LIBERDADE, MORAL E PANOPTISMO NO COMBATE A VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES



RESUMO

O presente trabalho, busca demonstrar que o sujeito deve lutar para adequar sua liberdade às questões impostas pela moral social. Assim a pessoa deve querer aquilo que precisa ser querido. Por ser um trabalho que se refere a regras de conduta social, a moral aparece enquanto definição de modos de atuação em sociedade, também é colocada como uma boa forma de regramento no combate a violência contra crianças e adolescentes. Nesse sentido todo individuo deve passar por um processo de moralização e reconhecer que a sua liberdade é algo intrínseco a ele, e que deve ser usada para portar-se aos moldes sociais. Sabendo que o sujeito é livre e que há uma moral para se escolhida é apresentado um modelo denominado panoptismo para auxiliar no condicionamento da pessoa para cuidar que a moral seja cumprida, e que a pessoa transgressora possa ser punida. O panopstismo é um modelo de vigilância adotado na sociedade do século XVI e XVII e que deu muito certo, pois condiciona a pessoa a obedecer as regras sempre. O efeito panóptico entra no psicológico do sujeito e faz com que ele tenha a sensação de estar sendo vigiado sempre, dessa maneira um adulto que se sente vigiado pensaria várias vezes antes de agredir uma criança ou adolescente, pois saberia que a punição viria sem tardar. Dessa forma, a pessoa deve usar sua liberdade para querer adequar-se as regras que pedem respeito para com as crianças e adolescentes.


Palavras-Chave: Liberdade, Moral, Panopstismo, Violência, Menor.


INTRODUÇÃO


1 A LIBERDADE

Falar sobre a questão da liberdade equivale estar diante de uma problemática que envolve a história do ser humano desde as suas mais remotas raízes.

           Aqui segue a demonstração de alguns conceitos tradicionais de liberdade que serão necessários para compreender essa questão, relacionado a temática da moralidade e a defesa da criança e do adolescente; no pensamento de Michael Foucault.

Na exposição do significado da liberdade, prima-se pela liberdade no sentido do indivíduo autônomo que tem por si só uma visão ampla da realidade e que age conforme seu livre arbítrio. Nesse sentido percebe-se que a pessoa que infringe a lei tem que estar disposta a pagar um preço.

Essa colocação contribuirá para ver que no pensamento de Michael Foucault o indivíduo é posto mediante a uma realidade social e deve se adaptar a esse meio para ser aceito,, tendo que agir conforme princípios impostos pela sociedade, para um princípio de vida que não ameasse o outro.

Nesse âmbito, se faz referência à moral determinada de forma regradora que exclui o sujeito caso ele não queira aquilo que se deve querer, de modo que se o indivíduo não respeitar os fatores impostos pela sociedade ele deverá sofrer as penas impostas.

Na perspectiva de defender a criança e o adolescente a sociedade pauta-se por vários mecanismos de controle, aqui pode-se fazer menção a um grande modelo de vigilância denominado modelo panóptico para garantir o controle do sujeito.

Michael Foucault,2002, diz que por ser a moral dirigida conforme os interesses para o bom funcionamento da sociedade; ela deve se impor fazendo com que o indivíduo queira escolher respeitar os princípios morais.

Nesse âmbito, se faz referência à moral determinada de forma regradora que exclui o sujeito caso ele não queira aquilo que se deve querer. Assim no caso da violência contra a crianças e adolescentes necessariamente o sujeito deverá ser punido.

1.1 O SIGNIFICADO DE LIBERDADE VOLTADO PARA AS NORMAS SOCIAIS


Sendo uma designação bastante complexa pelas múltiplas interpretações discorridas acerca de seu conceito, e acentuando o aspecto negativo acerca da submissão.

A liberdade é uma vertente que quer dizer de uma pessoa a qual dispõe de si mesma no que se refere à autonomia, isto é, agindo regido por leis próprias as quais demonstram o sentido característico do Homem no que toca o seu livre arbítrio dada pela capacidade de escolha pela vontade humana entre o bem e o mal, entre o certo e o errado, conscientemente conhecidos pela pessoa.

Num âmbito ampliado do conceito toma-se a liberdade por possibilidade legal de agir por si mesmo, com autodeterminação, independentemente de toda e qualquer coerção exterior.

Nesse sentido o sujeito na condição social, tem responsabilidade de utilizar sua liberdade para querer defender os as regras morais.

A liberdade é pensada desde a mais remota antiguidade como um processo de autodeterminação obtida num movimento em que se apresenta uma não colocação/imposição de limites onde o indivíduo tem em suas próprias mãos o fio condutor de seus gestos e ações..

Esta independência do homem pela sua faculdade de abraçar por si só uma conduta, pode ser tomada como princípio de si mesmo. Por aí se tem que "O homem é o princípio e o pai de seus atos, assim como de seus filhos" (ABBAGNANO, 1970, p.606).

Uma escola de filosofia do período helenístico denominado estoicismo define a liberdade como ação do sujeito em conformidade com a natureza, de modo que:

Para os estoicos, o homem livre é aquele cuja razão conhece a necessidade natural e a necessidade de sua própria natureza e tem força para guiar e dirigir a vontade para que esta exerça um poder absoluto sobre a irracionalidade dos instintos e impulsos, isto é, sobre as paixões. Ser livre é agir conforme à natureza seguindo suas leis necessárias e conforme à natureza do agente seguindo uma vontade pessoal poderosa dirigida pela razão(CHAUI, 2004, p. 335)

        

Partindo desse conceito, o sujeito deve utilizar sua liberdade para adequar-se a sociedade de maneira mais natural possível.

Compreende-se então que, a liberdade é um elemento essencial na vida do ser denominada no seu sentido de autonomia em que o indivíduo está posto a uma condição em que tem que escolher.

E nessa escolha ele deve primar pela moralidade, que garante e defende a pessoa, nesse caso a criança e o adolescente.

