Política Criminal Carcerária no Brasil e Políticas Públicas



Antonio Roberto Xavier*

*SGT da PMCE 5ª CIA/1ºBPM; Mestre em Políticas Públicas e Sociedade – UECE (2008), Mestre em Planejamento e Políticas Públicas – UECE (2007); Especialista em História e Sociologia – URCA (2006) e Graduado em História – UECE (2002).

Resumo

Neste artigo, num primeiro momento, discuto sobre os principais problemas existentes nas prisões brasileiras em relação ao tratamento desumano e degradante dispensado aos apenados. Num segundo momento, demonstro a realidade das prisões no Brasil com relação ao contingente e os tipos sociais que mais são pegos pela lei penal. Por último, alerto sobre a possibilidade constante de rebeliões nas prisões em todo País.

Palavras-chave: política criminal, prisões, lei penal

 Abstract

In this article, at a first moment, I argue on the main existing problems in the Brazilian prisons in relation to the inhuman and degraded treatment excused the imposed a fine on ones. At as a moment, I demonstrate to the reality of the prisons in Brazil with regard to the contingent and the social types that more are to catch for the criminal law. Finally, I alert on the constant possibility of rebellions in the prisons in all Country.

Keywords: Criminal policy, prisons, criminal law.

1. Introdução

A política criminal carcerária no Brasil sempre ocorreu de maneira descolada das políticas públicas de inclusão ou de ressocialização dos apenados. A história do tratamento desumano, degradante, criminalizador e fossilizador no sistema carcerário brasileiro vêm de longe. Sob as concepções do Direito Penal postivista-legalista, a política criminal e o Sistema Penal Brasileiro – SPB padece de políticas públicas voltadas para o respeito e a dignidade da pessoa humana.

Vivemos atualmente diante de duas questões cruciais no País com relação à violência criminal: a primeira diz respeito ao aumento descontrolado dessa violência em todos os espaços. A segunda questão que também é derivada da primeira paira na adoção de política criminal sempre mais dura aumentando cada vez mais a superlotação carcerária. Na realidade é possível se dizer que no Brasil nunca houve política criminal planejada, estudada, direcionada e atualizada para a área carcerária. Como conseqüência mais visível, vez por outra, há erupções de megarebeliões e o avanço do Crime Organizado se torna uma ameaça à soberania do Estado Democrático de Direito a partir das penitenciárias. Foi o caso das rebeliões em quase todos os presídios dos Estados brasileiros e os ataques a alvos civis e a agentes do poder público ocorridos em (2006), comandados pelas duas maiores organizações criminosas do Brasil: Primeiro Comando da Capital – PCC, em São Paulo e Comando Vermelho – CV no Rio de Janeiro. Neste sentido, a função das prisões no Brasil não é ressocializar apenados, mas, castigar desumanamente e transformar delinqüentes de pequenos delitos em criminosos em potencial. É preciso saber qual o sentido das prisões respondendo a três perguntas básicas: por que punir? A quem punir? Como punir?

2. Modelo do sistema penitenciário na sociedade disciplinar

Segundo Foucault (2001a), o modelo do novo sistema penitenciário surgiu na Europa na passagem do século XIII para o século XIX e serviu, entre outras coisas, como um laboratório para constituição de um corpo de saber sobre o criminoso e seus delitos. As prisões desse novo modelo carcerário são tecnologias políticas típicas do novo modelo de Sociedade: a Disciplinar, surgida no final do século XVIII, por ocasião da instalação do Estado-Nação (pós-Revoluções Americana e Francesa) em substituição a Sociedade de Soberania do Estado Absolutista.

