O POETA, O CRONISTA E O LEITOR



O Poeta e o cronista se encontraram e começaram a conversar, cada um puxando a brasa pra sua sardinha, claro. O poeta, com sutileza e sensibilidade, ensaiava sua tese de superioridade da poesia sobre a crônica, insinuando que o poema é literatura de maior relevância, pois fala de amor, de natureza, de paz, das coisas do coração, enfim, a poesia seria a língua da alma, não havendo atividade intelectual da escrita que a superasse. O cronista, com o ar prático que lhe é peculiar, não ficou pra trás e opôs argumentos contrários, afirmando que a crônica é mais importante do que a poesia, pois lida, regra geral, com o cotidiano, com a realidade da vida, mostrando a cara das pessoas e da sociedade, configurando-se infinitamente superior à poesia.

 

A conversa entre ambos parecia não ter fim e já caminhava para ares menos amistosos, eis que cada um queria demonstrar a superioridade de seus ofícios. Sentindo o clima tenso, o Leitor se aproximou da dupla de intelectuais e falou-lhes que tanto gostava de poesia como de crônica e não via superioridade de uma sobre a outra, pois ambas tinham sua importância e seu lugar garantido na literatura e citou poetas importantes como Bilac, Augusto dos Anjos, Cora Coralina, Álvares de Azevedo e tantos outros, mencionando também cronistas de igual relevo como Rubem Braga, João Ubaldo Ribeiro, Luis Fernando Veríssimo, entre outros grandes nomes. Disse ainda o leitor que nada impedia que um poeta também fosse cronista e vice-versa, aliás, acrescentou o Leitor, seria até melhor que fosse assim, pois vejam os trabalhos de Drummond, esse grande poeta e cronista mineiro, que se destacou nas duas áreas.

 

Nessa hora, o Poeta e o Cronista estavam entre orgulhosos e envergonhados. Orgulhos porque tiveram a certeza de que o Leitor aprecia os seus escritos e envergonhados porque não esperavam receber uma lição daquele que deveria aprender com o trabalho deles e não o contrário e quando já iam agradecer a oportuna intervenção do Leitor, este arrematou: - A boa poesia deve absorver em seu texto, mesmo que sutilmente, o ar prático e claro da crônica, a fim de melhor mostrar a sua alma, assim como a crônica deve herdar da poesia sua sensibilidade e escolha certa das palavras. Crônica e poesia não são diferentes, apenas se completam.


Autor: sander dantas cavalcante


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