Aparece aí essa autonomia de escolha que é justaposta tecnicamente e filosoficamente como justificativa auto-explicativa do termo.

Dessa forma essa colocação propõe o encontro de obstáculos dispostos nesse campo próprio da liberdade onde se apresentam eventos particularizados no qual o indivíduo enquanto sujeito único se depara com obstáculos específicos, isto é, ainda que seja difícil para o sujeito utilizar sua liberdade para querer defender a criança e o adolescente, ele deve mesmo assim primar por essa premissa.


2. A MORAL REGRADORA COMO FONTE PARA A DEFESA DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE.


2.1 CONCEITOS TRADICIONAIS DE MORAL E O PRINCÍPIO DE DEFESA DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE.


Segundo Boff (2004, p. 37), a moral: é a parte da vida concreta.

Trata da prática real das pessoas que se expressam por costumes, hábitos e valores culturalmente estabelecidos; diante disso, tem-se que a moral está posta ao cotidiano das pessoas no que diz respeito a sua vida prática.

Para a moral, o indivíduo é visto como sujeito moral na medida em que suas ações se dão conforme os hábitos, costumes e valores próprios de uma cultura.

Assim a moral cumpre um papel de idealizadora daquilo que deve ser.

A moral pode ser colocada muito próxima dos projetos de idealização de combate a violência contra crianças e adolescentes, pois esses princípios morais vão nortear as condutas das pessoas em relação as crianças e adolescentes.

A moral trilha os caminhos do justaposto do derivado da tradição se deslocando em muitos momentos do princípio ético que reza os imperativos categóricos de Kant "trate o ser humano sempre como fim, jamais como meio". (BOFF, 2004, p. 37).

Esse é um modelo que deve ser visto, pois todas as pessoas querem respeito, assim devem também respeitar os direitos dos outros.

Uma questão que pode ser considerada com a frase de Kant referida por BOFF, 2004, mostra que uma ação na defesa da criança e do adolescente é uma ação tão nobre que deve ser respeitada e seguida por toda a humanidade.

O que se quer demonstrar nessa formulação é que o ser humano livre deve primar por escolher uma moral que respeite os direitos dos outros, mais precisamente da crinaça e do adolescente.

Neste contexto, deve ficar claro que o cerne da questão não é o de afirmar que a moral em si tira a liberdade das pessoas, mas a de que o sujeito deve agir livremente escolhendo os princípios morais conforme sua liberdade a qual resguarda à pessoa o princípio da sua verdade mais profunda.

 

Para dar um exemplo particularmente eloquente, se um tirano, ameaçado-te, te impusesse testemunhar em falso contra um inocente, pode muito bem ocorrer que por medo, cedas e jures em falso; mas depois, terias remorso. Isso significa que compreendes muito bem que devias dizer a verdade mesmo que não o tenhas feito. E se "devias" dizer a verdade, então também o "podias" (embora tenhas feito o contrário). O remorso significa precisamente que devias e, portanto, podias, (REALE, 1990, p. 909).

 

Assim, para REALE, 1990, é necessário agir sempre pela moral mesmo em situações mais difíceis.

Inspirado nesse autor é possível afirmar que se deve pautar pela defesa da criança e do adolescente em qualquer circunstância, mesmo nas situações mais difíceis.

  1. A NORMATIZAÇÃO SOCIAL


A sociedade sempre teve discursos voltados para a sexualidade do sujeito, mas a sexualidade vista de um ponto sempre muito negativo.

Sendo a sexualidade um canal de poder e agressividade, o ser humano adulto ficou muito vulnerável a situações onde queira dominar a outra pessoa, principalmente quando essa pessoa é mais frágil, que é o caso das crianças e adolescentes.

No âmbito dessa colocação acerca da moral é certo que ao longo do século XVII aparece de modo explícito no tocante a sexualidade dos indivíduos uma discussão bastante diferenciada.

Isto se deve ao aparecimento de uma hipótese repressiva que veio incitar a sociedade ao discurso da sexualidade não como forma de liberdade nas expressões sexuais, mas como mecanismo de controle, a incitação ao discurso a serviço do poder, e o poder usado como dominação.

Ao olhar para a história da sexualidade percebe-se toda uma repressão e falta de trabalhar a sexualidade do sujeito com naturalidade, dessa maneira, pessoas crescem com distúrbios não trabalhados, representando ameaça à própria sociedade.

Assim sendo o discurso se fez instrumento de normatização do indivíduo forçado a introjetar leis para poder se adequar na dinâmica do processo "normal" da sociedade.


 O fato é que nesse período a sexualidade está inerente a uma realidade de culpa e vergonha onde expressar-se livremente sobre ela é o mesmo que violar as regras da boa conduta "fala-se em tom de voz que demonstra saber que é subversiva" (FOUCAULT, 2003, p. 13)

 

Através dessa citação de Michel Foucault, percebe-se que se a sexualidade do sujeito fosse trabalhada de uma forma mais tranquila seria mais fácil para um indivíduo adulto considerar a fragilidade de uma criança e repeitá-la.

Percebe-se que a sociedade encontra-se nesse momento da história um desejo de liberdade que se manifesta pela interdição, censura e negação daquilo que o ser humano tem como órgão elementar na sua vida dizendo sem dizer da sua sexualidade, apresentando-se como paradoxo do drama vivenciado ao longo de sua estruturação social.


  1. A HISTÓRIA DA SEXUALIDADE COMO CONTRIBUTIVO PARA OS DESVIOS DE CONDUTA


Ao longo da história da sexualidade, nota-se que a sexualidade dos indivíduos foi se formatando em baixo de uma censura muito forte que se dava de maneira subtendida.

De fato se houvesse uma forma mais dinâmica e normalizada de ver a sexualidade da pessoa, não haveria tanta necessidade de agredir uma criança ou adolescente numa região tão frágil como a sexualidade.

