Política externa brasileira - de Vargas a FHC



GUERRA, Emanuelle. UNICURITIBA. Estudante de Relações Internacionais;

FAIAS, Madelon. UNICURITIBA. Estudante de Relações Internacionais;
CORDEIRO, Nicolle. UNICURITIBA.. Estudante de Relações Internacionais;

ZAIA, Sophia. UNICURITIBA.. Estudante de Relações Internacionais.

INTRODUÇÃO

Para fins acadêmicos de pesquisa da disciplina de Metodologia da Pesquisa, elaboramos este artigo, escolhendo fazer um levantamento de informações acerca da política externa brasileira com o objetivo de analisar seus antecedentes políticos de 1930 a 2003, do primeiro mandato de Getúlio Vargas ao segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso, além de compreender melhor a desenvoltura, posicionamento e influência de nosso país em âmbito internacional. Facilitando, pois, o entendimento de ocorrências atuais de questões relacionadas ao assunto.

As relações de um Estado com os outros Estados do mundo são regidas pela política externa do país, a qual costuma sempre proteger os interesses internos econômicos, ideológicos e de segurança nacional de cada Estado Nação, resultando em cooperações internacionais e até mesmo o que poderíamos chamar de "desavenças internacionais", sendo a política de relações exteriores, portanto, responsável pela manutenção da paz ou motivo de início de guerras, tendo o seu entendimento determinante importância, pois acaba se tornando um instrumento dos governos que afetaram e ainda afetam a vida cotidiana e o futuro de vários povos.

Nossa política internacional sempre teve caráter pacífico (com a exceção da Guerra do Paraguai – 1864 a 1870), mesmo depois do rompimento com Portugal, porém, nossa capacidade de crescimento e autonomia nunca foi utilizada de maneira estável, passando por períodos favoráveis às classes sociais, porém prejudiciais à nação e, outras em que essas idéias favoráveis aos segmentos sociais foram utilizadas de forma mais abrangente, avaliando as circunstâncias presentes para reger suas atitudes e deixando para trás possíveis antecedentes que poderiam afetar as decisões.

 

BARGANHA E APROXIMAÇÃO COM OS ESTADOS UNIDOS: 1930-1955

O período que compreende o fim da República Velha e o início do governo de Getúlio Vargas (1930) foi caracterizado pela política externa brasileira haver se tornado automaticamente direcionada e movimentada pelos Estados Unidos. Isso ocorreu por meio da economia, tendo o Brasil como agroexportador e importador de produtos manufaturados e também militarmente, a partir da cooperação (OLIVEIRA, 2005). Este período também foi marcado "[...] por um processo pragmático de barganha, pendular entre as perspectivas de alinhamento com a Alemanha ou com os Estados Unidos [...]" (OLIVEIRA, 2005, p. 42).

Os Estados Unidos também produziam matéria prima, dando espaço para a Alemanha obter maior influência sobre a América Latina. Assim, no entre-guerras, Vargas passou a estabelecer acordos e conexões com os Estados Unidos e Alemanha utilizando de possibilidades oferecidas por ambos (OLIVEIRA, 2005).

 

Por não possuírem possessões coloniais, Estados Unidos e Alemanha se voltaram para os mercados latino-americanos. Suas estratégias comerciais e políticas, entretanto, diferiram sobremaneira: enquanto os Estados Unidos buscavam garantir sua liderança na região pelo livre-comércio e o culto à liberal democracia, a Alemanha, carente de divisas, buscava no comércio compensado (troca de mercadorias sem intermediação de moeda forte) e no culto ao autoritarismo parlamentar nacionalista conquistar espaços na região latino-americana. (PINHEIRO, 2004a, p. 22).

 

O que explica a posição de Vargas, está relacionado com a política interna brasileira. Esta era "dividida" em dois setores: o tradicional agroexportador, que defendia o comércio-livre, pois a exportação de seus produtos agrícolas era essencial, portanto, tinha vínculo com os Estados Unidos. Já o outro setor, era o novo círculo industrial que se formava no país, onde eram favoráveis ao protecionismo alfandegário, e se identificavam com a Alemanha, esta que também visava táticas protecionistas (OLIVEIRA, 2005).

 

Por conseguinte, essa indefinição era ainda mais realçada pelo fato de que o Governo Vargas tinha como fundamentação básica a proposta de desenvolvimento industrial do País, portanto, a proposta de inserção internacional do Brasil não estava mais diretamente correlacionada com os interesses do setor agroexportador. (OLIVEIRA, 2005, p. 46).

 

O Brasil, nesse período, praticava o liberalismo com os Estados Unidos e fazia intercâmbios comerciais com a Alemanha pela troca de matéria prima por equipamentos. Além disso, o Brasil passou a relacionar-se mais amplamente com seus vizinhos fronteiriços, promovendo a paz e o pan-americanismo, assim como a aproximação com a Argentina. Com a Segunda Guerra Mundial (1939 - 1945), a política externa brasileira teve que se posicionar dando fim ao dualismo. Os Estados Unidos desejavam tanto influência como controle e coordenação na relação com a América Latina diante da guerra. Ficou clara a importância do Brasil na cooperação com os Estados Unidos no conflito, dando maior poder em negociações no âmbito internacional.

Participar da guerra era garantir a presença brasileira nos arranjos de paz. E tomar parte nessas negociações significava se fazer ouvir no processo de construção de uma nova ordem mundial. Além disso, participar desse reordenamento representava um diferencial nada desprezível frente aos demais países da América do Sul, particularmente frente à Argentina. Mais uma vez o Brasil se pautava pela busca de presença mais significativa no sistema internacional. (PINHEIRO, 2004a, p. 26).

