Da necessidade de legislação específica de âmbito nacional para a competência do ICMS nas importações por conta e ordem de terceiros.



De acordo com a Lei Complementar 87 de 1996 cabe também o recolhimento de ICMS nas importações realizadas por pessoas físicas ou jurídicas. Procurando aumentar as formas de favorecimento às empresas brasileiras surgiu a modalidade de importação considerada importação por conta e ordem de terceiros. Nesta modalidade a empresa adquirente realiza quase toda a importação, cabendo a importadora apenas a prestação de serviços. Tendo em vista a nova forma de negócio, surge a dúvida quanto à competência do recolhimento do ICMS, se ao Estado da Importadora ou da Adquirente. São Paulo e Espírito Santo solucionaram o impasse tendo como sustentação uma decisão do Supremo Tribunal Federal que designava o Adquirente como real importador. No entanto, o Espírito Santo não é o único Estado portuário e nem São Paulo o único Estado possuidor de empresas adquirentes de mercadorias oriundas do exterior. Para isto, necessário se faz uma regulamentação específica para tal ato jurídico, com o intuito de evitar qualquer tipo de encontro entre normas e estabelecendo de forma nacional, clara e taxativa, a competência do recolhimento do ICMS nas importações por conta e ordem de terceiros.

A competência do recolhimento de ICMS nas importações por conta e ordem de terceiros é um assunto há muitos anos objeto de guerra fiscal política, e não mais jurídica, entre os Estados.

São Paulo e Espírito Santo foram os últimos estados a fazerem parte desta batalha, cujo ápice foi atingido em 20.03.2009 com publicação da Decisão Normativa CAT nº 3/2009 e recentemente disciplinado em acordo firmado entre eles por meio do Protocolo ICMS nº 23/2009, que abrangeu também as importações por encomenda, modalidade criada pelo governo federal em 2006.

Quando falamos de importação por conta e ordem de terceiros, falamos de uma modalidade utilizada por basicamente todos os Estados brasileiros, seja como importador ou como adquirente.

O ICMS é regulamentado pela Constituição Federal, por leis específicas, regulamentos e instruções normativas. Trata-se de um tema repleto de teorias diferenciadas e de grandes discussões entre tributaristas e empresas que lidam com o comercio exterior, gerando algumas ações judiciais que chegaram, inclusive, a instância máxima da Justiça brasileira, o Supremo Tribunal Federal.

Antes de falar da guerra política e da necessidade de uma legislação específica para a competência do recolhimento do ICMS nas importações por conta e ordem de terceiros, mister tecer breves considerações sobre as modalidades de importação, em específico, a por conta e ordem de terceiros.

Existem três modalidades de importação, a importação comum, a importação por conta e ordem de terceiros e a importação por encomenda.

As organizações, cada vez mais e por diversos motivos, vêm optando por focar-se no objeto principal do seu próprio negócio (atividades-fim) e por terceirizar as atividades-meio do seu empreendimento.

Essa tendência ocorre também no comércio exterior. Algumas empresas vêm terceirizando suas operações de importação de mercadorias. Uma das formas de terceirização reconhecida legalmente e devidamente regulamentada pela Secretaria da Receita Federal (SRF) é a importação por conta e ordem de terceiros.

Importar nos dias atuais não significa mais possuir um ativo suficiente para arcar com as despesas gerais de importação, seja do produto ou de seus impostos.

A Importação por conta e ordem de terceiros é regulamentada pela SRF pela Instrução Normativa nº 225, de 2002, que impõe requisitos e condições para a atuação de pessoas jurídicas importadoras em operações procedidas por conta e ordem de terceiros e a IN SRF nº 247, de 2002, que estabelece, entre outros, obrigações acessórias, tanto para as empresas importadoras por conta e ordem, quanto para as empresas adquirentes.

