Cuidados Paliativos - O Olhar Do Enfermeiro Na Assistência Aos Familiares De Clientes Fora De Possibilidade Terapêutica



FARIA, Monique Delgado*
PEREIRA, Miriam Salles**

RESUMO: Conviver com a morte e a ansiedade faz parte do cotidiano dos profissionais de enfermagem e familiares dos pacientes. O objetivo deste estudo é caracterizar o papel do enfermeiro frente às dificuldades enfrentadas pelos familiares de clientes fora de possibilidade terapêutica. Utilizamos como metodologia uma revisão bibliográfica através de artigos e livros publicados no período de 1981-2007. Identificamos que os familiares necessitam de cuidados assim como os pacientes e que a falta de diálogo e a pouca valorização dos sentimentos do cliente e sua família restringem a relação família-enfermeiro. Sendo assim, gestos simples que os profissionais podem fazer para que esta família sinta-se cuidada e amparada, como informações aos familiares, maior tempo junto ao cliente e olhar para a família de forma humanizada são cuidados essenciais para promover uma assistência de qualidade ao paciente e família.

Descritores: Famílias, cuidados e pacientes fora de possibilidade terapêutica.

ABSTRACT: To coexist the death and the anxiety is part of the daily one of the familiar professionals of nursing and of the patients. The objective of this study is to characterize the paper of the nurse front to the difficulties faced for the familiar ones of customers is of therapeutical possibility. We use as methodology a bibliographical revision through articles and books published in the period of 1981-2007. We identify that the familiar ones need cares as well as the patients and that the lack of dialogue and to little valuation of the feelings of the customer and its family restricts the relation family-nurse. Being thus, simple gestures that the professionals can make so that this family feels itself well-taken care of and supported, as information to the familiar ones, bigger together time to the customer and look for the family of humanizada form are well-taken care of essentials to promote an assistance of quality to the patient and family.

Descriptors: Families, care and patients outside possibility therapy.

*Graduanda do 8º período do Curso de Enfermagem do Centro Universitário de Volta Redonda – UniFOA, RJ; e-mail:[email protected]

**Enfermeira. Mestre em Ciências – FIOCRUZ/RJ, Profª Responsável pelas disciplinas: Imunologia, Microbiologia, Saúde do Adulto e Idoso 2, Semiologia e Semiotécnica do Curso de Enfermagem do Centro Universitário de Volta Redonda – UniFOA, RJ; e-mail: [email protected]

1. INTRODUÇÃO
A assistência ao paciente sem possibilidade terapêutica é um desafio para a família e equipe multidisciplinar, especialmente para o enfermeiro que mantém contato direto com a paciente por um tempo maior.

Uma definição ampla de cuidados paliativos é oferecer um “cuidado total ativo” de pacientes e seus familiares por uma equipe multiprofissional, onde a atuação de profissionais capacitados é sem dúvida um requisito muito importante para um atendimento com qualidade entre eles, destacando-se o papel o enfermeiro, quando a doença do paciente já não responde ao tratamento terapêutico e a expectativa de vida relativamente curta, portanto os cuidados paliativos têm a finalidade de integrar o aspecto físico, emocional, social e espiritual de pacientes e seus familiares (1).

Em muitos países do mundo, os cuidados paliativos têm pouca ênfase. A razão para esta falta de conhecimento poderia estar relacionada às pessoas dos países desenvolvidos envolverem num sonho cultural de eterna juventude e saúde, cuja morte não tem lugar e deve ser escondida. Já nos países pobres do hemisfério sul do planeta, as prioridades giram em torno de necessidades básicas, tais como: comida, água e segurança, em tais contextos os cuidados paliativos são visto como mero luxo, mas somente pessoas que tiveram o privilégio de se envolver em cuidados paliativos sabem a dimensão desta filosofia.

Os cuidados paliativos têm a finalidade de integrar o aspecto físico (biológico), psíquico (emocional), social e espiritual do paciente, apresentando como principais metas o controle afetivo de sintomas e manutenção da qualidade de vida. É importante ressaltar que qualidade de vida é um conceito subjetivo relacionado à satisfação, o que depende da história e costumes de cada um para que a qualidade de vida seja alcançada há uma necessidade de uma equipe multidisciplinar junto ao paciente e seus familiares. Em cuidados paliativos, o paciente e a família são considerados uma unidade de cuidados sendo que a família muitas vezes exerce o papel do cuidador, e que também necessita de cuidados (2).

