EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO TRABALHO DO MENOR NA EUROPA E NO BRASIL



Na Europa

Na Antigüidade, o trabalho do menor não se afastava do lar e do ambiente doméstico, tinha fins essencialmente artesanais. Os afazeres eram ensinados aos menores quase sempre pela própria família, para que ao emancipar-se viesse a exercer um trabalho.

Nas corporações de ofício medievais, os ensinamentos eram ministrados pelos mestres e companheiros aos menores aprendizes, onde os mesmos eram assistidos e corrigidos até a absorção de boa técnica.

Toda a proteção legal efetiva verificada em relação à atividade laboral do menor desenvolveu-se e modificou-se a partir do surgimento da Revolução Industrial, período histórico durante o qual a Europa, mais precisamente a Inglaterra, se transformou de sociedade feudalmercantil, de economia preponderantemente agrária, numa economia industrial, caracterizada pela produção em grande escala mediante a utilização crescente das máquinas.

O número de crianças que trabalhavam cresceu de forma geométrica no final do século XVIII com a descoberta do tear.

No século XIX, com a Revolução Industrial iniciada com a máquina a vapor, além dos trabalhos nas minas de carvão, havia o trabalho nos moinhos e fiações. A população adulta era suficiente para atendera as necessidades das indústrias. No entanto, usavam crianças e adolescentes trabalhando a mesma quantidade de horas de um trabalhador adulto, ganhando a metade do salário deste. Em muitos casos, crianças de cinco ou seis anos eram obrigadas a trabalhar de 13 a 16 horas por dia.

Condições péssimas como essas, impostas para as crianças pobres, rapidamente se desenvolveram para as empresas, que passaram a contratar cada vez mais crianças e por salários cada vez menores. As famílias também não conseguiam mais dispensar o ganho das crianças para se manterem. Muitas vezes, com a aprovação de líderes políticos, sociais e religiosos, as crianças passaram a trabalhar nos serviços mais perigosos. Os resultados sociais malignos incluíam analfabetismo, com ulterior empobrecimento maior das famílias e uma multidão de crianças doentes, mutiladas e aleijadas.

No início do século XIX com a exploração tão em larga escala, a sociedade política começa a organizar-se em defesa do menor.

A primeira lei de proteção ao trabalho do menor vigorou na Inglaterra em 1802. A "Lei Peel" limitou em 12 horas a jornada diária de trabalho nas fábricas, proibindo também o trabalho noturno.

Entretanto, a aprovação de leis que visavam à proteção do trabalho infantil não era tão fácil como se imagina. Mesmo com a discordância de muitos e influentes políticos e empresários favoráveis à continuidade do trabalho infanto-juvenil, algumas leis foram aprovadas em defesa do menor.

Na França em 1813 foi proibido o trabalho de menores em minas. Em 1819 na Inglaterra, foi aprovada a lei, que tornava ilegal o emprego de menores de nove anos, bem como restringia o horário de trabalho de adolescentes de menos de 16 anos para 12 horas nas atividades algodoeiras.

Ainda na Inglaterra, em 1833, a Comissão Sadler proibiu o emprego de menores de nove anos e limitou a jornada de trabalho do menor de 13 anos a 9 horas, além de vetar o trabalho noturno.

Em 1839, a Alemanha aprovou a lei que proibia o trabalho de menores de nove anos e em 1869 a lei industrial fixou a idade mínima de admissão em 12 anos.

Na segunda metade do século XIX, a lei ordinária de proteção ao menor é criada na Itália, no ano de 1866. A industrialização mais tardia feita pela Itália em relação à Inglaterra, França e Alemanha levou este país a conhecer os malefícios que o trabalho do menor acarretava se exercido de maneira desregulamentada e sem a interferência estatal.

A onda sindical que se fortalecia no continente europeu, principalmente nos paises mais industrializados da época, fazia nascer às primeiras legislações referentes à proteção laboral do menor, cuja regulamentação definitiva realizou-se com o Tratado de Versalhes e as Conferências Internacionais do Trabalho, realizadas pela OIT a partir de 1919.

É forçoso reconhecer que a legislação pioneira no que diz respeito à matéria era superficial, tímida e pouco abrangente. Mas considerando que em um momento anterior as leis de proteção ao trabalho simplesmente não existiam, haverá a compreensão de que os primeiros ordenamentos que tratavam da matéria são elementos de um processo histórico, de um embate entre os desamparados e os detentores de capital, em um processo que registra ganhos por parte dos primeiros, sendo, porém os mesmos alcançados de forma paulatina, sofrida e sem a garantia de sua total eficácia.

No Brasil

Somente com a abolição da escravatura no Brasil é que foi desencadeado o debate sobre o trabalho infantil.

"Antes as crianças sempre foram exploradas, mas como a escravatura cobria o trabalho com adultos e crianças, as crianças pobres e órfãs eram recrutadas para o trabalho das fazendas e das casas grandes "dos Senhores", onde eram exploradas e abusadas, mais do que o filho dos escravos que valiam dinheiro e essas não valiam."

 

O menor trabalhava nas fazendas dos senhores de engenho executando pequenos serviços que gradativamente aumentavam de acordo com o potencial de cada indivíduo. Era uma escravidão institucionalizada, pública e notória.

Antes da extinção da escravatura nenhuma criança recebia algum ganho pelo trabalho que executava. Com a massa de escravos livres sem trabalho, as famílias não conseguiam sustentar seus filhos, e muitos dos filhos das escravas não tinham pai conhecido e ficavam pelas ruas. A crise econômica que avassalou o país na época desempregou as famílias dos brancos e seus filhos também ficavam à deriva.