Isto se aplica não só no que tange a sexualidade da criança ou adolescente, mas a eles como indivíduos frágeis num todo.

A sexualidade foi ganhando essa conotação repressiva por ter mecanismos de poder sobre ela que tinha uma finalidade prática para o gasto de suas energias, de modo que a sexualidade foi se formando nos moldes do poder que de maneira impositiva e dominadora.

Dessa forma, sob o punho da censura ficava implícita um plano subliminar pela ordem da linguagem, expressão característica que denominava a sexualidade do indivíduo.

Assim, a instigação a fala sobre a própria sexualidade aparecia como confirmação da dominação que se poderia obter do sexo pelo discurso, ainda que sobrepujado a limitação aquele do qual se deve falar com muita cautela.

"Há censura no discurso sobre o sexo como se para dominá-lo no plano dela, tivesse sido necessário, primeiro reduzi-lo ao nível da linguagem" (FOUCAULT, 2003, p. 21). Contudo estas restrições fortaleceram ainda mais a indecências no que tange as conversações sobre estas questões de forma que "o cerceamento das regras de decência provocou provavelmente, como contra-efeito, uma valorização e uma intensificação do discurso indecente" (FOUCAULT, 2003, p. 22).

Partindo da história da sexualidade, sabe-se que a sociedade moderna foi criadora das mais heterogêneas identidades sexuais, associando até mesmo qualquer transgressão as normas sexuais estabelecidas, à mera doença mental. Surge neste contexto "a idade da multiplicação, uma dispersão de sexualidades, um reforço de suas formas absurdas, uma implantação múltiplas das perversões". (FOUCAULT, 2003, p. 38).

Como configuração da situação vivenciada naquele período, vê-se que o sujeito estava limitado à um aprisionamento moral, até o final do século XVIII três grandes codificadores explícitos além das regularidades devida aos costumes e das pressões de opinião regiam as práticas sexuais: "o direito canônico, a pastoral cristâ, e a lei civil" (FOUCAULT, 2003, p. 38).

Em seguida pode-se perceber elementos que deixam claros fatores um todo regrador:

"Romper as leis do casamento ou procurar prazeres estranhos mereciam de qualquer modo, condenação" (FOUCAULT, 2003, p. 38).

Tem-se desta maneira a exposição de comportamentos considerados anormais à sociedade vigente, onde a sexualidade daquele que não está em conformidade com a regra é vista como aberração; deixando a marca da constante vigília sobre aqueles que podem infracionar a lei que rege a moral, "o que se interroga é sexualidade das crianças, a dos loucos e dos criminosos, é o prazer dos que não amam o outro sexo; os devaneios, as obsessões, as pequenas manias ou as grandes raivas" (FOUCAULT, 2003, p. 39).

Pautando-se nesse aspecto normatizador da moral sexual do indivíduo, pode-se ver que o casal legítimo é o que obtém um pouco mais de vulnerabilidade na sua relação sexual, ainda que executadas conforme regimento; estimula-se o casamento na perspectiva de um grande silenciamento. "O casal legítimo, com sua sexualidade regular, tem direito à maior discrição, tende a funcionar como uma norma mais rigorosa, talvez, porém mais silenciosa" (FOUCAULT, 2003, p. 38).

Sendo uma designação bastante considerável na sociedade, a família é vista como recurso a diminuir a extensão da prevenção sexual de modo que "a família é o cristal no dispositivo da sexualidade" (FOUCAULT, 2003, p. 126).

Situada essa realidade do combate ao que se chamava de desvio da normalidade de instinto sexual, revela-se que a intenção social é a de padronizar a sexualidade dos indivíduos primando pelos casais heterossexuais.

Buscando impor uma medida para as relações do casal até mesmo a medicina desenvolveu mecanismos, influenciando na maneira de expressar-se sexualmente do casal. "Com esta intenção "inventou toda uma patologia orgânica, funcional ou mental originada nas práticas sexuais "incompletas", classificou com desvelo todas as formas de prazeres anexos; integrou-os ao "desenvolvimento" e às perturbações" do instinto" (FOUCAULT, 2003, p. 41).

Vale considerar que é próprio da história dizer de nações que adotavam uma grande povoação como forma de garantir virtude e fortuna, porém a prosperidade dos países nos termos que estão sendo abordados, também dependem de como cada qual usa seu sexo, neste contexto em que se insere um problema político e econômico da população se tem mais um motivo para obter como ponto chave, o sexo dos indivíduos.

 

É necessário analisar a taxa de natalidade, a idade do casamento, os nascimentos legítimos e ilegítimos, a precocidade e a freqüência das relações sexuais, a maneira de torná-las fecunda ou estéreis, o efeito do celibato ou das interdições, a incidência das práticas contraceptivas. (FOUCAULT, 2003, p. 28).

 

Volta-se aqui ainda a questão do período histórico vale relembrar que trata-se de um contexto em que impera a revolução industrial, onde se faz necessário concentrar toda energia para o trabalho por isso cria-se uma teia de observação sobre o sexo, pautando-se numa constante análise das condutas sexuais; "Aparecem também às campanhas sistemáticas que, à margem dos meios tradicionais-exportações morais e religiosas, medidas fiscais tentam fazer do comportamento sexual dos casais uma conduta econômica e política deliberada" (FOUCAULT, 2003, p. 28).

Partindo de todo o conjunto de interesses sociais apresenta-se uma vigência diferenciada para "proteger" o sexo do casal sendo designada uma divisão extrema entre o quarto do casal com o lugar em que dormiam os filhos.

Neste mesmo contexto quando se passou a arquitetar casas, próprias para moradias populares, o cuidado que se tinha era o de manter uma plausível separação entre as crianças, dividindo em masculino e feminino, aduze-se normas quanto à genital idade infantil.

Volta-se o olhar pra a excitação genital da criança bem como para sua fase de evolução corporal pelo desenvolvimento que se dava em suas características sexuais e capacidade de reprodução obtida nesse período.