Segundo ainda Foucault, inicialmente, as prisões foram criadas para vigiar, punir e registrar continuamente o indivíduo e sua conduta, limitar seus espaços e controlar o seu tempo. Para cumprir esse objetivo, as prisões necessitavam de um projeto arquitetônico elaborado pelo empirista e jurista inglês Jeremy Bentham, em fins do século XVIII, descrito por Foucault:

Façamos uma breve revisão do funcionamento arquitetônico do panopticon. Ele consiste num amplo terreno com uma torre no centro e, em sua periferia, uma construção dividida em níveis e celas. Em cada cela, duas janelas que permitem a vigilância das celas. As celas são como 'pequenos teatros', onde cada ator está sozinho, perfeitamente individualizado e constantemente visível. O detento, deste modo, torna-se visível ao supervisor, porem apenas a este, ele é privado de qualquer contato com as celas contíguas. Ele é 'objeto de uma informação, jamais sujeito numa comunicação'.... Foucault ressalta que isto se dava através da indução do detento a um estado de objetividade, de permanente visibilidade. O detento não pode ver se o guarda está ou não na torre, portanto, deve se comportar como se a vigilância fosse constante, infinita e absoluta. A perfeição arquitetônica é tal que, mesmo que o guarda não esteja presente, o aparelho de poder continua a funcionar (apud DREYFUS & RABINOW, 1995, p. 207).

O poder panóptico de Bentham é contínuo, disciplinar e anônimo podendo ser acionado por qualquer um que esteja na condição de fazê-lo e qualquer um pode estar sujeito a seus mecanismos. Se esse poder panóptico funcionasse infalivelmente não haveria violência nas prisões, pois os presos, por não saberem quando estão sendo vigiados tornar-se-iam guardiões de si próprios. Conforme Foucault, o panóptico produz, ao mesmo tempo, saber, poder, controle do corpo e controle do espaço, numa tecnologia disciplinar integrada. É um esquema de poder de constante vigilância de seus habitantes. É uma tecnologia do poder disciplinar. Sem dúvida, o panóptico sendo, ao mesmo tempo, vigilância e observação, segurança e saber, isolamento e transferência, encontrou, na prisão, o lugar ideal para sua realização. No entanto,

Uma dimensão extremamente importante do funcionamento do sistema de prisão é o fato de que ele nunca conseguiu cumprir suas promessas. Desde o seu nascimento e até o presente, as prisões não funcionaram. A descrição de Foucault do número de reincidências e a uniformidade da reforma retórica é tocante. As prisões não corresponderam às exigências para as quais eram as únicas qualificadas: produzir cidadãos normais a partir de criminosos empedernidos (idem, p. 214).

Na visão Foucaultiana a análise deve girar não em torno do fracasso das prisões, mas a que objetivos ou lições se pode tirar com os supostos fracassos (que ao final nem fracassos são). Neste caso, seria necessário supor que a prisão e os castigos não sejam destinados a suprir as infrações, mas antes, a "distingui-las, distribuí-las, utilizá-las; que eles visem, nem tanto a tornar dóceis aqueles que estão prontos para transgredir as Leis, mas que eles tentem organizar a transgressão das Leis numa tática geral das sujeições" (idem, ibidem). Com efeito, conforme Deleuze (1981), a partir, sobretudo da 2ª Guerra Mundial consolidou-se um novo modelo de Sociedade, a de controle em razão das crises dos estabelecimentos de confinamento (escola, fábrica e prisões). Neste sentido, nesta sociedade o controle social terá que acompanhar os avanços tecnológicos podendo, inclusive, o apenado ser acompanhado no cumprimento de sua sanção por meio de chips, coleras eletrônicas, etc.

3. A realidade das prisões no Brasil

A indistinção de infrações penais: a falta de distribuição eqüitativa e justa e a falta de aproveitamento de infratores menos periculosos nas prisões brasileiras vêm, ao longo do tempo, transformando o Sistema Penitenciário Brasileiro numa constante escola de aperfeiçoamento para violência criminal em todos seus aspectos. A prática indiscricionária de amontoar presos nas prisões no Brasil vem de longe. Na década de 1930 e durante o Regime Militar, por exemplo, o autoritarismo político dos governantes permitiu jogar nos cárceres pessoas que tinham ideologias partidárias (presos políticos) junto com os presos condenados por infrações penais ou presos comuns. O contato dos presos políticos com os condenados comuns contribuiu e muito para conscientização e reconhecimento de direitos sempre negados aos reclusos comuns.

Aqui no Brasil, por exemplo, a massa carcerária extraiu muitas lições do contato havido na década de 1930 com os membros da Aliança Nacional Libertadora encarcerados na Ilha Grande. Quando os presos políticos se beneficiaram da anistia que marcou o fim do Estado Novo, deixaram nas cadeias presos comuns politizados, questionadores da causas da delinqüência e conhecedores dos ideais do socialismo (LIMA, 1991, p. 27).

