DANO MORAL POR ABANDONO AFETIVO DOS PAIS



SUMÁRIO: 1 Introdução; 2 Do dano moral: 3 Da dignidade da pessoa humana e do afeto; 4 Do cabimento efetivo da indenização e do dano; 9 Conclusão: Existênciade danos morais por abandono afetivo.

Introdução

O presente tema, ultimamente discutido e muito polemizado tem como escopo teleológico estabelecer lógica jurídica de cabimento de indenização por danos morais pelo abandono afetivo do pai. Destarte, discuti-se o cabimento ou não da indenização por danos morais por abandono afetivo do pai para com o filho, o tema vem gerando grande polêmica no atual cenário jurídico brasileiro.

Com tudo merece primeiramente salientar que a muito se discute se os alimentos são suficientes para garantir ao filho tudo àquilo que uma criança merece receber física, psíquica e emocionalmente, segundo a Constituição Federal do Brasil.

Diante disso faz-se necessário compreender até que ponto o direito pode interferir nas relações inter-pessoais, ainda mais quando se trata de uma relação tão íntima e peculiar como a do pai com o(s) filhos(as).

Dai, surgem algumas duvidas, quanto ao exposto em nosso ordenamento jurídico, pois, poderia o direito positivo obrigar o pai a amar seu filho? Quanto vale o amor de um pai? As obrigações se restringem ao sustento? O desenvolvimento emocional também é obrigação legal dos genitores?

Antes de responder esses e outros questionamentos sobre o inquietante e polêmico tema, faz-se necessário, inicialmente, tecer alguns comentários acerca da origem e conceito do dano moral.

Saliente-se que o Código de Hamurabi, art. 127, a Lei das XII Tábuas, o Alcorão, que adota a Lei do Talião, o Direito Canônico, o Código de Manu e a própria Bíblia já registravam o dever de indenizar-se o dano moral em razão de ofensas. Sendo assim, poder-se-ia dizer que o dano moral teve sua origem a partir do momento em que o homem começou a ditar regras de condutas para com os seus semelhantes.

Importante salientar que a indenização por dano moral não fica restrita somente ao atual Código Civil brasileiro, como é sabido esse tema está presente em nosso ordenamento jurídico desde a Constituição Federal de 1988, conforme se vê do artigo 5º da Lei maior.

Nesse diapasão, cumprem trazer a baila os diferentes conceitos e definições dadas por ilustres doutrinadores. Senão vejamos:

Yussef Cahali[1], por exemplo, ao tratar do tema, afirma dever ser o dano moral caracterizado por seus elementos, como a privação ou diminuição daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem e que são a paz, a tranqüilidade de espírito, a liberdade individual, a integridade física, a honra e os demais sagrados afetos.

Sílvio Venosa[2] por sua vez, aproximando-se um pouco de Cahali, vê o dano moral como o prejuízo que afeta o ânimos psíquico, moral e intelectual da vítima, 'abrangendo também os direitos da personalidade, direito à imagem, ao nome, à privacidade etc.'

Aguiar Dias[3], ao deparar-se com a dificuldade em delimitar um conceito para o dano moral constatou que 'com os danos não patrimoniais, todas as dificuldades se acumulam, dada a diversidade dos prejuízos que envolvem e que de comum só têm a característica negativa de não serem patrimoniais. '

Vejamos, ainda, o conceito de dano moral trazido por Maria Helena Diniz[4], a melhor ao integrar as diferentes definições apresentadas ao conceituar dano moral como a 'lesão a um interesse que visa a satisfação ou gozo de um bem jurídico extra patrimonial contido nos direitos da personalidade (...) ou nos atributos da pessoa.

Do Dano Moral

É sabido que o dano moral propriamente dito, no conceito dos danos indenizáveis, inicialmente não foi de fácil aceitação no meio jurídico como se esperava. Nasceu, após muitas discussões, através da jurisprudência, contudo, hoje estar pacificada a sua existência. Restam, apenas divergências quanto a sua quantificação e ao critério a ser usado para valorá-lo, pois, em princípio, a idéia geral é a de que a dor, o sofrimento não têm preço.

Com efeito, o dano moral, por não atingir o patrimônio material da pessoa, era de difícil entendimento, além de que parecia ser algo quase impossível de constatar e de quantificar. A Constituição Federal de 88, nos incisos V e X do artigo 5º, bem assim o novo Código Civil, no seu artigo 186, entretanto, introduziram em seus ordenamentos o instituto de forma explícita, conforme se verifica, sem qualquer dúvida, pelo teor dos dispositivos em questão.

