A Era do Rádio



                A Era do Rádio: O conjunto de influências

O aparelho radiofônico foi o primeiro meio de comunicação de massa, sendo desenvolvido na Inglaterra no final do século XIX, passando a ser comercializado por Guglielmo Marconi a partir de 1896. Mas, em princípio, o rádio apenas emitia sinais telegráficos, com o avanço das pesquisas em todo o mundo, um padre cientista gaúcho, Roberto Landell de Moura, apresentou um protótipo em um feira científica, que foi patenteado pelo governo brasileiro em 1900, e em 1904, nos Estados Unidos, foi concedida a ele a patente da transmissão das ondas sonoras. Começava então a longa e bem sucedida jornada da radiodifusão no mundo, sendo o rádio, o primeiro meio de comunicação capaz de exercer sobre seus ouvintes na época, o mesmo fascínio da televisão nos dias de hoje.
Em virtude de sua importância no Brasil e, principalmente por ter marcado gerações, ao rádio foi dedicada uma “Era”, na qual os programas de auditório permeavam o imaginário da população e suas cantoras, cantores e locutores eram as maiores estrelas do país. Quase a totalidade das jovens sonhava em fazer parte do elenco estelar das principais emissoras da época, como a Rádio Mayrink Veiga, a Philips e a Rádio Nacional, sendo esta última pertencente ao governo.
Acompanhando o alcance que o rádio exercia sobre as massas, os políticos de maneira geral e em particular Getúlio Vargas, se beneficiaram muito dessa amplitude, o primeiro uso de cunho político dado a ele(o rádio) foi a comemoração do centenário da Independência, em 1922, inaugurada a transmissão comercial no Brasil, ficando então o presidente Epitácio Pessoa marcado por esse ato.
Num primeiro momento, o conteúdo era basicamente educativo, não arrebatando o público de maneira tão significativa, além de não contar com muitos recursos financeiros para seu funcionamento. Na verdade o “grande salto” aconteceu graças à percepção política inquestionável do presidente Getúlio Vargas, que como denominam CIACCIA e MANHANELLI(2007) em artigo intitulado “ A História do Rádio na Política Brasileira”.
Os autores determinam que a ruptura ocorreu em 1932, com a promulgação do decreto-lei 21.111 de 1° de Março, no qual todas as rádios a partir daquele momento passariam a anunciar produtos comerciais, o objetivo das emissoras tornou-se mercantil, o custo dos anúncios estava relacionado com a audiência, fazia-se necessário agradar os consumidores. Até mesmo uma rádio estatizada, como a poderosa Nacional, do Rio de Janeiro não se furtava a disputar o mercado, valendo-se do mais intenso populismo. “Esta mudança atrai dinheiro e conseqüentemente[sic]a concorrência e impulsiona o mercado. As características da programação sofrem grandes mudanças, passando do erudito ao popular e buscando levar às pessoas lazer e diversão. Indústria e comércio descobrem o potencial do rádio no incentivo ao consumo e a classe política percebe que poderia também ser um grande ´vendedor de idéias.” (CIACCIA, MANHANELLI, 2007)
Durante a presença de Vargas à frente do país, registrou-se a preocupação cada vez maior do presidente em expandir o alcance das informações geradas nas emissoras, sendo assim em 1937, Getúlio apresentou ao Congresso um projeto para ampliar esse alcance, o mesmo dizia: “O governo da união procurará entender-se a propósito com os estados e municípios de modo que mesmo nas pequenas aglomerações sejam instalados receptores providos de auto-falantes em condições de facilitar a todos os brasileiros, sem distinção de sexo nem idade, momentos de educação política e social, informes úteis aos seus negócios e toda sorte de notícias tendentes a entrelaçar os interesses diversos da nação. [...] À radiotelefonia está reservado o papel de interessar a todos por tudo o quanto se passa no Brasil” (CIACCIA, MANHANELLI, 2007)
Indubitavelmente, o ano de 1932 foi o “divisor de águas” para o rádio brasileiro, apesar das principais emissoras funcionarem desde 1926, a visibilidade era muito menor, mesmo que muitos autores afirmem o contrário, dizendo que a famosa Era do Rádio tenha começado antes desse decreto, somos forçados a discordar, afinal as evidências falam por si.
No Brasil da Era do Rádio, mais uma vez nos deparamos com a importância cultural dos arredores da zona portuária, sendo a Praça Mauá a localização exata das maiores estações de rádio, de um lado encontrava-se a Rádio Mayrink Veiga, no ar desde 1926 e campeã de audiência durante toda a década de 30; do lado oposto da praça a Rádio Tupi, conhecida por seu programa “O Cacique no Ar”, em 1936 “ (...)o foco das atenções volta-se para a própria Praça Mauá, quando, nos últimos andares do famoso edifício ´A Noite`, têm início as transmissões da Rádio 
Nacional do Rio de Janeiro(...)” (CALABRE, 1998).
