JOGO, BRINQUEDO E BRINCADEIRA: SUAS IMPLICAÇÕES NO COTIDIANO INFANTIL



Evania Cristina Silva Duarte [1]

Regina Fatima de Brito[2]

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Pode-se afirmar que a escola seja um ambiente, ou lugar de tomadas de decisões. Decisões que muitas vezes são levadas para o resto de uma vida.

São das relações humanas e suas decisões que surgem o êxito ou fracasso escolar, as dificuldades e as barreiras a serem vencidas durante todo o processo de ensino. Dessa forma abordaremos o assunto relacionado aprendizagem através do lúdico, ferramenta essa que faz parte da rotina diária da criança seja qual for o espaço que esteja inserida.

Este artigo se pauta na interação entre as teorias lúdicas e o fazer pedagógico do professor.

Acredita-se que os educadores estão cientes da importância dos jogos, brinquedos e brincadeiras, mas, muitas vezes, têm dificuldade em desenvolver uma metodologia lúdica no contexto escolar.

Propomos aqui um estudo bibliográfico reflexivo em que o lúdico é uma das principais ferramentas do profissional da educação infantil e que é imprescindível que o educador seja persistente e busque uma metodologia lúdica consistente para proporcionar a criança às vivencias significativas que irão acompanhá-las pela vida a fora.

1- JOGO, BRINQUEDO E BRINCADEIRA: DIFERENTES NOMES DE CHAMAR

No cenário da produção cientifica é possível constatar uma não correspondência dos termos entre os autores. Um exemplo é Vygotsky (1989) que ora fala de brincadeira e ora usa a palavra brinquedo como correspondente. O autor chama de brincadeira o mundo ilusório criado pela criança onde os desejos irrealizáveis podem ser realizados.

Kishimoto (1996), baseando-se em Brougére (1981,1993) e Henriot (1983,1989) buscou compreender a diferença entre os termos. Assim propõe a autora:

Jogo- ação voluntária processual que inclui uma intenção lúdica do jogador, com regras internas e ocultas, possuindo caráter improdutivo e incerto e tendo um fim em si mesmo. Uma atividade livre que, se imposta, deixa de ser jogo.

Brinquedo- objeto que representa certas realidades é um substituto dos objetos reais, para que possa ser manipulado pelas crianças. Também pode representar realidades imaginárias.

Brincadeira- ação voluntária e consciente que a criança desempenha ao concretizar as regras do jogo, ao mergulhar na ação lúdica.Kishimoto (1996: 27),

Uma quarta diferenciação necessária é a delimitação do lúdico na relação entre jogo, brinquedo e brincadeira. Sobre isso Dantas (2000) explica que o termo lúdico abrange tanto a atividade individual e livre quanto coletiva e regrada.

De forma geral, Dantas (2002), afirma que: "Toda ação da criança é lúdica, pois exerce por si mesma antes de poder integrar-se em um projeto de ação mais extenso que a subordine e transforme em meio". (p.113)

Na dimensão lúdica, as atividades surgem liberadas, livres, gratuitamente, sem caráter instrumental. E, por isso se configuram como atividades prazerosas que, tendem a aperfeiçoar e constituírem-se em uma cadeia complexa de ações instrumentais subordinadas a relação entre um fim e um produto.

Desta forma, após o deleite da ação livre e prazerosa, as ações desenvolvidas no âmbito da ludicidade transformam-se e assumem o caráter de trabalho para logo em seguida lançar-se a novas descobertas gratuitas. Assim, Dantas (2002) conclui: "O jogo tende ao trabalho como a criança tende ao adulto". (p.114).

1.1- O ato de brincar para a criança

Se observarmos as atividades que a criança realiza, veremos que os jogos e as brincadeiras podem estar presentes tanto no dia-a-dia das creches e pré-escolas quanto na vida doméstica das crianças. Conseqüentemente, os professores que souberem trabalhar com os jogos e brincadeiras em seus planejamentos poderão tornar suas propostas de atividades mais adequadas à forma como as crianças pequenas se desenvolvem e aprendem.

A brincadeira é para criança um espaço de investigação e construção de conhecimentos sobre si mesma e sobre o mundo. Brincar é uma forma de a criança exercitar sua imaginação. A imaginação é uma forma que permite às crianças relacionarem seus interesses e suas necessidades com a realidade de um mundo que pouco conhecem. A brincadeira é um espaço privilegiado de aprendizagem onde age como se fosse maior do que a realidade. Ela realiza simbolicamente aquilo que ainda não tem capacidade de fazer. (Bettlheim,1988).