 

A separação entre adultos e crianças, a polaridade estabelecida entre o quarto dos pais e o das crianças (que passou a ser canônica no decorrer do século, quando começaram a ser construídas habitações populares a segregação relativa entre meninos e meninas, as regras escritas sobre cuidados com bebês, a atenção concentrada na sexualidade infantil, os supostos perigos da masturbação, a importância atribuída à puberdade. (FOUCAULT, 2003, p. 46). Assim, coloca-se aos pais um procedimento organizado na vigilância dos filhos, impele-se que as questões sexuais sejam a todo tempo ocultadas escondidas mantidas num ritmo de grotescos segredos, por estas e muitas outras interdições, pode-se dizer que se configurou a fisionomia rígida das perversões (FOUCAULT, 2003, p. 48).

 

Nessa perspectiva, após o Concílio de Trento se vê mesmo na igreja, o indivíduo conduzido a confessar-se de tudo aquilo que se remetia aos recônditos mais obscuros do seu ser, levado a fazer "todo um exame minucioso do ato sexual em sua própria execução" (FOUCAULT, 2003, p. 22).

"Examinai, portanto, diligentemente, todas as faculdades de vossa alma, a memória, o entendimento, à vontade. Examinai também com exatidão todos os vossos sentidos" (FOUCAULT, 2003, p. 23).

Nesse percurso, se põe a necessidade de transformar todos os desejos em discurso, ainda que se presenciasse um momento de interdição de certas palavras e decência das expressões como forma de fazer com que estas fossem confirmadas moralmente e tomadas como aceitas pela moral vigente; aí aparece a necessidade quase inerente no aspecto social de, falar transformando os desejos em discurso;


Não falo da obrigação de confessar as infrações às leis do sexo, como exigia a permitância tradicional; porém da tarefa, quase infinita de dizer, de se dizer a si mesmo e de dizer a outrem, o mais frequentemente possível (FOUCAULT, 2003 p. 24).


É fato que o aspecto histórico de toda realidade vigente em torno da questão da sexualidade vista como algo em comum, colocou o sexo numa situação em que se apresenta de forma limitada para construir-se livremente no seu âmbito moral.

"O que é próprio das sociedades modernas, não é o terem condenado o sexo a permanecer na obscuridade, mas (...) a falar dele sempre, valorizando-o como segredo" (FOUCAULT, 2003 p. 37).

   Mesmo que se tenha tido a pretensão de manter o discurso da sexualidade prática numa perspectiva enigmática, é fato que este mesmo discurso tem cada vez mais se intensificado, ainda que de forma patológica desviando a intenção primeira que se constituía na vontade de extirpá-lo insidiosamente. Todavia pode-se inferir que todos os interpostos à sexualidade humana, vieram de modo contra positivo confirmar a introdução de uma sexualidade depravada aos olhos da sociedade moderna, demonstrando por esta conduta o paradoxo da imposição moral.

 

Imagino que seja aceita a afirmação de que o discurso sobre o sexo, já há três séculos, tem-se multiplicado em vez de rarefeito, e que se trouxe consigo interditos e proibições ele garantiu mais fundamentalmente a solidificação e a implantação de todo um despropósito sexual (FOUCAULT, 2003, p. 56).

Dessa forma, todo o discurso ao longo da história da sexualidade esteve vinculado a uma repressão da sexualidade que era obtida como um lado obscuro do indivíduo.

Essa caracterização da sexualidade auxiliou para a criação de pessoas doentes sexualmente que acabam por abusar de crianças e adolescente.

Isso acontece porque a sexualidade por sei só é vista por FOUCAULT, 2002 como um mecanismo de dominação, e uma vez que ela não é trabalhada de forma integralizada, o poder sobre indivíduos mais frágeis, aparece como válvula de escape.

Partindo daí se nota que a história da sexualidade é um elemento muito forte na construção do perfil pessoal e emotivo do agressor.

 

3 O PANOPTISMO COMO MACANISMO DE VIGILÂNCIA PISCOLÓGICA NO COMBATE A VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES.

 

Este tópico tem a finalidade de explicitar como o panoptismo pode ser utilizado como mecanismo de vigilância psicológica no combate a violência contra crianças e adolescentes.

Para entender a forma de ação do panopstismo, o tópico procura demonstrar o que é o conceito de panoptismo, apontar as formas em que o sistema panóptico se adentrou e foi aplicado na sociedade ao longo do tempo.

Assim, o panoptismo é colocado como aquele que incorporado para atender os mais diversos tipos foi de interesses de moralização individual e social daspessoas, dessa maneira se tornou uma excelente forma de combate a violência contra crianças e adolescentes.

3.1 A ORIGEM DO MODELO PANÓPTICO

A palavra panoptismo é um conceito fundamental para a compreensão da formação e funcionamento das sociedades disciplinares ocidentais a partir dos Séculos XVII-XVII aparecendo em meados dos anos 70 nas análises empreendidas por Michael Foucault na obra, Vigiar e Punir.

Na obra vigiar e punir o autor faz uma abordagem bastante ampla de uma estrutura arquitetural de controle sobre o indivíduo a qual foi projetada por Bentham.

Neste escrito, o controle é o fio condutor das ações sendo este controle o objetivo certeiro em que se quer ainda que recorrendo a coerção psicológica, forçar o sujeito a manter-se o tempo todo ligado a suas obrigações.

O Panóptico de Bentham é a figura arquitetural dessa composição. O princípio é conhecido: Na periferia uma construção em anel; no centro uma torre, esta é vazada de largas janelas que se abrem sobre a face interna do anel; a construção periférica é dividida em celas, cada uma atravessando toda a espessura da construção; elas têm duas janelas, uma para o interior, correspondendo às janelas da torre; outra, que dá para o exterior, permite que a luz atravesse a cela de outro lado, basta então colocar um vigia na torre central, e em cada cela trancar um louco, doente, condenado, um operário ou um escolar.  Pelo efeito da contraluz, pode-se perceber da torre, recortando-se exatamente sobre a claridade, as pequenas silhuetas cativas nas celas da periferia. Tantas jaulas, tantos pequenos teatros, em que cada ator está sozinho, perfeitamente individualizado e constantemente visível. (FOUCAULT, 1975, p.163).