A história do presídio Cândido Mendes situado na Ilha Grande no Estado do RJ demonstra a dura realidade do Sistema Penitenciário no País. A cadeia havia sido criada durante a primeira República, ainda no contexto das Sociedades Disciplinares analisadas por Michel Foucault. Nela existia um posto de fiscalização sanitária para detectar males em navios que vinham da Europa e da África, como a febre tifóide. Na década de 1920, o presídio Cândido Mendes servia para presos idosos e para aqueles que estavam prestes a terminar suas penas. Porém, a partir de 1964, com o advento do regime militar o presídio foi transformado em prisão de segurança máxima onde se juntou o bandido dito irrecuperável com o velho presidiário, que trabalhava como colono nas lavouras em torno do presídio. Isto contraria tanto o projeto panóptico arquitetônico de Bentham como as intenções de possível justiça.

A situação carcerária no Brasil não somente se constitui num caos, mas tende a se transformar numa erupção constante de megarebeliões. As freqüentes rebeliões e motins que ora estão ocorrendo nos presídios e cadeias públicas no Brasil continuarão acontecendo com maior força, ainda. Quando em 1971, na França, Foucault diagnosticou que as prisões iriam "pegar fogo", muitas autoridades e estudiosos da época o ignoraram. Porém,

O início de uma onda de motins que se estendeu pelos estabelecimentos penitenciários franceses durante o inverno de 1971-1972. Mais de trinta canais de detenção e centrais tornaram-se palco de greves, de motins, de sit-in. Esses movimentos que serão sucedidos pelos de 1973, estão na origem da reforma penitenciária de meados dos anos 1970.... Os detentos exatamente porque detentos e humilhados e usados e explorados, tornaram-se uma força coletiva em face da administração. Para Foucault, esta força dava testemunho do início de um processo, essa sublevação era a primeira manifestação de 'uma luta política encetada contra todo o sistema penal pela camada social que era sua primeira vítima' (GROS, 2004, pp. 17 e 19).

Esses fatos demonstraram o quanto Foucault estava correto em sua análise e quanto acreditava que o poder, mesmo sendo o de dominação sobre apenados precisa ser dosado coordenadamente. Para Foucault o que se tem de analisar não é uma teoria ou um conceito sobre o poder, mas como ele opera. Para ele a dominação não é a essência do poder, mas que o poder se exerce tanto sobre o dominado como sobre o dominante. É possível perceber que há nas relações de poder um processo dialético que é transferido às relações sociais proporcionando a auto-formação ou a auto-obediência. Nesta ótica, as relações de poder operam de forma objetiva, intencional, estratégica, gradual, lógica e articulada. É desta forma que o panoptismo de Jeremy Bentham (1791), tomado por Foucault, constitui-se numa forma geral e definidora das relações de poder com a vida cotidiana nas Instituições Disciplinares, especificamente nas prisões. Quando não se compreende e não se segue as normas de como o poder deve ser operado este pode causar grandes resistências, superiores as suportáveis e aí o exercício do poder não produz, mas provoca o caos. É nesse aspecto que o autoritarismo das leis e do poder público no Brasil tem proporcionado megarebeliões e motins constantes nas penitenciárias e cadeias por todo o País.

O poder não é uma mercadoria, uma posição, uma recompensa ou um trauma, é a operação de tecnologias políticas através do corpo social.... Para compreender o poder e sua materialidade, seu funcionamento diário, devemos nos remeter ao nível das micro-práticas, das tecnologias políticas onde nossas práticas se formam.... O poder não estar restrito às instituições políticas. O poder representa um 'papel diretamente produtivo', 'ele vem de baixo', é multidirecional, funcionando de cima para baixo e também de baixo para cima.... Na prisão, tanto os guardas quanto os prisioneiros são alocados sob as mesmas operações específicas de disciplina e vigilância, sob as restrições concretas da arquitetura da prisão (DREYFUS & RABINOW, pp. 203-204).