Essas emissoras preocuparam-se em melhorar a qualidade de som e cativar o público. Os programas de variedades obtiveram repercussão imediata e neles a música popular predominava, por isso, as emissoras de maior audiência começaram a contratar com exclusividade, orquestras e cantores, mesmo assim o número de artistas era reduzido. Foi a partir daí que surgiram os programas de calouros cujo prêmio principal era a assinatura de um bom contrato com a emissora. Por seu lugar de destaque, o rádio recebeu algumas homenagens como a marchinha “Cantores do Rádio” composta por Carlos Braga( o Braguinha, que adotou o pseudônimo de João de Barro), Lamartine Babo e Alberto Ribeiro interpretada pelas irmãs Carmem e Aurora Miranda que dizia: “Nós somos as cantoras do rádio/ Levamos a vida a cantar/ De noite embalamos teu sono,/ De manhã nós vamos te acordar. Nós somos as cantoras do rádio/ Nossas canções, cruzando o espaço azul,/ Vão reunindo, num grande abraço, / Corações de Norte a Sul.” (BABO, BRAGUINHA, RIBEIRO ,1936)
Além do concurso de calouros havia o concurso para coroar a “Rainha do Rádio”, este era realizado pela Rádio Nacional e coroou sua primeira rainha, Linda Batista, em 1936, permanecendo no posto por doze anos. A programação das rádios contava ainda com programas jornalísticos, esportivos e rádio novelas como a “Direito de Nascer”, que mudou o hábito da população, pois todos procuravam chegar em casa mais cedo para não perder nenhum capítulo.
No setor musical propriamente dito, gostaríamos de destacar um locutor em especial, Henrique Foréis Domingues, o Almirante. Era compositor, cantor e ator. Recebeu este apelido por ter feito parte do Tiro Naval no Rio de Janeiro e andar sempre com o uniforme impecável. Durante o serviço militar já tinha certa experiência como cantor, por esse motivo foi convidado a integrar um grupo formado por rapazes do bairro de Vila Isabel era o “ Flor do Tempo”, e em 1929 integrou o famoso “Bando de Tangarás” formado por Carlos Braga( o Braguinha, que adotou o pseudônimo de João de Barro), Noel Rosa, Henrique Brito e Álvaro Miranda. 
Iniciou sua carreira como radialista em 1938, sendo conhecido mais tarde como a patente mais alta do rádio, foi o responsável por apresentar o programa “ A História do Rio através da Música”, a partir de 1942, o motivo da escolha desse personagem é evidente e se justifica pelo fato do mesmo ter dado grande destaque ao samba e atuar ativamente na música, desfrutando de prestígio no meio. Se não fosse o advento radiofônico e a postura populista e intervencionista de Getúlio Vargas, a realidade periférica desses cidadãos seria por muito mais tempo marginalizada; o dia-a-dia dessa comunidade chegou aos ouvidos de aristocratas e políticos pelos timbres melodiosos de cantores como Sonia Carvalho, Marlene, Elsinha Coelho, Silvinha Melo, Araci de Almeida, Marília Batista, Linda Batista, Dircinha Batista, Ângela Maria, Carmem Costa, Emilinha Borba, Carmem Miranda, Aurora Miranda, Heleninha Costa, Carmélia Alves, Ademilde Fonseca, Zezé Gonzaga, Neuza Maria, Adelaide Chiozzo, Dolores Duran, Lenita Bruno, Vera Lúcia, Violeta Cavalcanti, Carminha Mascarenhas, Jorge Fernandes, Orlando Silva, Nuno Roland, Francisco Alves, Silvio Caldas, Ataulfo Alves, Luiz Gonzaga, Nelson Gonçalves, Paulo Tapajós, Albertino Fontes, Gilberto Milfont, Luiz Vieira, Bidu Reis, entre outros.
Embora o rádio tenha desempenhado importante papel no cenário nacional, e o assunto nos reserve inúmeras informações interessantes a cerca dos concursos de calouros, as rádio novelas, os auditórios repletos de pessoas e os locutores admirados pelo povo, gostaríamos de ressaltar que nosso objetivo não é enfocar toda a magia do rádio presente no imaginário da época, mas mostrar que foi através do primeiro meio de comunicação de massa do Brasil, que compositores pertencentes as classes mais humildes da população foram ouvidos pelas demais camadas e foi através do rádio que as diferentes classes da sociedade carioca estabeleceram contato relegando um certo status de fidalguia a música criada no morro e na zona portuária.
Se a proximidade não era geográfica passou a ser cultural, afinal a identificação com o cotidiano dos bairros transpôs as paredes das casas pelas ondas sonoras dos gramofones e radiovitrolas, na música os artistas manifestavam a realidade presente no meio em que todos estavam inseridos, se as casas eram barracos feitos de madeira e tetos de latas de tinta, ou grandes palacetes na Zona Sul não importava, a não identificação se restringia ao caráter econômico, mesmo que a nova cidade mantivesse “ares” parisienses, a essência permanecia a mesma.

BIBLIOGRAFIA:

CALABRE, Lia. Folia na Praça Mauá: Rádio Nacional, Boemia e Carnaval In Circuito Mauá: Saúde, Gamboa e Santo Cristo. Rio de Janeiro, CD-ROM, 1998

CAPARELLI, S. 50 Anos Depois, só Há um Discurso: o dos governantes. In: Perosa, L. M. L.F. A hora do clique. São Paulo: Anhangabaú: ECA - USP, 1995.

CIACCI,Fábio; MANHANELLI, Carlos. A História do Rádio na Política Brasileira. In: VI Politicom, 2007, Sta. Bárbara do Oeste. Propaganda política e audiovisuais. Sta. Bárbara D`Oeste: Faculdade Anhanguera, 2007.V. 01.





Autor: Rafaelli dos Santos Ribeiro


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