Através desta citação é pode-se confirmar que o sistema panóptico visa controlar o sujeito, dessa maneira é visto como um elemento muito competente no combate a violência.

Uma vez que a sociedade esteja dominada por um sistema de vigilância, é possível perceber que o índice de violência pode diminuir.

Essa arquitetura tem a finalidade de manter o sujeito ligado às suas competências e tendo em mente essa composição, fica demonstrado que ela está para abolir tudo o que possa distrair ou mesmo descentralizar as pessoas as quais tem uma função a executar. Dessa forma a liberdade fica fraca e é obrigada a se colocar nas mãos de quem detém o poder e dita as regras, a liberdade fica a mercê de um dispositivo onde o jogo de interesses define o que é preciso que se queira.

Esta composição arquitetural tem o formato circular de modo que a pessoa é vista, mas não consegue ter acesso a uma visibilidade lateral, assim, se evita toda e qualquer forma de conspiração, uma vez que esse modelo é tomado como garantia daordem.

Analisando essa composição se vê que se os indivíduos adultos fossem mais vigiados haveria menos violência contra crianças e adolescentes.

3.2 AS INSTITUIÇÕES DISCIPLINARES NA PERSPECTIVA DO PANOPSTISMO

As instituições disciplinares aparecem num período da história em que a preocupação com a produção em grande escala era bastante acentuada.

De modo que a forma de disciplinar do panoptismo está ligada com o aumento da produção, assim quando se aplica a vigilância ao individuo força-o a não se empenhar em nada que possa ser subterfúgio para o trabalho.

Como forma de demonstrar o regramento que havia nesse período para que as pessoas fossem educadas para o trabalho será explicitado o regulamento de uma fábrica que realmente existiu na França em 1840/45.

Era uma instituição onde havia 400 pessoas que não eram casadas e que deviam levantar-se todas as manhãs às cinco e cinquenta deveriam ter terminado a toilette, a cama  e ter tomado o café; às seis horas começava o trabalho obrigatório, que terminava às oito e quinze da noite com uma hora de intervalo para o almoço, às oito e quinze, jantar, oração coletiva, o recolhimento aos domingos era às nove horas em ponto. O domingo era um dia especial; o artigo cinco do regulamento desta constituição dizia: " Queremos guardar o espírito que o domingo deve ter, isto é, dedicá-lo ao cumprimento do dever religioso e ao repouso. Entretanto, como o tédio não demoraria a tornar o domingo mais cansativo do que os outros dias da semana, deverão ser feitos exercícios diferentes de modo a passar este dia cristã e alegremente"; de manhã, exercícios religiosos, em seguida exercícios de leitura e de escrita e finalmente recreação às últimas horas da manhã; À tarde, catecismo, as vésperas, e passeio depois das quatro. Caso fizesse frio, leitura em comum, os exercícios religiosos e a missa não eram assistidos na Igreja próxima porque isto permitiria aos pensionistas deste estabelecimento terem contato com o mundo exterior; assim para que nem mesmo "a igreja fosse o lugar ou o pretexto de um contato com o mundo exterior do estabelecimento". Os fiéis de fora não eram sequer admitidos. Os pensionistas só podiam sair do estabelecimento durante os passeios de domingo, mas sempre sob a vigilância do pessoal religioso. Este pessoal vigiava os passeios, os dormitórios e assegurava a vigilância e a exploração das oficinas. O pessoal religioso garantia portanto, não só o controle econômico. Estes pensionistas não recebiam salário, mas um prêmio- uma soma global estipulada entre 40 e 80 francos por ano- que somente lhes era dado no momento em que saíam. No caso de uma pessoa de outro sexo precisar entrar no estabelecimento por razões materiais, econômicas, etc., deveria ser escolhida com o maior cuidado e permanecer por muito pouco tempo. O silêncio lhes era imposto sob pena de expulsão, de um modo geral, os dois princípios de organização, segundo o regulamento, eram: os pensionistas nunca deveriam estar sozinhos no dormitório, no refeitório, na oficina, ou no pátio, e deveria ser evitada qualquer mistura com o mundo exterior, devendo reinar no estabelecimento um único espírito" (FOUCAULT, 2005, p. 109).

              

A explanação acima demonstra como havia um controle estabelecido sobre as pessoas. Da mesma maneira, se houvesse um controle maior sobre as atitudes dos adultos, haveria menos violência contra menores no Brasil e no mundo.

Assim da maneira apresentada, as pessoas eram vigiadas e essa vigilância constante provocava no indivíduo uma introjeção consciente ou de estar sendo visto a todo o momento por estar psicologicamente vulnerável a inspeção que sobrevém a todo o momento e de modo contínuo, "Daí o efeito mais importante do panóptico: induzir (...) um estado consciente e permanente de visibilidade que assegura o funcionamento do poder". (FOUCAULT, 1975 p. 166).


3.3 O CONDICIONAMENTO PSICOLÓGICO DO PANOPSTISMO


O objetivo é que a pessoa esteja condicionada pelo efeito panóptico para que ela se dobre e de garantia de sua submissão mesmo que a ação de vigilância deixe de se dar a modo constante; a certeza que tem de ficar é que a essa situação induzida pelo panóptico, por si só vai domesticar e regrar a pessoa. Por isso o motor propulsor do panóptico é "fazer com que a vigilância seja permanente em seus efeitos mesmo se é descontínua em sua ação" (FOUCAULT, 1975, p. 166) partindo desse pressuposto, percebe-se que um detento poderia ser vigiado por determinado tempo mesmo que pequeno e já estaria disciplinado, disciplina esta proveniente do olho que vigia.

