MEMÓRIAS DA EDUCAÇÃO DOS ANOS 1970



Este trabalho surgiu como oportunidade de fazer uma arqueologia do ensino público na década de 1970, tendo como parâmetro a minha experiência de migrante do interior do Estado, para concluir estudos no Centro Educacional Edgard Santos (CEES), na cidade do Salvador. O texto pode auxiliar professores e gestores a compreenderem criticamente como e porque algumas práticas pedagógicas, passados mais de trinta anos, ainda se encontram presentes no cotidiano das escolas. Palavras-chave: tecnoburocracia – autoritarismo – pedagogia mecanicista

INTRODUÇÃO

Um de resgate da memória, distante do fenômeno analisado (33 anos), se assemelha muito ao trabalho de busca arqueológica, pois se trata de encaixar detalhes de tempo e espaço diferentes, sem se deixar "contaminar" com o presente.

Este artigo buscará uma análise do meu ingresso no Centro Educacional Edgard Santos (CEES), no ano de 1974, destacando aspectos ligados à gestão, a didática, o plano político ideológico predominante naqueles dias que deram origem a uma tecnocracia escolar cujos reflexos marcaram toda uma geração de alunos, professores e a sociedade como um todo.

Naqueles dias os processos e métodos pedagógicos estavam distantes de um projeto político crítico, herança que ainda interfere na construção das relações pelo elenco de representações sociais negativas que ajudou a forjar na escola brasileira.

O trabalho interessa a alunos dos cursos de licenciatura que porventura desejem conhecer os alicerces que sustentam a idéia de alguns segmentos da geração anterior, de seus familiares e professores dos níveis anteriores ao ensino superior.

A escolha do método, pelo distanciamento dos dias é de caráter histórico, pois possibilita uma análise e interpretação de situações para compreender a realidade existente e tirar algumas conclusões sobre a complexidade, dinâmica e as teias de motivações que deram sustentação ao objeto de estudo.

1A REALIDADE DA EDUCAÇÃO FUNDAMENTAL

Era o tempo do pré-histórico e dinossaureano curso primário, de cinco anos que se estendia do primeiro ao quinto ano, integrado ao "preliminar" que era uma espécie de "jardim de infância", o que estendia o curso primário para seis anos.

A esse tempo, na seqüência da escolaridade (educação), tínhamos o nobre "curso secundário" ou ginasial com ramificação para os cursos "clássico", "científico", "normal" ou "técnico" - qualquer destes em três anos.

O curso ginasial em quatro anos e demais seqüencial existia praticamente somente nas grandes cidades; de sorte que os abastados pais daquele tempo tinham que se contorcer com internatos, pensões e hospedarias na capital para que os filhos prosseguissem a nobreza da escolaridade no ginásio, para não deixá-los estagnados num básico curso primário; ao passo que a grande massa do estudantado confinava-se aí em sua formação escolar.

Centrado em conteúdos e no mecanicismo do aprendizado pautado no "decoreba", o curso primário de cinco (ou seis) anos daquela época da "roda quadrada", ainda nos dias de hoje é conclamado pelos saudosistas como uma invejável escolaridade.

Naqueles ditos e antigos tempos do curso primário de cinco (ou seis) anos o "aluno" era conduzido e o professor "garantia" que em suas turmas se aprendia a ler, a escrever, a acentuar. Tinha cópia e ditado. Emprego do verbo (presente passado e futuro); emprego dos pronomes (eu, tu ele), aprendia-se gramática – sujeito, predicado e objeto (in)direto; sinônimo das palavras; as quatro operações em matemática, carroção. Contas de dividir. E em ciências, os livros abordavam muito sobre o corpo humano; sobre animais, sobre as plantas. Era um tempo em que a escolaridade e os costumes exigiam a que se usasse o lápis, a caneta, o quadro e o giz, para se demonstrar o que foi ensinado.

Com relação a esta condição, Gadotti ressalta que:

[...] a história da educação brasileira é a história de educação do colonizador. Nessa pedagogia, o educador tem por função policiar a educação para que não se desvie da ideologia do dominador. (GADOTTI, 1991 p. 16).

Sem a crítica mais acurada, foram estas características que criaram o ícone da educação de excelência nas escolas públicas, como selo de integridade e o ensino particular então estigmatizado pelo "pg/pp" (pagou, passou), hoje o ensino particular tornou-se referência de escola e serviço com respeitável liderança na formação, educação e escolaridade dos nossos dias.