Nessa operação, uma empresa – a adquirente –, interessada em uma determinada mercadoria, contrata uma prestadora de serviços – a importadora por conta e ordem – para que esta, utilizando os recursos originários da contratante, providencie, entre outros, o despacho de importação da mercadoria em nome da empresa adquirente.

Importar por conta e ordem de terceiros virou assunto em destaque nos últimos anos tendo em vista os inúmeros incentivos fiscais e a falta de uma reforma tributária regulamentando-os.

Estados em que a economia não tem um forte destaque, se aproveitam de medidas tributarias para atraírem empresas e aumentar a sua capacidade financeira, entre elas podemos destacar a do Estado do Espírito Santo, o FUNDAP.

O FUNDAP nada mais é do que um incentivo renomeado de parcelamento, onde dos 12% (doze por cento) do ICMS, apenas 4% são destinados ao Estado e aos municípios, 8% (oito por cento) voltam para o contribuinte. 4% (quatro por cento) poderão ser utilizados como FUNDAP SOCIAL, que é um projeto de linha de crédito previamente autorizado pelo Banco de Desenvolvimento do Estado do Espírito Santo BANDES que poderá ser utilizado pela empresa Fundapiana ou vendida como crédito para terceiros. Os 4% restantes, podem ser arrendados em leilão por no mínimo 10% do valor total ou parcelados em até 5 anos com amortização de 20 anos.

Criado pela Lei 2.508 de 1970, o FUNDAP aumentou notadamente as importações realizadas pelo Espírito Santo e, principalmente, a importação por conta e ordem de terceiros. A empresa que importava por São Paulo, Minas Gerais, Santa Catarina e outros Estados, passou a importar pelo Estado do Espírito Santo. O dinheiro que as importadoras Fundapianas deixavam de gastar com o ICMS já era um lucro consideravelmente grande. Existiam até casos de empresas importadoras que ganhavam mais com o FUNDAP do que com a prestação de serviços.

O FUNDAP, sendo chamado de parcelamento ou de incentivo fiscal foi muito bem aceito pelas empresas, mas, não tão bem aceitas pelos governantes de Estados vizinhos.

Notório o grande incentivo produzido pelo Estado do Espírito Santo, que, por sinal, é um tema a ser abrangido pela futura suposta reforma tributária iminente em nosso país.

Como a Reforma não chegou, alguns Estados como São Paulo e Minas Gerais, começaram a glosar as mercadorias importadas pelo Espírito Santo, alegando que estas não deveriam ter sido tributadas no Estado do Importador e sim, no Estado do real importador nas importações por conta e ordem de terceiros, o Adquirente.

Isto posto, o incentivo fiscal continuou, no entanto, caso a importação fosse realizada por adquirente no Estado de São Paulo, este seria considerado o importador e São Paulo o Estado competente pela tributação e não mais o Espírito Santo, e caso o importador decidisse continuar efetuando a transação, haveria a dupla tributação em ambos os Estados.

A guerra fiscal foi objeto de inúmeros impasses jurídicos e políticos, até que em maio de 2009 foi firmado um acordo entre ambos por meio do Protocolo ICMS nº 23/2009.

A fim de evitar a dupla tributação, os Estados do Espírito Santo e São Paulo firmaram um acordo em que estabelece[1]:

" Cláusula Primeira – Nas operações de importação de bens ou mercadorias do exterior promovidas por estabelecimentos situados no Espírito Santo ou de São Paulo, por conta e ordem de terceiros de adquirentes situados no outro Estado, na forma estabelecida na Medida Provisória nº 2.158-35, de 24 de agosto de 2001, na Lei nº 10.637, de 30 de dezembro de 2002 e nas Instruções normativas SRF nºs 225, de 18 de outubro de 2002, e 247, de 21 de novembro de 2002, o recolhimento do Imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação – ICMS relativo à operação deverá ser efetuado pelo estabelecimento importador em favor do Estado de localização do ADQUIRENTE." (grifos nossos)

Surge então, a solução para qualquer dúvida a respeito da tributação do ICMS nas operações realizadas por conta e ordem. Sendo realizada entre Espírito Santo e São Paulo, a tributação será feita no Estado do Adquirente. O Adquirente então é o verdadeiro importador da operação.

