CRIOTERAPIA COMO COADJUVANTE NO TRATAMENTO DA ESPASTICIDADE EM PACIENTES COM ESCLEROSE MÚLTIPLA



FACULDADE ANHANGUERA DE SANTA BÁRBARA

CRIOTERAPIA COMO COADJUVANTE NO TRATAMENTO DA ESPASTICIDADE EM PACIENTES COM ESCLEROSE MÚLTIPLA

Daiane Aparecida Terci Higa

Teresa de Godoi Souza

ORIENTADOR (A):

Profª. Andreza Maria Luzia Baldo de Souza

Santa Bárbara D´Oeste

Dezembro 2008

CRIOTERAPIA COMO COADJUVANTE NO TRATAMENTO DA ESPASTICIDADE EM PACIENTES COM ESCLEROSE MÚLTIPLA

Daiane Aparecida Terci HigaI; Teresa de Godoi SouzaI; Andreza Maria Luzia Baldo de SouzaII

I Acadêmica da Faculdade Anhanguera de Santa Bárbara – SP

II Professora Supervisora Especialista do Setor de Neurologia da Faculdade Anhanguera de Santa Bárbara – SP

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RESUMO

A crioterapia é uma das técnicas mais utilizadas pelos fisioterapeutas atualmente por ser uma técnica de baixo custo e de prático manuseio. Esta tem como ação fisiológica a diminuição da descarga fusal, além da ação antiespasmódica e antiespástica. A Esclerose Múltipla é uma doença neurológica de caráter inflamatório e degenerativo que apresenta como uma das principais complicações a espasticidade. OBJETIVO: apresentar uma breve revisão da fisiologia da espasticidade assim como os efeitos fisiológicos da crioterapia e sua possível aplicação em portadores de EM. MÉTODO: levantamento bibliográfico de livros, artigos e sites científicos nas bases de dados atualmente disponíveis. RESULTADOS: foram encontrados poucos registros acerca do tema, no entanto os achados fisiológicos da utilização de crioterapia para redução da espasticidade em outras patologias sugerem o uso do gelo como coadjuvante no tratamento da espasticidade em portadores de EM, porém necessitando de melhores comprovações científicas.

Palavras - chave:

esclerose múltipla, espasticidade, crioterapia.

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INTRODUÇÃO

Werner (2005) descreve a Esclerose Múltipla como uma doença neurológica, desmielinizante e inflamatória de etiologia auto-imune comprometendo o SNC. A palavra esclerose significa cicatriz endurecida. No caso dessa doença, a mielina é atacada e no processo inflamatório é substituída por tecido cicatricial. À medida que a mielina é substituída, os impulsos elétricos destinados a manter o SNC íntegro, entram em curto-circuito. Os sinais e sintomas dependem da área e da quantidade de tecido nervoso que foram lesionados. A progressão dessa doença é imprevisível.

Wander & Iracy apud Umphred (2004), relatam que a EM é determinada pela carga genética e a influência ambiental. Ocorre normalmente em indivíduos brancos com idade entre 15 e 50 anos, do sexo feminino, podendo ser de etiologia viral, sendo provável que o dano à mielina seja pelo sistema imune. Os sinais e sintomas comuns são: espasticidade, fraqueza muscular, hiperreflexia, Babinsk; dor moderada ou intensa; visão afetada, vertingens; disfunção vesical, intestinal e/ou sexual; depressão, euforia; fadiga.

Segundo descrição de Umphred (2004), normalmente os sintomas surgem no decorrer de um dia, podendo reaparecer em poucas horas, ou em alguns dias ou semanas.

Cardoso, Oliveira & Almeida (2005) relatam que a espasticidade é uma característica que ocorre em 90% desses pacientes, esta criará um desequilíbrio da atividade muscular, com maior reflexo de estiramento, postura anormal e padrões de movimento em massa. A hipertonia juntamente com a espasticidade é mais marcada no início do movimento, podendo ser modificada por fatores externos como a crioterapia que é o resfriamento ou diminuição da temperatura dos tecidos.

Scott (2004) define crioterapia como tratamento dos pacientes com a utilização do gelo, ocasionando alterações fisiológicas com fins terapêuticos. Os efeitos fisiológicos da crioterapia ocorrem na redução de dor, espasticidade, velocidade de condução nervosa, transmissão neuromuscular, fluxo sanguíneo, edema e atividade metabólica. Também reduz a atividade do fuso muscular, junção neuromuscular e nervos periféricos.