 

Assim, com a preocupação no desenvolvimento econômico, o governo Vargas se focou no investimento industrial e militar. Volta Redonda, no estado do Rio de Janeiro, foi construída em 1940, com o apoio dos Estados Unidos, pelo acordo feito com o presidente norte-americano Franklin Roosevelt. O Brasil permitiu que os Estados Unidos instalassem bases militares americanas no Nordeste deixando de ser neutro na Guerra e passando a se envolver no conflito ao lado dos Estados Unidos. Oliveira (2005) resume o governo de Vargas entre 1930-1945:

 

[...] o período entre guerras, em especial a partir dos anos 1930, caracterizou-se pela manutenção de uma americanização, transformada em norte-americanização, em conjunto com a exploração de novas possibilidades externas que se abriam em função de processo internacional de disputa entre os sistemas de poder em gestação. Processo que Gerson Moura definiu como de eqüidistância pragmática. (OLIVEIRA, 2005. p. 52).

 

Em 29 de outubro de 1945, Getúlio Vargas é deposto e Eurico Gaspar Dutra assume o governo (1946-1950). Devido ao pragmatismo marcante no governo de Vargas, ao fato de este apoiar a democracia, no envio de tropas à Segunda Guerra Mundial e, ao mesmo tempo, sustentar um governo autoritário como o Estado Novo, foi motivo para a crítica interna à Vargas aumentar (PINHEIRO, 2004a).

Segundo Lafer, após a Segunda Guerra, o novo contexto mundial fica dividido em áreas de influência (apud OLIVEIRA, 2005) com os Estados Unidos se concentrando na América Latina e a Europa na África. Os Estados Unidos ascendeu como potência mundial e ao lado desta estava a União Soviética, ocasionando a reversão de alianças entre os dois países que resultou na Guerra Fria, caracterizada pela bipolaridade (PINHEIRO, 2004a).

Com o término da Guerra, os países latino-americanos se engajaram em uma posição de solidariedade mútua, tanto no plano político quanto econômico, na expectativa de uma forte "[...] cooperação hemisférica e regionalismo econômico junto com os Estados Unidos." (OLIVEIRA, 2005). O Brasil, que se considerava como aliado especial (PINHEIRO, 2004a, p. 28) dos Estados Unidos, esperava ser privilegiado na nova ordem internacional que se estabelecia.

Os Estados Unidos, porém, haviam colocado a América Latina em segundo plano, pois se ocupavam com os desdobramentos da Guerra Fria. Ainda assim, os Estados Unidos colocaram em prática planos estratégicos de influência na América Latina que buscavam "[...] consolidar sua presença pelo estabelecimento e institucionalização de seu sistema de poder." (OLIVEIRA, 2005). Esse objetivo foi estabelecido com a criação, em 1947, do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR) e da Organização dos Estados Americanos (OEA), em 1948, este dizendo que "[...] um ataque armado por qualquer Estado contra um Estado americano será considerado como um ataque contra todos os Estados americanos." (OLIVEIRA, 2005, p. 61). Porém, deve-se lembrar que o objetivo dos Estados Unidos era consolidar sua influência e hegemonia na América Latina, portanto o TIAR era "[...] muito mais um canal de articulação político-militar de hegemonia norte-americana no continente." (OLIVEIRA, 2005, p. 62).

Como aponta Oliveira (2005), com o governo de Dutra, um alinhamento com os Estados Unidos se tornou o objetivo principal da política externa brasileira na época. Mas, como anteriormente mencionado, os Estados Unidos focavam sua política na Guerra Fria, em especial para Europa e Ásia. Portanto, não haveria tratamento especial para o Brasil, e o país, como diz Moura, "[...] seria atendido no mesmo plano de outros países latino-americanos [...]" (apud OLIVEIRA, 2005). Esse posicionamento dos Estados Unidos diante da América Latina se deu no plano tanto político como econômico. Malan (apud OLIVEIRA, 2005, p. 65) cita em seu livro que, quando Macedo Soares, então ministro da Viação e Obras Públicas, vai aos Estados Unidos, em 1946, buscar ajuda financeira, ele teve como uma das respostas: "[...] para os programas de desenvolvimento, o interlocutor deveria ser não o governo norte-americano, mas a instituição multilateral especialmente criada para tal fim – o Banco Mundial [...]".

Segundo Almeida (apud OLIVEIRA, 2005), devido à insatisfação do Brasil diante desse quadro, não conseguindo apoio americano aos esforços de industrialização e desenvolvimento, Vargas reassume o governo em 1951. A política externa deste período de Vargas fica caracterizada pela negociação político-estratégica com Washington pela ajuda ao desenvolvimento econômico, conhecido como barganha nacionalista (PINHEIRO, 2004a).

A questão, no entanto, era barganhar com quem e o quê, pois a conjuntura internacional não era a mesma do período entre guerras, onde o Brasil direcionava sua estratégia de negociações tanto para os Estados Unidos quanto para a Alemanha (OLIVEIRA, 2005).

Foi assim que um comportamento mais autônomo, que projetasse o país no plano internacional, teve de ser direcionado a regiões e temas em que, de fato, os interesses estratégicos norte-americanos não estivessem ameaçados. América Latina, África, Ásia e Oriente Médio ganharam seu lugar na agenda, particularmente nos debates das Nações Unidas, onde a delegação brasileira se mostrou mais afinada com as realidades do poder, ao perceber as limitações impostas pelo alinhamento incondicional aos Estados Unidos. (PINHEIRO, 2004a, p. 29).