Apesar de solucionado, a situação, no entanto, não foi bem aceita, principalmente pelo Estado do Espírito Santo, e hoje é objeto de muito questionamento na área tributária no que tange a sua constitucionalidade.

Notório, no entanto, é o fato de que apesar da discussão ser jurídica ela se tornou exclusivamente política, fazendo saber então qual seria o Estado que se beneficiaria mais com o protocolo.

Trazer um ótimo incentivo fiscal ao Estado do Espírito Santo, atrai um número grande de empresas, mas, além de atrair várias empresas para o Estado, estava atraindo, também, empresas de outros Estados, como o de São Paulo, que deixavam de importar por outros portos, especificamente o de Santos, para importar pelo porto de Vitória no Espírito Santo, enriquecendo cada vez mais os cofres públicos Espírito-santenses e esvaziando os Paulistas em na arrecadação do ICMS.

Como citado anteriormente, o incentivo do FUNDAP-ES já foi objeto de várias discussões entre políticos quando se falava em reforma tributária. Sabemos que, em virtude da crise que assola o país, a reforma tributária acabou ficando em "stand by", razão pela qual o Estado de São Paulo para não se prejudicar mais com a situação decidiu criar a CAT nº 3/2009 que originou o Protocolo em destaque.

Mister observar, no entanto, a falta de uma regulamentação específica nacional acerca do assunto.

O confronto entre jurídicos e não mais políticos, surge quanto à Constitucionalidade do Protocolo firmado entre os Estados.

Cita nossa Constituição Federal que[2]:

" Art. 155.Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

(...)

II - Operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior.

IX – Incidirá também:

a)sobre a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja sua finalidade, assim como sobre o serviço prestado no exterior, cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o domicílio do destinatário da mercadoria, bem ou serviço

XII – Cabe a lei complementar:

a)definir seus contribuintes

d)fixar, para efeito de sua cobrança e definição do estabelecimento responsável, local das operações relativas à circulação de mercadorias e prestação de serviços " (g.n)

Para alguns doutrinadores, a Constituição é clara, para outros, totalmente complexa no assunto objeto de estudo. Clara no sentido de demonstrar que o Estado competente para o recolhimento do ICMS na importação é o Estado do destinatário da mercadoria, mas, complexa quando estabelece poder à apenas Lei Complementar de definir os seus contribuintes.

A Lei Complementar que rege o ICMS é a Lei Complementar 87[3]:

" Art. 11. O local da operação ou da prestação, para os efeitos da cobrança do imposto e definição do estabelecimento responsável, é:

I- tratando-se de mercadoria ou bem:

a) do estabelecimento onde se encontre, no momento da ocorrência do fato gerador;

Art. 12. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:

IX – do desembaraço aduaneiro de mercadorias ou bens importados do exterior." (g.n)

Ora, se a Constituição Federal define que cabe exclusivamente à Lei Complementar definir o contribuinte, e o local do fato gerador, a Lei Complementar é clara em afirmar que o fato gerador ocorre no momento do desembaraço aduaneiro, e este desembaraço ocorre no Estado do Importador e não do Adquirente. Isso vai de encontro com o protocolo firmado.

Nota-se, partindo da premissa de que o Estado do Adquirente é onde deve ser recolhido o ICMS, a Constituição é clara ao afirmar que o imposto será arrecadado no domicílio do destinatário da mercadoria. Se partirmos da idéia de que o Estado da importadora, é o responsável, a Constituição também nos dá amparo ao afirmar que cabe a Lei Complementar definir o estabelecimento, o local da tributação do imposto, no caso, o local do desembaraço aduaneiro.

A Instrução Normativa 247/02 da Receita Federal em seu artigo 12 afirma ser o real importador nas importações por conta e ordem de terceiros a empresa que promover o despacho aduaneiro.