Tivemos como objeto de estudo as dificuldades que a família enfrenta ao cuidar de cliente fora de possibilidade terapêutica.

O interesse pela temática surgiu ao depararmos com a realidade dos cuidados ofertados a família, muitas vezes deficiente por falta de um relacionamento entre o enfermeiro e familiar que em muitas ocasiões chega a ser formal e burocrático, sobretudo despersonalizado, onde funcionários de hospitais em maior parte do tempo evitam contato com os familiares.

No Brasil os cuidados paliativos sempre foram exercidos, uma vez que nossa realidade mostra um crescimento de pessoas com doenças crônicas principalmente em fase avançada. A falta de formação de profissionais, política adequada e de informações dos pacientes mostram a realidade que acomete a saúde no país (3).

Diante o exposto, surgem algumas questões inquietadoras:

- Como deveria ser a assistência prestada aos familiares de pacientes sem a possibilidade terapêutica?

- O que de primordial deveria ser feito pelos profissionais de saúde visando a melhoria da assistência oferecida atualmente?

É fundamental reconhecer que se trata de um problema de saúde pública, em muitos momentos, negligenciado. É necessária a criação de comitês para treinamento de profissionais de saúde que possam suprir esta assistência, fazendo com que esse cuidado seja realizado de forma sistematizada.

Poderíamos abordar os cuidados ao cliente fora de possibilidade terapêutica e as dificuldades enfrentadas pela equipe de saúde que é sempre o foco dos cuidados, entretanto optamos em enfatizar as necessidades dos familiares que muita das vezes se torna desconhecida pela equipe de enfermagem, onde a angústia e a dor são vivenciadas não só pelo cliente, mas por todos familiares e profissionais de saúde.

Este estudo tem como objetivo abordar a percepção do enfermeiro sobre as necessidades dos familiares de clientes fora de possibilidade terapêutica, enfocando um olhar humanizado à família.

Acreditamos que a participação mais efetiva do enfermeiro à família permitirá uma maior integração no cuidar, favorecendo assim que os familiares integrem mais na assistência, permitindo assim que os cuidados sejam compartilhados entre cuidador (equipe de enfermagem) e família.

2. METODOLOGIA

Este estudo foi desenvolvido através de uma revisão bibliográfica buscando colher conhecimento e informações científicas sobre os fatores relacionados aos cuidados oferecidos à família de pacientes fora de possibilidade terapêutica.

Trata-se de uma pesquisa bibliográfica não sistematizada, onde foram utilizados os seguintes critérios: artigos científicos publicados em periódicos nacionais, teses, dissertações e livros que abordam cuidados paliativos, humanização e aspectos comportamentais entre enfermeiro e familiares no período de 1981-2007.

A pesquisa bibliográfica permite um contato direto com o que já foi escrito sobre o assunto e possibilita uma nova abordagem sobre o tema específico, ampliando assim a cobertura do fenômeno pesquisado (4, 5).

Definiram-se como palavras-chave os descritores de saúde: humanização, família, cuidados paliativos e assistência de enfermagem a familiares de pacientes fora de possibilidades terapêuticas.

Este procedimento metodológico permitiu selecionar 29 referências identificadas em pesquisa do SCIELO, LILACS, BIREME e BDENF, dos quais foram analisadas em sua íntegra para desta forma constituírem material deste trabalho.

3. RESULTADOS

Observou–se após a leitura dos artigos selecionados a importância de uma participação mais efetiva do enfermeiro com a família enfatizando o diálogo com os familiares e uma abordagem holística ao paciente.

Wensel(5), enfermeira americana, após anos trabalhando em cuidados paliativos com sua experiência, sugere que para enfermeiros trabalharem em cuidados paliativos, precisam obter algumas habilidades, tais como ter cuidado e interesse pelo outro, estar aberto para discutir a fé, encorajar a esperança, escutar familiares e pacientes, orar o pedido da família e paciente, olhar e tocar a pessoa.