O Brasil administra um dos maiores sistemas penais do mundo ficando entre os dez. A população carcerária está distribuída em vários estabelecimentos carcerários, incluindo penitenciárias industriais terceirizadas, presídios e cadeias públicas, casas de detenção, distritos e delegacias policiais, colônias agrícolas, centros de observação e recuperação, casas de albergados, hospitais de custódia e tratamento psiquiátrico e os núcleos para menores.

As cadeias públicas, que parecem mais verdadeiros calabouços, estão repletas de presos. As penitenciárias, presídios públicos ou terceirizados, casas de albergados e até as colônias agrícolas estão com excedentes de apenados. Segundo pesquisa divulgada pelo Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN, no último ano do governo de FHC, 2002, o sistema carcerário brasileiro abrigava 239.345 pessoas, entre homens e mulheres. Em dezembro de 2006, o registro era de 401.236 apenados, entre homens e mulheres. Isto significa um aumento de 67% a mais de presos. Na variável homem/mulher verificou-se uma estabilidade, ou seja, em 2002, 95,7% dos presos eram homens, enquanto em 2006, eram 94,25%. A pesquisa começou em 2000 e o crescimento foi constante, mas a partir de 2003, segundo Maurício Kuehne, diretor do DEPEN, o aumento foi significante. Isso ocorre, segundo Kuehne, porque entram mais presos do que saem no sistema. É registrado, em média mensal, um excedente de 3.000 (três mil) presos no sistema carcerário. Atualmente, em razão do aumento do fluxo carcerário, o sistema penitenciário do Brasil abriga 103.433 presos a mais do suportável (DIÁRIO DO NORDESTE, 27/03/2007, P.16.)

Apesar das garantias de proteção e respeito à pessoa humana relativa à população carcerária constar na Constituição Federal (art.5º), de 1988, incluindo respeito e proteção à integridade física e moral, na prática isto não ocorre. Bem antes da CF de 1988, o CPB, que é de 1940, em seu artigo 38 estabelece: "Aos presos serão assegurados todos os direitos não atingidos pela lei".

Além desses instrumentos legais existe uma Lei específica destinada, exclusivamente, ao sistema carcerário, a Lei de Execuções Penais – LEP (Lei Nº 7.210, de 11 de 07 de 1984). Esta Lei, em tese, é o guia essencial à Administração penal e regulamenta, normatiza e prevê direitos e deveres dos apenados e dá outras providências. Em seu artigo 10, a LEP estabelece que a assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade. A LEP foi criada com o objetivo de proteger os direitos substantivos e processuais daqueles que estão no cárcere cumprindo penas, garantindo-lhes, inclusive, assistência jurídica, de saúde, educacional, sócio-cultural, religiosa, material e trabalhista. A assistência material prevista nos artigos 12 e 13 da LEP prevêem que ao preso e ao internado será fornecido alimentação, vestuário e instalações higiênicas e o cárcere disporá de instalações e serviços que atendam aos presos nas suas necessidades pessoais, além de locais destinados à venda de produtos e objetos permitidos e não fornecidos pela Administração carcerária. Vale ressaltar que é assegurado ao detento, no artigo 28 da LEP, o trabalho remunerado, porém, este trabalho não está sujeito ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT. As normas da LEP foram inspiradas no modelo das regras mínimas para o tratamento de prisioneiros estabelecido pela ONU.

Com efeito, o preceituado nesses dispositivos legais não é aplicado na prática no cotidiano das prisões em todo o Brasil. Devido a isto, o sistema penal no País e sua administração têm sido focos de ferrenhas críticas por órgãos ligados aos Direitos Humanos e pela imprensa nacional e internacional. São inúmeros os pressupostos de que o sistema penitenciário brasileiro encontra-se em crise e chegando à beira do caos. Essas crises vão desde as incompatibilidades do sistema legislativo punitivo ao sistema de administração carcerária. Deste modo, a questão carcerária tem preenchido páginas e está sempre em constante debate por estudiosos e autoridades do poder público na tentativa de se encontrar solução. O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária – CNPCP, por exemplo, adotou ações complementares para a administração criminal e penitenciária estabelecidas nas resoluções Nºs. 016, de dezembro de 2003 e 03, de setembro de 2005. O objetivo do CNPCP é regulamentar com eficiência a administração da Justiça Criminal na execução das penas e de medidas de segurança aos presos, prevenindo a violência criminal dentro dos presídios e realizando inspeção e fiscalização para que presos de dentro das prisões não comandem ações criminosas extramuros dos diversos presídios espalhados pelo Brasil.

