Profissionalização Docente



Outro dia, ao ministrar uma palestra para acadêmicos de pedagogia e outras licenciaturas, afirmávamos que o desafio para o profissional da educação na atualidade pode ser resumido a três grandes questões:

1. Como contribuir para que a escola, socialmente referenciada, resgate sua cidadania no espaço público, uma vez que a sociedade neoliberal maximiza o mercado em detrimento do bem comum?

2. Como contribuir para que a escola seja pontencializada como instituição social entre instituições sociais, e não tratada como uma empresa entre empresas, as quais visam ao lucro, à competitividade, ao consumo e à acumulação?

3. Como contribuir para que o professor e a professora sejam concebidos e efetivamente tratados como profissionais, os quais se beneficiem da liberdade de cátedra porque têm sua profissão auto-regulada, exercem o controle da formação de seus pares e têm o monopólio da prestação de serviços educacionais indispensáveis ao desenvolvimento humano e social da comunidade junto à qual atuam?

Nossas perguntas ainda estão no ar. Mas, já no dia 31 de outubro deste ano, uma pesquisa de âmbito nacional deva conta de que a "rede pública tem 42% de docentes satisfeitos", isso na Folha de São Paulo, ao passo que uma outra investigação garantia-nos que "80% dos docentes do País se sentem desvalorizados", essa última no jornal O Estado de São Paulo.

Intrigou-nos a discrepância dos dados sobre um mesmo grupo de sujeitos de pesquisa. O que terá acontecido? Só quem realizou as pesquisas pode nos dizer. No entanto, algumas falas, justificando ou questionando uns e outros resultados, podem ser debatidas. E é isso o que faremos neste artigo.

A Folha On-Line traz a palavra da professora Ângela Soligo, coordenadora do curso de Pedagogia da Unicamp, para quem "pesquisas com um grande número de entrevistados, em que as opções de resposta têm de ser determinadas, pode tornar o resultado impreciso. 'Aquele professor que está mais ou menos satisfeito pode ter escolhido a opção satisfeito', acrescentando que um estudo como esse, 'não pode ser encarado como verdade absoluta, mas sim um indicador a ser investigado com pesquisa qualitativa'". Parece-nos sensata a ponderação de Soligo, uma vez que apenas números não nos dizem nada. Eles precisam ser interpretados, analisados e compreendidos naquilo que querem nos indicar, o que só pode ser feito com pesquisas que utilizam metodologias qualitativas.

Sobre a pesquisa que apontou a insatisfação dos professores na ordem de 80%, encomendada pela Organização dos Estados Ibero-Americanos, temos a ressaltar a palavra de Yves de La Taille, docente do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. Para o professor Yves, "nos últimos anos houve uma redução do grau de valorização do professor. 'Mas a redução não aconteceu apenas em relação ao professor, mas a valorização da sociedade em relação à política e até religião'", segundo a matéria do Estadão.

Pensamos que o alerta da professora Soligo se confirmou no mesmo dia, em uma matéria de um veículo de comunicação de massa diverso daquele da pesquisa que foi convidada a comentar. Pelas evidências empíricas, cremos que, realmente, a insatisfação dos professores com a docência por causa das precárias condições de exercício da profissão chega mesmo aos 80%. Por isso, parece-nos prudente afiançar os resultados da pesquisa publicada no Estadão, e reservar tempo para uma análise mais acurada daquela que a Folha On-Line veiculou.

Nesse sentido, acreditamos ser um bom momento para reivindicarmos a profissionalização do magistério pela via da auto-regulação, do controle da formação inicial e continuada e pelo exercício do monopólio do exercício da profissão. Não se trata, obviamente, de reserva de mercado, muito menos de fechamento de uma categoria profissional sobre si mesma, mas de organização de suas forças para fazer valer o seu real valor, o qual deve ser socialmente reconhecido, validado e efetivamente respeitado no cotidiano da prática escolar.

Claro que essa idéia assusta os "papa-cifrões" donos de empresas educacionais, bem como as instâncias de governo que têm de manter a educação pública estatal. Ela também assusta os sindicatos, os quais, perante a idéia de os professores e professoras se unirem em uma Ordem dos Profissionais da Educação, entendem, a priori, que perderão poder. Assusta, inclusive, os próprios docentes, que passam a tomar ciência da importância social de seu papel. Contudo, em vez de ceder ao medo do novo, talvez a melhor saída seja a de aceitá-lo como um desafio válido e merecedor de enfrentamento.

Nesse sentido argumentava a professora Ilma Passos Alencastro Veiga, da UnB. Segundo ela, só no dia em que os professores se organizarem e lutarem por seus direitos, a tão sonhada profissionalização do magistério será uma realidade entre nós. Ela, que tem uma larga experiência de pesquisa sobre o assunto, com publicações reconhecidas em âmbito internacional, incentiva-nos a que esforcemo-nos por esse objetivo comum. De nossa parte, entendemos como digno de respeito o desafio que Ilma Passos nos apresenta, pois se continuarmos desorganizados, estaremos validando o antigo ditado de que quem divide é porque quer ter maior facilidade para dominar, à custa da insatisfação de 80% daqueles que desempenham a profissão de professor.

Se assim é, que rompamos com nossas fragmentações. Que somemos força e que lutemos por nossa profissionalização. Se nós, professores e professoras, não agirmos desse modo, quem, nesse país do faz-de-conta, poderá fazer isso em nosso lugar?


Autor: Wilson Correia


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