 

Getúlio Vargas, ainda assim, tenta implementar sua estratégia de barganha instalando, em 1951 no Rio de Janeiro, a Comissão Mista Brasil – Estados Unidos para o Desenvolvimento Econômico, visando apoio ao desenvolvimento industrial brasileiro. A comissão recebeu fortes críticas internas "[...] aos empréstimos concedidos pelo fato de terem beneficiado sobremaneira as filiais norte-americanas instaladas no País e igualmente pela necessidade, como contrapartidas, de aquisição de produtos norte-americanos." (OLIVEIRA, 2005, p. 69). A Comissão foi desativada em 1953 após a posse de Eisenhower (OLIVEIRA, 2005).

Com a Guerra da Coréia, foi assinado, em 1952, entre Brasil e Estados Unidos, um acordo de assistência militar recíproca, que foi mais uma tentativa de Vargas em relação à barganha:

 

Nesse sentido, a Guerra da Coréia foi a oportunidade que se abriu ao Brasil para tentar se aproveitar dos interesses estratégicos dos Estados Unidos. [...] Vargas tentou, assim trocar seu apoio e mesmo a possibilidade de envolvimento efetivo na Guerra da Coréia em troca de auxílio ao desenvolvimento econômico brasileiro e ao acordo militar em negociação. (OLIVEIRA, 2005, p. 71).

 

As expectativas do Brasil, porém, são novamente frustradas, quando os Estados Unidos isolam a união militar de apoio econômico. Portanto, nas políticas externas dos governos Dutra e Vargas o que predominou foi a constante influência e presença do capital norte-americano para o desenvolvimento, que posteriormente foi modificado pelo fato de os Estados Unidos se voltarem para a Guerra Fria e para questões estratégicas de segurança internacional, enquanto "[...] as reivindicações de apoio aos processos de desenvolvimento dos países latino-americanos[...]" (OLIVEIRA, 2005, p. 72) ficaram, praticamente nesse período todo, em segundo plano.

Após o suicídio de Vargas, em 1954, e a instalação de uma crise política no Brasil, começamos a sofrer uma intensa pressão por parte do governo norte-americano e, também, de grupos nacionais por conta da decretação do monopólio estatal do petróleo, ou seja, ao Estado brasileiro pertenceria todo o petróleo extraído pela Petrobrás, criada a partir da Lei nº. 2.004 do governo Getúlio Vargas. Porém, havia outros motivos para o descontentamento do capital estrangeiro (em especial o americano), o Decreto – lei de Vargas (1954), que limitou em até 10% ao ano as remessas de lucros para o exterior do capital inicial investido, para que houvesse um maior desenvolvimento interno do comércio e da indústria brasileiras e, não gerando confronto entre o país (Brasil) e o GATT (General Agriments on Tariffs and Trade) ou o FMI (Fundo Monetário Internacional), por ainda se encontrar dentro das regras comerciais estabelecidas por ambos.

Ainda assim, houve protestos, principalmente estrangeiros, que acabaram por "ameaçar", de certa forma, o Brasil no que diz respeito às relações exteriores, sendo o principal evento exemplificativo a reunião do Conselho Americano de Câmaras de Comércio, que chegou a discutir a possibilidade de suspensão dos empréstimos ao Estado brasileiro, evidenciando o impacto que a crise política interna do Brasil teve diretamente às relações internacionais deste com os Estados Unidos da América (CERVO & BUENO, 2002).

Toda esta situação foi o que a ascensão à Presidência da República "presenteou" o vice-presidente João Café Filho (1954-1955), que, ao subir ao poder, levou consigo várias pessoas simpatizantes ao capital estrangeiro, o que melhorou bastante as relações com os Estados Unidos e, acabou contrariando as atitudes do governo antecedente.

Os Estados Unidos, segundo Bandeira (apud CERVO & BUENO, 2002), acreditavam que países menos desenvolvidos, ou, "carentes de financiamento para o desenvolvimento", deviam buscar capitais a partir de empréstimos na iniciativa privada. E, assim, segundo Cervo (2002), Eugênio Gudin, Ministro da Fazenda, fez um empréstimo de 200 milhões de dólares de bancos norte-americanos.

Ainda no governo Café Filho, foi assinado um acordo com o governo americano sobre excedentes agrícolas, para a aquisição de, também de acordo com Cervo e Bueno (2002):

 

[   ] 500 mil toneladas de trigo em grão, além de farinha de trigo, banha, cereais para forragens e fumo, em menor quantidade. Pelos termos do ajuste, o Brasil compraria os cereais em cruzeiros, a preço de mercado, obedecendo a uma taxa fixa de conversão. Do produto da venda, 76% os Estados Unidos emprestariam ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico.

 

Mesmo assim, o que mais chamou atenção na política externa brasileira nessa transição de governos (de Getúlio Vargas a Juscelino Kubitschek) que foi o governo de Café Filho, foi o que diz respeito à cooperação dos Estados Unidos na área de energia atômica. Os Estados norte-americanos e o Brasil assinaram um "[   ] acordo de cooperação para o uso civil da energia atômica e o Programa Conjunto de Cooperação para o Reconhecimento dos Recursos de Urânio no Brasil [   ]" (CERVO & BUENO, 2002, p. 285), em 1955, no Rio de Janeiro. O primeiro facilitava o intercâmbio de informações e tecnologias entre os dois países, enquanto o segundo visava o levantamento das províncias uraníferas brasileiras.

Nesses acordos, os americanos tentavam sempre garantir que as pesquisas teriam caráter pacífico, visando somente o desenvolvimento de tecnologias energéticas, mas nunca militares, o que não agradou muito os nacionalistas, afinal, tais requisitos estariam impedindo um desenvolvimento militar mais avançado no país. Porém, mesmo denunciando a possível pressão que estava sendo feita sobre o Brasil em relação à assinatura dos acordos, o Conselho de Segurança Nacional acompanhou de perto a negociação e negou a existência de qualquer espécie de pressão, afirmando que não havia risco à soberania militar brasileira, o que, inclusive, levou outros países latino americanos a assinarem tratados semelhantes com os Estados Unidos.