Segundo Cosenza et al (2008), recomenda-se o uso da crioterapia como recurso terapêutico diário na redução da espasticidade, facilitando ao paciente a realização de suas atividades de vida diária, melhorando também seu desempenho durante as sessões fisioterapêuticas.

Lianza et al (2006) relatam que o frio é utilizado como efeito transitório no controle da espasticidade em doenças como a Esclerose Múltipla por reduzir a sensibilidade ao reflexo de estiramento do fuso neuromuscular e por inibir os motoneurônios pelas vias polissinápticas.

Guirro & Guirro (2004) salientam que há de quatro a dez vezes mais pontos sensíveis ao frio do que ao calor nas áreas cutâneas e que a aplicação do gelo por 40 minutos ininterruptos, diretamente sobre a pele, é suficiente para diminuir as propriedades elétricas do músculo bíceps braquial.

Segundo Morales (2007), a doença pode causar repercussões importantes na vida dos pacientes, provocando impacto negativo comparado à população geral, mesmo nas fases de menor incapacidade.

Hobart (2006) relata que a espasticidade requer tipicamente uma combinação de tratamentos, e deve envolver uma aproximação focalizada no paciente, coordenada e multidisciplinar da equipe.

Os parágrafos seguintes descrevem brevemente a fisiologia da espasticidade e os efeitos fisiológicos da crioterapia.

Segundo descrição de Teive (1998), a espasticidade é um acometimento neurológico em que ocorre um desequilíbrio da contração muscular, conseqüentemente uma desregulação do tônus, com exacerbação dos reflexos profundos, devido à hiperexcitabilidade do reflexo do estiramento. Esta se associa à síndrome do neurônio motor superior, apresentando como sinais clínicos fraqueza muscular, hiperreflexia profunda e presença do sinal de Babinski. Surge durante a realização de movimentos ativos e passivos, dependendo da velocidade imposta. A hipertonia é secundária à perda das influências inibitórias descendentes (via retículo-espinhal), como resultado da lesão do trato córtico-espinhal (piramidal). A perda da influência inibitória descendente resultará em aumento da excitabilidade dos neurônios fusimotores gama e dos moto-neurônios alfa. Uma descarga excessiva dos neurônios gama pode constituir a base do estado patológico da espasticidade, resultante de descarga aumentada dos centros cerebrais superiores. Temos como principais neurotransmissores envolvidos no mecanismo do tônus muscular o ácido gamaminobutírico (GABA) e glicina (inibitórios) e glutamato (excitatório), noradrenalina, serotonina, neuromoduladores (como adenosina) e vários neuropeptídeos.

Pinheiro (2006) relata que a crioterapia é uma das técnicas mais utilizadas pelos fisioterapeutas atualmente para auxiliar no tratamento da espasticidade por ser uma técnica de baixo custo e de fácil manuseio. Esta tem como ação fisiológica a diminuição da descarga fusal além de ação antiespasmódica e antiespástica. Os fatores que podem influenciar a crioterapia são: temperatura ambiente temperatura da pele, temperatura da técnica, local e área de superfície a ser tratada, tempo de aplicação e intervalo entre as aplicações.

Segundo Guirro & Guirro apud Lehmann et al. (2004), a sensibilidade das fibras nervosas ao frio depende da mielinização e do diâmetro da fibra. Um dos efeitos da crioterapia sobre as fibras nervosas amielínicas é o aumento do limiar da sensibilidade dolorosa, no entanto, para que isso ocorra, são atingidas antes as fibras mielínicas responsáveis pela contração muscular e propriocepção. O gelo age diretamente no fuso muscular e no órgão tendinoso de Golgi.

Umphred (2004) relata que a velocidade de condução do nervo periférico, tanto em fibras mielinizadas grandes quanto em fibras desmielinizadas pequenas, diminui 2,4m por °C de resfriamento. Como resultado, a percepção de dor e a contratilidade do músculo diminuem. Receptores periféricos tornam-se menos excitáveis. A resposta do fuso muscular ao alongamento diminui; como resultado, o espasmo muscular também diminui.

Kitchen (2003) salienta que os fusos musculares respondem mais rapidamente do que outras estruturas neurais e musculares à medida que a redução necessária da temperatura para produzir mudanças não é tão grande. Com temperaturas reduzidas, a sensibilidade do fuso muscular cai em proporção ao grau de resfriamento, possivelmente como resultado de um efeito direto sobre o terminal sensitivo, ou à medida que a freqüência de disparo dos aferentes Ia é diminuída, ou pelos dois motivos. Para que esse efeito seja conseguido, parece ser necessário um resfriamento minucioso do músculo, presumivelmente para assegurar o resfriamento dos fusos que estão embebidos na estrutura muscular. As fibras musculares de contração rápida são mais suscetíveis ao resfriamento.