Partindo desse mecanismo de controle, já não mais é preciso escorar-se em grande controle, já não mais é preciso escorar-se em grandes fortalezas como aspecto mantenedor de posicionamento, mas parte-se do pressuposto interior da certeza, da consciência formada que vigia dando a cada qual particularmente o limite que lhe cabe, diante disso cabe ao indivíduo exercer o papel que lhe é dado de modo submisso e leal.

É importante ter em mente que o modo panóptico é incorporado ao processo de domesticação de pessoas nas mais diversas formas buscando estabelecer um controle para a moralização social e individual dos sujeitos. Fica claro o desejo por tornar a pessoa relativa a um grupo que se controla oferecendo a possibilidade de escolha desse individuo por si mesmo. É preciso saber-se formado pela moral de um grupo a fim de ser protegido e amado por esse conjunto de pessoas. Dessa forma, Foucault mostra que é como indivíduo que a pessoa é domesticada.


É enquanto indivíduo que se entra na escola é enquanto indivíduo que se entra no hospital, a escola, ou que se entra na prisão (...). É a estrutura de vigilância que (...) vai constituí-los secundariamente enquanto grupo. ((FOUCAULT, 2005, p. 113).


Considerando o pretendido pela sociedade que era moralizar a pessoa Bentham cria o modelo panóptico que foi empregado em seu primeiro momento nas prisões de seu tempo e foi estendida ao longo do tempo para a disciplina moral da pessoa até mesmo no que tange a ação sexual do sujeito.

É interessante ver que para a formação da arquitetura panóptica Bentham tomou por base o modelo de um zoológico existido em sua época em Paris. Nota-se uma semelhança bastante acentuada nessas duas estruturas visto que o zoológico de Paris estava disposto de tal maneira que os visitantes passavam admirando os animais os quais não percebiam que estavam sendo observados, não perdendo dessa maneira a quietude e tranquilidade. Pode-se perceber que a estrutura física do panóptico tem essa mesma disposição.

 

(...) encontramos no (...) panóptico a preocupação análoga da observação individualizante da caracterização e da classificação, da organização analítica da espécie. O panóptico é um zoológico real, o animal é substituído pelo homem, a distribuição individual pelo agrupamento específico e o rei pela maquinaria de um poder furtivo. (FOUCAULT, 1975, p. 168).


É comum que conforme apresentado, o sujeito que não correspondesse ao estabelecido pela moral social fosse integrado a instituição de normatização como, escolas e hospitais psiquiátricos com a finalidade de ser corrigido para a "boa conduta moral" assim essas instituições se apresentavam com o intuito de ajudar o indivíduo a estabelecer-se socialmente ainda que para isso não olhasse a liberdade do sujeito que se tornava relativa a esses mecanismos coercitivos.


Todas essas instituições-fábrica. Escola, hospital psiquiátrico, hospital, prisão – tem por finalidade não excluir os indivíduos; liga-os a um aparelho de produção. A escola não exclui os indivíduos; mesmo fechando-os; ela os fixa a um aparelho de transmissão do saber. O hospital psiquiátrico não exclui os indivíduos; liga-os a um aparelho de correção, a um aparelho de normatização dos indivíduos. O mesmo acontece com a casa de correção ou com a prisão. Mesmo se os efeitos dessas instituições são a exclusão do indivíduo ela tem por finalidade primeira fixar os indivíduos em um aparelho de normatização dos homens. ((FOUCAULT, 2005, p. 114).


Tendo em mente esse sistema apela-se para uma moral que afeta o psicológico da pessoa baseada no panoptismo como imposição que leva o sujeito a sentir-se amedrontado e culpado mediante atos passíveis de punição. Por ai pode-se ter que:


Se trata, no fundo, não somente de apropriação de extração da quantidade máxima de tempo, mas, também de controlar, de formar, de valorizar, segundo um determinado sistema, o corpo do indivíduo se fizéssemos uma história do controle social do corpo, poderíamos mostrar que, até o século XVIII inclusive, o corpo dos indivíduos é essencialmente a superfície de inscrição supliciado e castigado. (FOUCAULT, 2005, p. 119).


O que foi citado acima quer mostrar a forma como a moral volta-se para os interesses próprios de sua época e naquele período ela tratava não só de ter determinado o que fazer, mas havia conforme já salientado todo um cuidado para que ninguém fugisse a regra como nas instituições.

Da mesma forma que a moral dos tempos anteriores, era controlada por todo um sistema, é notável que o estabelecimento de elementos regradores mais intensos poderiam contribuir no combate a violência contra crianças e adolescentes.

Para ver melhor tudo isso basta se colocar a par de como era o procedimento de vigilância e correção adotado pelos educandários, escolas, hospitais psiquiátricos etc...

 

Podemos caracterizar a função destas instituições da seguinte maneira. Primeiramente, estas instituições-pedagógicas, médicas, penais ou industriais – tem a propriedade muito curiosa de implicar o controle, a responsabilidade sobre a totalidade ou a quase totalidade do tempo dos indivíduos; são, portanto. Instituições que de certa forma se encarregam de toda a dimensão temporal da vida dos indivíduos. (FOUCAULT, 2005, p. 116).

 

O dispositivo panóptico empregado pelas instituições de vigilância tem por si só a função e tendência de voltar-se à uma amplitude de forma a estar direcionado sempre a uma expansão no âmbito social, de modo que "o esquema panóptico, sem se desfazer nem perder nenhuma de suas propriedades, é destinado a se difundir no corpo social; tem por vocação, tornar-se aí uma função generalizada" (FOUCAULT, 1975, p.171).

Trata-se do caráter amplo dado ao sistema panóptico, o qual é estendido a toda a sociedade como forma de regramento e adequação moral.

É fato que o panoptismo é desenvolvido em uma época da história em que o homem deveria voltar-se para o trabalho e que todo esse de controle se deve a isso e é utilizado com essa finalidade; é um período em que toda a moral é aprimorada e regida com uma finalidade.