Cabe, contudo diferençar nesse momento, o dano moral do dano patrimonial, pois que o dano patrimonial, como bem ensina a professora Mª Helena Diniz[5]:

mede-se pela diferença entre o valor atual do patrimônio da vítima e aquele que teria, no mesmo momento, se não houvesse a lesão. O dano, portanto, estabelece-se pelo confronto entre o patrimônio realmente existente após o prejuízo e o que provavelmente existiria se a lesão não se tivesse produzido. O dano corresponderia à perda de um valor patrimonial, pecuniariamente determinado.

já o dano moral, muito mais difícil de ser determinado, haja vista que não existe critérios objetivos para tanto, alem de que, cabe ao aplicador do direito analisar critérios de justiça não apenas individualizados, mas também de cunho social, posto que aquela medida se transforma em resposta aos anseios de uma sociedade, lida com questões éticas e de cunho psicológico. Por isso na hora da valoração do quantum debeatur como indenização por danos morais o julgador deve determinar valor razoável e equilibrado.

O dano moral não tem equivalência própria do ressarcimento por danos patrimoniais, mas um caráter, satisfatório, para a vítima e lesados e punitivo para o lesante, sob uma perspectiva funcional.

Tem natureza compensatória, sendo uma satisfação que atenue a ofensa causada, proporcionando vantagem ao ofendido, que poderá, com a soma de dinheiro recebido, procurar atender às satisfações materiais ou ideais que reputem convenientes, tentando diminuindo, assim, em parte, seu sofrimento.

DO AFETO

Quanto se esta tratando de tema polemico, e de extremo interesse social, qualquer manifestação que contraria a moda – aqui frise-se a maioria - , causa "free-som" e criticas acaloradas, porem, num segundo momento quando um paradigma é quebrado, ou tenta ser, um olhar mais apurado e debates mais fundamentados fazem ex-surgir novas idéias, gerando a dialética saudável que, em fim, descamba na evolução do conhecimento.

Dignidade da pessoa humana e obrigação de afeto dos pais

A constituição federal A Constituição de 1988 em seu art. 1º, III, consagrou o princípio da dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado Democrático de Direito. Assim, com o advento da Magna Carta de 88, ganhou evidência a preocupação necessária com a proteção da pessoa humana. A dignidade da pessoa humana é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que leva consigo a pretensão ao respeito por parte dos demais. Dessa forma, temos hoje um verdadeiro direito constitucional à dignidade ampliando os horizontes do dano moral.

A obrigação do afeto, conseqüência do principio da dignidade da pessoa humana, leva em consideração aspectos psicológicos como bem definiu DRª. Ana Maria Falcão de Aragão Sadalla[6] do In RIBEIRO DO VALLE, L.E.L.

Pode-se dizer que afetividade é um conjunto de fenômenos psicológicos que são expressos sob a forma de emoções, sentimentos e paixões relacionadas a prazer/dor, satisfação/insatisfação, agrado/desagrado, alegria/tristeza,

com isso, a falta de afeto na formação do ser humano pode comprometer de alguma sorte seu comportamento futuro e até o deformar axiologicamente, percebível por desvios nas suas expressões, emoções, sentimentos e conduta.

Por se tratar de um problema na esfera social/moral sem dúvida gera prejuízo emocional e psicológico indenizável, obviamente comprovado o dano.

A constituição determina aos pais o dever-afeto aos filhos, pois segundo disposição do art. 205 da CF, somado ao 227 e por fim ao 229 queda-se evidente essa obrigação.

Entendemos que o conceito de família hoje está mais amplo e não restrito a laços consangüíneos, pois que relação afetiva ampliou esse arcaico entendimento. Porem a obrigação existe e é devida consoante a Constituição Federal Brasileira, ademais, na lição de M. H. Diniz[7], esta aduz:

Terá eficácia jurídica a norma constitucional que tiver tecnicamente condições de aplicabilidade, podendo, então, produzir os seus efeitos de direito, ao passo que, eficácia social terá a norma que, além de condições técnicas, encontrar na realidade social e nos valores positivos as condições de sua obediência.

Do cabimento efetivo da indenização e do dano

Interessa a este ensaio demonstrar que existe na Constituição Federal uma imposição, aos pais, e so a estes, de dar aos filhos o atual e discutido afeto. Para isso e para que se possa ter um entendimento quanto ao estabelecido carta magna de 1988 diante do tema proposto, transcreve-se in verbs os artigos da seguir e ao lado explica:

Art. 205 - A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

O supra referido artigo de forma clara estabelece como dever do estado e da família a prestação da educação, distinguindo neste ponto a educação formal da educação não-formal, este ultimo seria o dever da família e primeira dever do Estado, com o objetivo de preparo do menor para ser um cidadão completo.

Obviamente que o conceito de família vem sendo ao longo dos anos relativizado ao ponto de não ser mais reconhecida como outrora fora, haja vista que não é mais necessário perceber seus componentes: pai, mãe e filhos.

Com essa redefinição do conceito de entidade familiar como núcleo regido pela lealdade, tolerância, afetividade, respeito mútuo, cuidado e proteção, tem que se transformar também o amparo jurídico dispensado a essas entidades, agora voltado para os seus membros, independente do modelo familiar que escolham.[8]

Contudo, a constituição de 88 foi, ao sentir desta interprete, foi taxativa quando determinou genericamente Família atrelando o conceito antigo e através de laços sanguíneos.