Com a assinatura desses acordos, o governo Café Filho foi acusado de agir em função dos interesses norte-americanos e de que tal cooperação com os Estados do Norte só trariam benefícios aos mesmos, entre os quais estaria o possível monopólio das jazidas de urânio brasileiras.

 

DA ABERTURA ECONÔMICA BRASILEIRA AO PRÉ-GOLPE MILITAR: 1956-1964

 

Se durante o segundo governo de Vargas a opinião nacional via no contexto externo importante componente que poderia acelerar ou atrasar o desenvolvimento, consoante cada posicionamento ideológico, no governo JK (...) essa tendência reforçou-se ainda mais (CERVO & BUENO, 2002, p.287).

 

As relações internacionais brasileiras nunca foram tão valorizadas no século XX como no governo do presidente Juscelino Kubitschek (1956 - 1961). Havia uma idéia de que tínhamos de tirar nosso país do atraso e, isso só ocorreria por meio, não só de reformas internas, mas também pela mudança nas relações com outras nações. Havia uma necessidade de receber capital e tecnologias estrangeiras, assim como, a ampliação do comércio exterior para que a capacidade de importação do Brasil aumentasse. E, segundo Cervo e Bueno (2002), o desenvolvimento nacional visível a partir de Juscelino Kubitschek, passou a ser a chave para a compreensão da política externa brasileira de avanços e recuos até hoje.

Juscelino Kubitschek (JK) foi extremamente conhecido por traçar um "Plano de Metas" para seu mandato, cujo lema "cinquenta anos de progresso em cinco anos de governo" se tornou literalmente real e eficaz, principalmente com relação à indústria nacional. Seu governo era o que podemos chamar de "desenvolvimentista" e, contava com um amplo apoio do capital estrangeiro, resultando em estratégias que visavam à atração desses investimentos, como a isenção de impostos para a entrada de capitais, no que obteve sucesso e acabou por possibilitar a abertura da economia brasileira para investimentos provenientes de fora.

Houve um aumento nas exportações do país, principalmente do café, proporcionalmente ao aumento da capacidade de importação e, essa conquista, segundo JK, foi tão eficiente que inverteu a situação da balança comercial de um déficit econômico para um superávit. Segundo Cervo e Bueno (2002), também entraram no país cerca de 510 milhões de dólares, o que significava uma estabilidade política e econômica do Brasil que passava segurança para os investidores estrangeiros e, consequentemente, trazia desenvolvimento.

No plano internacional, Juscelino procurou estreitar as relações entre o Brasil e os Estados Unidos, ciente de que isso ajudaria na implantação de sua política econômica industrial e na preservação da democracia brasileira. Para isso, formulou a Operação Pan-americana (OPA), iniciativa diplomática em que solicitava apoio dos Estados Unidos ao desenvolvimento da América do Sul, como forma de evitar que o continente fosse assolado pelo comunismo. Apesar de ter apresentado poucos resultados concretos, a OPA representou um momento importante da política externa brasileira. Pela primeira vez, as relações exteriores do país passaram a buscar uma política externa mais autônoma em relação às "ordens" de Washington.

A importância que JK dava ao capital estrangeiro era tão grande que chegou a discursar sobre o tema, destacando o papel do Ministério das Relações Exteriores e enfatizando a importância da cooperação internacional:

 

A aceleração do progresso econômico das nações que, como a nossa, emergem do estágio do subdesenvolvimento, depende, em grande parte, da cooperação internacional, da intensificação dos contatos de toda a ordem, do harmonioso intercâmbio comercial, da canalização de um maior fluxo de investimentos estrangeiros e do incremento da assistência técnica, do aumento do valor e do volume das exportações [   ]. (KUBITSCHEK apud CERVO & BUENO, 2002).

 

A política externa adotada por Jânio Quadros (31/01/1961 - 25/08/1961) durante seu curto governo, diferentemente da OPA de Juscelino Kubitschek, partia de uma visão universal, mas sem descuidar dos aspectos regionais; buscava os interesses do país sem preconceitos ideológicos e para tal, adotava uma postura independente, criando a PEI (Política Externa Independente).

A PEI possuía bases nacionalistas e acabou ampliando a política de JK, visando o desenvolvimento do país e desvencilhando-se dos Estados Unidos, criando relações não somente com os Estados norte-americanos e dando prioridade aos mesmos, mas também com vários outros países do globo, perdurando da posse de Quadros (31 de janeiro de 1961) até o início do regime militar (31 de março de 1964).

Jânio acreditava que sua política externa assumira a defesa dos direitos internacionais brasileiros, da autodeterminação, ou seja, ela não deveria ser subordinada a uma política estrangeira, e a não intervenção em assuntos internos de outras nações. Era uma política de paz, desarmamento e coexistência pacífica, com apoio à descolonização completa de todos os territórios ainda dependentes. Queria que houvesse uma expansão das exportações brasileiras para qualquer país (inclusive socialistas). Acreditava também que, como o Brasil não possuía muitas obrigações internacionais e não pertencia a qualquer bloco, tinha o direito de liberdade para decidir sobre certos casos, como formação autônoma da ajuda externa, planos de desenvolvimento e encaminhamento (VIZENTINI, 1998).

João Belchior Marques Goulart (1961-1964), ou "Jango", foi vice-presidente da República no governo de Juscelino Kubitschek e em 1960 reelegeu-se vice-presidente na chapa de Jânio Quadros, assumindo o poder após a renúncia de Jânio.