A Discussão não é recente, por isso, em 01 de Maio de 2005 o STF no Recurso Extraordinário após inúmeras decisões contrárias a essa, decidiu ficar ao lado do Estado do Adquirente, e em decisão decidiu[4]:

"12. Na oportunidade, adotamos o entendimento que, independente do local onde haja ocorrido o desembarque da mercadoria, e conseqüentemente, o seu desembaraço aduaneiro, deve ser considerado o sujeito ativo do ICMS o Estado de domicílio do estabelecimento destinatário da mercadoria. (Rec. Ext. 268.586-1 – São Paulo – Relator Carlos Ayres Brito)"

A partir desta decisão, utilizando-a como jurisprudência mor, o Estado de São Paulo firmou o protocolo com o Estado do Espírito Santo, definindo o local da tributação do ICMS nas importações por conta e ordem de terceiro.

Por derradeiro, no entanto, devendo receber o maior destaque da obra, observa-se que não existem importações por conta e ordem de terceiros apenas no Estado do Espírito Santo e em São Paulo, mas sim, no Brasil inteiro.

Ora, um protocolo firmado entre os estados em questão não tem força alguma entre outros Estados do Brasil. Se o Estado de Pernambuco começar a firmar importações com Adquirentes em outros Estados (o que já ocorre), e estes outros Estados quiserem tributar novamente o ICMS alegando serem eles competentes, irá surgir uma nova discussão acerca do assunto. Sendo assim, algo tão importante na seara da importação vai terminar sendo regulamentada por Protocolos de Acordos firmados entre Estados, cada qual com o seu entendimento.

Alhures, mais do que necessário, é uma Legislação Federal para regulamentar de forma clara e taxativa a competência no recolhimento do ICMS nas importações por conta e ordem de terceiros, que hoje faz parte da rotina de trabalho de todas importadoras, tradings e empresas em geral.

Algo de suma importância que compõe o cotidiano entre empresas brasileiras, principalmente, em cidades portuárias, não pode continuar sendo regulamentado por simples protocolos firmados entre estados. Como já citado anteriormente, o recolhimento do ICMS, de acordo com a nossa Magna Carta, Constituição Federal, deve ser regulamentada por Leis Complementares, e se a Lei Complementar possui lacunas quanto à competência do ICMS na importação por conta e ordem de terceiros, que seja implantada uma nova Lei que não de espaço para qualquer tipo de contradição.

De acordo com a hierarquia jurídica brasileira, a Constituição Federal é o topo da pirâmide, seguida das Emendas Constitucionais e Leis Complementares. Ambas citam o recolhimento do ICMS, abrindo espaço para várias posições diferenciadas por doutrinadores e é notório que um simples acordo feito entre Estados em forma de Protocolo não será impasse para futuras discussões.

Para concluir, observa-se uma grande discussão entre Estados brasileiros quanto à competência para o recolhimento do ICMS nas importações por conta e ordem de terceiros. A Legislação brasileira abre espaço para diferentes posições entre doutrinadores e políticos devido à falta de um conteúdo claro, específico e taxativo. O STF sempre foi favorável ao recolhimento do ICMS no Estado do Importador, no entanto, no último julgado do Recurso Extraordinário 268.586-1 – São Paulo –do Relator Carlos Ayres Brito, a competência é exclusiva do Estado do Adquirente, e este é o real importador. Mantendo a idéia do STF e tendo esta como fundamentação, os Estados de São Paulo e Espírito Santo fizeram um Protocolo de ICMS 23/2009, definindo que a competência do recolhimento do ICMS será no Estado da Empresa Adquirente.

A idéia é interessante, mantém a posição da maior Instância Jurídica Brasileira, no entanto, um assunto de suma importância como tal, não deve ser regulamentada apenas por Protocolos firmados entre Estados, mas sim, uma Lei Nacional.




Autor: Leonardo Mariot


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