O enfermeiro (a) deve olhar o cliente como um todo, estar aberto ao diálogo e escutar o cliente e sua família, estimulando-os a expressar seus sentimentos.

Quando a família descobre que seu ente querido está com uma doença incurável, os familiares apresentam as fases descritas por Elizabeth Kubler Ross(6): “negação, raiva, barganha, depressão e aceitação”, portanto a família também necessita de ajuda e compreensão, tanto quanto o paciente.

Segundo Pires(7) em sua dissertação de mestrado observou que quando o familiar passa por uma situação de perda, principalmente quando um ente querido adoece por câncer, gera uma modificação nos papéis, muitas vezes assumindo o papel do cuidador, a família torna-se doadora e receptora, doadora porque dá o cuidado, seja em todas as dimensões físicas e emocionais tentando sanar as necessidades, relevando as crenças e valores particulares de cada um. Temos que lembrar sempre que quem conhece melhor o paciente não é a equipe de cuidados paliativos e sim a família e na família o cuidador.

As relações familiares e o desejo do paciente serão, em última instância, os principais determinantes da continuidade dos cuidados em um contexto no qual a autonomia das pessoas tenha um valor predominante.(8)

Conviver com um familiar fora de possibilidade terapêutica acomete um desgaste físico e emocional, muitas vezes a família oferece o cuidado na esperança de confortar seu ente querido, mas temos que lembrar que esta família precisa de orientação ao lidar com esta situação.

O foco de nossas habilidades torna-se o cuidado em um todo da pessoa curar não é mais o objetivo, uma vez que sabemos que não podemos curar mais a doença. O foco central do cuidado que dirige todas as ações é a experiência da pessoa e de sua família de viver com uma doença incurável e o processo morrer. (9).

Uma das principais razões do cuidado paliativo é ter como prioridade o valor da dignidade da pessoa. Significa que nós como cuidadores, reconhecemos que esta pessoa é única para si, família e Deus.

Costumamos dar valor àquilo que pode ser provado e principalmente o que pode ser medido e transformado em números, pois é possível radiografar e medir um tamanho de um coração, dosar uma enzima, isolar um vírus e uma bactéria, mas não é possível medir o grau de tristeza e o sofrimento de alguém ao se deparar com uma situação de perda, desta forma temos que focar não só em diagnósticos fisiológicos, mas também no que é observado, relatado e vivenciado por familiares em situações de desequilíbrio emocional perante as situações inevitáveis da vida (10).

Temos que focar nossos cuidados não apenas em diagnósticos, mas também dar valor ao que é vivenciado e relatado pelos clientes e familiares.

Atualmente no Brasil segundo o levantamento realizado pela associação Brasileira de cuidados paliativos existem em média trinta serviços no país, tendo suas diretrizes voltadas para o cuidado paliativo com características próprias e peculiares e que nasceram em sua maioria de serviços dentro dos hospitais (3).

É necessário mudar o conceito de que nada podemos fazer por esses enfermos e incorporar uma mudança de atitude, em que muito pode ser feito para o bem-estar de quem está sofrendo ou chegando aos momentos finais da vida.

No Brasil enfermeiros ainda produzem poucos artigos científicos sobre as intervenções realizadas com a família de pacientes. O baixo número de publicações pode indicar uma visão restrita sobre as responsabilidades destes profissionais (11).

Ainda há poucos serviços voltados para cuidados paliativos em nosso país. Este é um fator complicador, visto que os artigos científicos escritos por enfermeiros acerca dessa temática, poderiam ajudar a propor soluções para a melhoria da assistência prestada. Temos que encarar a realidade do avanço das doenças crônico-degenerativas e mudar o conceito curativista que vai além da terapêutica.

A família se sente cuidada pela equipe de saúde quando recebem informações acerca de seu familiar internado e quando a equipe tenta acalmar os familiares, e uma das principais reivindicações dos familiares é relacionado ao pouco tempo que é propiciado para permanecer junto ao seu familiar e este é um aspecto possível de ser trabalhado junto à direção e a equipe no sentido de atendê-los (12).

A equipe de saúde tem que saber identificar as necessidades da família e o que de importante poderia ser feito para que a mesma e o cliente se sentissem cuidados e amparados por esta equipe.