Em contraposição é possível uma

[...] pedagogia oposta à pedagogia do colonizador (pedagogia do conflito), o educador reassume a sua educação e seu papel eminentemente crítico: à contradição (opressor/oprimido) ele acrescenta a consciência da contradição, forma gente insubmissa, desobediente, capaz de assumir a sua autonomia e participar na construção de uma sociedade mais livre. (GADOTTI, 1991 p. 16).

Os que viveram aqueles dias, não identificam a pedagogia do conflito, e por isso não sentem vergonha em admitir que ainda recorrem às lições do antigo curso primário; tendo-o em conta de uma "boa base", afinal "ou estudava ou não passava"; as reprovações para a garantia ao futuro, do ensino e do homem.

2ESTUDAR NA CIDADE GRANDE: A NOVA REALIDADE E O CHOQUE CULTURAL

Nascido no contexto geográfico da Bahia denominado "polígono das secas", aos 11 anos, após concluir a 5.ª série do atual ensino fundamental,na Escola Municipal Dr. Mário Nou, fui "remetido" para a capital do Estado (Salvador) a fim de dar continuidade aos estudos em casa de parentes. Embora fizesses constantes visitas à cidade, estas não duravam mais que 15 dias, a saída para uma temporada letiva se constituiu em um choque cultural intenso.

Os colegas com um outro sotaque, com brincadeiras diferentes, o colégio imenso, com dois andares e um total de 14 salas de aula.

A minha realidade era de uma escola municipal, em um povoado distante da capital 300 km, num período em que os meios de comunicação mais eficientes eram o rádio, a carta e o telegrama.

Os professores, uma para cada disciplina eram uma novidade. Afinal a professora Dacilda Rios era uma sábia, ensinava a todos com o seu curso de magistério de forma inter e transdisciplinar, quando nem se tocava neste assunto. Além de zelar pela ordem e postura comportamental com uma régua de jacarandá que não poupava os que cabulavam as aulas, os que não conseguiam se sobressair na sabatina de tabuada e os que não cuidavam da higiene pessoal – cada piolho que ela fazia questão de verificar era um bolo.

Era um modelo de educação que, saber a tabuada de cor, "na ponta da língua", bem como a conjugação de verbos em todas as declinações e era ponto de honra para alunos e professores do antigo primário. Poucas pessoas, talvez, ousassem por em dúvida a necessidade desta mecanização.

3O CENTRO EDUCACIONAL EDGARD SANTOS

Fundado em 1965, o Centro Educacional, localizado à rua Prediliano Pita no Bairro do Garcia, levou o nome de Edgard Santos, antigo reitor da Universidade Federal da Bahia.

3.1A infraestrutura física

A infra-estrutura física das escolas, como conhecida na atualidade, é o resultado da evolução da importância do universo do ensino formal no processo civilizatório brasileiro. Até o final século XIX e até a primeira década do século XX, a maioria das escolas funcionavam em unidades habitacionais, ou em locais com estas características. A partir de 1910, por questões de higiene e saúde pública, a estrutura física das unidades de ensino começou a ser questionadas.

E, naquele ano o Major Alfredo Vidal, apresenta um projeto detalhado para construção de edifícios escolares na capital da República. Elogiado por Oswaldo Cruz, o projeto foi apresentado no ano seguinte em Paris, durante o Terceiro Congresso Internacional sobre Higiene Escolar.

As idéias do major ganham consistência e respeito, pois atendem às expectativas da arquitetura moderna da Europa, ao imaginar a infra-estrutura da escola sob dois aspectos, como uma caserna:

[...] que interioriza noções de ordem e de asseio e como uma metáfora do corpo [...] um corpo escolar saudável, que respire bem com vias de circulação de ar, que [...] enxergue bem, com iluminação adequada, [...] que se locomove bem, com espaços para exercícios físicos, [...] que dá higienicamente fim aos dejetos que produz, pela via dos vasos sanitários. (NUNES, 2003, p.387-388).

Assim, a concepção dos prédios escolares pretendia atingir novos sentimentos e comportamentos para além de suas fronteiras. Esta aceitação se dá de forma silenciosa em nome do novo, de uma arquitetura adequada, pois fora aprovada por países prósperos e modernos da Europa e pelas cidades norte americanas.

A estrutura física do CEES à época era composta de 37 dependências sendo que deste total 21 era destinadas para salas de aula, distribuídas em dois pavimentos e outras dependências distribuídas, como mostra o quadro I seguinte e as fotos exibidas ao final do trabalho:

DEPENDÊNCIAS DO CEES


Autor: JOSÉ TADEU NERIS MENDES


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