Bettlheim (1988), coloca que a brincadeira é uma ponte para a realidade e que nós, adultos, através de uma brincadeira de criança, podemos compreender como ela vê e constrói o mundo: quais são suas preocupações, que problemas ela sente dificuldade de colocar em palavras. Ele diz ainda que a criança escolhe a sua brincadeira de acordo com os seus desejos, problemas e ansiedades. Ou seja, brincar é sua linguagem secreta que devemos respeitar mesmo que não a entendemos.

Winnicott (1975), relata alguns pontos relevantes relacionado a origem do brincar, pois os bebes assim que nascem usam o punho, os dedos e os polegares para estimular a zona erógena oral. Após alguns meses passam a gostar de brincar com objetos como a ponta do cobertor, uma fralda, uma bola de lã, que lhe tornam vitais para o uso no momento de dormir, constituindo-se em defesa contra a ansiedade. Esse fenômeno é chamado de "objeto transicional". É tão verdadeiro que os pais ao perceberem tal apego levam objetos consigo nas viagens para acalmarem as crianças. Depois evoluem para brinquedos como bonecas, ursinhos macios, bolas ou qualquer outro. A necessidade desses objetos específicos começa em data muito primitiva, a partirdos quatros meses, e pode reaparecer em idades posteriores, sempre que a privação ameaça. O objeto transicional é simbólico. No iniciopode representar o seio da mãe, depois a própria mãe, uma pessoa, um animal de estimação ou qualquer outra coisa que seja importante para ela, e é utilizado nos momento de solidão ou quando o humor depressivo se manifesta.

No brincar, o conhecimento de si mesma, os papéis sociais evidenciados, envolvimento com os parceiros e a característica prazerosa contida no jogo remetem a criança a um tipo de conhecimento da realidade, permitindo sua apropriação e representação, contribuindo para a construção do conhecimento e da personalidade. (Dantas, 2002).

2- Jogos e brincadeiras como estímulos educacionais

Ao conceber a aprendizagem sob os aspectos cognitivos e afetivos, o jogo é um instrumento que contempla esses dois aspectos. Segundo Piaget (1990), o jogo é a construção do conhecimento, agindo sobre os objetos, as crianças, desde pequenas estruturam seu espaço e o seu tempo, desenvolve a noção de causalidade à representação e finalmente a lógica.

O jogo, por ser livre de pressões e avaliações cria um clima de liberdade, propicio a aprendizagem e estimulando a moralidade, o interesse, a descoberta e a reflexão, propiciando o êxito através da experiência, pois é significativo e possibilita a auto descoberta, a assimilação e a integração com o mundo por meio de relações e de vivências (Piaget, 1990).

Durante as interações proporcionadas pelos jogos é que se desenvolve o respeito mutuo entre adulto e crianças e entre criança-criança, dentro de um clima afetivo, em que ela tem a oportunidade de construir seu conhecimento social, físico e cognitivo, estruturando sua inteligência e interação com meio em que está inserida.

Conforme Piaget Apud Oliveira , 1990 nos relata que mediante a esta perspectiva há dois tipos de jogos que ocupam espaço na educação dessas crianças que apresentam dificuldade na aprendizagem, são eles:

1.Jogos livres, o mundo do faz-de-contas, que favorecem a autonomia, a socialização e, conseqüentemente uma melhor adaptação social futura.

2.Jogos direcionados, onde o educador prepara os que tem por finalidade interesses educativos, didáticos, que são relevantes para o desenvolvimento do pensamento e aquisição de conteúdos, porque proporcionam uma modificação cognitiva, ou seja, a passagem de uma postura de sujeitos passivos para ativos.

Nas brincadeiras de faz-de-conta a criança é livre para escolher papéis variados, onde passa desempenhar e definir suas próprias regras. Seu funcionamento é um processo que tem um fim em si mesmo. A criança brinca e tem prazer de brincar, pois o faz tornar uma criança criativa, que tem iniciativa própria e que organiza suas ações, enfim que planeja e substitui o significado dos objetos com o objetivo de reproduzir as relações e os fenômenos, observados por ela.

Os jogos direcionados pelo educador preocupam-se com o desenvolvimento dos conteúdos, ou seja, com o conhecimento escolar mais elaborado e especifico.