Contudo sendo o paciente o foco do cuidado, as necessidades dos familiares, são muitas vezes desconhecidas pela equipe de enfermagem. A sensibilidade do enfermeiro em perceber as necessidades da família pode resultar na implementação de novas políticas como horário de visitas mais flexíveis e maior proximidade da equipe com a família (12).

Quem cuida e se deixa tocar pelo sofrimento humano do outro, toma-se um radar de alta sensibilidade, humaniza-se no processo para além do conhecimento científico, tem a preciosa chance e o privilégio de crescer em sabedoria e nos coloca na descoberta que a vida não é um bem a ser privatizado, muito menos um problema a ser resolvido nos circuitos tecnológicos, mas um dom a ser vivido e prazerosamente partilhado solidariamente com os outros (13).

Ao doar-se nos cuidados e nos sentimentos humanos o cuidador recebe o dom de saber o valor da vida, percebe que não é só através de tecnologia que se cuida de um cliente e seus familiares, mas também a percepção de saber seus reais sentimentos.

4. CONCLUSÃO

Com os artigos analisados concluímos que os familiares precisam de uma atenção maior, uma vez que a família torna-se complemento nesse cuidar, não podendo então ser deixada de lado. Coisas simples que os profissionais podem fazer para que esta família sinta-se cuidada e amparada neste momento difícil, como: comunicação, interação do enfermeiro, olhar de forma mais humanizada, permitir a participação da família junto ao paciente por período de tempo maior e mantendo cliente e família informada acerca do tratamento, são cuidados essenciais para promover uma assistência de qualidade.

É fundamental mudar a visão dos profissionais de saúde e familiares em relação ao conceito de que nada pode ser feito ao cliente fora de possibilidades terapêuticas.

Embora poucas literaturas descrevam os cuidados com os familiares o enfermeiro em algumas citações se preocupa com a assistência a família. Reflitamos mais sobre essa assistência para que não fique só na teoria mas também com ações voltadas esse paciente e familiar, cuidando de uma forma holística e humanizada, traduzindo em gestos concretos o valor do ser-humano e isto deve ir além da tecnologia, sabendo usar o dom de ser enfermeiro e transpassar toda a ética e os valores desta profissão aos pacientes e familiares, cultivando a esperança, crescendo em sua fé e em seus valores humanos.

“Nossas vitórias sobre a doença e a morte são sempre temporárias, mas nossa necessidade de apoio, cuidado diante delas, são sempre permanentes “
(Callahan, 1993)

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1- WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO). Cancer painl and paliative care. (Techinical Report series 804). Geneva, World Health Organization, 1990.

2- Kovacs MJ. “Sofrimento psicológico de paciente com câncer avançado em programas de cuidados paliativos”. Boletim de Psicologia, 1998.

3- Cavalcanti de Melo AQ. Humanização e cuidado paliativo. Os cuidados paliativos no Brasil Ed. Loyola, Brasil, 2ª edição 2004.

4- Lakatos, EM; Marconi M.A fundamentos de metodologia científica. São Paulo: Atlas, 1996.

5- Wenzl C. “The role of nurse chaplain: a personal reflection”. In Ferrel BR, Coyle N (Ed.). Palliative nursing. Nova York : Oxford; 2001.

6- Kuber-Ross E. Sobre a morte e o morrer:o que os doentes tem para ensinar a médicos, enfermeiras, religiosos e aos seus próprios parentes. 5. ed . São Paulo: Martins Fontes; 1992

7- Pires AA. A gerência do cuidado paliativo de enfermagem ao paciente oncológico na visita domiciliar (dissertação de mestrado) Rio de Janeiro, Escola de enfermagem Ana Nery (UFRJ).2006.

8- Simoni M & Santos ML. Considerações sobre cuidado paliativo e trabalho hospitalar: uma abordagem plural sobre o processo de trabalho de enfermagem. Psicologia USP, 14(2):169-194, 2003.

9- McCoughlan M. Humanização e cuidado paliativo, A necessidade de cuidado paliativo Ed. Loyola, São Paulo, Brasil, 2ª edição 2004.

10- Dias da Silva MC. Quem ama não adoece. Ed. Best Seller ,35ª edição 2004.
Autor: monique delgado


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