Do Codicilo



José Ricardo Romão da Silva

Acadêmico de Direito da Universidade de Ribeirão Preto – UNAERP

Estagiário do Ministério Público do Estado de São Paulo

O acontecimento singular que desperta na humanidade mais interesse do que a própria vida é, sem quaisquer sombras de dúvidas, a sua extinção pela morte. Com efeito, a morte é tema de reflexão sobre o homem e a sua existência, uma vez que é também causa do desaparecimento da sua vida social.

Em que pese o desaparecimento do corpo físico, faz-se mister, entretanto, dar uma continuidade nessa vida social, mormente no que se refere à família e propriedade do finado. Exsurge, pois, questões diversas e palpitantes, a exemplo do funeral, da destinação dos bens deixados pelo falecido, entre outros assuntos concernentes ao direito da sucessão.

Impende destacar, outrossim, que o ordenamento jurídico brasileiro preocupou-se com os desejos pífios e pequenos do finado, os quais, não raramente, deixam de ser realizados pelos familiares após a sua morte. Nesse diapasão, salta aos olhos o instituto do codicilo.

Realmente.

Sob as luzes desse instituto jurídico, bem se posicionou Carlos Maximiliano, ao lecionar, com maestria que "Codicilo vem a ser o ato de última vontade pelo qual o disponente traça diretrizes sobre assuntos pouco importantes, despesas e dádivas de pequeno valor"[1].

Deveras, depreende-se do artigo 1.881, do Código Civil, que codicilo é ato e última vontade, destinado a disposições de pequeno valor, a saber, acerca do enterro, de esmolas de pouca monta a certas e determinadas pessoas, ou, também, aos pobres de certo lugar, assim como legado de móveis, roupas ou jóias, de pouco valor, de uso pessoal do disponente.

Neste sentido, convém invocar a inteligência da festejada Maria Helena Diniz, a qual ensina, in verbis:


O critério para apuração do valor é relativo, devendo-se considerar o estado social e econômico do codicilante; para tanto, o juiz examinará, prudentemente, cada caso concreto, considerando o valor da deixa relativamente ao montante dos bens do espólio.[2]

Desnecessárias grandes formalidades para a validade do codicilo. Basta, tão-somente, que seja efetuado mediante instrumento particular ou documento escrito de próprio punho, datado e assinado. Mais: admite-se, hodiernamente, codicilo datilografado, desde que datado e assinado pelo codicilante. Não se olvide, nesse trilho, que o codicilo deverá fazer disposições acerca de assuntos de somenos relevância. Explica-se melhor: não comporta destinação de bens de valor ponderável.

O codicilo destina-se, também, para várias outras finalidades, a saber: nomear e substituir testamenteiros; perdoar o indigno; bem como destinar verbas para o sufrágio da sua alma.

No tocante ao reconhecimento de filhos havidos fora do matrimônio, há autores, tais como Carlos Roberto Gonçalves, que entendem ser possível fazê-lo por meio de codicilo, "uma vez que o art. 1.609, II, do Código Civil permite tal ato por escrito particular, sem maiores formalidades"[3]. De outro lado, contrapondo-se ao aludido entendimento, vêm veementes autorizados doutrinadores, a exemplo de Washington de Barros Monteiros, o qual refuta a possibilidade de reconhecimento de filho por meio de codicilo, máxime que "com essa perfilhação, transpõe os limites traçados pelos citados arts. 1.881 e 1.883"[4].

É sobremodo válido e oportuno anotar que o entendimento é pacífico quanto a idoneidade do codicilo para instituir herdeiros ou, ainda, realizar deserdações. De igual modo, a teor do artigo 1.882, do Codex, deflui-se que o codicilo é ato autônomo, haja vista que não há quaisquer exigências legais para que alguém possa fazê-lo se, tão-somente, cometeu precedentemente um testamento.

Registre-se, por fim, que um codicilo revogar-se-á por outro codicilo, de maneira expressa ou, ainda, quando contiver disposição incompatível com o anterior.

Não se olvide, mais, que a ausência de referência ao codicilo num testamento posterior, implica revogação do codicilo. De outra banda, em hipótese alguma, pode o codicilo revogar um testamento, a despeito de a recíproca ser verdadeira. Não se desconhece, também, que, caso o codicilo esteja fechado, deverá ser aberto da mesma forma que o testamento cerrado.


[1] Carlos Maximiliano. Direito das Sucessões. 3ª Edição. Volume 1. Rio de Janeiro: Editora Freitas Bastos, 1952, p. 557.

[2] Maria Helena Diniz. Curso de Direito Civil Brasileiro. 23ª Edição. Volume 6. São Paulo: Editora Saraiva, 2009, p. 312.

[3] Carlos Roberto Gonçalves. Direito das Sucessões. 7ª Edição. Volume 4. Coleção: Sinopses Jurídicas. São Paulo: Editora Saraiva, 2004, p.54.

[4] Washington de Barros Monteiro. Curso de Direito Civil. 35ª Edição. Volume 6. São Paulo: Editora Saraiva, 2003, p.152.


Autor: José Ricardo Romão da Silva


Artigos Relacionados


Codicilo Como Instrumento Da SucessÃo TestamentÁria

Direito Das SucessÕes

Codicilo: Breves Considerações

Considerações Sobre O Codicilo

Dos Codicilos

O Codicilo

Considerações Sobre O Codicilo