Goulart deu continuidade à Política Externa Independente (PEI) instaurada por seu antecedente, mas, ao contrário daquele que enfatizava a política da PEI para haver um neutralismo pacifista por parte do Brasil, fez uso da "independência externa" para gerar desenvolvimento. Conforme afirma Pinheiro (2004b), a Política Externa Independente não era mais pensada em termos neutralistas, mas sim em termos da capacidade de o Brasil possuir uma atuação autônoma por meio da ampliação de seus recursos econômicos, políticos e sociais, enfim, do seu desenvolvimento.

No período Jango, em relação a Cuba, o Brasil optou por basear sua posição em princípios mais permanentes da diplomacia brasileira. Assim, posicionou-se em defesa de Cuba no sistema interamericano e contra a intervenção norte-americana, baseada em princípios tradicionais da diplomacia brasileira - o direito à autodeterminação e o princípio da não-intervenção - em vez de ceder às pressões dos Estados Unidos.

Além disso, segundo Dantas (apud CERVO & BUENO, 2002), a política externa brasileira também manteve seu posicionamento de

 

[...] manter condições de segurança que permitirão ao capital privado desempenhar o seu papel vital no desenvolvimento da economia brasileira e que nos entendimentos com as companhias para a transferência de empresas de utilidades pública para a propriedade do Brasil será mantido o princípio da justa compensação com reinvestimento em outros setores importantes, para o desenvolvimento econômico do Brasil.

 

Como o Brasil era o representante fundamental de poder na América Latina, algumas iniciativas da política externa e inúmeras medidas tomadas por João Goulart na política interna afetaram os interesses de Washington e as relações entre os dois governos foram se deteriorando. E, embora sem participar diretamente do golpe de 1964, Washington apoiou o movimento que ao fim derrubou o governo Goulart e com ele a Política Externa Independente.

 

POLÍTICA EXTERNA NO PERÍDO MILITAR

Na política externa durante os regimes militares, foi adotada, generalizadamente falando, a continuação da Política Externa Independente (PEI), implantada inicialmente por Jânio Quadros e aprofundada no governo de João Goulart.

O governo do Marechal Castelo Branco (1964-1967) trouxe a tentativa de realinhamento com o governo norte-americano, com a aplicação da Política da Interdependência, e tinha como intuito afirmar sua posição no contexto da Guerra Fria, até mesmo porque o próprio golpe militar havia se dado devido à ameaça de um possível golpe comunista, buscando uma segurança externa que ajudaria no processo de desenvolvimento brasileiro. Sua posição favorável aos Estados Unidos caracteriza o paradigma Americanismo.

Ainda nesse início de ditadura, as relações políticas com Cuba foram cortadas. Segundo o chanceler Vasco Leitão da Cunha, "[...] o rompimento de relações com Cuba foi dada devido a questões ideológicas, sem ter havido pressão dos EUA [...]" (CUNHA, 1994, p. 281).

Essa tentativa caracterizou inicialmente a descontinuidade da PEI em relação à política externa adotada durante o governo do Marechal, pois aquela afirmava o bom relacionamento econômico brasileiro com todos os países (inclusive os socialistas), enquanto o que se aplicou foi uma política econômica, sobretudo voltada para garantias aos investimentos e empresas ocidentais (principalmente norte-americanas).

Porém, houve um grande descontentamento em relação à reciprocidade americana. Para Carlos Estevam Martins (apud OLIVEIRA, 2005, p.112):

 

[...] especialmente no caso dos Estados Unidos, esperávamos que seu comportamento internacional fosse ditado não pela percepção que eles tinham dos seus próprios direitos e necessidades, mas pelos deveres e atribuições que, arbitrariamente, lhes havíamos imputado.

 

Dentre os países latino-americanos, as relações mantidas mais importantes foram com a Argentina. "Ambas as nações se apoiaram mutuamente no momento da implantação dos regimes de segurança nacional, procurando geralmente manter-se de acordo nos fóruns regionais como a OEA [...]" (VIZENTINI, 1998, p. 52), visando o melhoramento da economia latino-americana e o fortalecimento da ALALC (Associação Latino-Americana de Livre Comércio), uma tentativa de integração comercial da América Latina.

Em relação ao continente africano, o governo brasileiro se desvencilhou da idéia, antes cogitada pela PEI, de apoio a nações recém-independentes. Concentrou-se nas colônias portuguesas, que junto com Portugal, poderiam futuramente formar uma aliança de países de origem lusitana.

Castelo Branco demonstrou uma crença ingênua na reciprocidade americana, e isso causou um resultado negativo para seu governo. A Política de Interdependência havia se tornado, de dependência.

O Marechal Arthur da Costa e Silva (1967-1969) então assumiu, com a insinuação de reformulação do sistema de seu antecessor. Seu governo foi baseado na Diplomacia da Prosperidade cuja finalidade seria colocar a parte diplomática em favor do desenvolvimento nacional, aproveitando ao máximo as oportunidades oferecidas pelo setor externo para a aceleração do progresso e a modernização do país.

 

A Diplomacia da Prosperidade baseia-se na convicção de que o desenvolvimento é uma responsabilidade nacional a ser exercida, principalmente, por meio de instrumentos internos. O governo reconhece, contudo, o caráter estratégico do setor externo, tanto em termos de comércio, como de capitais e técnicas. (COSTA E SILVA, 1968, p. 131).

 

A Diplomacia da Prosperidade procura reverter o quadro de alinhamento brasileiro com os norte-americanos, buscando novas alianças político-econômicas para um maior avanço do país. Defende assim, uma maior ligação entre os países em desenvolvimento, deixando de lado a visão "castelista" de Ocidente-Oriente, bem como a existência de fronteiras ideológicas, e visando apenas o eixo Norte-Sul, com base em uma política fundada nas necessidades dos países do terceiro mundo.