Com efeito, o sistema carcerário no Brasil padece de carências que têm se acumulado ao longo do tempo começando pela falta de construção de presídios, sobretudo na esfera federal. Além disso, as celas dos presídios brasileiros não estão de acordo com as normas regulamentares. Ao invés da construção de celas presidiárias individuais, com 6 (seis) metros quadrados, com pia, ventilação, acompanhamento individualizado do preso, parlatório e trabalho o cárcere no Brasil, em regra geral apresenta um flagrante quadro de violação dos direitos da pessoa humana. São celas esburacadas, úmidas, fedidas, sem qualquer higiene que comportam dezenas de seres humanos apenados, quando deveria comportar 4 (quatro) ou 5 (cinco) presos, no máximo. É possível dizer que o apenado no Brasil é punido duplamente: quando sua sentença é selada nos Tribunais extramuros, significa apenas a primeira porque a outra e mais cruel lhe aguarda nos intramuros dos famigerados cárceres de todo o País. Existem, em regra geral, 5 (cinco) problemas graves na situação carcerária no Brasil: superlotação,tratamento desumano, falta de trabalho, corrupção e Crime Organizado.

O sistema penal, em um significativo número de casos, especialmente em relação aos delitos patrimoniais – que são a maioria -, promove condições para a criação de uma carreira criminal. Particularmente, dentre as pessoas originárias das camadas mais humildes da sociedade, o sistema seleciona aqueles que, tendo caído em uma primeira condenação, surgem como bons candidatos a uma segunda criminalização, levando-os ao ingresso no rol dos desviados, como resultado do conhecido fenômeno psicológico do "bode expiatório". Induvidosamente, isto constituiu uma inqualificável violação dos Direitos Humanos, e o sistema penal, ao insistir com a pena, nada mais faz do que engrossar esse rol, e até leva o indivíduo à destruição (ZAFFARONI & PIRANGELI, 1997, p. 76).

Apesar de a política criminal ter por objetivos: desenvolver efetiva política de promoção do homem no plano social; defender a instituição das penas alternativas; apoiar a descriminalização e a despenalização; atentar para as avançadas modalidades criminosas, como poluição sonora, do ar, das águas, crimes digitais e Crime Organizado; disciplinar eticamente os programas de televisão que banalizam a violência e o sexo; ampliar as vagas do sistema penitenciário, evitando o recolhimento de condenados e presos provisórios em delegacias policiais; construir mini-prisões para abrigar no máximo 300 reclusos; construir presídios de segurança máxima em regiões fronteiriças ou em zonas de grande concentração de criminalidade violenta; promover permanentemente assistência jurídica aos condenados, aos presos provisórios, aos internados e aos egressos, através das Defensorias Públicas, dos Serviços de Assistência Judiciária mantidos pela OAB, assim como Escritórios de Prática Forense dos Cursos ou Faculdades de Direito; e outros, a realidade é justamente o contrário.

Os condicionamentos do Sistema Penal no Brasil, além de promover a destruição psíquica e física da pessoa humana, não somente sujeita-a a um processo de criminalização, mas, submete-a a um processo de fossilização. Isto é feito na medida em que esse sistema

... se vale de uma seleção de pessoas dos setores mais humildes e, .... Este condicionamento, ainda muito pouco estudado, é, todavia, gravíssimo. Utiliza-se de um grupo de pessoas de baixa condição social, que perde o seu grupo de identificação originário e o leva à adoção de permanentes atitudes de desconfiança, que se corrompa, e essa corrupção o obrigue a uma solidariedade incondicional para com o grupo artificial e se veja submetido a um regime quase militar: e, conseqüentemente, à arbitrariedade em relação às condições e estabilidade laborativa, serve como "bode expiatório" para os excessos do sistema, e, por fim, torna-se mais exposto à violência física que esse mesmo sistema cria (ZAFFARONI & PIRANGELI, 1997, p. 76).