Na sociedade feudal, os interesses eram outros, a moral era outra, o poder que vigiava para que a moral fosse cumprida era outra, contudo sendo o trabalho a exigência da idade moderna, os mecanismos de poder se voltaram para o tempo do indivíduo para que fosse exclusivo para a produção.

 

Na sociedade feudal e em muitas sociedades que os etmólogos chamam de primitivas, o controle dos indivíduos se faz essencialmente a partir da inserção local, da falta de pertencerem a um determinado lugar. O poder feudal se exerce sobre os homens na medida em que pertencem a uma certa terra. A inscrição geográfica local é um meio de exercício do poder. Este se inscreve sobre os homens por intermédio da sua localização. Ao contrário, a sociedade moderna, que se forma no começo do século XIX é, no fundo, indiferente ou relativamente indiferente à pertinência espacial dos indivíduos; ela não se interessa pelo controle espacial dos indivíduos na forma de sua pertinência a uma terra, a um lugar, mas simplesmente na medida em, que tem necessidade de que os homens coloquem à sua disposição seu tempo. É preciso que o tempo e dos homens seja oferecido ao aparelho de produção que o aparelho de produção possa utilizar o tempo de vida o tempo de existência dos homens. É para isso e desta forma que o controle se exerce. São necessárias duas coisas para que se forme a sociedade industrial. Por um lado, é preciso que o tempo. Dos homens seja colocado no mercado, oferecido aos que o querem comprar, e comprá-lo em troca de um salário. E por isso que em uma série de instituições encontramos o problema e as técnicas da extração máxima do tempo". (FOUCAULT, 2005, p. 116).

 

Considerando a preocupação social do panóptico tem-se este como elenco de estruturação do poder, não com base no poder em si, mas com a preocupação forte e acentuada no tocante aos aspectos construtivos para o alicerçamento que dá vigor a uma sociedade, dado pelo resultado peculiar da produção elevada a um grau majoritário pelo seu próprio êxito, assim como estimular um superávit na economia, apresentar um aumento progressivo no móvel de instrução além do mais dar sustentação consistente a moral pública. Dessa forma:

 

O panóptico (...) tem um papel de amplificação; se organiza o poder, não é pelo próprio poder, nem pela salvação imediata de uma sociedade ameaçada; o que importa é tornar mais fortes as forças sociais aumentar a produção, desenvolver a economia, espalhar a instrução, elevar o nível da moral pública; fazer crescer e multiplicar (FOUCAULT, 1975, p. 172).

 

Para confirmação do parecer das instituições de vigilância o modelo panóptico é trabalhado a todo o momento reinando a moral regradora sobre toda a sociedade considerando a ela todo o poder e ao indivíduo apenas rastros de sua liberdade ofuscada por um modelo social "ideal" nos moldes de seu tempo.

 A estrutura panóptica permitia além da vigilância, a punição para aqueles que agissem de maneira contrária aos propósitos do que era determinado. Assim os que processem dessa forma eram punidos.


Tratava-se sempre de um indivíduo marginalizado em relação à família, ao grupo social, à comunidade local a que pertencia; alguém que não estava dentro da regra e que tornara marginal por sua conduta sua desordem, a irregularidade da vida. (FOUCAULT, 2005, p. 113).


Esse dispositivo de controle-vigilância deixava explícito para o indivíduo que se ele não se enquadrasse nos moldes do que era posto como verdade, ele seria separado do grupo social para que uma vez sentindo a dor da rejeição abrisse mão de sua liberdade para pensar o que deve ser pensado. "Já que você se separou de seu grupo, vamos separá-lo definitiva e provisoriamente da sociedade" (FOUCAULT, 2005, p.114).

Segundo os pensamentos Bentanianos a instituição panóptica apresenta-se como um modelo idealista de uma realidade percebida e pretendida enquanto perfeição, pensando numa estrutura perfeita de vigilância.

O grau pretendido de elevação perfeccionista do panóptico sustenta-se pela extensão desse projeto pelos tempos atuais desde o seu surgimento sustentáculo persistente pela sua base imaginária.

É preciso perceber que o panoptismo não se limitou à educação e controle nas prisões não ficando somente numa utopia do encarceramento perfeito mas que no que se refere a sua noção generalizada pode-se aplicar o panóptico " para emendar os prisioneiros, mas também para cuidar dos doentes, instruir os escolares, guardar os loucos, fiscalizar os operários, fazer trabalhar mendigos e ociosos" (FOUCAULT, 1975, p. 170).

A disciplina garantida pelo panoptismo é modo de distribuir os indivíduos em seus espaços de modo a não demonstrarem o que o seu eu individual tem intrinsecamente, pois se esses sujeitos expressarem e agirem por si só estarão desorganizando a sociedade que tem medo do incalculável por isso a disciplina imposta é uma maneira de garantir as intervenções dadas pela relação de poder.

Isto "é um tipo de implantação dos corpos no espaço, de distribuição dos indivíduos em relação mútua de organização hierárquica de disposição dos centros e dos canais de poder" (FOUCAULT, 1975 p. 170) utilizados como mecanismos de controle nas mais diversas instituições nas quais se apresentam a necessidade de vigiar o comportamento dos indivíduos.

Pelo panóptico aplicado pode-se perceber que ele age como um dispositivo onde o poder se torna aperfeiçoado justamente pela utilização da estrutura panóptica. De modo que essa estrutura, pelas várias formas de práticas permitidas por ela torne uma grande extensão de pessoas submetidas a esse modelo.

É fato que tudo isso tem uma alta propensão ao funcionamento considerando a tensão gerada no indivíduo pela certeza da observação que deixa intervir a qualquer tempo de modo que essa "pressão constante age antes mesmo que a faltas, os erros, os crimes sejam cometidos". (FOUCAULT, 1975, p. 170).