As relações brasileiras com os Estados Unidos diminuíram devido ao posicionamento contrário brasileiro ao Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP) e seu alinhamento com as posições terceiro-mundistas e liderança exercida nas negociações de comércio e produtos de base, durante a 2ª UNCTAD (Segunda Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento).

O governo do presidente Artur da Costa e Silva caracterizou uma tentativa de Globalismo, porém, ao início do Governo Médici, foi retardada essa tentativa, voltando ao Americanismo.

Já no governo de Emílio Garrastazu Médici (1969 - 1974), o Brasil foi reconhecido pelos Estados Unidos como potência regional. O General baseou-se na Diplomacia do Interesse Nacional (DIN) que tinha por objetivo melhorar a posição do Brasil no âmbito do Imperialismo, fazendo-o assim uma grande potência. Ele "[...] procurou intensificar as relações não só econômicas como também políticas com os mais diferentes países [...]" (OLIVEIRA, 2005, p. 144). Também abandonou a idéia de solidariedade com as nações de terceiro mundo e melhorou suas relações com os norte-americanos.

Foi durante o seu governo que ocorreu o chamado milagre econômico, onde a economia brasileira se expandiu de maneira excepcionalmente rápida. Porém, durante esse período houve o crescimento da divida externa, e, no âmbito interno, houve o aumento da concentração de renda e da pobreza.

Dentro da dificuldade de acesso ao mercado externo e das ampliações das barreiras protecionistas, o Brasil buscou novos parceiros para se inserir no sistema internacional. Lima e Moura afirmam (apud OLIVEIRA, 2005, p. 144):

 

É dentro desse quadro que se pode entender a prioridade que a política do Itamaraty passou a conferir à cooperação sul-sul e, particularmente, às relações com a América e a áfrica Meridional, regiões onde, por razões históricas e geográficas, o Brasil teria condições de maximizar suas ‘vantagens comparativas’.

 

Foi no Governo Médici que terminaram as negociações com o Paraguai para a construção da Hidroelétrica de Itaipu, a de maior potência instalada no mundo.

O Governo de Ernesto Geisel (1974 - 1979) foi o início da volta do Globalismo como forma de política externa brasileira, esta que se baseou no plano do Pragmatismo Responsável e Ecumênico.

 

O primeiro passo da diplomacia denominada Pragmatismo Responsável e Ecumênico do Chanceler Azeredo da Silveira foi estreitar vínculos com os países árabes. O Itamaraty permitiu a instalação de um escritório da OLP em Brasília, apoiou o voto anti-sionista na ONU e adotou uma intensa política exportadora de produtos primários, industriais e serviços, em troca do fornecimento de petróleo. Mais do que isto, o Brasil adotou uma íntima cooperação com potências regionais como Argélia, Líbia, Iraque e Arábia Saudita, sob a forma de joint-ventures para prospecção no Oriente Médio através da Braspetro, e para o desenvolvimento tecnológico e industrial-militar (venda de armas brasileiras e projetos comuns no campo dos mísseis). (VIZENTINI, 1998, p. 202).

 

Neste período, o Brasil se vinculou com países como o Japão, pela retomada de investimento japoneses no Brasil em desenvolvimento, e a Alemanha, com a qual fez um acordo nuclear muito importante, pois os alemães necessitavam de um financiamento exterior para aprimorarem seu programa e o Brasil desejava fazer alianças com países desenvolvidos.

O Brasil também estreitou suas ligações com os países socialistas com os quais já existiam vínculos e estabeleceu relações, tanto diplomáticas como comerciais, com a China. Segundo Azeredo da Silveira (apud OLIVEIRA, 2005, p.150):

 [...] tanto nossas responsabilidades quanto nossas necessidades aumentaram. Em conseqüência, o Brasil teve que multiplicar seus contatos com outras nações, diversificar os mercados para seus produtos e buscar novas fontes de financiamento e tecnologia. Essa necessidade de diversificação de contatos foi ainda mais acentuada pela crise econômica que hoje aflige o mundo ocidental. À medida que alguns dos mercados tradicionais fecham suas portas às importações feitas ao Brasil, precisamos buscar outros clientes que ainda não tenham sido afetados pelo vírus do protecionismo.

 

Muitas das atitudes brasileiras contrariaram as posições norte-americanas, fazendo-os adversos à política externa brasileira desse período. Na realidade, o Brasil não teve essas atitudes em vontade de contrariar os Estados Unidos, mas sim em prol de seus interesses e necessidades momentâneos.

O último presidente do regime militar foi João Baptista Figueiredo (1979 - 1985), sendo seu regime marcado, no âmbito interno, pelo processo de abertura política e a crise político-econômica.

A política externa de seu governo foi guiada pela Diplomacia do Universalismo, que deu continuidade ao Pragmatismo Responsável do governo Geisel, do mesmo jeito que continuou o paradigma do Globalismo, conservando e intensificando a presença da diplomacia brasileira em todas as partes do globo, mas se adaptando às novas condições econômicas e políticas mundiais.

 

A política externa do Chanceler Ramiro Saraiva Guerreiro autodenominou-se de Universalismo, e esforçou-se por manter a autonomia do Brasil num cenário crescentemente desfavorável, conservando fortes traços de continuidade com o Pragmatismo Responsável. Definindo o país como parte do Terceiro Mundo, a diplomacia brasileira continuou a atuar nos fóruns internacionais em convergência com o Movimento Não-Alinhado (embora não o integrando), denunciando as estruturas políticas e econômicas internacionais. Com a gradativa submissão da Europa Ocidental e do Japão ao rearranjo econômico e diplomático-estratégico da administração Reagan, a cooperação com estes países conheceu uma significativa redução. Na África, o Brasil manteve uma presença importante, mas a recessão da década perdida naquele continente e o aprofundamento da guerra na África austral limitaram fortemente os resultados de tal cooperação. (VIZENTINI, 1998, p. 275).