No Brasil, as prisões e as detenções, muitas vezes ilegais, apesar das restrições constitucionais, continuam ocorrendo banalizadamente contra a maioria da população trabalhadora, pobre e não branca. A forma indiscriminada de detenção e prisão que são realizadas no País configura-se um desrespeito deliberado, apesar do Estado Democrático de Direito, dos preceitos constitucionais e dos Direitos Humanos. Nas prisões, apesar de haver uma lei que regularmente a administração penal, a LEP, as atrocidades de violências continuam ocorrendo contra presos, sendo suprimido destes direitos e garantias constitucionais. Neste sentido a prisão no Brasil é uma instituição ineficiente, beligerante e degradante, com recursos mal administrados e dominados pela corrupção. Se os organismos policiais e o Judiciário não sofreram reformas muito menos o sistema penitenciário.

4. Considerações finais

Não sou adepto de nenhuma impunidade. Todavia, não se pode esquecer que a pena, para ser justa precisa ter apenas o grau de rigor suficiente para afastar o homem da vontade do impulso ao crime. É válido acreditar que não existe homem que em sua sã consciência hesite entre o crime, apesar das vantagens que este anseie, e o risco de perder para sempre a liberdade. Devemos está cônscios de que nenhum tormento pode ir além da capacidade da resistência humana, limitada pela sensibilidade e a organização do corpo humano e que os castigos mais cruéis, podem provocar, às vezes, a impunidade. Se as leis são tão cruéis, correm o risco de serem modificadas rápido ou não poderão mais vigorar e punir o crime.

Destarte, é preciso repensar a realidade das prisões no Brasil de modo a dispensar políticas públicas no sentido de não mais tratar seres humanos como lixo ou coisa parecida. Se quisermos avançar no almejado Estado Democrático de Direito teremos que começar por respeitar os Direitos da pessoa humana que constantemente estão sendo desrespeitados nas prisões por todo este imenso País. Advirto também que apesar de termos tido uma certa calmaria de rebeliões após os episódios de 2006, sobretudo em São Paulo e no Rio de Janeiro, é bom começarmos a discutir outras estratégias visando não só conter as rebeliões, mas evitá-las em seu nascedouro. O fim do ano se aproxima e nesse período poderemos ter, talvez, megarebeliões nunca visto antes. Não estou querendo fazer profetismo algum, porém nunca é demais a prevenção, principalmente quando tratamos de tão complexa questão. É oportuno citar o ex-presidiário e romancista russo Fiódor Dostoievski (2003), quando afirmava que é possível julgar o grau de civilização de uma sociedade visitando suas prisões. Indubitavelmente, qualquer pessoa ao visitar uma das prisões brasileiras concluirá sem qualquer hesitação: o Brasil está mergulhado numa imensa barbárie social.

Referências Bibliográficas

I – Livros e periódico

DELEUZE, Gilles. Conversações – 1972 – 1990. Rio de Janeiro: ed. 34, 1992.

1981.

DIÁRIO DO NORDESTE, 27/03/2007.

DOSTOIÉVSKI, Fiódor Mikháilovitch. Crime e Castigo. São Paulo: nova Cultural, 2003.

DREYFUS, Hubert & RABINOW, Paul. Michel Foucault, uma trajetória filosófica: para além do estruturalismo e da hermenêutica. Tradução de Vera Porto Carreiro. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995.

FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. História da violência nas prisões. Petrópolis: Vozes, 2001a.

__. Sobre a Prisão. In: Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal, 2001b.

GROS, Fredéric et. al. (Orgs.). A coragem da verdade. Tradução de Marcos Marciónico. São Paulo: Parábola editorial, 2004 (Episteme; I).

LIMA, Wiliam da Silva. Quatrocentos contra um – Uma história do Comando Vermelho. Petrópolis: Vozes, 1991.

ZAFFARONI, Eugênio Raúl & PIRANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro parte geral. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.

II - Legislação/Doutrina

BRASIL. Ministério da Justiça. CONSELHO NACIONAL DE POLÍTICA CRIMINAL E PENITENCIÁRIA – CNPCP, resoluções Nºs. 016, de dezembro de 2003 e 03, de setembro de 2005 (Estabelece ações complementares para a administração criminal e penitenciária).

Lei 2.848/ 40 (Estabelece o Código Penal Brasileiro).

__. 7.210/ 84 (Lei de Execução Penal).


Autor: Antonio Roberto


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