Art. 227 - É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.(grifo nosso)

Segundo se infere do artigo supra demonstrado, a constituição pretende deixar claro que à família incumbe o dever de amparar o menor de forma que este cresça a salvo de qualquer mal, que seja passado para essa criança, na medida do possível e com prova de empenho, valores que a tornem digna de ser um adulto capaz de sobreviver em meio a uma sociedade e passar para seus descendentes os mesmos valores que aprendeu com sua família.

Aduz-se ainda do mesmo artigo, no final, que qualquer tipo de violência física ou psíquica não será tolerada, pois quem tem o dever de amparar e proteger não pode de forma alguma exerce-los de forma negligente, com discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Por fim, o artigo 229 de forma clara e objetiva, retirando qualquer duvida de quem quer que possa ainda tê-la, declara que "aos pais cabe educar criar e assistir aos filhos menores, retirando de qualquer outro ente familiar a responsabilidade do afeto, deixando-a apenas aos pais.

Ademais, por mais que se relativize o conceito de família os pais biológicos tem o dever de agir conforme as determinações constitucionais, sob pena de descumprimento do dever ali estabelecido.

Art. 229 - Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.

Sem embargo, o pedido de indenização para o caso do abandono afetivo so pode ser acatado caso seja constatado o dano, mediante requerimento e comprovada demonstração por intermédio de perícia técnica, pois de outra forma ilógico seria a procedência.

Nesse sentir, a constituição, por mais que tivesse estabelecido deveres aos pais, jamais chancelaria o dever de indenização pelo dano genérico ou mero argüiu.

Por tanto, traçando um raciocínio superficial para comprovar o tema ora defendido, traça-se esquema básico para a o cabimento de indenização a qualquer título, assim vejamos:

Ato(conduta) ---> Nexo de Causalidade ---> Dano.

Dito isso, o caso de indenização por danos morais por abandono afetivo deve ser entendido de forma regular como qualquer outro, desta forma comprovado o dano, que na pratica não é muito simples, deve ser indenizado.

Por fim, uma vez demonstrado o dano evidente fica o dever de indenizar, entretanto, quando se trata do abandono afetivo, alvo alias de severas criticas por ser confundido com amor – que é afeição profunda[9] –, este deve ser entendido como o que se pode inferir do conjunto de deveres determinados pela carta de 1988 aos pais.

Outrossim, educar, assistir e criar, cultivando no menor valores éticos e morais para o torna-lo cidadão digno e respeitado, são deveres que o dinheiro por si so não objetivam – prestação de alimentos, menos ainda educação formal pura e simples, pois para que os pais tornem o filho PESSOA, sem afeto ou sem o afeto que a constituição determina , FICARIA IMPOSSÍVEL TORNA-LO CIDADÃO DIGNO.

CONCLUSÃO

Por tudo mais quanto foi exposto, claro esta o ponto de vista desenvolvido. O afeto determinado pela constituição como dever dos pais pode sim ser alvo de ação de indenização, por que toda lesão a direito, como bem definido no art.5º XXXIX, será apreciada pelo Poder Judiciário.

Na prática, determinar o dano não será tarefa fácil e as ações podem se estender por muitos anos, ate porque não se trata de perícia simples, muito menos de resolução pacifica, porem é preciso ficar claro que a ação de indenização de dano moral por abandono afetivo, tem como objetivo final a tentativa de reparação do dano que jamais poderá ser restabelecido.

Com isso, não se pretende afastar o filho do pai, por outro lado pode ate acontecer o oposto, faze-lo perceber ao fim o quão desleixado foi com o menor, fazendo com que ele se aproxime afetivamente do filho, todavia, o dano causado ao filho foi ao longo de anos e na fase de desenvolvimento e formação da pessoa, isso não pode ser restabelecido, o dano é para a vida toda, a indenização tem o caráter compensatório.

REFERÊNCIAS

AGUIAR DIAS, José. Da responsabilidade civil. V.1. Ed.Forense, Rio de Janeiro

BUENO, Silveira. Dicionário escolar. edição revista e atualizada. Ed.Ediouro. Rio de Janeiro, 2004

CAHALI, Y. S.Dano Moral. 2ª ed. 4ª Tiragem. São Paulo, RT, 2000. pág. 704

DINIZ, M. H. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil V.7. Ed. Saraiva. São Paulo, 2008

DINIZ, M. H. Norma constitucional e seus efeitos. Ed. Saraiva. São Paulo, 2008

Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3863> Acesso em: 10 dez. 2008

Disponível em: <http://www.faj.br/textosfoco/Afetividade.pdf > Acesso em: 10 dez. 2008

FARIAS, Cristiano C. de. Separação e divórcio: a separação judicial à Luz do garantismo constitucional. Ed. Lúmen Júris. Salvador, 2007.




Autor: Natália Bonfim


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