 

Na América Latina, destacam-se as relações brasileiras com a Argentina. A intenção conciliatória se inicia no Acordo Tripartite, que definiu parâmetros de uso dos recursos hidráulicos do Rio Paraná, assinado por Brasil, Argentina e Paraguai. Foram assinados também vários atos bilaterais, principalmente na primeira visita de Figueiredo à capital Buenos Aires, que, entre outros, afirmavam o apoio brasileiro aos argentinos na causa das Ilhas Malvinas, a oposição dos dois países ao regime do Apartheid e a cooperação militar entre Argentina e Brasil.

 

POLÍTICA EXTERNA NA REDEMOCRATIZAÇÃO

De acordo com Oliveira (2005), no governo civil pós-ditadura foram mantidas as diretrizes básicas da política externa, apesar das mudanças no regime interno.

Nos anos 1980, o crescimento da tendência de criação de blocos econômicos viabilizou a adoção de políticas protecionistas pelos países desenvolvidos, o que acarretou uma desaceleração do comércio mundial. Essas medidas prejudicaram os países em desenvolvimento e em especial o Brasil. Outro fator que mostrou a fragilidade brasileira perante o sistema internacional foi a crise da dívida externa.

É nesse contexto que o Governo de José Sarney (1985 - 1990) irá concentrar-se em duas estratégias: a de ampliação do papel do Brasil na América Latina junto da aproximação com a Argentina e, a outra, caracterizada pelo papel negociador com os Estados Unidos.

As possibilidades de manobra da diplomacia brasileira estavam comprometidas devido à crise interna (inflação crescente, aumento da dívida pública) e a já mencionada crise da dívida externa. Soma-se a isto a distensão do sistema bipolar e o novo papel das potências econômicas que refletirão negativamente sobre a América Latina e sobre o Brasil.

A aproximação Brasil-Argentina representa um esforço dos dois países em reposicionar-se diante do adverso contexto internacional do momento. É o reconhecimento das sérias dificuldades das circunstâncias econômicas internacionais e da percepção de que os países precisavam urgentemente unir-se para defender interesses comuns. Segundo Thompson (apud, OLIVEIRA 2005), "[...] a América Latina deve reforçar seu poder de negociação com o resto do mundo [...]".

 

Os esforços de ambos os países para adaptarem-se às condições internacionais e imprimirem às próprias políticas externas no novo direcionamento, em razão também dos novos ordenamentos domésticos que a redemocratização colocava, refletiram-se de forma distinta, em cada país, no padrão de continuidade de política externa, ao mesmo tempo em que produziram um nítido sentido de convergência quanto à prioridade a ser conferida à América Latina como espaço privilegiado de sua atuação político-diplomática e econômica. (PINHEIRO, 2004a, p. 73-74).

 

Apesar do desenvolvimento da estratégia mais voltada à América Latina, observa-se a permanência do paradigma globalista, conforme afirma Mello (apud, PINHEIRO, 2004a, p. 56-57).

 

O objetivo de explorar possibilidades junto ao Japão e à Europa mantinha sua centralidade, bem como o da atuação em consonância com os países em desenvolvimento, embora a única oportunidade diplomática mais promissora fosse concretamente identificada na ampliação das relações políticas e econômicas com a América Latina. De forma geral, apesar do reconhecimento acerca da necessidade de promover um ajustamento da atuação internacional do país aos novos condicionantes externos do final da década de 80, essas avaliações sugerem que o paradigma universalista mantinha-se como fundamento das interpretações da diplomacia brasileira quanto às perspectivas da ação externa do Brasil.

 

Segundo Oliveira (2005), a parceria Brasil-Argentina apresentava um caráter diferente das parcerias estabelecidas nos anos 1970. Para ele, foi construída uma parceria mais simétrica e baseada em interesses comuns. Pela primeira vez, "[...] se construiu uma parceria envolvendo temas sensíveis, como cooperação no campo nuclear e no campo da segurança [...]" (OLIVEIRA, 2005, p. 79-80).

No que tange a relação com os Estados Unidos, observa-se um progressivo distanciamento das relações bilaterais entre os dois países e o surgimento de questões responsáveis por divergências entre estes.

Patentes farmacêuticas, política de informática, dívida, produtos brasileiros de exportação (produtos siderúrgicos, calçados e aviões) foram os temas de tais divergências (PINHEIRO, 2004a, p. 51). À vista disso, a diplomacia brasileira esforçou-se para manter uma agenda positiva com os Estados Unidos.

Como resultado desse estreitamento de oportunidades, observa-se o começo da mudança de posição do Brasil nas negociações da Rodada de Uruguai do GATT (General Agreement on Tariffs and Trade).

Nessa Rodada, o Brasil, em parceria com a Índia, vai ocupar um espaço de liderança na obstrução de seu desenrolar, expressando ainda permanência da linha de ação diplomática de defesa da necessidade de redução do hiato entre os países desenvolvidos e os subdesenvolvidos. (OLIVEIRA, 2005, p. 225).

 

Segundo Pinheiro (2004a), com a assunção de Fernando Collor de Mello (1990 - 1992) à presidência da República, a política externa viu ambos os paradigmas entrarem em conflito.