A pretensão é justamente a de criar uma neurose no indivíduo de maneira que ele perca a crença na sua liberdade de tal forma que se volte exclusivamente para o objetivo da moral pré-estabelecida e incutida em sua mente.

  A estrutura panóptica é de intensa repercussão e tem fundamento suficiente podendo ser incluída num processo que pode dar força e apoio a uma série de fatores essenciais, a um elenco social como:

Reformar a moral, preservar a saúde, revigorar a indústria, difundir a instrução, aliviar os encargos públicos, estabelecer a economia como que sobre um rochedo (...) tudo isso com uma simples idéia arquitetural (FOUCAULT, 1975 p.171).

É considerável que na modernidade com o advento da Revolução industrial a sociedade tenha que adequar-se as exigências do trabalho que vem a todo vapor, perante isso, o indivíduo estava sendo educado para manter-se centrado na linha de produção; a partir disso, apropriou-se do modelo panóptico na inspeção dos cidadãos afim de que fossem educados para o trabalho. Assim, a preocupação persistente foi a de controlar o tempo do sujeito, bem como o seu corpo, partindo de uma moralização ferrenha como forma de impor ao sujeito uma adequação sexual às exigências de sua época.

A questão é simples, para pertencer e sobreviver socialmente o sujeito deverá submeter-se, uma vez que assim ele recebe seu prêmio que é a própria sobrevivência, mas se ele agir conforme suas próprias convicções e se elas forem contrárias as propostas pelo todo, este sujeito será punido com peso da exclusão. Neste percurso fica o questionamento levantado por Foucault "Por que, para ensinar alguma coisa a alguém, se deve punir e recompensar?" (FOUCAULT, 2005, p. 121).

Estabelecido o modelo panóptico como mediador, sabe-se que ele dá sustentabilidade ao processo civilizatório de uma sociedade contribuindo para a constante afirmação do poder que tem necessidade de se impor a todo o momento.

Dentro desse processo em que aparece toda uma fiscalização, que objetivando o crescimento social deve-se pergunta até que ponto essa forma de civilização não barrará paradoxalmente a ascensão social a partir do momento que esteja a liberdade dos indivíduos para produzir uma mecanização formatação social.

Por isso percebe-se que é de suma importância buscar estratégias onde o poder possa permitir a sociedade obter êxito na medida em que ele se qualifica, ao passo que corre o risco de reprimi-la, no seu ganho de forças. Daí a necessidade de chegar a "como o poder, aumentando suas forças, poderá fazer crescer as da sociedade em vez de confiscá-las ou freá-las?" (FOUCAULT, 1975, p.172).

Perante isso, se poderia da mesma forma primar pela necessidade de cada época utilizando-se de práticas democráticas, mesmos violentas para a constituição da ascensão social.

A solução do panóptico para esse problema é que a majoração produtiva do poder só pode ser assegurada se por um lado ele tem possibilidade de se exercer de maneira contínua nos alicerces da sociedade, até seu mais fino grão, e se por outro lado, ele funciona fora daquelas formas, súbitas, violentas, descontínuas que estão ligadas ao exercício da soberania. (FOUCAULT, 1975 p. 172).

Contudo os indivíduos que compõe a sociedade adentraram-se e acataram esse sistema ainda que sobrepujando sua liberdade.

No grande panóptico social cuja função é precisamente a transformação da vida dos homens (...) a prisão exerce uma função muito mais simbólica e exemplar do que realmente econômica penal ou corretiva. A prisão dos discursos: Ela diz:" Eis o que é a sociedade; vocês não podem me criticar na medida em que eu faço unicamente aquilo que lhes fazem diariamente na fábrica, na escola, etc. Eu sou, pois inocente; eu sou apenas a expressão de um consumo social". (FOUCAULT, 2005, p. 173).

A partir do emprego do modelo panoptismo impunhou-se a sociedade sob o crivo da "escravidão" uma vez que ele foi ganhando seu espaço com o estabelecimento de uma relação disciplinar que visou regrar o indivíduo afim de que ele cumprisse sua função num contexto em que a disciplina era o aspecto primordial.

A partir de então o modelo panóptico passou a ser utilizado até os dias atuais para o emprego da disciplinarização social confirmando o propósito de Bentham com a criação do panoptismo que era ver esse modelo expandindo para toda a sociedade como componente constante de cada ambiente.

"Bentham sonha fazer (...) uma rede de dispositivos que estariam em toda parte e sempre alerta, percorrendo a sociedade sem lacuna nem interrupção" (FOUCAULT, 1975, p. 173).

Considerações Finais

 REFERÊNCIAS

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia.Trad. Alfredo Bosi, et al. São Paulo: Editora Mestre Jou, 1970.

CORREA, Avelino Antônio. O desafio da liberdade. In: FERRAZ, José Antônio. Para

 Filosofar. São Paulo: Editora Scipione, 1996;

FOUCAULT, Michael. A Verdade as Formas Jurídicas. 7ª Edição. Rio de Janeiro: Editora Nau, 2005.

FOUCAULT, Michael. Vigiar e Punir.. São Paulo: Vozes, 1975.

FOUCAULT, Michael. História Da Sexualidade 1. São Paulo: Graal editora, 2003.

REALE, Giovanni. História da Filosofia: Do Humanismo a Kant. Vol. 3. São Paulo: Paulus, 1990. (Coleção história da filosofia)

SILVA, Cléa. Liberdade e Consciência no Existencialismo de Jean-Paul Sartre. 1ª Edição. Londrina: Eduel,1997.

http://www2.camara.gov.br/agencia/noticias/105795.html disponível em 15/11/2009

http://www.fabriciogandini.com/main.asp?link=indep&id=94&menu=49 disponível em 15/11/2009

OBRAS CONSULTADAS

FOUCAULT, Michael. A Ordem do Discurso. 9ª Edição. São Paulo: Loyola, 2005.


Autor: José Roque Pereria de Melo


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