O VÔO DOS MORCEGOS



1

Jonas vai ao encontro da jovem morena, esguia, tipo manequim.

- Bonita "gata!".

Diz sorrindo. O que é a vida da gente: Quem lhe diria que de repente, conheceria a moça e logo, combinariam o encontro que, como é natural, terminará num leito de motel? E tudo isso, graças ao avanço do mundo moderno, onde não há mais tabus para nada!

A avenida aos poucos diminui o tráfego dos veículos. Pedestres caminham nas calçadas, em sentido às paradas dos coletivos. São os trabalhadores após os expedientes, exaustos, doidos para chegar a casa, rever as famílias, jantar, assistir a televisão e depois, repousar o corpo, para no dia seguinte, tudo recomeçar.

- Assim é que funciona.

O carro macio chega à Praça da Encruzilhada. E Jonas avista a figura esbelta, de pé, no abrigo, recebendo-o com o sorriso de "covinhas".

- Danadinha de bonita!

Estaciona. Abre a portae ela entra.

- Esperou muito?

- Nada. Cheguei agorinha.

Sorriem e coniventes na mesma linguagem da compreensão, silenciam.

O carro adentra no Bairro do Espinheiro, com seus edifícios, residências de classe médio-alta, aburguesada.

- E aí tem algum lugar especial pra gente ir?

Sorrindo, ela se volta:

- Não. Você é quem decide.

- Tudo bem. Conheço um barzinho legal.

Gira a direção, adentrando na rua ao lado esquerdo. E, mais uma vez silenciam.

Com a mão direita livre, pousa-a sobre a coxa macia e acaricia-a. A morena virando o rosto de lado sorri. A mão prossegue devagarzinho a carícia.

Então, mais uma vez se voltando, a jovem fala:

- A gente se encontrou ontem, na festa do seu amigo e hoje, já estamos nos conhecendo...

Mantendo a atenção no vidro à frente, Jonas aquiesce:

- Pois é hoje tudo é prático, rápido. O que acho interessante é que ainda há pouco, eu estava pensando nisso. Nessa rapidez com que nos "acertamos".

- "Nos acertamos".

A voz dengosa, feminina, repete, enquanto a mão atrevida vai subindo, subindo...

2

O jantar. A comida saborosa. As doses. A conversa descontraída e agora, o motel.

Estaciona o carro. Saltam. No elevador, sobem para o terceiro andar. E já se beijam com ardor, se acariciando.

No quarto, despem-se e se procuram n o desejo que cresce. O rosto de traços bem definidos se abre num sorriso e Jonas vê de repente os caninos alongados, finos, então sorri e para perplexidade da parceira exibe também os caninos pontiagudos, crescidos, então, com rapidez os dois corpos se separam e acontece a grande metamorfose...


3

Fora do carro, o taxista fumando espera o próximo passageiro. Profissional, aguarda, contudo, impacienta-se:

- O movimento hoje está muito devagar!

Reclama, no desabafo em dizer o que sente. Atira o cigarro pequeno fora e, ao erguer o rosto vê os dois grandes morcegos saindo da janela do terceiro andar do prédio defronte e que tomam direções opostas.

- Nunca pensei que num motel de luxo desses tivesse morcegos.

As formas se perdem na noite.

Pensativo, o homem acende outro cigarro.

- É cada cena que acontece na noite!

Então, ao aceno do sujeito que deixa o motel, entra no carro e vai atendê-lo.

- Terei visto aquelas criaturas?

Estaciona.

- Boa noite.

- Boa noite. Me leva pra Água Fria.

- Certo. Pode entrar.

O outro assim procede e o carro parte.

 

Paulo Valença é autor paraibano, com livros de ficção premiados nacionalmente; Verbete do Dicionário Biobibliográfico de Escritores Contemporâneos; Verbete da Enciclopédia de Literatura Contemporânea;Membro de várias instituições literárias; Presente em diversos sites; Reside em Recife/PE.


Autor: Paulo Valença


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