Os jogos de construção possibilitam a aquisição do conhecimento físico, onde a criança terá elementos para estabelecer relações e desenvolver seu raciocínio lógico-matemático, o professor deve organizar jogos que contemple a classificação, seriação, seqüência, de espaço, tempo e medida, assim revela Vygotsky (apud: Oliveira, 1990).

A possibilidade de exploração e de manipulação que o jogo oferece as crianças com "dificuldades", em contato com as "normais", os adultos e objetos e com o meio, propiciando o estabelecimento de relações e contribuindo para a construção da personalidade e do desenvolvimento cognitivo, tornando a atividade lúdica imprescindível na sua educação.

O "fracasso", sentimento experimentado pelos alunos de classes especiais, pode ser substituído pelo sentimento de auto-satisfação e elevação da auto-estima baixa, pois o jogo e a brincadeira proporcionam prazer e desprazer. Quando a criança joga, fica livre de tensões e da avaliação constante dos adultos. O jogo/brincadeira são recursos do qual o educador pode fazer uso para ajudar as crianças com "dificuldades" de aprendizagem a se tornarem sujeitos pensantes, participantes ativos e felizes.

Este caráter do lúdico na efetivação da aprendizagem só ocorrerá quando o educador e toda comunidade escolar passar a valorizar o brincar, o jogo como elemento importante no processo de aprendizagem; quando reconhecer as limitações do elemento competitivo no brinquedo; equilibrar o brinquedo diretivo e espontâneo; observar o brinquedo infantil para conhecer melhor as crianças e para que possa avaliar até que ponto a atividade está oferecendo prazer à criança.

Estimular o uso de brinquedos que favorecem uma maior interação entre as crianças é um dos meios de promover a socialização entre as mesmas.

Muitas são as habilidades sociais reforçadas pelos jogos, brinquedos e brincadeiras como a cooperação, comunicação eficaz, competição honesta, redução da agressividade. O brinquedo permite que as crianças progridam até atingirem um nível de autonomia, maior do que as demais crianças que não tem esta prática.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A construção do saber inicia-se com a reorganização da estrutura escolar e de sua comunidade interna, dos pais e alunos. A comunidade escolar de modo geral precisa conhecer e conscientizar-se sobre os princípios que norteiam suas práticas e o que interfere diretamente no comportamento dos alunos, das intervenções que o processo ensino/aprendizagem sofre, de como esses elementos externos (culturais, políticos e sociais), alteram ou contribuem na ação pedagógica e na aprendizagem da criança.

A prática pedagógica deve partir de referenciais teóricos que contemplem o desenvolvimento pleno da criança, no crescimento de suas habilidades para que efetivamente apropries-se de conhecimentos básicos e que possam vir a construir outros saberes a partir desses. Esse é o projeto educativo que realmente traz significações ao ensino, pois visa primeiramente a aquisição e produção do saber, sem provocar violência tanto intelectual quanto afetiva, que inviabilizam toda a dinâmica do ambiente escolar.

O educador ao participar com a criança da construção do conhecimento deve considerá-la um ser ativo, possuidor de vontades, perceber e identificar seus objetivos, a forma particular nas interações e brincadeiras com as outras crianças. É a partir dessas observações que cria-se condições para a interação menos conflitante entre professor/aluno tornando-se um tanto quanto prazerosa para ambos.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BETTELHEIM,B. Uma vida para os seu filho: pais bons o bastante. Rio de janeiro: Campus, 1988.

BROUGÉRE, G. Brinquedo e a cultura. 2 ed. São Paulo: Cortez, 1997

DANTAS,H. Brincar e trabalhar. In: Kishimoto, T.M.(Org.). O brincar e suas teorias. SP.:Thomson, 2002.

DAVIS, Claudia & OLIVEIRA Zilma de. Psicologia na educação. Ed. Cortez, São Paulo: 1990.

KISHIMOTO, Tizuko Morchida. O jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. São Paulo, Cortez,1999.

_____________. O brincar e suas teorias. São Paulo, Pioneira,1998.

PIAGET,Jean. Apud. Davis, Claudia & OLIVEIRA Zilma de. Psicologia na Educação. Cortez, São Paulo:1990.

VYGOTSKY, apud DAVIS, Claudia & OLIVEIRA Zilma de.Psicologia na Educação. São Paulo: 1990.

WINNICOTT, D. W. Obrincar & a realidade. Rio de Janeiro: Imago, 1975.




Autor: Evania Duarte


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