O fim da Guerra Fria elevou os Estados Unidos à condição de potência hegemônica global. É natural, pois, que Collor tentasse retomar o paradigma americanista. No entanto, a tentativa mostrou-se ineficaz, pois a visão globalista do Ministério das Relações Exteriores prevaleceu. As razões essenciais para a manutenção do globalismo como paradigma, segundo Mello (apud, OLIVEIRA, 2005), foram:

 

O alto grau de enraizamento desse paradigma no âmbito do Ministério das Relações Exteriores; a coesão da corporação diplomática na coordenação de suas preferências; [...] e o contexto de incerteza quanto à distribuição das preferências do sistema político doméstico.

 

Além disso, conforme afirma Celso Lafer (2007), tanto a América Latina quanto o Brasil eram de importância secundária para os Estados Unidos.

Oliveira (2005) ressalva que o Itamaraty não teve participação direta na proposta política externa de Collor.

À vista disso, Celso Lafer, que passa à direção das Relações Exteriores em 1992, retoma alguns aspectos do globalismo, o que caracteriza a segunda fase do Governo Collor. As negociações para a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, a ECO-92, são um exemplo desse quadro (LAFER, 2007).

A crise da política interna choca-se com o projeto de política externa de Collor o que acaba resultando em seu impeachment.

A substituição de Collor por Itamar Franco (1992 - 1995) e a nomeação de Fernando Henrique Cardoso (FHC), seguido por Celso Amorim, como ministros das Relações Exteriores, fizeram com que a diplomacia brasileira mantivesse a política externa reintroduzida por Celso Lafer. Buscou-se a adaptação do Brasil às circunstâncias internacionais sem que se deixasse de lado sua histórica prioridade na busca pela autonomia e pelo desenvolvimento.

Com relação ao desenvolvimento, buscou-se discutir nas "[...] Nações Unidas uma Agenda para o Desenvolvimento em acréscimo à chamada Agenda para a Paz, então em vigor na organização [...]" (PINHEIRO, 2004a, p. 58). No que tange a busca pela autonomia, "[...] tratou-se de intensificar a participação nos debates internacionais buscando obter mais voz nos foros de decisão internacionais [...]" (PINHEIRO, 2004a, p. 58).

Tanto o primeiro quanto o segundo mandato de FHC (1995 - 2003) foram marcados por privatizações, abertura econômica e liberalização das regras de comércio. A estabilização econômica conseguida com o Plano Real de 1994 deram credibilidade internacional ao país. No plano da política externa, o Governo FHC foi marcado pela intensificação na participação brasileira nos foros decisórios como a ONU e OMC. Houve também uma aproximação com os países intermediários (China, Índia e África do Sul).

Pelo o que foi apresentado, pode-se inferir que apesar da inflexão do Governo Collor, "[...] serão mantidas as diretrizes básicas da política externa em vigência desde Jânio Quadros". (OLIVEIRA, 2005, p. 230).

CONCLUSÃO

Ao longo do artigo pode-se perceber que a política externa brasileira foi orientada por dois paradigmas - embora de maneira não tão sistemática - o americanista e o globalista (ou universalista). O primeiro é aquele em que o eixo da política externa brasileira era os Estados Unidos, onde uma maior aproximação com esse país aumentaria os recursos de poder do Brasil. O segundo caracteriza-se pela diversificação de parcerias como condição para aumentar o poder de barganha brasileiro, inclusive junto aos americanos.

Os objetivos determinantes da política externa brasileira, desde o final do último século, são a busca pela autonomia e pelo desenvolvimento. Mesmo com a adoção do americanismo, ou seja, com certa dependência dos Estados Unidos, o que se buscava, no entanto, era a autonomia.

Quando governos decidiram por adotar o globalismo, buscou-se primeiramente, uma distância nos debates e nas negociações internacionais, isso aconteceu até a Guerra Fria. Paulatinamente, a estratégia para atingir a autonomia mudou. Em vez de distanciarem-se, os governos optaram pela participação. Como exemplo dessa nova atitude pode-se citar a liderança que o Brasil atualmente assume em relação ao G-20 na Rodada Doha da OMC (Organização Mundial do Comércio).

Concluímos que o universalismo está em vigência no Brasil desde o governo de Jânio Quadros, e que o país não deixará mais de participar dos foros internacionais e sempre buscará a realização dos dois principais objetivos que são o desenvolvimento e a autonomia da política externa brasileira.

 

REFERÊNCIAS

 

 

CERVO, Amado Luiz; BUENO, Clodoaldo. História da política exterior do Brasil. Brasília: UnB, 2002.

 

COSTA E SILVA, A. Mensagem ao congresso nacional. Brasília: Imprensa Nacional. 1968. Disponível em: <http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u1348/000126.html>. Acesso em: 14 nov. 2009.

 

CUNHA, Vasco Leitão da. Diplomacia em alto mar. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1994.

 

LAFER, Celso. A identidade internacional do Brasil e a política externa brasileira. São Paulo: Perspectiva, 2007.

 

OLIVEIRA, Henrique Altemani de. Política externa brasileira. São Paulo: Saraiva, 2005.

 

PINHEIRO, Letícia de Abreu. Política externa brasileira, 1889-2002. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004a.

 

PINHEIRO, Letícia de Abreu. A política externa independente durante o governo João Goulart. São Paulo: FGV/CPDOC. 2004b. Disponível em: <http://www.cpdoc.fgv.br/nav_jgoulart/htm/6na_presidencia_republica/A_politica_externa_independente.asp>. Acesso em: 20 nov. 2009.

 

SILVA, Arthur Costa e. Mensagem ao congresso nacional. 1968. Brasília: Imprensa Nacional. Disponível em: <http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u1348/000126.html>. Acesso em: 14 nov. 2009.

 

VIZENTINI, Paulo G. Fagundes. A política externa do regime militar brasileiro. Porto Alegre: Editora da Universidade/UFRGS, 1998.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Autor: Emanuelle Guerra


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