Segundo Kitchen apud Price et al

(2003) foi demonstrada uma redução significativa da espasticidade no tornozelo (secundária a traumatismo craniano) após a aplicação de uma bolsa de gelo líquido no músculo gastrocnêmio, depois de um resfriamento cuidadoso durante 20 minutos.

Davies (1996) relata que quando se dispõe de gelo moído, o terapeuta mergulha a mão do paciente em um balde que contém uma mistura de gelo e água. A mistura consiste em aproximadamente um terço de água e dois terços de gelo, de tal modo que a mão possa ser introduzida facilmente, e o frio adicional é produzido pelo gelo que está derretendo. O terapeuta afunda a mão do paciente três vezes no gelo, com uma breve pausa entre as imersões. A sensação experimentada pela sua própria mão indicará por quanto tempo o frio pode ser tolerado.

Para Gracies (2001), embora o banho de imersão frio (10 a 20 minutos em 26,7 °C) seja recomendado em pacientes com esclerose múltipla, há estudos recentes conflitantes, de que a espasticidade tem aumentado depois de um banho de imersão (24°C) nessa mesma patologia.

Segundo Guirro & Guirro (2004), com o frio prolongado, a transmissão de impulsos aferentes e eferentes é reduzida. Simultaneamente, a taxa metabólica no tecido resfriado também é reduzida. Para Kitchen (2003), os diferentes efeitos do resfriamento são conseqüência de fatores como: o volume do tecido, a composição do tecido, a capacidade do tecido de modular os efeitos do resfriamento – em grande parte um fator ligado ao suprimento sangüíneo, velocidade de queda da temperatura, temperatura para a qual o tecido é resfriado.

Para Guirro & Guirro (2004), a temperatura da pele sofre decréscimo logo após o contato com o gelo, mas mesmo após sua retirada, esta resposta ainda permanece por 1 hora. Os termorreceptores na pele são estimulados e produzem uma vasoconstrição reflexa autônoma na superfície do corpo. Além disso, há um efeito constritor direto do frio sobre a musculatura lisa das arteríolas e vênulas. O fluxo sangüíneo muscular não é muito influenciado pelos reflexos térmicos, mas é determinado em grande parte pela taxa metabólica local. Os músculos ficam, geralmente, protegidos das mudanças de temperatura na superfície da pele por uma camada isolante de gordura subcutânea. São necessários 10 minutos para que se obtenha resfriamento muscular em indivíduos magros, em obesos 30 minutos, pois somente com esse tempo o resfriamento consegue ultrapassar a camada de gordura. Esse recurso só deve ser utilizado se o paciente tolerar a terapia, ou seja, não sentir angústia durante o tratamento e quando não houver alteração de sensibilidade.

Umphred (2004) descreve que felizmente são raros os efeitos graves da crioterapia. A maior parte deve-se à hipersensibilidade ao frio e as contra-indicações são para o fenômeno de Raynaud, gota, e crioglobulinemia.

Pinheiro (2006) refere que é necessário fazer um teste de hipersensibilidade ao frio, este consiste em uma aplicação de aproximadamente 10 a 20 segundos usando um cubo de gelo sobre um ponto da pele e após esse período verifica-se a condição da pele. Se a hipersensibilidade ocorrer, isso deve ser documentado e o tratamento com a crioterapia suspenso.

METODOLOGIA

Neste trabalho foi realizado um levantamento bibliográfico em livros clássicos da literatura e busca de artigos nas bases de dados: Bireme, Pubmed, Scielo e World Gate.

As palavras-chave utilizadas nas bases de dados foram: esclerose múltipla, crioterapia, espasticidade. O cruzamento da pesquisa foi realizado da seguinte maneira: crioterapia e espasticidade, crioterapia e Esclerose Múltipla.

CONCLUSÃO

Conclui-se que os resultados do presente estudo oferecem dados e evidências favoráveis quanto à redução da espasticidade com o uso da crioterapia, porém, os benefícios e eficácia de sua aplicação nos portadores de Esclerose Múltipla necessitam de melhores comprovações científicas.

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Autor: Daiane Higa


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