A preocupação maior da sociedade do fim do século XIX era com a criminalidade infantil e a procura de soluções para o problema do menor abandonado e/ou delinqüente. A experiência da escravidão havia demonstrado que a criança era mão-de-obra mais dócil e mais barata e com maior facilidade de adaptação ao trabalho.

Com as ondas migratórias do fim do século, de quase todos os países da Europa vieram imigrantes que inicialmente foram utilizados para substituir a mão-de-obra escrava no campo. Rapidamente houve a instalação desses imigrantes pobres nas cidades do sul do país e com experiência de trabalho em fábricas.

No Brasil, essa mão-de-obra dos imigrantes foi absorvida na indústria, sem distinção entre adultos e crianças no trabalho. As denúncias de exploração dos menores, as greves por salários e por reduções da jornada de trabalho eram feitas igualmente por adultos e crianças.

Somente em 1891, no Império, foi criado o primeiro diploma legal que protegesse o trabalho do menor.

O decreto 1313/1891, editado quase um século após a primeira lei de proteção ao menor (A Lei Peel de 1802 na Inglaterra), já trazia em seu preâmbulo os seus objetivos, que eram "atender à conveniência e à necessidade de regularizar o trabalho e as condições dos membros em avultado número de fábricas existentes na Capital Federal, a fim de impedir que, com prejuízo próprio e da propriedade futura da Pátria, sejam sacrificadas milhares de crianças...."

Houve, por parte do então Presidente da República, Deodoro da Fonseca, fixação da idade mínima de 12 anos para o ingresso nas fábricas, em sete horas não consecutivas a jornada diária dos menores de 12 a 15 anos do sexo feminino, e de 12 a 14 anos do sexo masculino e em nove horas, nas mesmas condições, os de 14 e 15 anos do sexo masculino.

Houve também a proibição do trabalho de crianças em máquinas em movimento e na faxina.

Já em 1917 começou a haver a proibição das crianças menores de 14 anos de trabalharem em fábricas. No entanto a maioria das crianças pobres e os filhos de imigrantes não tinham certidões de nascimento para provar sua idade, o que favorecia nas fábricas o trabalho de crianças de 8, 10 e 12 anos.

"A regulamentação do trabalho infantil só ocorreu em 12 de Outubro de 1927 com a publicação do Código de Menores, que instituiu medidas tendentes a assegurar o desenvolvimento físico, mental e psicológico normal do menor com a proibição do trabalho de menores de 12 anos de idade, proibição de trabalho de menor de 14 anos nas atividades insalubres e perigosas; proibição ao menor de 18 anos de trabalhar em lugar perigoso à saúde, à vida, à moralidade, excessivamente fatigantes ou excessivo às suas forças; fixação em seis horas não consecutivas da jornada de trabalho do menor de 18 anos e proibição ao trabalho noturno."

No entanto, um habeas-corpus suspendeu por dois anos a entrada em vigor do Código, porque ele interferia no direito da família em decidir o que é melhor para os seus filhos.

A Constituição de 1934 proibiu no seu artigo 121 o trabalho para menores de 14 anos, além de restrições ao emprego de menores em trabalho noturno e insalubre.

A Constituição de1937 manteve a proibição ao trabalho do menor de 14 anos e incluiu a proibição de trabalho noturno para menores de 16 e, em indústrias insalubres, a menores de 18 anos.

Seguindo a evolução legislativa nacional, veio o Decreto-lei n° 5452, de 1º/5/43, aprovando a Consolidação das Leis do Trabalho, que destinou o capítulo IV (arts. 402 a 441) à proteção do trabalho do menor, inserido no Título III - Das normas especiais de tutela do trabalho.

Com a publicação da CLT, além da condição de aprendiz, a criança de 14 a 18 anos que podia trabalhar ganhava um "salário de menor", a metade do salário mínimo do trabalhador.

Nas indústrias da construção civil, que se difundiam pelo sul do país, muitos dos serviços mais perigosos eram os realizados pelas crianças com salário mínimo especial.

A Constituição de 1946 manteve as bases do que previa a constituição anterior. O progresso se deu no aumento da idade mínima para o trabalho noturno, que passou de 16 para 18 anos.

Com a promulgação da Constituição de 1967, houve o retrocesso caracterizado pela redução da idade mínima para o trabalho do menor de 14 para 12 anos.

Com a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 houve nova alteração, passando de 12 para 14 anos a idade mínima para o trabalho.

Em dezembro de 1998, uma Emenda Constitucional eleva a idade mínima para o trabalho para 16 anos.

Em 1990, a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei n° 8069 de 13/7/90 regulamenta os princípios constitucionais, introduz e consolida novos princípios adotados internacionalmente e dedica a questão do trabalho do menor todo seu capítulo V, que abordaremos oportunamente.

Referências bibliograficas

BRASIL. Ministério do Trabalho. Diagnóstico preliminar dos focos do trabalho da criança e do adolescente no Brasil. Brasília: MTb, 1996.

Estatuto da criança e do adolescente. Brasília: MTb, 1998.

Fórum nacional de prevenção e erradicação do trabalho infantil: ações e perspectivas. Brasília: MTb, 1999.

Trabalho infantil no Brasil: questões e políticas. Brasília: MTb, 1997.

GRUNSPUN, Haim. O trabalho das crianças e dos adolescentes. São Paulo: Ltr, 2000.

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Autor: Bento Jr Advogados


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