essa questão foi mais abrandada, pois determinou, expressamente, que as ações por danos morais fossem postuladas na Justiça do Trabalho e, conseqüentemente, o seu prazo prescricional, não tendo fundamento algum para a utilização das normas cíveis. Além do mais, ficou expressamente elucidado no art. 7º, XXIV, da CF/88 e no art. 11 da CLT o prazo bienal para efeitos da contagem do prazo para os créditos oriundos das relações trabalhistas. Não há, portanto, que falar na inexistência de uma norma específica, como defende os adeptos da corrente cível.

Na Justiça do Trabalho, esse tema é pacífico, senão vejamos orientação jurisprudencial:

A regra de contagem de prazo prescricional aplicável é a bienal do artigo 7º, inciso XXIX, alínea "a" da Constituição Federal, e não a do Código Civil. Extinto o contrato de trabalho em 26.08.91 e proposta a ação em 29.07.99, após, portanto, o biênio legal, está prescrito o direito de ação do reclamante (TRT 4ª R. – RO 00320.921/00-0 – 7ª T. – Rel. Juiz Hugo Carlos Scheuermann – J.20.02.2002).

Outra orientação jurisprudencial que respalda esse posicionamento vem do TST:

Quando em juízo estão litigando as partes do contrato de trabalho, ambas agindo na condição de empregado e empregador; e tendo por objeto uma indenização decorrente de alegado ato ilícito patronal é forçoso reconhecer que a pretensão de direito material deduzida na reclamatória possui nítida natureza de crédito trabalhista que, portanto, sujeita-se, para os efeitos da contagem do prazo de prescrição, à regra estabelecida no art. 7º, XXIX, da Constituição Federal. A matéria deve ser dirimida à luz da norma jurídica específica acerca de créditos de contrato de trabalho, no caso, a norma constitucional referida, motivo pelo qual não se aplica o art. 177 do Código Civil (TST – RR 8871 – 3ª T. – Rel. Min. Terezinha Célia Kineipp Oliveira – DJU 13.09.2002).

Nesse sentido, não tem o que se discutir, uma vez que as ações de indenização são postuladas na Justiça do Trabalho, devem-se, também, respeitar as normas determinadas pela mesma para a contagem da prescrição referente às ações de indenização.

Portanto, observa-se que a EC/45 veio, mais uma vez, esclarecer um tema antes controvertido no âmbito jurídico.


Autor: LUIZ ARAUJO


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